Sunday, September 16, 2012

Os Maias 4


Inês M. & Rita S. (11.º 4.ª)



Rita S. & Inês M. (Muito Bom (-)) Pontos fortes Escrita requintada, que tentou, alcançando-o, um estilo literário, quase queirosiano  (embora com esporádicos lugares comuns do século XXI: «preenche este vazio» [vá lá, o «preenche-me» ainda é mais detestável]; «preencher algo» [por favor, evitem os «algos», os «quaõs», os «quiçás» e quejandas pirosices], «pássaros cantando»; «verdadeiros valores», «sair da sua zona de conforto» [não, este não aparecia, mas, como é o lugar comum recente que mais me irrita, apeteceu-me citá-lo]). Leituras em voz alta muito perfeitas (diria só que a de Rita ganharia em ser menos adocicada: quem fala é um homem recém-formado, que em Coimbra tivera vida boémia e se revelara revolucionário; a cadência imprimida por Rita torna a fala demasiado juvenil e meiga, mais apropriada a um Eusebiozinho pré-adolescente do que a um Carlos a querer começar carreira). Música bem escolhida e bem montada. Aliás, toda a realização (filme, montagem) revela gosto e domínio técnico. Aspetos melhoráveis Na redação, ligeiros solecismos (na nossa linguagem: pequenas quebras de coesão, sobretudo frásica): «Até o avô, que nunca te teve especial apreço» (até o avô, que nunca teve especial apreço por ti [tem-se apreço por alguém ou tem-se alguém em muito apreço]); «às vezes, penso que não gostaria que estivesses» (às vezes, penso que gostaria que estivesses); «degenerei assim a minha solidão» (estraguei, prejudiquei, comprometi [«degenerar» costuma ocorrer com sentido passivo, não costuma ser transitivo: sofre-se uma degeneração, não se costuma degenerar alguma coisa: «degenerei» = ‘fiquei degenerado’] {diz-me a Inês que o que lê é «desvaneci», mas eu continuo a ouvir, a 3.06, ‘degenerei’ — de qualquer modo, «desvanecer» também não costuma ter este uso transitivo, embora ele não seja talvez impossível, aliás com ambos os verbos}); «que traz recordações inexistentes» (que faz recordar o que não aconteceu [as recordações existem, os factos a que aludem é que não aconteceram]). A melhor pronúncia (para alguém de Lisboa e no século XXI) de «medicina» é ‘me[dsi]na’ (o primeiro «i» não é para ser um [i], correspondendo antes ao chamado e mudo); «te escrever», quase no final, soa talvez demasiado 'descrever'.



Tiago & Maria (11.º 9.ª)





Maria & Tiago (Suficiente +) Pontos fortes A ideia era boa e podia até beneficiar de alguma investigação em termos de Geografia (e de História). A própria imagem, um mapa, o que também é boa ideia, podia servir de guia, convindo, porém, procurar um mapa de finais do século XIX. Não ficou claro se havia intenção de manter o cenário do século XIX (e, nesse caso, há algumas incongruências no que se relata) ou se se tratava de aproveitar deslocação para os nossos tempos. Leitura em voz alta de Maria na velocidade adequada (já a leitura de Tiago foi demasiado rápida, quase sôfrega). Não há grandes falhas de escrita. Aspetos melhoráveis. Nos anos setenta do século XIX,  não haveria, em Londres, a roda de que falam  (mas não sei se o objetivo era mesmo transpor a situação para hoje em dia; mas, se assim fosse, haveria também que aproveitar melhor essa diferença de contextos). Na escrita: «Passei por mais de uma dezena de países, em que cada um deles me fará...» (este «em que» não é gramatical); «até ao imaginável» (seria «até ao inimaginável»?); «em busca de ... e que conseguissem pôr todos os dias comer na mesa» (e de que conseguissem); evitar «maravilhosos campos de cultivo de flores e paisagens maravilhosas»; «contrariamente um pouco na riqueza nórdica» (contrariamente à riqueza nórdica); «super-simpático» não parece o registo de Carlos (mas admito que se tratasse de transposição propositada para uma linguagem recente).





Francisco S. & João S. (11.º 1.ª)





João S. & Francisco S.  (Bom + ou quase Bom+/Muito Bom-) Pontos fortes Boa conceção, e realização, do filme-trailer, com inteligente estruturação em vários momentos (os próprios títulos foram bem escolhidos). Foi também criativa a maneira de encarar a representação (pretende-se, mais do que uma encenação realista e de um modo de representar que visasse a verosimilhança, fazer uma espécie de filme-banda desenhada, em que as imagens são, assumidamente, caricaturais: isso fica mais claro na segunda parte). Grafismo (não me reporto ao lettering, mas, por exemplo, aos achados de algumas imagens: Carlos, em viagem e à chegada da Europa, em fundo muito branco [1,50-2.15]; Paços de Celas filmados de baixo, a preto e branco, focando-se também a viola; imagem final com Ega e Carlos em «paralítico»; etc.); enfim, parecem os autores ter bastante sensibilidade para o lado fotográfico, imagístico, do cinema. Aspetos melhoráveis Creio que o formato pensado era o de trailer (ora, enquanto trailer, nota-se a falta de jogo com o som e com a música, elementos decisivos neste género); eu preferiria assumir que não se perseguiu esse fim específico. Som parece-me baixo. Evitaria os slides (por exemplo, o de Memórias de um Átomo), por serem um elemento divergente do resto do estilo do filme. Na escrita: «Carlos sempre despertou para a sua vocação» (Carlos despertou para a sua vocação); «*nos paços de Celas foi-lhe dado um dia e noite [não percebi este trecho, mas parece estar agramatical]». Na oralidade: «compromisso» saiu quase como ‘comprimisso’.




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