Ibisfilmes 12.º 2.ª
«Só a natureza é divina, e ela não é divina…» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/617
«Eu, eu mesmo…» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/2478
«Há tantos deuses!» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/1103
«Cuidas tu, louco Flaco, que apertando» (Ricardo Reis)
http://arquivopessoa.net/textos/428
Francisco Chaves (17,9) Expressão oral As leituras foram feitas, por vezes, à maneira de tipos (à labrego, a de Elder Caeiro; à de cabotino, a de Zelder Reis; criticaria só o facto de o tipo Helder de Campos não ter um estilo de voz/leitura específico). É discutível o estilo escolhido para cada heterónimo, mas a paródia serve precisamente para contrastar registos, deixando-nos surpreendidos com essas reinterpretações. E há lógica nas equivalências dos tipos (mais pela biografia dos heterónimos do que pelo seu estilo): Caeiro, o rústico; Campos, o urbano (cfr. a parte da bicicleta), rodeado de sensações diversas (o trecho em casa com música); Reis, o sofisticado (neste caso, mais epicurista do que estóico). Quase não há lapsos de leitura (apenas no primeiro poema de Campos, no antepenúltimo verso, ouvi «eu só eu» em vez de «eu sou eu»; e, no último verso lido por Zelder Reis, há pausa excessiva antes de «[a hora dos] outros»). O facto de a leitura ser assumida por uma personagem impede que se faça crítica à exacta expressividade (por exemplo, eu diria que Álvaro de Campos implica mais intermitências, mais mudanças de velocidade, mas não sei se com Helder de Campos terá de ser assim). Concepção Nem menciono os aspectos técnicos que hão-de ter muito mérito (que não sei aferir). Há também um notável sentido narrativo e capacidade para a sua transposição em filme. Costuma haver excesso de elementos ficcionais, de alusões a outras narrativas (nem sempre descodificáveis para simples terrenos como nós) e certo exibicionismo de recursos nos filmes de Francisco, mas, desta vez, quase tudo se agrega de modo coerente, embora com o registo telegráfico a que obriga o escasso tempo: mesmo a súbita formação de uma banda de heterónimos (com dois bateristas? esperaria um Campos baterista; um Reis harpista; um Caeiro flautista) não parece demasiado inverosímil. Escrita Não há falhas nos títulos nem na narração. (Títulos que anunciam os heterónimos não estão sincronizados com as imagens: «Hélder de Campos» devia aparecer mais cedo. As imagens de «Zelder Reis» surgem quando ainda se lê poema de Campos.) Só um erro, mas recorrente: «Hélder», «Élder» «Zélder», se fossem palavras mesmo portuguesas, teriam acento (sem acento, teriam de ser como agudas). Pessoa Autógrafos do poema de Élder Caeiro: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item302/P61.html; http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item150/P1.html. Duração 4:14
Pedro M.
«Há quase um ano não escrevo» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2329
«Ah as horas indecisas em que a minha vida parece de um outro...» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/2868
«Começo a conhecer-me. Não existo» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/2438
«Deixei de ser aquele que esperava» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/844
& mais outros textos
Pedro M. (18,3) Expressão oral Tive dificuldade em controlar, frase a frase, o texto lido, já que se trata de compósito de variados textos de Pessoa e de Campos (e há também ligações — ou trechos mais amplos? — redigidas pelo próprio autor do filme). Em qualquer caso, não detectei lapsos de leitura. Leitura adopta — e bem — o estilo veloz que sentimos ser muitas vezes o mais indicado para os textos de Álvaro de Campos ou de Fernando Pessoa intimista. Valeria a pena, contudo, ponderar se essa velocidade mantida muito tempo não é contraproducente (o que reconhecemos como característico é a mudança de ritmo, que representa a angústia, a voracidade de Campos; se a regra for a velocidade, torna-se difícil estabelecer os momentos de surpresa, de choque). Retiraria alguns alongamentos (um tique das leituras «à actor do Teatro Nacional» — com que se metem certos sketches [cfr. «Diálogo sobre o arrependimento»] — em que Pedro quase que cai). É certo que essa maior demora em finais de palavras é estratégia defensiva, obrigatória para que se consiga ler em