Um
Seguem-se os Egafilmes (microfilmes relativos aos Maias ou aos amores de Pedro e Inês) do 11.º 1.ª. Para já, os de João G., João Af. D., Diogo, Cláudia, Carolina & Joana G., Luís, Micaela & Mariza, Brigitta & Eliana, Gonçalo, Tiago P. & Rui, Raquel & Alexandra, Pedro I, Hugo & João A., Ricardo L., Joana L., Soraia.
João G.
João G. (17,3) Concepção É a biografia (ou o epitáfio, se se quiser) de uma das personagens de Os Maias, Pedro da Maia. (Vendo bem, não sei se podemos dizer que Pedro é um protótipo do herói romântico. É um protótipo do homem romântico e, sobretudo, a prova, a iliustração, dos malefícios de um certo ambiente romântico.) O texto retoma alguns trechos do romance, mas resumindo-os muito e agregando-os. Expressão oral Não há falhas. É uma muito boa leitura. Talvez que «anunciando-lhe que, brevemente, seria avô» seja um daqueles casos em que às vírgulas da pontuação escrita não teriam de corresponder pausas na oralidade. Texto Construiu-se um texto muito fundado em passos dos próprios Maias. É um condensado bem feito, mas a que talvez faltem mais rasgos do próprio autor do filme, que, dada sua capacidade, talvez devesse assumir o risco de um texto mais original. De qualquer modo, é trabalho bem acabado, limpo, quase sem erros. É só preciso corrigir um dado: quando Pedro, regressado da Europa, procura Afonso — que saíra entretanto para Santa Olávia —, a casa a que se dirige não é o Ramalhete, é a casa de Benfica, que era aí que por essa época residia o avô de Carlos (será aí também que irá Pedro quando Maria o trair, como aliás se diz no egafilme). Duração 2:31.
João Af. D.
João Af. D. (18) Concepção Finge-se um programa de televisão com entrevista a Eça. O autor faz de jornalista-locutor mas também assume o papel do próprio entrevistado. Houve engenho nesse recurso; há também sempre cuidado, requinte, em toda a encenação (cenário, adereços). Expressão oral Nestes casos, tenho dificuldade em perceber se devo aferir sobretudo pela representação (que implica mais do que a leitura: gestos, sorrisos, etc.) ou mais leitura (creio que vai havendo sempre leitura, por algum sucedâneo de teleponto). Em qualquer caso, esse compromisso entre leitura e representação não é fácil para os «actores» dos egafilmes. João saiu-se bem, embora creio que mais no papel de Eça do que no do entrevistador (talvez porque as intervenções do entrevistador supunham naturalidade, mais difícil de conseguir do que o snobismo de Eça; por outro lado, a entoação nas perguntas é difícil, e as interrogações tendem a parecer escolares). Pronúncia de «Egipto» mais usual é sem se ouvir o [p] (mas talvez Eça, no século XIX, ainda o pronunciasse). Texto Percebendo-se que houve leitura de ensaios, de manuais, para se construir a entrevista, ainda assim conseguiu o autor tornar o texto quase coloquial (o que é sinal de que também houve trabalho de redacção); há umas poucas falas, porém, em que essa conformação do investigado a um estilo oral não foi tão eficiente quanto devia — e, nesses raros casos, parece haver informações excessivas nas respostas de Eça (como se este debitasse um curriculum vitae). Achei interessantes as alusões ao filme em torno do Padre Amaro («foi exactamente assim que eu o imaginei») e aos romances editados pelo filho, que considerei irónicas (mas eram mesmo para ser irónicas? se sim, não devia esse ironia ter ficado mais explícita?). Será mais «crónica de costumes» do que «dos costumes». Duração 4:03.
Diogo
Diogo (17,3) Concepção Num invólucro de anúncio (que só fica claro no final), temos a situação de alguém que responde a perguntas de jogo em torno de Os Maias. A escolha do formato é engenhosa, já que é um bom pretexto para, por um lado, se exibir informação concentrada sobre a obra, sem que esta pareça artificial; por outro lado, implica uma leitura bastante fragmentária (perguntas, respostas, interjeições, comentários). Além da boa planificação do filme, merece relevo a parte gráfica (que considero muito clara e perfeita).
