Microfilmes autobiográficos 10.º 3.ª
Pedro R.
Pedro R. (17,5) Texto/Estrutura Resulta bem a articulação entre parte representada («em direto») e narração em off, embora se pudesse temer que parecesse estranhável o narrador homodiegético ser uma voz masculina e, enquanto personagem, a protagonista ser uma rapariga. O mérito desta boa coordenação entre parte teatralizada e narração é do texto e da montagem, da boa planificação (recolha de imagens incluída), mas também da voz do narrador (o tom calmo e pausado de Pedro, interiorizado quase, contrasta bem com o bulício da história que se vai vendo). Desconfio um tanto da solução ‘acordar de um sonho’, e ainda mais do ponto de exclamação da última legenda, e não sou fã da alegoria religiosa (São Pedro, Inferno, etc.). Expressão oral Muito certa a locução pelo narrador; a representação da personagem por Pedro (S. Pedro) também não tem falhas de «leitura» (por exemplo, a representação pela rapariga que contracena com Pedro, que aliás também tem boas capacidades e até tem discurso mais audível, já apresenta algumas hesitações).
Filipa
Filipa (17,4) Texto/Estrutura O texto construído por Filipa não tem erros de sintaxe ou quaisquer agramaticalidades, a não ser talvez num «a vida ensinou-me» (seria «ensinou-mo», tendo este «o» como antecedente «temos que cair»). É um monólogo que se segue facilmente, sem lhe encontrarmos insuficiências, e está escrito de modo a propiciar um módico de teatralidade, conveniente à exibição de capacidades de leitura em voz alta. Só criticaria esporádicas cedências a lugares comuns do registo intimista corrente («preenchem-me», «asas para voar», «não sei: eis a questão»). O minimalismo das imagens funciona bem, ainda que fique contrariado pelo slide com as crianças de África (quebra-se aí, escusadamente, a unidade gráfica do filme, tal como depois, mas mais compreensivelmente, nas legendas finais a marcarem palavras relevantes). Expressão oral É muito boa a leitura em voz alta (e o texto punha as suas dificuldades: as interrogações, a própria extensão sem grandes momentos para recuperar fôlego). Notei apenas estes aspetos melhoráveis: excessiva a ‘pontuação’ em «no entanto» e em «na verdade» (são vírgulas que, na verdade, não se devem ler); «acerca» foi dito com a primeira vogal pouco aberta (deve dizer-se «[á]cerca» e não «[α]cerca»).
Gisela D.
Gisela D. (16,7) Texto/Estrutura O foco escolhido (uma viagem, umas férias) acaba por permitir que a abordagem autobiográfica nos apareça filtrada por um pretexto exterior (as actividades durante o cruzeiro; as paisagens; etc.). E, no entanto, a autora surge a todo o momento através do que vai valorizando (e as actividades desportivos são um pólo notório desse retrato). É claro que um texto deste género — que, confessemos, no limite poderia ter uma faceta irritante de panfleto turístico, de prospeto de companhia de navegação — não implica escrita de grande complexidade; mas também é verdade que, assumido esse estilo direto, entre o descritivo e o extasiado, a redação está bem resolvida, sem erros que eu possa aqui indicar. O filme há de ter aproveitado recolha de imagens anterior em família, mas houve eficiente montagem (articulação entre imagens e texto é muito coerente). Expressão oral A Gisela escolheu uma estratégia de segurança, lendo com certa lentidão, ainda que essa escassa velocidade nunca chegue a parecer-nos artificial. Foi uma boa decisão, facilitadora até da compreensão de quem ouve: é que as imagens são muito ilustrativas, têm elas mesmo função informativa (se o discurso fosse muito rápido, mais «cheio», talvez o filme exigisse ao espetador demasiada concentração — assim, tudo é bastante cómodo). Dentro desse ritmo paulatino, as inflexões da voz, a entoação, são absolutamente corretas. No entanto, e tentando ter «ouvidos de tísico», assinalaria isto: «imaginem: dentro de um navio!...» e «que sensação emplogante!» talvez exigissem entoação mais expressiva; e «empolgante» deveria soar «emp[o]lgante», e não «emp[u]lgante».