velocidade (e sem tropeções). Permite que se ganhe fôlego para as frases seguintes. Concepção Trata-se de «montagem» de muitos textos de cariz intimista (de Pessoa e de Campos). Em fundo, imagens ora relativamente figurativas (o beber café; as estradas) ora quase abstractas (as mãos em sombra chinesa; o corte de cabelo). As imagens, fragmentadas, aceleradas, tomadas logo à partida em ângulos não convencionais, com guinadas da câmara, imitando o movimento apressado na cidade, visam acompanhar o turbilhão emocional que nos chega discursivamente. Dificilmente se chegaria a um símile visual mais exacto da poesia de Campos, sobretudo. Creio é que o estilo visual adoptado aconselhava que a leitura fosse ligeiramente mais pausada (porque a própria hiperactividade do filme potencia a velocidade das palavras ditas, já de si elevada). Último minuto e tal é também visualmente muito impressivo e original (da cena do corte de cabelo ao arder e apagamento da máscara, já sem texto). Escrita [Convinha-me ter a noção clara das pontes entre textos redigidas pelo próprio autor do filme. Enfim, o facto de não as distinguir facilmente dos fragmentos de Pessoa já é bom sinal.] Duração 4:40.
Pedro G.
«Não tenho pressa. Pressa de quê?» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/2583
Pedro G. (16,7) Expressão oral Há dois tipos de oral no filme: o oral, mais ou menos de representação, do narrador e do diálogo com Pessoa-estátua; e a leitura do poema. Nesta, não notei nenhum erro ou falha na entoação (haverá quem diga que não faria mal que a leitura fosse mais coloquial, como se Caeiro estivesse a falar, e a pensar, espontaneamente). A parte em diálogo, mas não ao vivo, tem apenas uma falha («Mostrengo» foi dito como, ou quase como, «Monstrengo»). Concepção Engendrou-se uma situação que permite o encaixe do poema, deslocado para uma praia, para assim não incomodar Pessoa. Com praia e autor em fundo — efectivamente, sem pressa nenhuma —, é lido o poema de Caeiro. Nesta parte, parece faltar uma peripécia qualquer (por exemplo, mais momentos como o desenho de «pressa» na areia e seu apagamento). Escrita O diálogo com Pessoa, que é uma ideia criativa, poderia ter tido depois uma redacção mais irónica (a situação prestava-se a uma abordagem cómica mais incisiva), ainda que se tenham aproveitado alguns aspectos levemente caricaturais: a voz do poeta, a recusa de ouvir o poema. O próprio facto de se tratar de poema de um heterónimo já dava pretexto para alguma brincadeira (ocorre-me que o próprio local da leitura poderia ser objecto de discussão com o poeta: praia ou campo, dado tratar-se de Caeiro). Pessoa A edição usada não é a do link (que é de Teresa Sobral Cunha); pareceu-me ser a de Fernando Cabral Martins. Início do texto não o reconheci (era composição com outro texto ou edição diferente do poema?). Autógrafos: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item287/P1.html; http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item288/P1.html Duração 2:28
Bernardo
«Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espaço, a figura dela» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3248
«Há três espécies de Portugal, dentro do mesmo Portugal» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/3477
Bernardo (15,5) Expressão oral A leitura dos vários textos (os de Pessoa e os escritos pelo autor do filme) não tem propriamente erros do ponto de vista gramatical — desrespeito da sintaxe ou más pronúncias —, mas é muitas vezes demasiado apressada, sobretudo à medida que o filme vai avançando, talvez por receio de se ultrapassar o tempo dado. Foi pena não ter havido outra calma nas leituras da segunda metade do filme, que se ressentem da velocidade (que leva à falha das justas entoações). Na leitura destes textos finais há também algumas situações de pontuação oral excessiva (por vezes, por colagem à pontuação propriamente dita, a escrita): «e // por isso»; «mas // amar é isso mesmo»; «e // eu tenho a certeza». Concepção Escolheram-se dois textos de Pessoa (um poema de Caeiro, ligeiramente alterado, na flexão — em vez de «ela», «ele», o Benfica, e as mudanças correspondentes — e um texto em prosa — excepção que aceitei — a que se acrescentou um item, o quarto, sobre benfiquistas). Têm engenho as transformações havidas, creio que depois valeria