Expressão oral Devemos distinguir a leitura em voz alta das perguntas e a parte, que também é lida mas já é muito representada, das reacções do respondente. No fundo, pensando bem, é sempre o mesmo tipo de leitura — uma leitura que simula que alguém está a ler, a pensar em voz alta, como se falasse sozinho consigo, embora a pretexto de perguntas que está a ler (mas a ler para si). O estranho desta situação é que para a leitura em termos de representação (de uma personagem que é alguém a resolver um jogo) ser boa não pode ser demasiado perfeita, porque uma pessoa que esteja a ler para si, mesmo em voz alta, procede com bastante anarquia, com cortes, pausas. Em termos de leitura «pura», o Diogo esteve muito bem (não há falhas); só que, por vezes, nas partes que são mais de representação (as mais exclamativas), convinha ser menos leitor e quase actor. Por outro lado, já no final, apercebemo-nos de que a cena pode inscrever-se numa situação de publicidade (o que já justificaria o estilo, organizado e «certinho» da locução). Não descobri erros de leitura, excepto talvez este: «sugere» pareceu-me pronunciado com aférese (de «su») Texto Sempre bem escrito. Também aqui a crítica que se pode fazer é a de que algumas das explicações sobre as alíneas (já depois da resposta dada, sobretudo) talvez devessem ser mais coloquiais. Às tantas, não parecem de uma pessoa a pensar, parecem de alguém a ler um ensaio. Em vez de «que case apenas com Maria Eduarda após a morte do avô», poria «que case com Maria Eduarda apenas após a morte do avô» (embora também seja aceitável como estava). Gralha (ou erro?): «caracaterizado». Duração 3:19.
Cláudia
Cláudia (16,9) Concepção Começa-se por uma parte mais pessoal, que, a pretexto de referir a experiência com a necessidade escolar de ler a obra, anuncia a exposição que se segue (caracterização de cada uma das personagens de Os Maias). Gosto do estilo desta parte introdutória, na 1.ª pessoa, e prefiro-o ao da segunda metade do filme, em que se repetiram informações correntes. Expressão oral Boa leitura. Reparei no cuidado havido em não fazer apócopes (cortar finais de palavras), que anteriormente criticara. Em compensação, notei talvez ligeiro alongamento excessivo, que dá à leitura um estilo que lembra o de programas culturais na televisão, por exemplo. Deve dizer-se «Salc[e]de» (disseste «Salc[ε]de», e quem se atreve a troçar da minha maneira de dizer «coragem» — com «o» aberto — merece que eu aqui cite esta má pronúncia). Em «carácter» o «c» é mudo (em «cara[k]ter» há uma pronúncia hipercorrecta, levada pela leitura apenas, como faziam os professores ao, ao ditarem, tentarem deixar clara a ortografia) — quando o acordo estiver em uso, escreveremos «caráter» (embora seja um daqueles casos em que a grafia com «c» será também autorizada, porque se aceita que a pronúncia com «k» ainda acontece). Não percebo, cerca de 1:20, o que está entre «e também» e «hereditários» (há aqui rapidez lisboeta). Texto A escolha do formato condiciona a escrita. A Cláudia seria capaz de fazer texto mais interessante, se tivesse preferido abordagem menos académica, menos convencional, como aliás faz no início. Na segunda metade, as considerações aproximam-se muito do que vemos nos manuais e sebentas (embora se perceba que houve o cuidado de se usar linguagem própria). Podiam ter-se evitado lugares comuns (que estão para «encher»): «amigo do seu amigo»; «um simples maço de folhas»; «páginas repletas de histórias». Sintaxe discutível a de «destaca a situação superior» (seria «destaca-se a sua situação superior»?). Em «Dâmaso Salcede, homem baixo, gordo e [que] tem como especial [...]» é necessário o «que». O verbo «descrever» é demasiado usado ao longo do filme. A propósito de Alencar, dizes face «escoveirada», que não existe e deve ser substituído por «escaveirada». Duração 3:31.