Rafael
Rafael (16,5) Texto/Estrutura Se no filme em cima, o de Gisela, a presença do desporto não era invocada explicitamente como central mas ficava suficientemente nítida depois, o microfilme de Rafael faz mesmo do desporto o pretexto primeiro do retrato que de si nos dá. Continuando em comparações com o vídeo anterior, vale a pena notar que a perspetiva história (o percurso de desportista desde muito criança) vem subsituir a abordagem geográfica (a deslocação em férias). A música escolhida (que me lembra o ritmo de saraus de ginástica) vai bem com os saltos, corridas, mergulhos que vamos vendo (e, por contraste, casa bem com a leitura em voz alta). De novo como no filme anterior, temos de gabar o arquivo fílmico familiar, mas também a excelente coordenação conseguida entre filme e comentário. O texto está quase todo correto, embora sem arriscar estruturas sofisticadas. (Notei uma única falha: «uma delas» tendo como referente treinos de trampolins e natação — seria «um deles», «uma das duas actividades», um dos dois desportos».) Expressão oral Em termos de velocidade, a leitura de Rafael está no limite do aceitável. Também aqui se optou — e, bem, quanto a mim — por ler muito pausadamente, mas, em ou outro momento, ter-se-á estado perto de uma lentidão que seria sentida como falta de destreza. Não se confunda esta velocidade, propositadamente controlada, com duas ou três pausas que me parecem motivadas por vírgulas excessivamente marcadas (depois de um «porém», depois um «no entanto», depois de um «mas»).
Francisco Az.
Francisco Az. (14) Texto/Estrutura O título «Uma breve história [já acrescentei o acento em falta] da minha vida» é bom. Mas também é verdadeiro no que é talvez mais criticável no filme do Francisco: a reunião de imagens foi apressada (decerto seria possível preencher mais os espaços sem grande demora); o próprio tempo previsto foi bastante desperdiçado (ficou por usar mais de um minuto). O texto resume bem o que para o autor é mais importante: conseguiu ele encontrar boas fórmulas para distinguir em que se tem ancorado a sua vida, numa escrita que é quase de publicitário, no recurso a frases curtas e sugestivas; porém, a abordagem podia ser menos liminar, mais desenvolvida. Não haverá falta de capacidade, ter-se-ia podido era dedicar mais tempo à tarefa. Expressão oral Em geral, a leitura é boa. Assinalo só ligeira propensão para «comer» um pouco certas sílabas, dada a relativa velocidade e certa displicência — diríamos, lisboeta — na pronúncia. Apurando muito os ouvidos: «com[à]quele» foi como resultou o que, mais corretamente, é «com[α]quele»; «esta alegra-me e distrai-me» saiu um um tanto embrulhado; no ataque de «as mesmas anedotas parvas» houve ligeira hesitação.
João
João (16,3) Texto/Estrutura Há simplicidade de meios e, ao mesmo tempo, requinte, na coordenação dos vários recursos. A ideia para o texto não é extraordinariamente original, mas a sua conjugação com música e tom de leitura reflexivos, quase melancólicos, e imagens muito coloridas resulta num filme, digamos, bem produzido, bem acabado. Na redação, evitaria a estrutura «sol esse que» (é sempre mais elegante: «que» apenas). Expressão oral Foi bastante boa a leitura de João. Farei só estes reparos: «mas, infelizmente,» é exemplo de pausa exagerada por se interpretar a pontuação gráfica como marca para paragem (e, como sabemos, a pontuação não corresponde sempre a pausa; e, claro, nem todas as pausas são expresas por pontuação); a segunda sílaba de «que é a única coisa que alegra os nossos dias tão monótonos» ficou pouco nítida.
Leonor
Leonor (17) Texto/Estrutura O texto é cuidado, fugindo a apenas afirmar gostos ou ao simples relato de quotidiano. Há preocupação de tudo enquadrar numa linha levemente argumentativa, interpretativa do retrato que de si vai traçando Leonor. Logo na introdução ao próprio texto se nota o vezo justificativo (mas tenho dúvidas gramaticais: a «é confuso resumir» preferiria eu «é difícil resumir»; «refrescadas palavras» parece-me demasiado inventivo; «algo que nos é íntimo» era substituível por «algo que nos é inerente» ou «algo que é íntimo»). Boa comparação-metáfora: «a minha vida é como a música: nem sempre afinada ou melódica mas sempre com uma direção a seguir». Aliás, a música que vai sendo tocada pela autora valoriza o filme: é uma comprovação que não se tem de afirmar, que se pressente desde o início e só é explicitada quase no final — quando se chega à tal metáfora. Expressão oral A Leonor consegue ser natural a ler, dando ao texto uma normalidade de quem conversa, ainda que em registo formal, sem forçadas expressividades. Essa busca de fluidez leva a que certos trechos de transição, dada a espontaneidade com que são atacados, se tornem pouco perceptíveis (por exemplo, ficou quase apagada a expressão após «profissionalmente, não sei o que serei» [1,16]; tal como foram comidas as sílabas do verbo antes de «usufruir» [1,33] — parece «possamos» mas devia ser «podermos»).