abreviar a parte apenas musical-visual, até para ter havido mais tempo para o fecho com o texto construído já pelo próprio autor (evitando-se a tal pressa que considerei prejudicial). Outra solução seria prosseguir sempre só com textos de Pessoa (alterados ou não), mas aplicados ao assunto em causa. Enfim, acho que sem perder o escopo pessoal assumido — ode ao Benfica, no fundo — era possível ter-se correspondido mais ao mesquinho objectivo escolar do filme, em torno de Pessoa e da expressão oral. Ainda assim, acho que se consegue razoável compatibilidade entre as duas metas. Escrita Há bom sentido do registo apropriado ao género em causa, quase épico, e capacidade de redacção dentro do tipo específico de texto. (Montagem e escolha de música concorrem também para o tom pretendido.) No segundo verso, o feminino em «vendo-a» deve manter-se, já que o pronome tem como antecedente «a figura dele» (feminino, portanto). Duração 4:20 [Escrevi este comentário às dez-onze da noite de sábado de 12/12, quando o Benfica jogava na piscatória cidade de Olhão. Quando comecei, o Benfica já perdia; porém, deve o filme ter trazido sorte ao glorioso, porque fechava eu o texto e o Benfica empatava.]
Jorge
«Ah, um soneto…» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/3367
Jorge (18) Expressão oral Só encontrei duas fragilidades na leitura em voz alta do poema: «saudades» (o segundo, sobretudo) quase percebidos como «sodades»; no verso «Nos músculos cansados de parar», acho desnecessária a pausa depois de «cansados». De resto, foi uma muito boa leitura; também os trechos escritos pelo autor são sempre bem lidos/representados. Concepção Há vários níveis «narrativos», encaixados sucessivamente: no programa «Rima Comigo» está incrustada a secção «Leituras Caseiras»; nesta se insere a prestação de Palmício, que inclui uma espécie de clip (que aliás se desloca entre dois espaços); o clip poético não é apenas uma declamação do poema de Campos, já que uma estrofe inicial, da responsabilidade de Jorge, foi-lhe acrescentada e o último terceto ocorre como resposta ao resto do poema (e já no tal novo espaço). Aliou-se criatividade (todas as partes de paródia - a júris, a programas -, a mazinha ironia final, alusão amiga ao delegado de turma; a redacção de texto confundível com o de Campos) ao cuidado em cumprir as exactas instruções da tarefa. Duração 1:38
Inês
«O amor, quando se revela» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/1318
«A neve pôs uma toalha calada sobre tudo» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/909
Inês (18,5) Concepção A homonímia entre Pessoas (porque, como se sabe, são vários) e pessoas é o tópico agregador. O texto faz essa aproximação, ao mesmo tempo que abre pretexto à leitura de dois poemas (de Caeiro; de Pessoa). O filme mostra o Chiado, espaço muito óbvio do nosso poeta, com pessoas a cruzarem-se nas ruas, implicitamente também com Fernando Pessoa, a cuja estátua na Brasileira chegamos mesmo no final. Música — que em outra versão do filme ofusca menos a voz da autora — é também apropriada ao bom resultado do conjunto, na medida em que a sua paulatina aceleração, o seu «crescendo», é um bom fundo para a leitura, calma, afável, de Inês. Expressão oral Com isto já falei da leitura, muito boa, sem nenhum lapso. Em «A neve [...]», de Caeiro, evitaria a pausa entre «E adormeço / sem menos utilidade que todas as acções do mundo», não tanto por não haver pontuação no original (pontuação gráfica e pausas na oralidade não têm de ter correspondência), mas porque as frases ditas quase «sem curva» me parecem reproduzir bem a índole de Caeiro (que é assertivo, mas desprendidamente). No texto de Pessoa, hesito em conjecturar que o registo pudesse ser mais de balada (mas também a leitura é irrepreensível). Escrita O texto é bom, porque feito a pensar nas necessidades circunstanciais de compatibilizar poemas, pretexto escolhido, tempo de filme (e responde bem a este intuito prático): é um texto profissional. Mas não é um grande texto (reconheçamos que tem bastantes lugares comuns, figuras de estilo fáceis). De qualquer modo, também aqui não há erros de sintaxe ou outros. Trabalho limpíssimo, portanto. Pessoa Autógrafo do texto de Caeiro: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item252/P1.html Duração 2:38
Sara A. & Sara C.