Joana G. & Carolina
Carolina & Joana G. (16,9-17) Concepção É um filme sobre os amores de Inês e Pedro, guiado pelos Lusíadas (e incluindo também cenas do filme de Leitão de Barros). Justaposto ao texto de Camões, aparece um texto maior, criado pelas autoras, em que personagens de hoje manifestam estranheza acerca daquele amor (comparando-o com o que seria verosímil modernamente). Estas personagens são visíveis apenas em sombras ou em membros inferiores fugidios. A abordagem, muito menos descritiva do que a que inclui os exemplos de filme e do poema, favorece o conjunto (dramatiza-o, torna-o mais reflexivo). Expressão oral Ambas as autoras-leitoras estiveram bastante bem (ou muito bem, até) na leitura dos passos que escreveram (e também na estância 123, cuja leitura repartiram). No entanto, na estância 119 (a cargo de Carolina) houve falhas localizadas, embora a leitura fosse até fluente, em termos de entoação. Não sei se é erro de leitura em voz alta ou da leitura que fizeram ao transcrever o texto dos Lusíadas, mas é «tu, só tu, puro amor» (ouvi «poro»). «Pérfida», o que está em Camões, pareceu-me «pérvida». E, ainda na mesma estância, é «f[ô]ra» que deve ser (não «f[ó]ra»). Ao ler a estância 120, Joana esteve, ao primeiro ouvido, menos fluente, mas, em compensação, não errou em palavras. Lição: futuramente, é preciso ter especial cuidado na transcrição ou interpretação dos textos (quando já de épocas passadas, sobretudo). Texto Bom texto (o criado por Carolina e Joana, entenda-se). Não está bem: «É o que alguns querem e não lhes deixam» (seria: «É o que alguns querem e não lhes deixam [fazer]»). «Milhões e milhões de vezes» parece-me ingénuo, lugar comum infantil; como «lendas de há centenas e quase milhares de anos». Duração 3:20.
Luís
Luís (16,9) Concepção Imagina-se uma página de um diário de Carlos da Maia. Essa página é pretexto também para se fazer uma visita por locais de Lisboa relacionados com a personagem. É, portanto, um filme em formato de roteiro pelo lugares dos Maias — [pertence, em parte, a este formato o egafilme de Tiago G., do 11.º 4.ª]. Note-se que a recolha das imagens implicou decerto bastante pesquisa e trabalho (embora em passeio). Expressão oral A leitura é boa, mas talvez abaixo do nível que o Luís costuma alcançar nas leituras em voz alta. A leitura de um monólogo, a que mais se assemelha à de uma página de diário, é difícil, se não for relativamente neutra. Um texto que já tem, pelas pausas, pelo teor reflexivo, várias marcas de emoção, acaba por requerer que a leitura seja parcimoniosa nas entoações (a não ser que se adopte um estilo dramático que é depois difícil de manter durante tanto tempo; nalgumas das entoações, reflectiu-se esta dificuldade). A pronúncia «Arist[u]cracia» será mais comum do que «Arist[ô]cracia»; é «espontaneidade» (e não «espontan[ia]dade»; houve hesitação, ou pausa excessiva, em «Onde [se] discutia a política». Texto Bem escrito, embora me parecesse que as alusões a aspectos literários (de «teoria» sobre os Maias) prejudica o registo que se espera de um diário. (O estilo mais rico, mais para ler com os olhos apenas do que oralmente, também não facilita a leitura expressiva.) Não há erros, a não ser os que ponho a seguir (que nem sei se serão de escrita se lapsos de leitura): «olhos castanhos que se pareciam com as [tem de ser «os»] de uma deusa»; em vez de «e não um vencedor que ele idealizava», teria de ser «e não o vencedor que ele idealizava» (ou então: «e não um vencedor, como ele idealizava»). Duração 4:04.