Marta V.
Marta V. (17) Texto/Estrutura Como se verá, considero a leitura em voz alta e o acabamento-conceção do filme mais fortes do que o texto. Este cai um pouco num defeito comum a alguns autorretratos: tendemos a recorrer a lugares comuns, talvez por, no fundo, não ser fácil falarmos de nós e por o embevecimento, a amizade, que temos pelos outros nos incitar a tudo superlativarmos. Porém, há uma vantagem no estilo seguido: o texto muito parcelado funciona como legenda das imagens — estas foram bem escolhidas e vão-se sucedendo no ritmo ideal, aliás bem equilibrado com a música escolhida. E o final («quero aprender com as histórias que vida tem para me contar, para estar apta a contar a minha») é uma bela conclusão para um microfilme autobiográfico. Focando-me em pormenores melhoráveis na redação: evitaria repetir a estrutura «tenho e tive», «praticaram ou praticam», «estes ou outros»; quanto a «dá asas a que me liberte», é lapso por «dá azo [= ensejo] a que me liberte»; e qual é o referente, o antecedente, de «em que»? (1,50); «melhor capacitada» deveria ficar «mais bem capacitada»; a expressão «amiga dos meus amigos» devia ser proibida. Expressão oral Resulta agradável a audição do texto, por mérito da muito boa leitura de Marta, em que não encontro falhas, seja de entoação ou de pronúncia seja de velocidade.
Gi
Gi (16) Texto/Estrutura É inteligente o recurso a uma narrativa em analepse, com a narradora homodiegética com fingidos sessenta (ou setenta?) e dois anos: pode assim dar-se-nos uma retrospetiva de vida fictícia que, em parte, talvez corresponda aos sonhos da verídica enunciadora. Ainda assim, fugindo à demasiada estilização, o percurso da sessentona construtora de mãos biónicas (que pena Nino Scordia já não estar cá!) não é isento de escolhos e nem tudo é ser investigadora em Santa Maria. A moralidade acaba por ser que o melhor é não exigir demasiado dos planos que fazemos, ir antes aproveitando o que se proporcionar fazer. A escrita, num registo coloquial, não tem falhas. As imagens não têm muito que ver com a narrativa (mas terão dado muito trabalho a filmar, talvez não à Gi). Expressão oral (Abstraindo-nos do volume do som, escasso, que terá razões técnicas de que aqui não curamos.) Há talvez excessiva velocidade, o que até torna a leitura mais exigente, embora se perceba que há intenção de, com essa velocidade, imitar a fala espontânea, num estilo representado, expressivo. E a verdade é que a autora consegue não tropeçar em quase nenhuma ocasião, mesmo se parece que a, certa altura, a falta de respiração, de pausas, pode tornar-se pouco natural. Haverá pausa excessiva entre «e» e «alguém com quem apreciar» (aos 2,24) e um errado «vão[-se] provavelmente correr» (mesmo no final).
Luísa
Luísa (17) Texto/Estrutura O texto é sofisticado, complexo (o que, ver-se-á, põe dificuldades suplementares à leitura em voz alta). As imagens mostram-nos sobretudo a protagonista, representada por Gi (e gelado), enigmaticamente passeando em direção ao Tejo. E, quando já julgávamos que o rio não surgiria, dado um Terreiro Paço quilometricamente inesgotável, ei-lo, ao pôr do sol. Estas imagens iterativas, e um tanto obsessivas, até são coerentes com a euforia misteriosa da narradora, embora eu tivesse evitado os fotogramas que as intercalam em ilustrações pontuais diretas (relógios, números). Em vez de «na futilidade constante deles», proponho, porque mais formal, «na sua futilidade constante». Quanto ao resto, a redação está muito boa. Expressão oral O texto já tinha a dificuldade de incluir perguntas e exclamações, cuja leitura impõe sempre o risco de parecer pouco natural. Luísa quis ainda conferir à leitura a expressividade justificável pela convicção da misteriosa narradora. O registo aproxima-se do da declamação poética mais do que da representação naturalista (digamos que é mais Dona Maria II do que telenovela). Dentro do primeiro perfil de registo, quase tudo bem, a não ser ligeiríssimos entaramelamentos nas sequências mais enfáticas. Entoação de «incerta», logo ao princípio do filme, e «coitada!», já no fim, mereciam ser matizadas (é a tal dificuldade de conjugar declamação e naturalidade).