«Tão vago é o vento que parece» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/342
«Vai alto pela folhagem» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/88
«Quando as crianças brincam» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2185
«Hoje de manhã saí muito cedo» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3230
e ainda outros textos
Sara A. & Sara C. (17,25) Expressão oral Em geral, a leitura de Sara C. é mais perfeita do que a de Sara A. Nos textos lidos por Sara C. não encontrei lapsos substantivos — apenas um «brisa» por «a brisa»; talvez um «treme», por «dorme» (mas que precisa de confirmação). A leitura de Sara A. é um pouco menos segura, há algumas hesitações — antes de «prolixo», por exemplo; em «Vai alto pela folhagem» há lapsos: «aragem» foi lido como «origem»; «onde cismo» (= ‘onde eu penso’) é lido como «onde o sismo»; «de tormenta» é ouvido «da tormenta»; «arvoredo» parece «arv[α]redo»). Concepção É um filme feito com gosto e sensibilidade estética. Escolheram-se textos/fragmentos de textos (muitos!) de Pessoa e heterónimos e, creio que quase sem modificações, foram eles justapostos de modo a dar o percurso de um dia (de manhã à noite). Filmes das autoras vão ilustrando os ambientes a que vagamente se alude em cada texto. Como estes filmes foram realizados em locais, momentos do dia, estilos diferentes, o resultado, apesar de extenso, não é cansativo. Além disso, procura-se que as imagens sejam também poéticas, o que faz esbater o que pudesse haver de demasiada colagem entre poema e ilustração. Pessoa Na edição (Caeiro) para que remete o link em cima está «Por ter acordado ainda mais cedo» (e não «muito mais cedo») e «sinto pensar» (e não «deixo pensar»). E, no entanto, a sua leitura foi boa (só que se usou outra edição, melhor). O mesmo acontece com «Tão vago é o vento que parece», em que também há várias diferenças entre a edição Ática e as mais recentes («calar»/«calor»; «em animal»/«um animal»); neste texto, na edição que prefiro, vejo «Dorme um calor» (e Sara C., parece-me, leu «Treme um calor»?). Duração 4:23
Carlota & Alexis
«Para além da curva da estrada» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/2666
«Não, não é cansaço...» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/228
Alexis & Carlota (18,3) Expressão oral Há a representação (por Carlota e por Alexis); há a leitura em voz alta (de poema de Caeiro, por Carlota); há a recitação (de cor, creio, dos oito primeiro versos de poema de Campos, por Alexis). Em nenhuma destas três modalidades ouço algum lapso, hesitação, esquecimento, o que já é muitíssimo meritório. Mas não falando propriamente em erros concretos, podia haver alguma falha de expressividade, alguma dramatização artificial. Ora também aí não há críticas a fazer. (É claro que eram possíveis outras interpretações de Caeiro, mas o registo seguido é absolutamente legítimo. Quanto ao início do poema de Campos, o tom assumidamente de fingimento, de brincadeira, que lhe deu Alexis, acaba por fazer descartar dúvidas que quséssemos pôr acerca da expressividade que impunha o poema. E a sintaxe é fiel.) Concepção Dentro de um episódio do quotidiano, surge um pretexto para a leitura de poema e, depois, em resposta, a recitação de parte de outro. No caso do primeiro encaixe, o poema de Caeiro chega ao filme como poema mesmo, embora inserido numa circunstância da narrativa (num parêntese, portanto); no caso de Campos, o poema mistura-se com a narrativa menos anunciadamente, como se fosse apenas o texto natural de um dos protagonistas (o que, no entanto, fica esclarecido, talvez ainda antes de terminada a recitação). Consegue-se ainda, terminar com uma fala, que, integrada na cena sem parecer forçada, alude ainda a célebre verso de Álvaro de Campos («Todas as cartas de amor são ridículas»). O que é mais agradável no filme é a naturalidade de tudo (naturalidade que deve ter sido muito ensaiada, é claro). A música escolhida, a filmagem (de que um terceiro se encarregou), a conjugação com o espaço (ver o final com as personagens a afastarem-se), a telegenia do par são também importantes neste exercício escolar que simula bem ser um fragmento do dia-a-dia. Pessoa Autógrafo: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item43/P1.html Duração 2:04
