Ibisfilmes 12.º 4.ª
«Sim, sei bem» (Ricardo Reis)
http://arquivopessoa.net/textos/2635
«Last Poem» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/2589
«Quero dormir. Não sei se quero a morte» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2330
«Eu, eu mesmo...» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/2478
Ana (18,5) Expressão oral Leitura em voz alta muito boa. Não só não há erros (de tratamento da pontuação ou quaisquer outros) como o estilo de expressividade (nem neutro e burocrático — pecado em que talvez estejam a cair algumas das leituras que já fui ouvindo — nem demasiado histriónico, dramatizado) me pareceu quase o ideal (talvez ao poema de Campos conviesse um pouco mais de agitação, de irreverência, mas isso mesmo é discutível; por outro lado, essa súbita mudança de ritmo no último heterónimo trairia certa uniformidade assumida). Concepção Começa-se num primeiro cenário lisboeta, o miradouro de São Pedro de Alcântara, que Pessoa frequentava bastante (perto ficava a loja de antiguidades de Eliezer Kamenesky, amigo de Pessoa, onde o poeta, nos últimos anos, parece que chegava a fazer umas sestas); mostra-se-nos um Pessoa a escrever à máquina; a mesma Pessoa dactilógrafa vai surgir depois em mais dois espaços de Lisboa, à beira-Tejo e no Largo de Camões, também relevante na biografia do poeta. Ao mesmo tempo, ouvem-se textos de três heterónimos e um assinado por Fernando Pessoa ele-mesmo. Os textos são lidos sem que se detectem os seus limites. Pessoa A possibilidade de se fazer assim um dominó de textos dos vários heterónimos sem que os estilos dos poemas confinantes contrastem muito prova que em cada heterónimo há pelo menos um traço comum a outro ou ao ortónimo. Mas há outra razão para a relativa uniformidade de conteúdo e de estilo (que implicou engenho na recolha): o texto de Reis tem sido considerado dos menos ‘à Reis’ (logo na edição Ática se deixa em nota que parece mais do ortónimo do que de Reis; e na melhor edição dos poemas de Ricardo Reis, a de Luiz Fagundes Duarte, não encontro o poema [mas vi à pressa]); o de Campos é da «fase» intimista, que dissemos ter muitos paralelos com a poesia do ortónimo; o poema de Caeiro, «ditado pelo poeta no dia da sua morte» (mas note-se que «Last Poem» deve ser tido como indicação exterior ao poema, não é decerto o título [cfr. autógrafo: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item254/P1.html]), é, obviamente, muito especial, pouco típico. Não se estranhe a leitura «meu ceptro» no final do poema do ortónimo (embora na edição Ática, esteja só «ceptro», no autógrafo o que se vê é a expressão com o possessivo: «meu sceptro», tal como leu Ana). Duração 2:46
Cosme
«Tomámos a vila depois dum intenso bombardeamento» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/1837
Cosme (16) Expressão oral Ainda que sem incorrecções claríssimas (se tirarmos as duas que apontarei a seguir), a leitura devia ser mais expressiva: as duas primeiras estrofes descrevem um cenário de guerra que se pretende cru, chocante; o estilo de leitura pareceu-me demasiado desprendido. Nos antepenúltimo e penúltimo versos («Longe, ainda uma luz doura / A criação do futuro...») não pode haver a ligeira pausa entre «doura» (predicado) e «a criação do futuro» (objecto directo). Quanto ao último verso, teria de ser mais interrogativo («E o da criança loura?»). Concepção Há dois momentos facilmente demarcáveis. Na primeira metade do filme, ouve-se o poema (com imagem a negro); na segunda metade, surgem, eufóricas, as animações, elaboradas pelo próprio autor, que glosam o que havia de narrativo no poema de Pessoa (não há agora texto dito, apenas música, que, de resto, me parece marcante, embora talvez dissonante do tom do poema de Pessoa). Todo o trabalho de desenho, concepção das animações, é espectacular, além de, decerto, engenhosíssimo. Escrita Gostei de ver que as legendas (para créditos) não têm erros ortográficos (aliás, têm, mas em inglês: «a[n] school work». Pessoa Tem-se considerado (Georg Rudolf Lind) que Pessoa escreveu uma série de poemas antibelicistas entre 1915 e 1917, sugeridos pela I Guerra Mundial. Embora sem data explicitada, este poema será um deles. Tal como o mais conhecido «O menino da sua mãe» (ver no nosso manual, p. 171, ou http://arquivopessoa.net/textos/2052), «Tomámos a vila depois dum intenso bombardeamento» foca-se num caso único, «uma vítima inútil cuja morte vem a simbolizar toda a inutilidade da guerra» (Lind). Duração 0:52.