Ana Marta
Ana Marta (16,5) Texto/Estrutura É um autorretrato à entrada dos quinze anos, muito ancorado em memórias de infância. Dentro destas, já em si uma espécie de narrativa encaixada, há ainda um segundo encaixe, a recordação particular de um dia chuvoso. Regressa-se então ao presente, terminando o filme com homenagem à amizade. Texto bem concebido, criativo, mas com três ou quatro (ou cinco) incorreções linguísticas: «não haviam preocupações» («não havia preocupações»; o verbo «haver», a não ser como auxiliar, não se usa no plural — é um verbo impessoal: «preocupações» é o complemento direto, não é o sujeito); «não tinha consciência que o era» («não tinha consciência de que o era»); «relembro-me» (provavelmente: «lembro-me»); «são essas pessoas que eu digo» («é a essas pessoas que eu digo» ou «são essas [as] pessoas a que eu digo»); «nesta memória onde» [1.30] («nesta memória quando»). Já do domínio da escolha do vocabulário: cerca do minuto e cinco, diz-se, mais ou menos, que numa tarde chuvosa estava a chover. «Mas, porém» é pior do que «Porém». Expressão oral É uma boa leitura, ainda que, na segunda metade do microfilme, haja trechos em que a Marta vá com rapidez quase excessiva. Notei ainda «pontuação» demasiado marcada em «amigos que / [...]» e «outros que / [...]» (cerca de 1.25); e, logo no início, um «minha» um tanto alongado.
Marta B.
Marta B. (17,4) Texto/Estrutura Bom texto, muito boa montagem, excelente arquivo. Trata-se de um filme bem planificado, bem acabado (ou «produzido» como se diz neste ramo), em que a autora fugiu a soluções preguiçosas (as frases evasivas, as imagens só para preencher espaço, etc.), tendo tido o cuidado de escrever com elegância e bom gosto. Notei só estes lapsos: «e ao qual considerei um grande feito» («e o qual considerei um grande feito» ou «o que [...]»); «um ligeiro sentido de autonomia, que, por vezes, tanto dava jeito usufruir como fingir que desconhecia tal coisa» («um ligeiro sentido de autonomia, que, por vezes, tanto dava jeito usufruir como fingir que não existia»). Na legenda (título) «Um pouco de mim...», reticências deviam ficar encostadas à palavra à esquerda, sem espaço (o mesmo se diga na legenda final, «continua», que aliás nem precisaria de reticências). Expressão oral Muito boa leitura. Talvez pudesse ir a Marta ligeirissimamente mais lenta — ou talvez seja a música que nos faz ter essa sensação injustificadamente. Entaramelamento em «e do diploma».
Marta P.
Marta P. (16,5) Texto/Estrutura É um texto sensível, apresentado com bom gosto, quer gráfico quer musical. O resultado é um objeto simples, talvez até excessivente curto, mas original e que se segue com agrado. Aspeto linguístico melhorável: «E em que não tinha nada com o que me preocupar» é pior do que « E em que não tinha nada com que me preocupar». Um aplauso especial para a primeira menção nestes filmes, que me lembre pelo menos, a nenucos (havia já várias alusões à macaca, mas nenhum nenuco). Expressão oral Marta fez boa leitura em voz alta, embora se deva reconhecer que o texto não punha dificuldades e que preferiu — inteligente mas cuidadosamente — ir bastante devagar.
José Nuno
José Nuno (15,5) Texto/Estrutura Texto está bem escrito (não registei nenhuma agramaticalidade) e adota, aqui e ali, registo leve, brincalhão, que o torna agradável. Em termos de imagens, notam-se duas estratégias: na primeira parte, ou mesmo em grande parte do microfilme, recorreu-se ao arquivo de fotografias familiar; numa segunda parte, aliás nos últimos trinta segundos, quando nos aproximamos da actualidade, surgem as imagens puramente ilustrativas, googladas. É claro que o resultado da primeira parte é melhor. Expressão oral Embora haja fluência e o José Nuno perceba as entoações a fazer, haverá também velocidade a mais (como se se estivesse a ter pressa para corresponder à sucessão das imagens — mas não creio que fosse isso que tivesse acontecido, pois que o habitual é as imagens serem montadas com o som já colhido). Essa rapidez toda tinha forçosamente de implicar um ou outro tropeção (no final, «alguns» percebe-se mal; tal como, antes, «entrei [entraria?] logo para outro desporto» ou «comcei a comprar jogos»).