Marta
«Acho tão natural que não se pense» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3426
Marta (17,5) Expressão oral Leitura muito boa, sem falhas. Aliás, quase sem falhas: nas edições de Caeiro que consultei, vejo «Que tem que ver» (v. 4), e não «Que tem a ver», como diz Marta. Também a leitura da parte criada pela autora é muito boa, com a preocupação de simular a demora de quem está a escrever. Concepção Há dois momentos no filme. Na primeira parte, é lido o poema de Caeiro, ainda que quase integrado no quotidiano da autora. Na segunda parte, am texto criado, retomam-se tópicos do poema de Caeiro, a pretexto de um diário que vai sendo escrito. Escrita O texto assim inventado nesta segunda parte não tem problemas de sintaxe ou de correcção linguística e interpreta bem a ideologia de Caeiro. No entanto, talvez se possa considerar que, idealmente, o monólogo-diário se socorre de alguns quase lugares comuns. A autora teria sio capaz a autora de construir um texto mais denso. Pessoa Autógrafos de Caeiro: http://purl.pt/1000/1/alberto-caeiro/obras/bn-acpc-e-e3/bn-acpc-e-e3_item160/P1.html Duração 2:34
Tiago
«É noite. A noite é muito escura. Numa casa a uma grande distância» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/1011
«Acordo de noite, muito de noite, no silêncio todo» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/1004
«Ah, no terrível silêncio do quarto» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/3440
«Durmo, remoto; sonho, diferente» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/3542
«Duas horas e meia da madrugada. Acordo e adormeço» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/535
«O luar quando bate na relva» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3551
«O luar através dos altos ramos» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3431
Tiago (15) Expressão oral Muito interessante o nível a leitura em voz alta. Não sendo habitualmente o ponto forte do Tiago — e estou a ser eufemístico —, a leitura destes poemas de Cairo e de Campos tem poucas falhas. No poema «É noite» houve apenas a omissão de um artigo indefinido logo no primeiro verso — «a uma grande distância» foi lido «a grande distância» — e uma ligeira hesitação em «apesar de a luz»; em «Acordo de noite» — poema que já déramos em aula —, notei excessiva pausa, para marcar vírgulas, em «E, de repente, humano», achei pouco clara a pronúncia de «coração latente», considero ter faltado entoação interrogativa em «Que fazes, camarada, da janela com luz?» e ser desejável mais expressividade em «Ó candeeiros de petróleo da minha infância perdida!» (e, entretanto, gostei bastante da leitura do verso «Sonho, falta de sono, vida?»); no poema «Ah, no terrível silêncio do quarto», leu-se «encontrara» o que era «encontrará»; no poema «Durmo, remoto; sonho, diferente», assinalo as trocas de «sonho» (lido «sono») e «pressuroso» (lido «presunçoso»); no poema «O luar através dos altos ramos», talvez se devesse fazer menos pausa na mudança do verso em «além de ser / O luar através dos altos ramos». Sobretudo, fora estes pontos melhoráveis, a leitura está na adequada velocidade, cumpre as restantes entoações difíceis, etc., embora, por alguma deficiência técnica, o som não favoreça a audição. Concepção Escolheram-se poemas relacionados com a noite, o que me parece ser ideia acertada. Faz-se a sua leitura em voz alta (em off) enquanto se nos mostram imagens de mar/praia e autor. Este enquadramento foi uma solução económica, mas seria decerto possível ter congeminado filmagem mais criativa — aproveitando o tema ‘noite’? —, embora se possa dizer que os poemas de Campos (e os de Caeiro) são, na verdade, de reflexão sobre si próprio, de intrspecção (o que tornaria apropriado o tipo de cenário). Escrita Em vez de «Ibis filme», «Ibisfilme». Duração 3:30
Miguel
«Aquela falsa e triste semelhança» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/1006