Mariza & Micaela
Micaela & Mariza (17,5) Concepção Em representação, transpõem-se para o século XXI as personagens Pedro da Maia e Maria Monforte. Essa transposição obriga a mudanças de linguagem, de contexto (apartamento), de costumes (telemóvel; tráfico; ...). Expressão oral Neste domínio é a representação que será aferida. Inclui esta a maneira de dizer o texto (tal como a leitura em voz alta, afinal) mas também aspectos gestuais, proxémicos (ocupação do espaço na interacção com o outro), etc. A representação tem uma exigência que a leitura não põe: a necessidade de se decorar o texto. Quanto a isso, parece haver um único esquecimento, da parte de Mariza, em «me zangasse [...] contigo» (ou foi propositada a pausa para vincar a resposta de Maria?). De resto, ambas as actrizes vão bem, mas destacaria Micaela, que não só tem papel mais difícil como mostra muita capacidade de representação (incluindo-se nisto, como é óbvio e já disse, a maneira de dizer o texto). Texto Distingamos a criação da cena e a linguagem. Esta parece-me sempre adequada (conseguindo não parecer artificial e nunca ter sintaxe repreensível, conjugação difícil). A idealização da peripécia também a acho bastante perfeita, embora se possa dizer que a situação podia ter sido mais aproveitada (havia, no entanto, o risco de se perder a ponte com a história de Eça ou tudo parecer demasiado estapafúrdio). No título, «Da» (Pedro da Maia) não devia estar com maiúscula. Em «Vou escrever essa tal carta» é uma estrutura muito da vossa geração — sim, é verdade, é a geração que se está a ser evocada, mas, ainda assim, ... —, mas não é elegante (preferível: «essa carta»; «a tal carta»). Duração 2:48.
Brigitta & Eliana
Eliana & Brigitta (18,5) Concepção Parodia-se um episódio fulcral da intriga (já que nele tem origem a tragédia), alterando os dados, contemplando-se um envolvimento de Pedro com Tancredo. (Já agora: O Barão de Lavos, de Abel Botelho, e O Senhor Ganimedes, de Alfredo Gallis, são obras, embora um pouco posteriores aos Maias, da escola naturalista e que têm protagonistas homossexuais.) A brincadeira aproveita esta reformulação do enredo, mas também, mais sub-repticiamente, caricatura o género «telenovela» (é um pastiche de resumo dos episódios de uma telenovela), motivo pelo qual, pela primeira vez, não acho impertinente a canção de Teresa Salgueiro, alusão à série brasileira. Como o formato é esse, o enredo pode ser apresentado a cem à hora, sem que isso pareça artificial. O género permite também que de cada momento da história sejam apresentados meras ilustrações (como se fossem curtas sequências de um todo acabado); houve engenho na escolha dessas ilustrações, que, em geral, acentuam a paródia. Também se consegue fechar a intriga, chegando até ao momento em que Maria Eduarda avista um homem elegante (?) com uma cadelinha (?), passo gémeo do relance de Carlos a Maria Eduarda no peristilo do Hotel Central (e que fecha o ciclo dos preparativos da tragédia). De tudo isto, o mais inverosímil é a licenciatura em Medicina de Maria Eduarda (no século XIX, uma mulher não ia para a Universidade, e menos ainda para Medicina). Expressão oral Leitura sempre perfeita. Aspecto interessante foi, a dado momento, terem articulado as intervenções das duas leitoras; também engraçado o esforço para mimar a voz de Pedro. Texto Muito bem escrito. Um lapso: Maria Monforte não se dirigiria ao Ramalhete mas a Benfica, que essa é que era a morada de Afonso então (aliás, num segundo momento, as autoras já referem Benfica como local onde se suicidara a Monforte). Duração 3:06
Gonçalo, Tiago P. & Rui
