Aula 12 da Quarentena (= 131-132)
Aula 131-132 (= 12 da
Quarentena) (27 [3.ª,
5.ª, 9.ª], 28/abr [4.ª]) Como sempre durante este mês e tal, começo com uma
espécie de ponto da situação.
Há quem se esteja a atrasar muito
no «depósito» das tarefas de cada aula. Ora, em rigor, trata-se de tarefas que
seriam feitas durante as próprias aulas, como habitualmente as fazíamos. Mesmo
aceitando que pode dar jeito não as enviar de imediato (para não andar a saltar
de plataforma; eventualmente para as passar a Word; ou porque, em geral, só ponho a tarefa em Classroom depois da própria aula), não se justifica tanta
demora.
Propositadamente, não tenho marcado
prazo de entrega, para que as tarefas não fiquem encerradas no Classroom e para
não se trabalhar em stress, mas preocupa-me que alguns estejam a acumular uma série de escritos por entregar
(que depois não conseguirão fazer devidamente por atacado). Receio maior ainda
é que, na verdade, não estejam esses poucos sequer a ler estas aulas
em Gaveta de Nuvens. Repito aliás: seguirem as aulas aqui é essencial; estarem
a resolver as tarefas apenas (sem estarem dentro do resto do contexto) não
interessa.
Este 3.º período é longo. No nosso
caso, passou até a ser mais avaliável (precisamente por ser maior e por, no
caso do Português, o tipo de avaliação não ficar afetado — só a gramática
passou a ser mais difícil de classificar, mas é assunto que até conseguiremos
resolver também). Ou seja, as
classificações do 3.º período, para mim, estão bastante abertas (de certo modo, mais até do que o ano passado, em que o período foi especialmente
curto, e em que, mesmo assim, houve ainda muitas subidas e algumas descidas). É ingénuo da minha parte estar aqui a fazer o sermão que se segue — porque quem me lê agora não é decerto um dos que, poucos aliás, não têm cumprido as tarefas —, mas vocês transmitir-lhes-ão este recado, aos poucos com quem estou aborrecido, quando os virem aí pelo bloco C, no Lidl à hora do intervalo, etc.: se continuarem as falhas de trabalhos, a sua classificação final de Português pode descer bastante. (E é claro que, como disse nas sínteses do 2.º período, e se deduz do
que já disse agora, também não descartarei subidas que sejam justas.)
Já comentei todas as tarefas da aula 7 que me chegaram até
há pouco. E aproveito para deixar quatro bons exemplos de resposta a
essa tarefa sobre a Sara de Sara e «A um poeta» (de Antero de Quental). Socorro-me
de um texto de cada turma, pedindo desculpa a T., R., B. e M., por estar a exibir
os seus textos. Podia aliás ter usado textos de mais colegas, porque houve outros
Muito Bons trabalhos. Da próxima vez, escolherei exemplos de colegas diferentes.
Quatro bons exemplos de solução da tarefa da aula 7 (comentário
com contraste entre «Sara» e «A um poeta»):
O soneto “A Um Poeta” dirige-se a um interlocutor, um poeta, tal como
sugere o título, apelando a que se levante e lute contra o conformismo:
“Acorda! É tempo!” (v. 5).
Apesar de ser atriz (e não poeta), Sara, protagonista da série homónima,
parece levar este conselho a sério. A princípio, esta personagem, mesmo que
contrariada, subjuga-se às vontades daqueles que a rodeiam, principalmente o
realizador do filme em que participa. No entanto, à medida que o grau de
insistência vai aumentando ‒ e o peso das
expectativas fica cada vez mais insuportável ‒, Sara decide que não pode continuar calada e
insurge-se contra o trabalho que lhe traz tanta infelicidade.
Respondendo positivamente ao apelo lançado pelo sujeito poético do
soneto de Antero de Quental, Sara, qual “soldado do Futuro” (v. 12), dá a sua
opinião verdadeira em relação ao filme (“Este filme não merece um espirro,
quanto mais uma lágrima”) e deixa bem claros os seus planos para o futuro (“Não
há nem mais uma lágrima”). O seu discurso pode, portanto, ser equiparado às
“canções / […] de guerra” (vv. 10-11) e “vozes de rebate” (v. 11) a que se
refere o sujeito poético.