«Não estou pensando em nada» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/2484
Miguel (17,4) Concepção Há um texto próprio — relato em viagem e diarístico, ‘dia na vida de’ —, em que se vão incrustando poemas, de Álvaro de Campos, como se estes pertencessem também ao discurso do autor (que, assim, mais do que lê-los, procura dizê-los como se prosseguisse o seu relato). A viagem (no tempo do dia, que é recordado; no espaço das ruas, que vão sendo mostradas) é um bom motivo, com óbvios constrangimentos para o filme, dificuldades resolvidas com uma série de requintes de realização. Alguns desses efeitos quadram-se bem com o futurismo-sensacionismo de Álvaro de Campos. O filme ficou um objecto agradável, em que seguimos uma história bem contada (bem planificada e tecnicamente informada). O texto é bastante bom, sem ser extraordinário, em linguagem coloquial-corrente, em que não oiço erros. Expressão oral Não é o ponto forte do ibisfilme: há muitas palavras que são apagadas por o Miguel ler com demasiada velocidade. Aliás: não é bem a velocidade que é demasiada — a entoação é bastante boa, por exemplo, o que não aconteceria se houvesse pouco controlo do ritmo da leitura —, há é sílabas, sons, que são ditos tão desleixadamente que mal se ouvem. Esta pronúncia comedora de vogais e sílabas é mais típica de Lisboa do que da maioria das regiões portuguesas (e é muito mais portuguesa do que brasileira, claro). É curioso que, quando se trata da leitura de poemas que ficam incorporados no resto do relato se nota menos essa pressa (ainda assim, no primeiro poema, o verso «É viver intimamente» foi demasiado elidido). No segundo poema, o quarto verso da primeira quadra, «Mas reconheço, adulto, aonde estou», que é difícil, talvez devesse implicar uma pausa maior antes de «adulto». Duração 2:27
Francisco D.
«A liberdade, sim, a liberdade!» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/3349
Francisco D. (16) Concepção Imaginou-se um programa radiofónico destinado à declamação de poesia. A edição em causa destinar-se-ia a poemas sobre ‘liberdade’, o que possibilita que, encaixada, surja a recitação de texto de Álvaro de Campos, «A liberdade, sim, a liberdade». Talvez porque o contexto é de radiofonia, o cenário parece ser dos anos sessenta-setenta, com fado ou qualquer música popular, em fundo, a acompanhar a recitação. Ora esta música parece-me prejudicar a recepção do poema de Campos. Mais do que nos outros heterónimos de Pessoa e do que no ortónimo, os textos de Álvaro de Campos contêm a expressão de estados frebris, de instabilidade, de hesitação, ânsias, que uma música convencional, com refrão, repetições melódicas, etc., quase contradiz. Sentimos que o que estamos a ouvir em fundo impede a sensibilidade anárquica que supõe a poesia de Campos (seja a intimista, seja a futurista-sensacionista). Mesmo que houvesse na leitura em voz alta a expressividade devida, ela ficaria bastante neutralizada. Enfim, o formato engendrado não é muito compatível com o texto escolhido (a não ser num registo irónico, que também não foi claramente assumido). Expressão oral A leitura em voz alta não tem erros (de eventuais más pronúncias ou trocas de palavras), o que já é meritório. No entanto, fica-se aquém da expressividade, do grau de dramatização (se assim podemos dizer), que o poema de Campos implica. Para pôr em voz alta este texto — e quase todos os de Campos — convém adoptar-se uma leitura que mude de ritmo constantemente, dê conta de mudanças de velocidade, imite, enfim, a impaciência, a sofreguidão, do poeta. Francisco fez isso mas apenas parcialmente (se nos abstrairmos da música, percebemos que há, com efeito, tentativa de seguir o ritmo descompassado de Campos). Bastante perfeita a leitura do texto de primeiro nível (introdução. e fecho, pelo locutor de rádio). Pessoa Em «Apertar da mão do amigo [sério?]...», o que está entre parênteses rectos não é para ser lido com entoação interrogativa; significa que a palavra, «sério», está conjecturada pelo editor (porque se lia mal no manuscrito). Duração 2:56
Catarina F.