Bruno
«Meu pobre Portugal» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/1765
«Fiquei doido, fiquei tonto...» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/291
«Não digas nada!» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/460
«Quando era jovem, eu a mim dizia» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/3889
«O bêbado caía de bêbado» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/1241
Bruno (18,7) Expressão oral Ambas as leituras (a do entrevistado e a do entrevistador e narrador) socorrem-se de tom próprio, que visa contribuir para a caricatura, para a definição dos dois tipos (o do poeta um pouco fanfarrão e brejeiro; o do entrevistador fútil). Assim, a aferição da expressão oral tem de ter em conta que a leitura dos versos (que estão integrados no diálogo) é forçosamente filtrada pelos tiques, propositados, da oralidade de cada personagem. (Note-se que a situação alivia a complexidade da leitura dos textos poéticos mas também transfere para a representação, para a simulação do diálogo, a dificuldade da tarefa, que passa a centrar-se mais na representação do que na leitura.) Considerado este critério, confirmo que a oralidade é sempre muito boa, notando eu só um erro (de má pronúncia): no último verso de «Meu pobre Portugal», temos «transeunte amável» (e o que ouvimos no filme é «*trauseunte amável»). Concepção Trata-se de uma paródia de uma entrevista a Fernando Pessoa, enquanto cromo popular convocável por um programa cultural ligeiro (a moldura em que encaixa a entrevista, o tal programa «Conhecendo Lisboa com as pessoas», é mais da ordem do pastiche do que da paródia, a implicar, quanto a mim, uma subtileza, uma ironia mais finas). No diálogo com o sr. Fernando vão surgindo, integrados nas respostas, versos dos poemas que pus em cima (mas também de outros, creio, que terei de identificar depois com mais calma). Escrita Há bastante do próprio autor, que mostra dominar a redacção de vários registos (o anúncio de programas de televisão ente os géneros cultural e de lazer; os discursos de entrevistador desses programas e de quem presta depoimentos). Consegue-se parodiar com inteligência (e não é fácil escrever neste registo humorístico). A cerzidura de versos de Pessoa na entrevista (um «centão» é como se designa a construção de textos com excertos de outros textos) obriga a trabalho de redacção e ficou muito bem feita. Em vez de «poema que agora declarou», proponho «poema que agora declamou»; também trocaria o nome da primeira personagem que aparece (Beatriz Costa foi uma actriz, que as gerações anteriores à vossa conheceram bem — há muito aposentada, era figura frequente em entrevistas; nem sequer seria muito caricaturável, porque a si mesmo não se levava demasiado a sério; ainda por cima, salvo má interpretação minha, associamo-la mais à senhora idosa que conserva inesperada lucidez do que a uma personagem como a que o Bruno quis caricaturar). Nas legendas que vão cortando (autenticamente) o plano, vejo um erro de pontuação: «Mas[,] se não quiserem ser compreensivos, tentem ter dois metros [...]» tem de ter a vírgula que pus entre parênteses rectos (é que «se não quiserem ser compreensivos» é uma oração subordinada intercalada a meio da subordinante «Mas [...] tentem tal tal». Aliás, a redacção das legendas é dos poucos aspectos que mereciam ser aprimorados (não refiro o estilo coloquial — cria um contraste paródico com a formalidade suposta do programa —, mas a sintaxe: por exemplo, «autor dele» pode dar lugar a «seu autor»; e evitaria as aspas em «salamaleques» — a palavra existe, lá por ser ridícula não tem de ser aspada). Duração 5: 35
