Thursday, September 14, 2006

9.º 2.ª


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Esta secção sobre António Gedeão teve como pretexto o concurso «Rómulo de Carvalho / António Gedeão, o poeta da Ciência» (promovido pelo Plano Nacional de Leitura). Para efeitos desse concurso, funciona como página, da responsabilidade do 9.º 2.ª da Escola Secundária José Gomes Ferreira (Benfica, Lisboa). Não se trata, porém, de página que responda aos requisitos de navegabilidade e interactividade propostos pelo regulamento do Concurso. Desaproveitámos os recursos informáticos, concentrámo-nos nos textos. Em geral, a página reúne textos escritos pelos alunos «à maneira de» ou a propósito de algum texto de Gedeão (dá-se o texto de António Gedeão em corpo pequeno, enquanto a glosa, pelo aluno, fica em corpo um pouco maior). Portanto, também a obra do poeta foi privilegiada em detrimento da vida e restante obra de Rómulo de Carvalho.

Anti-Anne Frank


Ainda de lembrarás de, no sétimo ano, termos lido textos do Diário de Anne Frank. O poema «Anti-Anne Frank» contrasta um drama que tem as «vantagens» de ter sido protagonizado por quem o conseguia relatar, analisar (e acabou por se tornar, postumamente, famosa) e a infelicidade de quem nem pode sequer dar testemunho do seu drama. Os versos 3-7, sempre iniciados por «nunca», dão conta de episódios ocorridos com Anne Frank. Se ainda te lembrares de outros, tendo em conta os textos e o filme que então vimos, acrescenta ao poema mais versos iniciados por «nunca», idealmente com algumas rimas.

Anti-Anne Frank

Esta criança esquálida,
de riso obsceno e olhares alucinados,
nunca apertou nas mãos a fria face pálida,
nunca sentiu, na escada, as botas dos soldados,
nunca enxugou as lágrimas que aniquilam e esgotam,
nunca empalideceu com o metralhar de um tanque,
nem rastejou num sótão,
nem se chama Anne Frank.

Nunca escreveu diário nem nunca foi à escola,
nem despertou o amor dos editores piedosos.
Nunca estendeu as mãos em transes dolorosos
a não ser nos primores da técnica da esmola.

Batem-lhe, pisam-na, insultam-na, sem que ninguém se importe.
E ela, raivosa e pálida,
morde, estrebucha, cospe, odeia até à morte.

Pobre criança esquálida!
Até no sofrimento é preciso ter sorte.
António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D'Água, [2004], p. 172

Anti-Anne Frank

Nunca viveu a vida como merecia,
Nunca a haviam ido buscar a casa pelos cabelos,
Nunca e nunca havia sido levada naquele carro de maneira tão fria,
Nunca havia qerido tanto sair dali.
Nunca sentiu tanta raiva...tanto ódio.
Nunca desejou tanto escrever naquele belo diário.

[Carolina M.]



Poema do poste com flores amarelas



O poema que se segue, ao contrário do que é costume na poesia de António Gedeão, não é rimado. Os seus versos são aliás extensos, quase como se se tratasse de prosa. Escreve uma continuação do poema.

Poema do poste com flores amarelas

Vieram os operários, puseram o poste de ferro na berma do passeio
e foram-se para voltar noutro dia.
O poste tinha sido pintado há pouco de verde
e quando lhe batia o sol rutilava como as escamas dos dragões.
Mesmo junto do poste, no passeio, havia uma árvore que dava flores amarelas,
e o vento fez cair algumas flores amarelas sobre o poste verde.
As pessoas que por ali passavam diziam «que chatice de poste»,
mas o poeta sorria para as flores amarelas.
António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D'Água, [2004], p. 220
Poema do poste com flores amarelas...
Todos os dias, de manhãzinha,
ia à janela observar aquele poste
que tinha tornado a rua mais colorida,
a cada dia que passava.
As pessoas que por aquela rua andavam
já não reclamavam por causa do poste verde,
paravam por instantes a observá-lo
e a admirar a sua beleza tanta.

E aquela rua, carregada de cinzento,
ficou mais colorida, com aquele poste,
e o poeta sempre sorria, ao olhar para ele,
carregado de flores amarelas...

[Marta S.]

Lição sobre a água

Seguindo a matriz sintáctica do poema «Lição sobre a água», escreve uma «Lição sobre o vinho [ou outra bebida]». Começarás assim: «Este líquido é vinho / Quando ...». Tenta respeitar a tal «matriz sintáctica» e conseguir rima segundo o mesmo esquema rimático (ou muito aproximado).