[Teresa, 12.º 3.ª]
O percurso de Sara apresenta uma variação decrescente em oposição à
sucessiva elevação a que o poema de Antero de Quental se refere. Sara é uma
atriz famosa que se sente emocionalmente esmagada durante a produção de um
filme (“Não, o filme é que acabou comigo”). À medida que a mesma cena é
repetida uma e outra vez, cresce a sua irritação e desespero, culminando num
discurso agressivo contra os realizadores e a equipa de filmagens. Em oposição,
o poema de Antero incita um interlocutor a levantar-se e lutar junto aos seus
“irmãos, que se erguem” (v. 10) por um mundo melhor (“Um mundo novo espera só
um aceno” ‒ v. 8).
Esta afirmação pessoal coincide, contudo, com a de Sara, impondo-se
contra uma força exterior e lutando por algo. A diferença reside na motivação
por detrás deste esforço: enquanto o sujeito poético incita à prossecução de um
ideal moral e a uma luta pelo bem, a exaltação de Sara assenta na sua fúria e
ódio contra as pessoas com quem trabalha.
[Rodrigo, 12.º 3.ª]
Na série Sara, a personagem principal revela um enorme desespero
e frustração por não conseguir chorar numa cena do filme (“[Sara] – Chora,
Sara, chora!”). Após várias tentativas falhadas, a raiva, a pressão e a inquietação
aumentaram, levando a personagem à exaustão.
No poema, “A um poeta”, de Antero de Quental, o sujeito lírico apela à
consciencialização da realidade pelos poetas, incentivando a que se ergam para
ultrapassar os vários obstáculos ao longo da vida, fazendo “espada de combate”
para alcançarem o que desejam.
A evolução psicológica do sujeito poético e a de Sara assemelham-se
pois, no início, ambos desconhecem a realidade: Sara desconhece os comentários
da equipa a seu respeito e o sujeito poético está distante da “luta e do
fragor”. Seguidamente, há um momento de viragem, em que ambos os protagonistas
se apercebem do contexto que os rodeia e, ao ouvirem a “grande voz das multidões”,
mudam de atitude, ambos movidos pela sua vontade e pelo sonho: Sara cancela as
gravações e o eu do texto busca a liberdade.
[B. Entrezede, 12.º 5.ª]
Sara, da série Sara da RTP, tem o percurso inverso ao do apelo no
poema “A um poeta”, de Antero de Quental.
Sara é uma atriz cansada que já trabalhou em vários projetos que, na sua
maioria, m que chorasse. Quando se vê confrontada com a sua incapacidade de
chorar no filme de época que está a gravar, Sara perde a cabeça. Tentando
corresponder às expectativas do realizador, Sara esforça-se, determinada a
verter umas lágrimas, pelo menos. Ela encontra-se num estado de ansiedade,
consternada por não conseguir fazer o que esperam dela, mas apesar disso luta.
Já o poeta descrito no poema de Antero encontra-se adormecido, sem vontade ou
desejo de lutar: “Tu que dormes, espírito sereno, / Longe da luta e do fragor
terreno”, vv. 1 e 4.
Cansada de tentar desesperadamente chorar, e sentindo-se demasiado pressionada
pelo realizador, Sara explode num último grito de guerra: “Não há nem mais uma
lágrima!”. Sara desiste do filme e de chorar. Mas o poeta a quem se
dirige o sujeito lírico do soneto de Antero é aconselhado a fazer o
contrário. O sujeito poético pede-lhe que lute, e que não se deixe ficar como um
desistente cansado: “Acorda! é tempo! (…) / (…) são canções / Mas de guerra (…)”,
vv. 5, 10, 11.
Temos então uma Sara determinada, que luta apesar do desespero que
sente, mas que acaba por desistir por raiva e cansaço. Por outro lado, temos um
poeta adormecido a quem o sujeito poético apela que acorde e que lute.
[Margarida V., 12º 9.ª]
Ainda sobre estas tarefas da aula 7,
achei que podiam ter usado mais o termo «soneto» (até para não repetirem
«poema» e «texto»). Notei que alguns veem Sara como desistente ou conformista,
mas discordo: ela acaba por se revoltar, enfrenta os que considera estarem a
ser injustos por a verem só como atriz de um estilo estereotipado. Finalmente,
poucos apontaram as preocupações sociais, quase políticas, que estão subjacentes
aos apelos do sujeito lírico de «A um poeta», de Antero de Quental.