Afonso
Afonso (13) Texto/Estrutura Decidiu bem o Afonso ao centrar-se num seu gosto, numa sua atividade específica, a mistura de música (não sei se é esta a designação que vai sendo corrente). Conta-nos como veio a adquirir experiência nesta área, do grau de proficiência que já atingiu (mas também, com humildade, reconhecendo que ainda há coisas a aprender), da seriedade com que encara este hóbi (que é também uma quase carreira), as sensações sentidas nas sessões que anima. Considero o texto bem escrito, mas admito que houvesse formatos que pudessem tirar mais partido das óbvias relações que o foco do texto (a música, o jogo de sons, até as luzes) tem com a realização de um microfilme. Haveria que não desperdiçar essas conexões. Correções linguísticas: «este mundo da música que é difícil entrar» («este mundo da música em que é difícil entrar»); em «eu uso vários meios tecnológicos» podia suprimir-se o «eu» (devemos aproveitar uma característica do português, ser língua de sujeito nulo, ou seja, que acolhe bem frases sem o sujeito explicitado por pronome ou nome, bastando para isso a pessoa verbal). Expressão oral A leitura em voz alta não foi suficientemente preparada: exigia-se mais ensaios. Até em termos técnicos, domínio que não punha dificuldades ao Afonso, terá havido alguma precipitação.
Sara
Sara (15) Texto/Estrutura Texto saiu demasiado expositivo-argumentativo, embora, no final, haja uma reorientação de todo o discurso para um desfecho autorreflexivo. Sara ter-se-á concentrado apenas na escrita, desperdiçando a possibilidade de articular texto e imagens. Em qualquer trabalho, devemos pôr-nos na pele do recetor e moldarmos o que estamos a criar às necessidades do destinatário — creio que esse exercício falhou um pouco neste caso: a redação, que recorre muito a recuperações de segmentos ditos antes (há, por exemplo, um exagero de «essas»; e, já agora, de «certas», «determinadas»), não é talvez a adequada a um texto que vai ser ouvido (e não lido diretamente na folha). De qualquer modo, há bons trechos nesta redação. Correções a fazer: «crescer é um realizar de opções e de consequências» (teria de ser: «crescer é um realizar de opções e significa/acarreta/implica consequências»); «as pessoas tornam-se inertes às confusões que os [as] rodeiam» («inertes ante/perante as confusões»? ou seria «imunes às confusões»?). Expressão oral Houve velocidade a mais (talvez por se ter a noção de que o texto era extenso); por vezes, essa pressa leva a uma leitura muito para si própria (como para não maçar os outros), que faz que oiçam mal alguns passos. Não percebo o segmento «ao defini-la apenas em [?] e [?]» (0.7-0.10).
Joana
Joana (16,5) Texto/Estrutura Trata-se de umas «Pequenas lembranças de infância», que chegam depois até ao presente. Há três estilos: o do início, com a Joana bebé a ser filmada, «ao vivo»; depois, permanecem essas imagens e, em off, temos a narração dos tempos a partir daí; e uma parte final, ao som de «obladi-obladá», em que, em slides, se faz a síntese das várias épocas. Está bem construído o microfilme. A escrita é limpa, mas não tão trabalhada como poderia ser . Notei estas falhas de sintaxe: «pessoas que, apesar de só as conhecer há três meses, tenho a certeza de que nunca [as] vou esquecer» (o segundo «as» é agramatical, porque o primeiro «que» já recupera o antecedente «pessoas); «palavras das quais tive conhecimento do significado nesta altura» (seria: «palavras cujo significado conheci então»). Expressão oral Em geral, boa leitura. Porém, a Joana tende a pronunciar rapidamente. Não é que vá com excessiva velocidade o tempo todo: é ser demasiado despachada na exata pronúncia de cada palavra (o que é típico dos lisboetas e, mais ainda, dos lisboetas adolescentes). Esse estilo comedor de sílabas faz que não se percebam bem alguns segmentos (0.37; 1.22; 1.47).
Miguel G.