José
«A espantosa realidade das coisas» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3364
«Vive, dizes, no presente» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3226
José (16,8) Expressão oral Houve a preocupação de se ser expressivo (fugindo-se, portanto, a um estilo talvez demasiado neutro que tem imperado nos filmes já arquivados). O nível dessa dramatização da leitura é adequado (não se caiu naquele vício que encontramos em certas leituras de actores, o de se ser quase histriónico). Eu atenuaria apenas um tom, de perplexidade, de reforço, que ocorre nas frases de tipo exclamativo — e note-se que nos dois poemas nem há pontos de exclamação — e interrogativo. A ingenuidade de Caeiro faz que mesmo as frases «fortes», as máximas, as declarações, os entusiasmos e espantos, aparentemente enfáticos, devam ser ditos com certo desprendimento. Dada até extensão dos textos, é bastante bom que não haja praticamente «tropeções» em palavras ou más entoações por eventual incompreensão da sintaxe. Só notei estes lapsos: no oitavo verso de «A espantosa realidade das coisas», disse-se «muito mais», mas é «muitos mais» que está no texto; nos versos, do mesmo poema,«Mas acho que isto deve estar bem porque o penso sem esforço, / Nem ideia de outras pessoas a ouvir-me pensar» houve pausa excessiva na passagem de uma linha para outra, além de hesitação no ataque das primeiras palavras. Concepção Vai-se lendo os dois poemas de Caeiro, havendo no final do primeiro um texto que julgo construído pelo próprio autor do filme; há também slides que pretendem valorizar, quase resumir, a mensagem principal dos textos (parece-me que o segundo será mais eufórico do que os poemas de Caeiro permitem inferir). Nas imagens que vamos vendo temos passagens do quotidiano (algumas ligadas ao próprio autor — ténis, caminhos da cidade) que visam sobretudo retratar o presente; no entanto, à medida que se avança para o fim, surgem também imagens meramente ilustrativas (de paisagens): passamos do presente para a espantosa realidade das coisas. [Sobre um dos poemas, «A espantosa realidade das coisas», vale a pena comparar-se a perspectiva de José — ilustrativa, expressiva, mais virada para o exterior — com a de Filipa (12.ª 5.ª), que adoptou um registo menos interpretativo, mais reflexivo, intimista.] Escrita Num dos slides lê-se «O presente único e magnífico», mas convém que haja vírgula depois de «presente», porque o valor dos adjectivos não pode aqui ser restritivo (têm de funcionar como aposto, como explicação adicional). O último slide («Agarra-te ao presnte. / Vive a vida!», já o fui dizendo, parece-me fazer uma interpretação demasiado «clube dos poetas mortos» da exacta ideologia de Caeiro. Duração 2:47
David
«Amei-te e por te amar» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2230
David (16,3) Expressão oral A leitura quase não tem erros (exceptuo um mau momento em «Como te tive a amar» [v. 28]; e a pronúncia de «abstracto», em que /k/ não se deveria ouvir), o que não é despiciendo, até por se tratar de poema extenso, mas não é uma leitura que adopte sempre o registo expressivo apropriado. Sobretudo à medida que avançamos no texto percebemos que a leitura se contenta com ser fiel às frases no texto, faltando-lhe um estilo um pouco mais interpretativo. Por vezes, sentimos que falha o fôlego (porventura, ir mais lentamente, fazendo ligeira pausa entre estrofes, ou gravar segmentos menos extensos, resolveriam esta fragilidade). Concepção Tendo como fundo visual filme com vários motivos naturais e amáveis (gata, criança, flores, frutos), próximos