Rui, Tiago P. & Gonçalo (18,2) Concepção Num comentário encomiástico, podíamos dizer que o filme procura desconstruir o acto de fazer um egafilme. Numa visão menos embevecida, diria que os autores aproveitaram bem a sua criatividade, conhecimento de formatos/géneros, destrezas técnicas, para resolver um problema, o de não dominarem completamente o assunto sobre que o egafilme se devia fundar, Os Maias. A solução é até talvez preferível a ancorarem-se numa parte ínfima do enredo — alternativa acolhida por outros nas mesmas condições e a que os próprios autores deste egafilme, recorrem, pouco entusiasmados, a dada altura («vamos antes falar do suicídio») —, mas não deixa de ser uma «fuga para a frente» de quem teria obrigação de ser mais arrumado. O filme tem muitos momentos inteligentemente criados: a paródia às telenovelas; a paródia ao estilo declamatório, a cerzidura de variados géneros, as sincronizações de sons e imagens incoerentes (nas falas e na execução dos intrumentos); o acabamento estético, a implicar capacidade técnica, visível até no genérico (por um lado os dizeres irónicos; também a reposição acelerada das vozes de todo o filme); a composição musical criada. Expressão oral É sempre leitura em voz alta (para quem estivesse muito distraído, ou não conheça os protagonistas, as vozes são dobradas, mas trocadas: ouvimos a voz de Gonçalo nos lábios de Rui, de Tiago na boca de Gonçalo, etc.). Essas falas são, quase sempre, muito bem lidas. Tal leitura não implica textos difíceis, é verdade, mas exige expressividade, obrigando mesmo a uma representação (radiofónica, neste caso). Há também oral musicado. A pronúncia de «míope» é interessante: fazem a tónica em «m[iú’]pe», e, com efeito, é assim que todos vamos fazendo, embora a grafia conduzisse a «m[í’]ope». Texto Esquecido o estigma, já apontado, enquanto trabalho escolar, deve dizer-se que, uma vez assumida a subversão do tema, a escrita é muito boa (ver toda a planificação; e, mais de perto, a letra da música, as ironias nas falas e no genérico). Uma construção que creio agramatical é «porque te sucumbes» (a construção normal é «sucumbes», seguindo-se ou não a preposição). É dito «desfeixe», quando decerto se pretendia «desfecho» (1:37), por lapso de escrita ou de pronúncia. Em vez de «Parem lá de falar essa vertente brasileira do português», devia ser «Parem lá de usar essa [..]» ou «Parem lá de falar nessa [...]. Duração 4:28.
Raquel & Alexandra
Alexandra & Raquel (17,2) Concepção Apresenta-se «A Hebreia» (in Memórias de um átomo), de João da Ega, em suposta reformulação por Tomás de Alencar (no final, o próprio poeta romântico explica a Ega o sentido das adaptações que decidira empreender, num texto aliás irónico e, esse, quanto a mim, pouco alencariano). A história é lida, acompanhada de desenhos das autoras do egafilme (já não me lembro se havia uma autoria específica da parte iconográfica), que incluem, em legenda, algumas das falas. Todo este formato revela cuidado na elaboração e pesquisa. Expressão oral Muito boa leitura (calma, nítida; com ambas as leitoras a entrarem nos devidos tempos; quase sem hesitações — há um ligeiríssimo tropeção em «ciprestre»). Excepção a esta clareza: «galantos resplandeciam[?] por entre a neve, ultrapassando o destino que [?]» (neste trecho percebe-se mal o que Raquel lê; e terá lido mal «resplandeciam», se era esta a palavra). Texto Rico, usa linguagem, por vezes, difícil (uma certa atracção por linguagem endomingada não sei se tem em vista imitar a personagem que nos Maias caricaturaria Bulhão Pato), sendo por isso naturais duas ou três falhas: «o que a fortuna lhes aguardava» é agramatical, teria de ser «O que a fortuna lhes reservava» ou, simplesmente, «O que os aguardava»; «Ester, era assim chamada, filha do rei [...]» terá de ser «Ester — assim era chamada —, filha do rei [...]»; «Recôndito, entre a timidez e a curiosidade, [...]» parece-me rebuscado; tal como «sorriso honorário» (enfim, podem sempre dizer que o estilo aperaltado é para caricaturar o ultra-romantismo de Alencar); «florescendo assim, uma [...]» não pode ter vírgula. Antipatizo bastante com a fonte de letra que escolheram (porque tem pontos dos is iguais a acentos: resultado, parece que há acentos onde não deveria haver, e ficamos sempre na dúvida sobre se os is que deviam ter acento o têm mesmo). Também acontece, quando mudam de linha, ficar maiúscula, quando devia estar minúscula. Duração 2:58.