Comecemos
a aula propriamente de hoje.
Assiste
a este filme, uma «curta», de Filipe Melo. Filipe Melo tem muito mérito. Além
de professor de música — perto de nós, aliás, na Escola Superior de Música — e
músico, tem publicado livros, participado em programas de humor (com Bruno
Nogueira e Nuno Markl; mas também individualmente), e teve já algumas experiências
de realização de filmes.
Mais à
frente, vou pedir-lhes a criação de cinco versos a propósito deste Sleepwalk,
curta metragem de Filipe Melo:
O filme
que viste baseia-se numa BD, do próprio Filipe Melo (guião) em parceria com Juan
Cavia (desenhos) e Pedro Serpa (legendas), que foi publicada na revista Granta,
num número dedicado a textos sobre ‘Comer e Beber’. A seguir ficam as páginas
iniciais dessa BD, bem como uma receita que fechava o «conto»:
Aproveitemos
o diálogo na BD, para rever Discurso
direto, indireto, indireto livre. No manual, esta matéria está na p.
24 do anexo no final (que copio); também podes consultar ‘relato do discurso’ aqui ou ver a tabela que fica a
seguir (e que tirei de Inês
Silva & Carla Marques, Estudar Gramática no Ensino
Secundário, s.l., Asa, 2011).
Por vezes, estas explicações incluem um quarto conceito, o de discurso
direto livre, mas podemos descartá-lo, já que saiu do programa.
Transcrevo
as falas, os «balões», da BD (isto é das páginas que reproduzi), porque a banda
desenhada é muito maior, cumpre o enredo todo que vimos no filme:
Gasolineiro — Bom dia,
amigo. Posso ajudá-lo?
Forasteiro — Sim, pode
atestar. Desculpe... O senhor sabe onde vivem os Barrett? Turk e Dolores
Barrett.
Gasolineiro — Não está com
sorte, companheiro. O velho Turk morreu há mais de um ano.
Forasteiro — E a Dolores?
Sabe onde é que a posso encontrar?
Gasolineiro — A casa dos
Barrett é mesmo em frente à estação de comboios. Quer falar com ela porquê? O
Darren meteu-se em sarilhos outra vez?
Forasteiro — Só ouvi dizer
que ela faz a melhor tarte de maçã do país.
Gasolineiro — Bem... Estou
a ver que veio de longe só por causa de uma fatia de tarte.
Forasteiro — É verdade,
amigo. Pode ficar com o troco.
Gasolineiro — Obrigado. Boa
sorte.
Como
se trata de BD, as falas estão todas em discurso direto. Passa-as para discurso
indireto, preenchendo os espaços que deixei:
O gasolineiro saudou o forasteiro e perguntou-lhe se o _____ ajudar.
O F. ___________ que sim, que podia atestar. Pedindo-lhe que _________,
perguntou-lhe se _______ onde _______ os Barrett, Turk e Dolores Barrett.
O G. respondeu-lhe que não ______ com sorte, que o velho Turk _________ havia
mais de um ano.
O F. perguntou, acerca da Dolores, se ______ onde a ______ encontrar.
O G. respondeu que a casa dos Barrett ____ mesmo em frente à estação de
comboios e perguntou-lhe porque ______ falar com ela, se o Darren se __________
em sarilhos outra vez.
O F. respondeu que só _________ dizer que ela _______ a melhor
tarte de maçã do país.
O G. retorquiu que _______ a ver que [ele] ________ de longe só por
causa de uma fatia de tarte.
O F. disse que ____ verdade {ou O F. assentiu} e acrescentou que
_____ ficar com o troco.
O G. agradeceu e desejou-lhe boa sorte.
Vê a solução na
Apresentação, com uns três comentários:
Agora repara como poderia ficar em discurso indireto livre. Não resulta muito bem o indireto livre com tantas falas curtas. O discurso
indireto livre ajusta-se melhor a situações em que haja um narrador que, a pouco
e pouco, assuma a voz de uma das personagens, e que esta tenha falas maiores. De
qualquer modo, reparem que quase desapareceram os verbos de introdução do
discurso («dizer», «perguntar», «responder») e que as formas verbais proferidas pelas personagens mudam de tempo tal como
aconteceria no discurso indireto normal. No entanto, mantêm-se certas expressões («Bem...»,
«sim», «amigo», «companheiro», e «já agora» ou «nada disso», que acrescentei) e a pontuação típica do discurso direto (os pontos de interrogação, as reticências). Na Apresentação destaquei a amarelo esses momentos mais típicos do indireto livre.