do enunciador, vai-se lendo em voz alta o extenso poema de Pessoa. As imagens são adequadas mas não acrescentam muito ao que vai sendo lido; há uma excepção, quando se nos mostram laranja e limões espremidos, apresentados até para ilustrar máxima, que aparece nos slides. Vê-se que há boas capacidades técnicas, sentido de como tudo deve ser acabado, mas também alguma descontinuidade (que atribuo à duração do filme e à pressa característica do autor). Escrita «meninas, vamos à murta» tem de ter o acento que pus (grave). Pessoa Um lapso escusado – e que adivinho tenha que ver com a velocidade a que consegue trabalhar o David (mas que mostra também que certa demora não é sempre inútil) – foi a troca da ordem de boa parte do poema. Lidas as sete primeiras estrofes, saltam-se as sete sextilhas que se seguiam e passou-se para a parte final do poema (de «Sem dor… um pasmo vago» a «Compreenderemos tudo»), só então se lendo as tais sete quintilhas em falta (de «[…] tuas mãos, contudo» a «Assim quase sem dor»). O poema tem algumas lacunas, de palavras não decifradas ou de espaços que o poeta não chegou a completar, o que leva a leituras em voz alta ilógicas (é o caso de «E n’um […] mudo / Compreenderemos tudo»); valeria a pena, nestes casos, adoptar outra solução. Duração 3:01
Xavier
«O que há em mim é sobretudo cansaço» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/269
Xavier (15,6) Expressão oral Quase não há erros na leitura, e o poema não é dos mais fáceis. Há um lapso, ainda assim: no v. 10, foi acrescentado um pronome («o que [me] falta nelas»). Quanto à expressividade, é discutível se é sempre a ideal (há alguma margem de subjectividade nisto, mas, por exemplo, a última estrofe, complexíssima, merecia uma leitura mais interpretativa, mais elaborada). Em todo o caso, acho aceitável o registo seguido por Xavier. Concepção Adoptou-se um formato muito económico. Serve de fundo um filme que mostra o próprio acto de ler um texto e que transmite a ideia também de estudo, trabalho. Em off, a leitura em voz alta (que levará a associarmos o cansaço pessoano ao cansaço pelo estudo, pela leitura, até, do próprio Campos?). Concluindo: acho que o autor era muito capaz de fazer filme mais sofisticado. Um reparo: pedira que se evitassem poemas do manual (como é o caso deste, que até já fora analisado em aula). Duração 1:05
Filipa
«Ora até que enfim..., perfeitamente...» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/235
Filipa (16,65) Expressão oral Ao contrário do que fizeram muitos — que optaram por leitura neutra, sem arriscar um registo expressivo —, a Filipa tentou uma leitura quase dramatizada, o que envolve um nível de dificuldade maior. Saiu-se bem no que se refere às entoações (não encontro casos em que tivesse escolhido uma «pontuação» oral que não fosse, à luz do que escreveu Pessoa, aceitável), o que é já muito meritório e, como disse, mais difícil de conseguir no tipo de leitura, expressiva, que arriscou. Notei só dois lapsos, aliás, não de entoações mas de pronúncia de palavras: «serapilheira» foi dito quase «s[α]rapilheira» (como se tivesse um «a», que é como quase todos dizem popularmente, mas não é como se deve dizer {entretanto, a Filipa chamou-me a atenção para o facto de na sua edição estar mesmo «sarapilheira»; e eu também tenho na edição de Campos que acho melhor, a de Cleonice Berardinelli, «sarapilheira»; leia-se, portanto, como eu disse que se não devia ler}); logo no terceiro verso do poema, «loucura» saiu quase como «l[u]cura». Concepção Além da citada declamação expressiva, temos um filme que mostra a autora a escrever o texto de Campos, depois de captação de imagem — de um objecto circular — que leva a que se obtenha uma sequência abstracta que bem poderia representar a complexidade psicológica em que se encontra o eu poético. Estas imagens não visam propriamente acrescentar sentido à interpretação do texto resultante da audição, mas acompanham-no bem e revelam cuidado técnico e planificação do trabalho. Escrita Numa das legendas, «Álvaro» surge com acento grave. Duração 1:20