«Quando vier a Primavera» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/991
Catarina F. (17,3) Expressão oral Muito boa leitura. Só melhoraria «pensar qu’a» (deve manter-se «pensar que a», sem fazer a ligação, porque se trata de registo literário); o mesmo se diga de «se soubesse qu’à amanhã» (será mais: «se soubesse qu[j]amanhã»). Genericamente, procuraria imprimir à leitura a atitude de indiferença convicta, infantilidade embevecida, ingenuidade confiante, que caracterizam Caeiro — confesso que não sei muito bem como, talvez indo mais lentamente, em estilo quase coloquial. Há uma sombra de angústia na leitura, enquanto que Caeiro deixa transparecer é um certo descaramento ingénuo. De qualquer modo, pode defender-se que, optando-se por uma leitura neutra, não dramatizada, o estilo teria de ser semelhante ao que usou Catarina. Também o texto próprio foi bem lido. Concepção Numa primeira metade do filme, lê-se poema de Alberto Caeiro. Terminado o poema, segue-se, sem fronteira explicitada, texto em que a autora retoma alguns motivos do poema do guardador de rebanhos. Bom texto aliás. As imagens filmadas vão acompanhando diversamente os dois momentos: primeiro um exterior de natureza, de jardim; depois, quando o texto já é da autora, um ambiente de escola de música (de Instituto Gregoriano talvez), com crianças, estojos de instrumentos musicais (onde se escondem decerto armas). Em ambos os casos a câmara vai tomando as vistas irrequietamente, o que dá ao filme um estilo mais mágico que documental. Escrita Já disse que o texto escrito pela autora é bom (embora também não seja extraordinário). Há um erro na legenda, já que «ibisfilme» não pode ter acento («íbis», sim») Duração 1:35
Carla & Joana III
«Acordo de noite subitamente» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/622
«Depus a máscara e vi-me ao espelho» (Álvaro de Campos)
http://arquivopessoa.net/textos/263
«Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/1182
«Quero dormir. Não sei se quero a morte» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2330
«Quando estou só reconheço» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/214
«Quem me dera que eu fosse o pó da estrada» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3546
«Hoje estou triste, estou triste» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/3683
«Não quero recordar nem conhecer-me» (Ricardo Reis)
http://arquivopessoa.net/textos/2792
«De aqui a pouco acaba o dia» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/2532
«Desfaze a mala feita para a partida!» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/1129
«Deixem-me o sono! Sei que é já manhã» (Fernando Pessoa)
http://arquivopessoa.net/textos/455
Carla & Joana III (16,8) Expressão oral Embora, por questões técnicas, não se ouça idealmente, a leitura em voz alta dos trechos escolhidos é bastante boa. Não me apercebi de falhas de entoação ou de pronúncias e, mesmo quanto a aspectos mais gerais — expressividade —, considero que a leitura feita é quase irrepreensível. Os reparos a fazer são os que se seguem. No poema «De aqui a pouco acaba o dia» — salvo erro, o único lido na íntegra —, marcaria mais a entoação interrogativa do verso final, «Também que coisa é que faria?». No poema «Desfaze a mala [...]», há uma pausa desnecessária em «Pois tudo a ti // te iguala», por Joana, e uma hesitação de Carla em «ao descrer». Há trechos que não se ouvem e que, portanto, não tenho a certeza de estarem bem lidos: excertos de «Quando estou só reconheço», «Hoje estou triste, estou triste» e «Não quero recordar nem conhecer-me». Entretanto, tratar-se quase sempre de trechos bastantes recortados dos poemas tem inconvenientes para a aferição da capacidade de leitura — é que é mais difícil ser-se chamado a ler muitos versos seguidos de um mesmo texto do que trechos escolhidos menos extensos embora de vários poemas. (Sim, eu sei que não foi da vossa parte estratégia defensiva.) Concepção O subtítulo ou título «Cada segundo com Pessoa» traduz o que me parece terem as duas autoras pretendido fazer. Acompanhar a passagem de umas vinte e quatro horas, ilustrada com poemas de Pessoa que aludissem a esses momentos ou a situações que as depois encenariam também. Para isso, tiveram Carla e Joana de se socorrer de trechos de poemas mais do que de poemas completos. Assim, há muita variedade de poemas e cenários (e também a relação entre textos e sua ilustração vai divergindo, entre a quase interpretação literal e a que implica discernir estados de espírito). Esta boa idealização e concretização, em termos de imagens, ficou um pouco prejudicada pelo som (cujo volume é bastante baixo, o que no entanto não impede, em geral, a aferição da leitura em voz alta). Duração 3:17
Mariana & Sara M.