O gasolineiro saudou-o e perguntou-lhe se o podia ajudar. Que sim, que podia
atestar.
E, já agora, acaso sabia onde viviam os Barrett, Turk e Dolores Barrett.
Para o gasolineiro, não estava com sorte o companheiro, o velho Turk morrera há
mais de um ano.
E a Dolores? Sabia onde é que a podia encontrar? Que a casa dos Barrett era
mesmo em frente à estação de comboios. Mas queria falar com ela porquê? O
Darren metera-se em sarilhos outra vez?
Nada disso, ele só ouvira dizer que ela fazia a melhor tarte de maçã do
país. Bem... O gasolineiro estava a ver que ele viera de longe só por causa de
uma fatia de tarte.
Era verdade, amigo, e que ficasse com o troco. O outro agradeceu.
Quando
puderes — talvez não agora; fica como tepecê —, vê partes deste programa em que
Filipe Melo comenta a curta que estiveste a ver.
Também
há o making of:
O que
te pedia fizesses hoje em termos de escrita é muito simples: cinco versos
apenas (cinco linhas soltas).
Queria
que criasses com o assunto «tarte» ou outro tópico relacionado com o argumento
de Sleepwalk ou com o contexto do filme, um verso ao estilo de cada um
destes poetas:
Alberto Caeiro
Álvaro de Campos
futurista/sensacionista
Ricardo Reis
Fernando Pessoa ortónimo
Fernando Pessoa
de Mensagem
Trata-se
de um verso por cada um. Não têm de se articular entre si, é claro, mas
tratarão do mesmo tópico, a tarte de maçã, ou de um outro qualquer motivo,
ideia geral, do filme. Cada verso exibirá características do autor em causa
(será um pastiche do estilo de cada um).
Embora
não me pareça que seja necessário — nem talvez conveniente —, relembro cada
heterónimo através destes clips expositivos (que já vimos em aula):
Cria
então os cinco versos (que, em breve, te pedirei para lançares em «Gaveta do
12.º 3.ª/4.ª/5.ª/9.ª»):
Alberto Caeiro —
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . .
Álvaro de Campos
futurista/sensacionista — . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . .
Ricardo Reis — .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . .
Fernando Pessoa
ortónimo — . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Fernando Pessoa
de Mensagem — . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Há
dois anos vimos um vídeo com a cantiga
de escárnio e maldizer «Ai dona fea, fostes-vos queixar» musicada por
Filipe Melo:
O
estilo da interpretação do grupo coordenado por Filipe Melo é paródico, mas as cantigas de escárnio e maldizer são,
já de si, brincadeiras (bastante agressivas, por vezes).
Podes consultar aqui o texto desta cantiga de João Garcia de Guilhade e, lendo a síntese que figura aí, recordar a índole deste género das cantigas
medievais (os outros dois géneros são, como sabes, as cantigas de amigo e as cantigas de amor).
Já que
falamos em paródias, vejam-se estes clips de Filipe Melo, que serão um quase equivalente
atual do escárnio e maldizer medieval. Começa-se por parodiar os concursos «Got
Talent», «The Voice», «Ídolos» e termina-se com uma paródia a um célebre final
de filme que vimos no 10.º ano.
Nesta semana (27-30 de abril), como
três das turmas não teriam aula na sexta, que é feriado, faremos só duas aulas
(mesmo no caso da turma 9.ª). Assim, além desta aula de hoje (2.ª, 27),
excecionalmente publicarei a outra aula desta semana na quarta, 29 de abril,
para ficarmos equilibrados em termos do horário de todas as turmas (que me desculpe a turma 5.ª, que teria aula já na terça). No futuro,
continuarei a afixar as aulas às segundas, terças e quintas.
TPC — Lança em «Gaveta do 12.º 3.ª/4.ª/5.ª/9ª» (Classroom)
tarefas desta aula e da anterior (11 e 12). Entretanto, se puderes, relanceia
partes do programa de Nuno Markl em que Filipe Melo comenta a curta metragem
que aproveitámos hoje (repito o que já pusera em cima):
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