Rodrigo
«Eu nunca guardei rebanhos» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/1456
Rodrigo (15,4) Expressão oral É difícil assentarmos no registo de leitura mais adequado a Caeiro, mas admito que talvez devesse ser ligeiramente menos «assertivo» (mais apagado, mais perplexo-hesitante) do que faz Rodrigo. De qualquer modo, o tom adoptado é também aceitável. Uma certa sobre-entoação traz problemas, já que qualquer má interpretação das devidas sintaxe ou pontuação torna-se mais notada (a penúltima estrofe evidencia esse problema). Por vezes, acontece vincar-se demasiado a pontuação — nem todas as vírgulas escritas devem corresponder a verdadeiras pausas na oralidade —, como sucede em «Porque, se o não soubesse, em vez de...» (as vírgulas são necessárias para delimitar a oração subordinada condicional mas não se reproduzem na leitura em voz alta) ou em «Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos, escrevo versos num papel» (em que a oração gerundiva não precisa de ficar tão nitidamente apositiva). Entretanto, em «E se desejo às vezes, por imaginar, ser cordeirinho», não se pode não fazer pausa na segunda vírgula (depois de se ter parado na primeira). Concepção O primeiro minuto é com o autor a andar, até se sentar no areal (não era mais apropriado, e mais acessível, aproveitar-se o terreno que imaginamos para Caeiro, uma granja, por exemplo?). Passado este momento de filme português (valorizado pelo ângulo de tomada de imagens, rasteiro), começamos a ouvir o texto do poema I do «Guardador de Rebanhos» (que aliás está no nosso manual, ao contrário o que pedira evitassem). A câmara passa a focar-se no autor, que logo associamos ao sujeito poético, porque, parado, contempla o horizonte, vai palpando a areia, parece estar, enfim, na beatitude típica de Caeiro. Quando o poema está a chegar ao fim, o «poeta» retira-se e, desta vez, faltam passos pela praia antes que o texto se cumpra todo, surgindo-nos o fecho abruptamente (por falha técnica do Rodrigo ou capricho do Blogger), sem que ouçamos os últimos catorze versos. Resolvido este problema, deve considerar-se que o filme é um objecto limpo, escorreito, ainda que sem extraodinária generosidade criativa (de que o Rodrigo seria capaz). Pessoa Vejam-se aqui autógrafos deste texto de Caeiro: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/guardador/guardador-ii_01.html Duração 2:38
Daniel
«D. Fernando, Infante de Portugal» (Fernando Pessoa, Mensagem)
http://arquivopessoa.net/textos/177
Daniel (15,6) Expressão oral É uma leitura sem falhas «gramaticais», boa, mas, quanto a mim, demasiado empolada. De certo modo, o tom épico, que o poema tem indiscutivelmente, seria mais bem traduzido por leitura em registo neutro (grave, mas não emotiva nem enfática). Concepção Solução adoptada é bastante pobre: lê-se o curto texto, enquanto se vê filme promocional de Ceuta. (As imagens da Ceuta actual e turística não serão ilustração muito pertinente da figura do Infante Santo, mártir. Por outro lado, não convém usar-se trechos tão longos de filmes de que se não é autor.) Enfim, creio que o Daniel pode fazer bastante melhor. Duração 1:22
João P.