Pedro I
Pedro I (17) Concepção Este egafilme mostra capacidade de planificação. Há uma lógica global (entre o protagonista escolhido, Os Maias, a música, a conclusão, as legendas), que resulta de se ter tido uma ideia e sabido, criativamente, através dela agregar uma série de factores dispersos (que assim ganharam coerência). Tudo deriva de se buscar para narrador (ou narrador e herói) o «Reverendo» Bonifácio, o gato de Afonso. Expressão oral É uma leitura boa, mas não tão boa como o Pedro é capaz de fazer. É claro que não é fácil fazer de gato, sobretudo se o gato em causa diz um texto denso. O que comento a seguir acerca da possibilidade de se desbastar a carga explicativa do texto está ligado à dificuldade que ele punha à leitura (por um lado, monólogo, o que implica estilo de quem vai reflectindo; por outro lado, certa discursividade, que não é muito compatível com a prosódia de quem está a pensar). Parece haver uma hesitação (ou engano no texto) antes «Graças ao meu querido dono»; também não percebi bem «andava aos [?] com Maria Eduardo». Texto É um texto bem redigido, sempre num registo de ironia leve. Talvez se pudesse mitigar uns momentos mais informativos (na segunda parte do filme): essa explicação do contexto do monólogo de Bonifácio, devida ao louvável zelo de se querer estabelecer relações com a intriga do romance, torna o discurso do gato menos natural do que seria, se coubesse ao espectador inferir as ligações entre as falas de Bonifácio e o enredo. Duração 2:06.
Hugo & João A.
João A. & Hugo (17) Concepção Criou-se um reencontro de Carlos e Ega («João da Ega» era preferível a, como vem na legenda, «João Ega»), na nossa época e com uma especial caracterização de Ega (que procura seduzir o amigo Carlos; e acaba por se suicidar). A mudança de época, a homossexualidade de Ega geram equívocos, que, inicialmente, são bem explorados: há ironias, da ordem do trocadilho linguístico (Bicharó/Bristol) ou do cómico fílmico (a troca de falas com actriz ou modelo); os diálogos são verosímeis, dentro do contexto de paródia. Porém, na parte final há uma aceleração do enredo que me parece artificial. Enfim, tendo sido bem lançada a situação, foi depois um tanto desperdiçada a base que se criara (optando-se por desfecho que não segue a lógica da paródia até aí, e que é mais inesperado do que caricatural). O filme revela também destreza técnicas, evidente sensibilidade para aspectos cinematográficos. Expressão oral É a capacidade de representação (clareza do texto dito e sua naturalidade) que é aqui aferida. Considero-a bastante boa. O som entre falas (devido à montagem?) prejudica a comodidade de recepção dos diálogos. Texto Quanto aos traços gerais da intriga, já fui dizendo que considero que o texto foi demasiado apressado na sua parte final, como se houvesse dificuldade em fechar a situação criativamente imaginada. A um nível mais local, frásico, deve dizer-se que não há erros de sintaxe e as falas são bem escritas. Duração 3:32.
Ricardo L.