Lição sobre a água

Este líquido é água.
Quando pura
é inodora, insípida e incolor.
Reduzida a vapor,
sob tensão e a alta temperatura,
move os êmbolos das máquinas que, por isso,
se denominam máquinas de vapor.

É um bom dissolvente.
Embora com excepções mas, de um modo geral,
dissolve tudo bem, ácidos, base e sais.
Congela a zero graus centesimais
e ferve a 100, quando à pressão normal.

Foi neste líquido que numa noite cálida de Verão,
sob um luar gomoso e branco de camélia,
apareceu a boiar o cadáver de Ofélia
com um nenúfar na mão.

António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D'Água, [2004], p. 202

Lição sobre a Coca-cola
Este líquido é a Coca-cola
Saborosa, boa, fresca, colorida.
Uma bebida com grande pinta,
Gaseificada e muito gostosa.

Tem cor preta a Coca-cola,
Bebemo-la fresca
Antes de dormir a sesta
E de ver a bola.

Antes da última badalada
Estou a comer uma pizza
Com uma massa muito lisa,
Acompanhada de uma Coca-cola gelada.
[Fahim]


Anacleta


O poema que se segue é um acróstico (o início dos versos, lido na vertical, constitui um nome) escrito por Rómulo de Carvalho aos 11 anos. Escreve um acróstico, e também dedicado a uma pessoa ou a coisa de que muito gostes. Usa o mesmo esquema rimático (A-B-A-B-C-D-C-D).

Anacleta

A mei-te ao ver-te formosa
N aquela bela manhã
A mei-te ao ver-te viçosa
C omo uma rosa louçã.
L endo num livro ela estava
E ncostada ao seu balcão
T endo gesto que mostrava
A mar-me do coração.
António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D'Água, [2004], p. 639.
Caparica

C astelos de areia e espuma.
A rtes de pesca a valer!...
P raias a perder bruma.
A ntes do amanhecer!...
R ochas batidas pelo mar,
I nclinadas, mas fortes...
C ais de gaivotas a voar...
A “escola” de muitas sortes!

[Tiago]


Poema da noiva de Chagall


A propósito do «Poema da Noiva de Chagall», escolhe uma outra pintura [buscada, por exemplo, em site de pintura] e escreve poema alusivo.

Poema da Noiva de Chagall

Tenho os olhos repletos de ventura.
E isto simplesmente
por ver na minha frente um tanque de água,
bancos de pedra à volta
e uns modestos arbustos sem grandeza.
Como a ventura é fácil quando tudo
se mede em desventura!

Tudo se junta neste quadro ameno
para dar felicidade momentânea;
e o que falta, que é tudo, isso, imagino.
A luz do Sol escondido a jorros brota,
caustica a pele e afogueia o rosto;
nos arbustos despidos as flores rescendem;
e no tanque parado, de águas sujas,
o transparente líquido se eleva
e em parábolas cai na morta superfície.

Desce um pombo do alto em voo lento
e na borda do tanque poisa, e olha.
Finjo que sou de pedra; e o pombo olha-me.
Finge-se ele de pedra enquanto o olho,
e assim nos demoramos, um e outro,
até nos convencermos
que só de mútuo amor se vive em paz.

Um roçar de asas vem do alto e desce.
É ela, a pomba, o número que faltava
no programa das festas dos meus olhos.
Ao lado dele poisa, e tão chegada
que as penas dele em mim se sobressaltam.

Foi então que um rumor tão insensível
como um abril de pétalas
roçou por entre as folhas dos arbustos.
A noiva de Chagall,
micro-onda violeta, espuma de detergente,
flutuando ao sabor de uma suposta brisa,
alegre e rápida, voluptuosa e breve,
em círculos de renda me envolveu.

De vassoura de esparto, o homem do jardim
juntava as folhas secas,
e ao juntá-las,
diluía rumores no silêncio da tarde
enquanto ia pensando noutra coisa.

António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D'Água, [2004], p. 242
Que bela pintura!
De tão maravilhosa ser,
Todos ficam para ver,
Para poderem crer
Que é verdadeira gravura!

Que bela pintura!
De tão suaves cores
É formada, para que todos
Se possam enfeitiçar,
Ao observar tão formosa gravura!
[Tatá]




Poema do alegre desespero

Repara nos seis primeiros versos do «Poema do alegre desespero». Escreve mais algumas estrofes com o mesmo esquema rimático e que tenham (ou tenham subentendida) a frase «compreende-se que ninguém se lembre de».