«Quem me dera que a minha vida fosse um carro de bois» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/598
João P. (17,8) Expressão oral Não é o que de melhor há neste filme, mas, ainda assim, trata-se de leitura muito razoável (mesmo se rouca, o que se compreende, por resultar de altos serviços prestados à causa leonina – seria eu bem menos compreensivo se se tratasse de sequelas por dedicação aos do, dizem eles, «sagrado manto»). Os dois últimos versos do poema de Caeiro («Mas eu não sou um carro, sou diferente / Mas em que sou realmente diferente nunca me diriam») foram os que saíram pior («não sou» e «que sou» percebem-se mal); na parte do texto criado pelo autor, era preferível a pronúncia «responsab’lidade» a «responsab[i]lidade» (que soa artificial, monitorada pela grafia, como as pronúncias «Filipa» ou «ministro» com is onde a pronúncia corresponde a um «e» mudo). Concepção Criou-se um enquadramento narrativo susceptível de acolher, a certa altura, o poema de Caeiro. Essa ficção usa um narrador participante que, paulatinamente, vamos percebendo tratar-se de cacifo, o que, no entanto, só é explicitado no fecho do discurso. Resulta irónico o facto de o texto do cacifo se ocupar do quotidiano dos pares do verdadeiro autor; a própria citação de Caeiro torna-se duplamente ambígua (assumida pelo cacifo, já não é como Caeiro a quereria; mas nós não deixamos de a aplicar também não ao ‘eu poético’, o cacifo, mas ao autor, o que a faz ter ainda um terceiro significado). A narrativa tem o mérito da sua idealização (assinale-se, sobretudo, a capacidade de reunir no pouco tempo do filme todos os ingredientes de uma história que não é sentida como forçada), mas também do rigor usado na execução (escrita, imagens, montagem, nada parece feito sobre o joelho). Pessoa Um dos autógrafos: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item171/P1.html Duração 1:59
Gil
«A rapariga inglesa, uma loura, tão jovem, tão boa» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/1128
Gil (17) Expressão oral Muito bem o oral de simulação de reflexão/diálogo; bastante bem a leitura em voz alta dos primeiros dez versos do poema; também de elogiar a capacidade vocal revelada na parte do poema cantada. Concepção Há três partes distintas. A primeira parte serve para criar condições para a segunda. Podia ser um manual de instruções de como proceder na tarefa do filme sendo aluno muito conciencioso — como o Gil. Não é bem um «making of» mas uma idealização do processo como seria resolvido por um aluno ideal (inexistente, claro). Nesta parte da narrativa há excelente clareza: bom texto, boa representação — natural, apesar de o conteúdo ser quase didáctico —, boa leitura em voz alta do início do poema, apurado domínio das técnicas (computador, vídeo) mas também do modo de se contar uma história em filme. A primeira parte termina com o pretexto para o miolo do filme: estaria tudo a ser monótono, era preciso mudar de formato. Na segunda parte, teremos o resto do poema cantado ao som de música cujo nome não me ocorre. Como a melodia não corresponde à métrica do poema, o exercício implica um estilo de interpretação bastante «à rapper», com malabarismos para fazer caber os versos na música sem alterar demasiado a entoação e sintaxe normais. É claro que a percepção do que dizem os versos de Álvaro de Campos se perde quase por completo. Em termos de exercício vocal, tenho de reconhecer grande competência a Gil, que consegue desenvencilhar-se desta arrumação de um texto numa matriz que não era a sua com indiscutível sensibilidade musical. É pena que o som não esteja bem calibrado, já que a música, muito alta, impede que se perceba bem a letra (e, portanto, esta capacidade que gabei). O poema de Pessoa não chega a ser todo lido (aliás, cantado). E entra-se numa terceira parte que serve para retomar a narrativa inicial, agora em modo escrito, pelas legendas apenas. Este regresso à reflexão sobre o acto de fazer o filme é auto-irónico, defensivo, e no fundo está mais no plano da enunciação do que a primeira parte (o «eu» equivale agora a Gil, quando, na primeira parte, sentíamos que aquele «eu» era ficcionado). Escrita É discutível a legenda «E a todos os outros que não me lembro» (é preferível: «E a todos os outros de que não me lembro»). Pessoa O primeiro verso deste poema foi também usado, mas apenas pontualmente, no filme de Raquel & Joana L. (12.º 6.ª), curiosamente, outro filme de «making of» [ http://gavetadenuvens.blogspot.com/2009/09/ibisfilmes-12-6.html ]. (Na mesma categoria de 'vídeos de «making of»' entram os de Raquel & Soraia [12.º 1.ª] e Joana L. [12.º 1.ª]: http://gavetadenuvens.blogspot.com/2009/09/ibisfilmes-12-1.html ) Duração 5.02