Ricardo L. (16,2) Concepção É uma mini-biografia de Eça, diz-se no título. O esquema é simples: slides ilustrativos e relato cronológico e factual. Eu desaconselhara este formato, como se lerá, salvo erro, em ‘Instruções sobre o egafilme’. É que há o risco de se repetir o que está multiplamente dito e escrito (por muito que a redacção seja conformada pelo autor — e o Ricardo é dos que mais bem escrevem em todo o 11.º ano —, o texto não pode variar muito do que se encontrou nas fontes, até porque haveria o risco de se quebrar a veracidade dos dados, e o género é demasiado denotativo para haver espaço para voos de criatividade). O mesmo se diga das ilustrações (são próximas do que pretendem referenciar, mas, se há mérito nisso, também se pode dizer que forçosamente a investigação teve de ser muito monitorada). Enfim, preferia um exercício que, tendo até talvez dado menos trabalho, implicasse mais a originalidade de que sei ser o autor capaz. Expressão oral A leitura é quase perfeita no que se refere à «sintaxe» (fazer as entoações devidas, perceber a «pontuação»), embora haja uma tendência para usar um tom «blasé» (de que Eça talvez não gostasse, por ser ele mesmo o destinatário). Esse snobismo é mais perdoável do que certos erros de pronúncia: «c[u]lite» não, será «c[ó]lite» (logo, a doença dela derivada também terá «o» aberto); será «conde de R[ε]sende» com «e» aberto (e não «R[ə]sende»); «Neuilly» foi lido mais à inglesa do que à francesa; «saldar» pareceu-me dito quase «s[α]ldar», quando a vogal é aberta («s[á]ldar»); «Su[ê]z» soou-me «Su[ε]z». Texto Já fui dizendo de como as qualidades de escrita própria são pouco aferíveis dado o formato adoptado. Assinalo que não há, praticamente, problemas de sintaxe (que talvez houvesse, mesmo assim, se o autor tivesse menos capacidades). A não ser: «filha do conde de Resende com quem este se casaria em» não pode ser («este» queria reportar-se a Eça e «quem» a Emília; e, no entanto, as anáforas não parecem dar para aqueles antecedentes). E há umas falhas mais lexicais: é Oliveira Martins (sem «de»); prefiro «para Vida do Conde» a «para a Vila do Conde». Duração 4:24.
Joana L.
Joana L. (18,2) Concepção A pretexto de conseguir uns «Os Maias» para totós, faz-se um resumo da intriga, pontuado com momentos de ironia (que resultam bem). Mas o lado leve da sinopse do livro de Eça vem sobretudo da manipulação de desenhos recortados: mais do que as imagens, é o seu manuseio (o ir conduzindo as figuras, o retirá-las repentinamente, o aproximar objectos das personagens com que se relacionam) que permite a brincadeira em torno do enredo; essa espécie de animação a que vamos assistindo é um segundo texto, um comentário ao primeiro texto, mais neutro, que se vai ouvindo. Expressão oral Há duas «vozes», a que introduz o vademecum para totós e a que narra o resumo. A primeira é expressiva; a segunda, denotativa (o que constitui um contraponto agradável às manipulações dos desenhos). Em ambos os casos, muito boa a leitura. Texto Nos aspectos estruturadores do filme (a idealização da situação, o registo adoptado), muito bem. No entanto, há umas falhas de sintaxe/léxico: «somos confrontados pela ideia de ler» não é muito gramatical; em vez de «muito proteccionista», «muito protectora»; não se pode dizer «Maria Monforte, uma negreira» (só em outro contexto, irónico, que no filme não se pode inferir); «que acaba por ser deixada» (que é preterida; que é abandonada por Carlos); «afastando a sua mente destas ideias» (era melhor: «afastando estas ideias da sua mente»); «deixando-se envolver nos hábitos que o rodeavam, envolveu-se com a Condessa de Gouvarinho» está deselegante, por causa da repetição (e de palavra corriqueira, aliás); em vez de «governante, Miss Sara», proponho, «governanta»; em «a sua verdadeira identificação», preferiria «identidade». Como acontece agora tão frequentemente, há excesso de determinantes possessivos. Numa das legendas («falhámos a vida, menino»), falta a vírgula que deveria preceder o vocativo. Duração 4:24.
Soraia
Soraia (12) Concepção Adopta-se um formato que eu desaconselhara: texto ensaístico sobre a obra (neste caso, sobre uma das personagens). O que se diz mostra pouco domínio da obra (que, creio, não terá sido lida). Enfim, lamento dizê-lo, mas tudo isto isto foi feito sobre o joelho. A própria extensão (um minuto útil) também é demasiado parcimoniosa. Expressão oral A leitura em voz alta está bastante aceitável. Texto Corrija-se o seguinte: não é verdade que Ega e Carlos tenham tirado ambos o curso de Direito: Carlos formou-se em Medicina (e Ega chegou mesmo a formar-se? para ser franco, não me lembro agora, mas é verdade que cursava Direito). Não creio que se possa dizer que Ega é um «eterno romântico», com base na argumentação que é aduzida em 0:40-0:45. Também me parece exagerado dizer que Ega tem um papel importante na «tramóia» especificamente por ajudar Carlos a revelar a situação ao avô. Duração 1:14
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