«Vou dormir, dormir, dormir» (Ricardo Reis)
http://arquivopessoa.net/textos/2033
«Acho tão natural que não se pense» (Alberto Caeiro)
http://arquivopessoa.net/textos/3426
«O homem vulgar, por mais dura que lhe seja a vida» (Bernardo Soares)
http://arquivopessoa.net/textos/4248
e um trecho em Paulo Neves da Silva (organização), Citações e Pensamentos de Fernando Pessoa, Casa das Letras, p. 112
Mariana & Sara M. (17) Concepção Fugindo um pouco ao que se estipulara, em vez de adoptarem apenas poema ou poemas, leram as autoras do filme também trechos de prosa (do Livro do Desassossego) e uma citação avulsa extraída da obra de Pessoa (do Livro do Desassossego, igualmente, mas transcrita numa antologia de «máximas» pessoanas), tudo sob o leitmotiv ‘pensamento’. O facto de no filme estarem sempre com o livro de citações na mão dá-nos a ideia, errada, de que tudo o que lêem é desse livro, quando, na verdade, foi relativamente pouco o que dele retiraram. Além disso, entre os textos de Pessoa que vão sendo lidos, há breves ligações da autoria de Mariana e Sara. Há estilização na filmagem, favorecida pelo cenário, quase abstractizante (efeito da quantidade de verde que serve de moldura), e pela simetria dos papéis que as autoras vão desempenhando. Expressão oral No primeiro poema, de Caeiro, não houve erros (trocas de palavras, más pronúncias, pontuação mal interpretada); a leitura da terceira estrofe, por Mariana, é mais clara, mais segura, do que a das duas primeiras, por Sara (que, no entanto, como disse, não fez erros). De certo modo, a leitura ideal, «à Caeiro», seria a que aliasse a perfeição havida nessa segunda parte a um estilo hesitante que, aqui e ali, embora involuntariamente, se notou na abordagem de Sara. Chegar-se-ia ao registo, entre espontâneo e espantado, que atribuímos ao guardador de rebanhos. No trecho de Bernardo Soares, que começa com «O homem vulgar», Sara troca «a felicidade de a não pensar» por «a felicidade de não a pensar»; e, em vez de «ser guilhotinados», diz «serem guilhotinados», tendo aliás hesitado depois no particípio passado; na apresentação a esta parte, «reflexão» deve pronunciar-se «refle[s]ão» e não «refle[ks]ão». Um outro trecho de Bernardo Soares, lido a partir de Citações & Pensamentos, «Tornei-me uma figura de livro [...]» (p. 112), ficou a cargo de Mariana, cuja leitura foi fluida e desembaraçada (no último período, porém, eu aconselharia mais lentidão — «senão o olhar» quase pareceu «senão olhar», além de que o texto, complexo, implicava que o ouvinte pudesse acompanhar os recursos de estilo de Pessoa). Quanto à primeira quadra de «Vou dormir. dormir, dormir», lida por Sara (e por Mariana?), não teve nenhuma falha. Duração 2:52
Catarina T.
[porei comentário mais tarde]
Joana I
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Cláudia & Joana II
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