Duarte
«Insónia» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/2358
Duarte (16) Expressão oral Há um único erro de pronúncia: em «excepto», o «p» não é para se ouvir (na pronúncia portuguesa europeia). Também a pontuação foi bem interpretada. A crítica que se pode fazer é do domínio da expressão da instabilidade emocional de Campos. A leitura de Duarte foi expressiva, e o tom adoptado pode ser adequado ao que o poema traduz; no entanto, esse registo, como o poema é longo, ganharia em ser intercalado com momentos com outras velocidades. Já o disse a propósito de outros filmes com poemas de Campos: para nos aproximarmos da expressividade apropriada a este heterónimo, temos de misturar ritmos de leitura diferentes. Para que nos apercebamos da velocidade inerente a certos troços, é preciso que outros sejam lentos; para que haja um estilo de quem está ansioso, sôfrego, é preciso que trechos de leitura «neutra» alternem com frases ditas abruptamente. (É o problema da filmagem de aviões em voo por Howard Hughes: para que se perceba o movimento, tem de haver nuvens paradas.) De qualquer modo, considerada até a extensão e a dificuldade do poema, é muito interessante que se tenha conseguido uma leitura tão acertada. Concepção Enquanto decorre a leitura expressiva de «Insónia», procura-se ilustrar o poema com imagens de um insomne nos dias de hoje (como se percebe de uma visita ao frigorífico — que, é claro, não havia no tempo de Pessoa, mas não deixa de ser um objecto que imaginamos entre as evocações futuristas de Campos: «Ó guindastes, ó frigoríficos com compal de laranja!»). Em termos técnicos, falhou a luz (mesmo querendo-se representar a noite, não resulta tanta escuridão); também o som precisava de ser mais uniforme. Pessoa Este mesmo poema foi tratado também no filme de Ricardo do 12.º 6.ª (creio que Duarte tinha previsto, inicialmente, escolher outro texto). Duração 2:57
Gonçalo
«Carnaval» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/4427
Gonçalo (15,7) Expressão oral A sintaxe é bem seguida, não havendo erros por má interpretação da pontuação nem más entoações; o estilo de leitura, muito clara, é agradável. De qualquer modo, eu julgaria apropriado ao poema (e, em geral, aos poemas de Álvaro de Campos) um ritmo um pouco mais nervoso, talvez mais veloz e, sobretudo, com mudanças de ritmo. Parece-me que seria essa a maneira de reproduzir a sofreguidão que se revela nos textos do Campos sensacionista-futurista (e no deste texto, que tem características intimistas mas tem também a sua costela sensacionista). Há duas confusões de pronúncia: «acordo» deve ser lido [ô], já que se trata do no nome e não do verbo («De amoroso acordo com tudo isto» = ‘em amorosa concordância com tudo isto’). Quanto a «zulu», é uma palavra aguda (as palavras agudas terminadas em «u» ou em «i» não levam acento), embora tenha sido lida como palavra grave. O verso «Como eu sou deles com um nojo a eles!» saiu hesitante. Concepção O formato é simples: leitura do poema, enquanto vemos um filme ilustrativo de um Carnaval. Nas instruções do filme desaconselhei este tipo de estratégia (a de buscar a ilustração directa), mas, neste caso, não acho que resulte mal, paradoxalmente, por o carnaval a que alude Campos não ser decerto o desfile-espectáculo que vemos representado (assim, o contraste entre o carnaval sobretudo íntimo de Álvaro de Campos e o Carnaval das imagens acaba por ser mais ‘à Campos’ do que a identificação que houvesse entre imagens e texto). Ao contrário, acho a música perniciosa, já que, por o seu ritmo impede que se percebam as modulações que, apesar do que disse, se notam na leitura de Gonçalo (a música neutraliza esses momentos mais expressivos, acentuando o estilo de leitura que considerei ser demasiado calmo). Ficamos também sem saber se as imagens foram recolhidas pelo próprio, mas creio que não (nestes casos, convém explicitar as fontes). Duração 2:48