Miguel G. (14) Texto/Estrutura Boa ideia, que merecia ter sido executada com mais demora. Era bastante original a assunção, que o Miguel fez, de um narrador homodiegético fictício (ainda por cima, figura pública e atestado em imagens). Convinha, porém, ter desenvolvido mais o texto, que dura aliás apenas metade do filme. Correções à linguagem: «a pressão recai nos meus ombros» (era: «a pressão cai sobre os meus ombros»); «dos milhares de jogos que faço, dos milhares que ainda vou fazer, só penso numa coisa» devia começar por «nos milhares». Expressão oral Creio que há lentidão a mais. Como se tratava de abordagem notoriamente ficcionada, até ficaria bem uma leitura expressiva, no limite da brincadeira, da caricatura (dependendo de novo texto, claro). Também aqui se desperdiçou um tanto a excelente ideia inicial. Mas não há erros de entoação ou de pronúncia localizáveis («t-shirts» parece demasiado aportuguesado).
Inês G.
Inês G. (16,7-16,8) Texto/Estrutura O ritmo vivo das imagens conjuga-se bem com a música e o estilo de texto, estes mais melancólicos. O texto, correto e agradável, só aparentemente é diarístico. Na verdade, depois de «querido diário», o que temos é um relato memorialístico, até chegarmos, já no final, a «acho que por hoje é tudo». Expressão oral A leitura em voz alta é boa, mas deve reconhecer-se que o texto não punha grandes dificuldades. Faltam talvez apenas alguns «pontos finais» (isto é, pausas entre segmentos mais importantes). Nos últimos trinta segundos nota-se alguma um pouco mais de velocidade e como que se percebe que há um papel a ser lido (idealmente, uma muito boa locução devia fazer-nos esquecer que se está a seguir um texto escrito). Não percebo o trecho que está cerca de 0.28.
Inês V.
Inês V. (15) Texto/Estrutura A abordagem é original, porque centrada num único assunto, a equitação, que pode assim ser tratado com atenção. Esse tema permite que acompanhemos várias fases da vida de Inês. Em termos de escrita, prefiro a metade inicial, menos técnica. Nesta criticaria apenas um «desatar a correr que nem uma maluca», que se deveria reformular em registo formal. Em compensação, na segunda parte do filme há trechos em que o discurso se burocratiza escusadamente («vertente»; «diversificar o leque»; «mundo equestre»; «a nível da postura»). Expressão oral Leitura começa bastante razoavelmente, mas, de novo, na segunda metade do filme, há algumas hesitações (que, creio, um número de ensaios maior teria evitado). Além desses tropeções na segunda metade, notei ainda no resto do filme: «tudo aquilo» soa «t[o]do aquilo»; e haverá pausa excessiva em «que / tinha visto o meu irmão passar».
Francisco A.
Francisco A. (17,1-17,2) Texto/Estrutura O texto começa, introspetivamente, por se fechar nas dificuldades de explicitar um autorretrato. (O lugar comum do ser «inexplicável por palavras» é de evitar, quando o que pretende — é um trabalho para Português — é precisamente exibir a capacidade de usar as palavras.) Embora a escrita seja correta, receei que esse registo se mantivesse depois muito tempo, porque me soam sempre artificiais estes exercícios de quem está a falar de si para dizer que não é capaz de falar de si. Mas não, aquele tópico inicial serve para introduzir um espaço-memória (Carvalhal, infância). E este ponto é talvez o mais agradável do texto (recordações, paisagens, alusões a vivências passadas). Documentado por excelentes imagens, está também escrito com segurança gramatical (embora, quanto a mim, com alguns lugares comuns escusados, os tais a que já aludi). Em «Vejo-a como sendo mais do que um nome», valia a pena prescindir do «sendo» («Vejo-a como mais do que um nome») Expressão oral Boa (aliás, bastante boa) leitura, sem falhas de entoação nem tropeções (só uma, mais que desculpável, hesitação em «Eu agora vejo a / terra»). Apenas notei umas três palavras pouco nítidas (ou de pronúncia discutível): «moldar» em «foram importantes para moldar quem eu sou agora» parecia-me tanto «mudar», que cheguei a escrever que neste contexto «mudei» não tinha lógica (seria ‘para me tornar naquele que sou agora’ ou ‘para mudar quem eu era’), mas creio que é mesmo «moldar» que se ouve; a pronúncia mais comum de «tijolo» seria «t[ә]jolo» (embora admita que «t[i]jolo» seja perfilhado por muitos, é devida aqui apenas a colagem excessiva à grafia); «me a arrancam» ou «ma arrancam» é no filme pronunciado «m[á]rrancam», porque os dois «a» se contraem, o que é razoável (mesmo assim, num texto formal essa crase era de evitar, fazendo-se aí uma ligeira pausa: «m[α] [α]rrancam»).
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