Carlos
«Árvore verde» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/3561
«Cai chuva do céu cinzento» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/4289
«Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2252
Carlos (15) Expressão oral Deve ter havido bastante rigor no ensaio, já que são muito poucos os erros ao nível de palavras ou de pontuação. Não sendo a leitura em voz alta ponto forte do Carlos, é meritório o resultado a que se chegou. Porém, o cuidado em percorrer o texto com atenção, evitando erros, levou a um ritmo de leitura demasiado lento (que não será o ideal para dar aos textos expressividade), o que não invalida que esta leitura em voz alta seja muito louvável. Ainda assim, há alguns erros localizáveis. Em «Árvore verde», nos versos «Ver é dormir / Neste momento», apesar da mudança de linha, não deve haver pausa; em «Lembro?», a interrogação não ficou tão marcada quanto deveria; o último dístico, «Se eu nunca soube / O que ele era», teria de ser dito com um tom de perplexidade, também quase interrogativo. No poema «Cai chuva do céu cinzento», «Verlaine», nome de importante poeta francês, pronuncia-se «Verl[ε]ne». No terceiro poema, «Chove. [...]»: «indistintamente» foi a única palavra portuguesa («Verlaine» não conta) em que houve um tropeção na leitura. Concepção Um filme sobretudo paisagístico ilustra, quase directamente, o que se vai ouvindo: árvores, chuva. A partir de certa altura, fica só um slide com o retrato de Pessoa, o que me parece significar que o trabalho foi, neste particular, pouco planificado. Pessoa «Cai chuva do céu cinzento» alude, com certa ironia, a um conhecido poema de Paul Verlaine: «Il pleure dans mon coeur comme il pleut sur la ville». Duração 3:17
António
«Do meio da rua» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2559
«Aqui neste profundo apartamento» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/3769
António (15) Expressão oral Primeiro, analiso a leitura de «Do meio da rua». Sem haver erros claros, as entoações e a expressividade falham bastante. Diria que a leitura deveria ser mais ágil, mais «plástica». Era preciso distinguir o estilo das duas primeiras quadras (a percepção do pregão, inopinadamente) e as consequências (nostálgicas) dessa percepção, a última estrofe. António adoptou um tom demasiado uniforme, monocórdico, que apaga este lado cénico que tem o poema. O aparte entre parênteses que constitui o segundo verso, «Que é, aliás, o infinito», teria de ser dito com mais ligeireza, para se perceber que corresponde a uma intercalação, supérflua para o resto da sintaxe. Também às reticências após «o mesmo pregão» convinha dar-se outra entoação (de quem concede ao ouvinte tempo para concluir o que se omite através daquela pontuação). O segundo poema já aceita um ritmo mais lento como o que lhe deu António. Ainda assim, marca-se aqui demasiado as várias vírgulas (como se a cada vírgula do escrito tivesse de corresponder uma pausa oral). Concepção Dois curtos poemas de Pessoa (valia a pena talvez ter escolhido textos um pouco maiores) são ilustrados com filmagens (a do primeiro poema está bastante escura; a do segundo poema remete para a recordação, a partir de fotografias, o que associamos ao acto de rememorar à procura de si mesmo a que se aludia no texto). Pessoa Ambos os poemas tratam da compreensão de si mesmo através a recuperação do passado (assumida ou não). O texto «Do meio da rua» lembra-nos outros de Pessoa ortónimo (mas também, mais vagamente, alguns do Campos intimista). Um pregão ouvido na rua transporta passageiramente o poeta até à infância, para, logo depois, rejeitar esse confronto com o passado e preferir-lhe o repouso indiferente («Dorme, coração»). Duração 0:44
Bernardo
[porei comentário mais tarde]
Tiago G.
[porei comentário mais tarde]
<< Home