Poema do alegre desespero
Compreende-se que lá para o ano três mil e tal
ninguém se lembre de certo Fernão Barbudo
que plantava couves em Oliveira do Hospital,
ou da minha virtuosa tia-avó Maria das Dores
que tirou um retrato toda vestida de veludo
sentada num canapé junto de um vaso com flores.
Compreende-se.

E até mesmo que já ninguém se lembre que houve três impérios no Egipto
(o Alto Império, o Médio Império e o Baixo Império)
com muitos faraós, todos a caminharem de lado e a fazerem tudo de perfil,
e o Estrabão, o Artaxerxes, e o Xenofonte, e o Heraclito,
e o desfiladeiro das Termópilas, e a mulher do Péricles, e a retirada dos dez mil,
e os reis de barbas encaracoladas que eram senhores de muitas terras,
que conquistavam o Lácio e perdiam o Epiro, e conquistavam o Epiro e perdiam o Lácio,
e passavam a vida inteira a fazer guerras,
e quando batiam com o pé no chão faziam tremer todo o palácio,
e o resto tudo por aí fora,
e a Guerra dos Cem Anos,
e a Invencível Armada,
e as campanhas de Napoleão,
e a bomba de hidrogénio,
e os poemas de António Gedeão.

Compreende-se.

Mais império menos império,
mais faraó menos faraó,
será tudo um vastíssimo cemitério,
cacos, cinzas e pó.

Compreende-se.
Lá para o ano três mil e tal.

E o nosso sofrimento para que serviu afinal?

António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D'Água, [2004], p. 220



Compreende-se que lá para o ano de quatro mil e tal
ninguém se lembre de certo referendo sobre o aborto,
que pôs a cabeça de todos num pantanal,
ou do meu poema sobre António Gedeão
que sempre pensei que fosse canhoto
e que não usasse calão.

Compreende-se.

E até mesmo que já ninguém se lembre do Aristides de Sousa Mendes,
aquele homem corajoso
que salvou milhares de judeus dos nazis,
passando vistos mesmo aos dementes,
fazendo todo o povo feliz,
excepto Salazar,
que o deixou pobre e desempregado,
qual história epistolar,
qual história de heróis,
qual história de cavaleiros,
que combatiam durante anos,
com as suas poderosas armas,
com as suas imponentes espadas,
que cortavam carne humana,
às postas esmigalhadas.

Compreende-se.

Ser ou não ser corajoso.
Ser não ser nazi
Nasceu tudo do pó.
E ao pó tudo voltará.

Compreende-se.
Lá para o ano quatro mil e tal.

E para que serviram todos estes versos afinal?


[Joana]
Poema para Galileo
Escreve um «Poema para [outra figura histórica (da ciência, da cultura)]».

Poema para Galileo

Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,
aquele teu retrato que toda a gente conhece,
em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce
sobre um modesto cabeção de pano.
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.
(Não, não, Galileo! Eu não disse Santo Ofício.
Disse Galeria dos Ofícios.)
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.
Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria...

Eu sei... Eu sei…
As margens doces do Arno às horas pardas da melancolia.
Ai que saudade, Galileo Galilei!
Olha. Sabes? Lá em Florença
está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.
Palavra de honra que está!
As voltas que o mundo dá!
Se calhar até há gente que pensa
que entraste no calendário.

Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu a quem tu esclareceste,
ia jurar — que disparate, Galileo!
— e jurava a pés juntos e apostava a cabeça sem a menor hesitação — que os corpos caem tanto mais depressa quanto mais pesados são.

Pois não é evidente, Galileo?
Quem acredita que um penedo caia
com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?

Esta era a inteligência que Deus nos deu.

Estava agora a lembrar-me, Galileo,
daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo e tinhas à tua frente
um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo
a olharem-te severamente.
Estavam todos a ralhar contigo,
que parecia impossível que um homem da tua idade
e da tua condição,
se estivesse tornando num perigo
para a Humanidade
e para a Civilização.
Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios, e percorrias, cheio de piedade,
os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.

Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,
desceram lá das suas alturas
e poisaram, como aves aturdidas — parece-me que estou a vê-las —
nas faces grávidas daquelas reverendíssimas criaturas.
E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual
conforme suas eminências desejavam,
e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal
e que os astros bailavam e entoavam
à meia-noite louvores à harmonia universal.
E juraste que nunca mais repetirias
nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e calma,
aquelas abomináveis heresias
que ensinavas e escrevias
para eterna perdição da tua alma.
Ai, Galileo!
Mal sabiam os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno mundo,
que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,
andavam a correr e a rolar pelos espaços
à razão de trinta quilómetros por segundo.
Tu é que sabias, Galileo Galilei.
Por isso eram teus olhos misericordiosos,
por isso era teu coração cheio de piedade,
piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos
a quem Deus dispensou de buscar a verdade.
Por isso estoicamente, mansamente,
resististe a todas as torturas,
a todas as angústias, a todos os contratempos,
enquanto eles, do alto inacessível das suas alturas,
foram caindo,
caindo,
caindo,
caindo,
caindo sempre,
e sempre,
ininterruptamente,
na razão directa dos quadrados dos tempos.


António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D’Água, [2004], p. 205
Poema para Da Vinci

Ó grande Leonardo,
Encontro-me aqui, com tudo apagado,
a pensar na minha visita ao Louvre,
e naquele teu famoso quadro, sim, aquele,
aquele com a misteriosa mulher a quem chamam Mona Lisa.
Aquela cujo sorriso misterioso e corpo formoso
nos deixou a todos embasbacados.
E que com aqueles olhos de mil emoções,
invocou a sua essência nos nossos corações.

Eu sei... Eu sei...
Porque falam eles apenas dela?
E porque não falam de Ginevra,
que era igualmente bela?
Ou da Leda, perdida para sempre,
a sua imagem pagã, o seu rosto demente?

Eu só te queria agradecer, grande Da Vinci,
Pela beleza e mistério que me deixaste.
E por aquelas belas obras,
que nos encheram todos de esperança,
pois o que dizem é bem verdade,
quem espera sempre alcança.

[Joana]





Alegremente, no autocarro
As quatro quintilhas de «Alegremente, no autocarro» têm estrutura idêntica (todos os seus cinco versos são paralelos). Escreve mais uma quintilha que siga a mesma estrutura e se enquadre no sentido do poema.

Alegremente, no autocarro

As crianças tristes passam alegres no autocarro,
cantando em altos berros e intrometendo-se com quem passa.
Vão todas ao Posto vacinar-se de graça.
A vacina é triste, as crianças são tristes,
mas passam todas, alegremente, no autocarro.

Os soldados tristes passam alegres no autocarro,
entoando as canções que cantavam nas romarias da sua terra.
Vão para o cais do embarque tomar o paquete que os levará para guerra.
A guerra é triste, os soldados são tristes,
mas passam todos, alegremente, no autocarro.

Os operários tristes passam alegremente no autocarro,
cantando e gesticulando com a garrafa de vinho na mão.
Vão todos para a fábrica vigiar as máquinas e carregar num botão.
A fábrica é triste, os operários são tristes,
mas passam todos, alegremente, no autocarro.

Os camponeses tristes passam alegres no autocarro,
cantando e dando vivas ao longo do percurso.
Vão todos à cidade, de fato novo, aplaudir o discurso.
O discurso é triste, os camponeses são tristes,
mas passam todos, alegremente, no autocarro.

Alegremente, no autocarro.

António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D’Água, [2004], p. 230
Os estudantes tristes passam alegres no autocarro.
Cantando alegremente os resultados dos testes.
Vão todos para a escola, de uniforme, admirar os seus mestres.
A escola é triste, os estudantes são tristes, mas
Passam todos, alegremente, no autocarro.

[Tiago]

Os professores tristes passam alegres no autocarro,
Entoando e gritando frases completas.
Vão todos para a escola, fazendo festas.
As aulas são tristes, os professores são tristes,
Mas passam todos alegremente no autocarro.

[Tatá]


Ballet
Escrever poema com o mesmo número de versos e estrofes de «Ballet» mas sobre outra arte, espectáculo, desporto (exemplos: «Futebol», «Natação», «Surf»). Não é obrigatória a rima.

Ballet

Como jogos de água, ascendes vitoriosa e ufana.
Soberana,
à superfície do tablado estendes
as linhas com que nos prendes,
filigrana.

Língua de fumo da taça do turíbulo,
endoideceste em beleza.
Vermelha e quente como o sangue do patíbulo
é tua natureza.

Volátil,
rodopias em torno do teu eixo
centrifugando círculos de espuma.
Estacas. E em sonolento desleixo,
esboçando incompletos gestos lentos,
fragmentos de movimentos,
semeias flores, na bruma.

Ascendes e rodopias.
Rodopias e ascendes.
Fazes-te noites e dias
nas sombras que denuncias,
nos relâmpagos que acendes.

Célere, corres,
mimosa
e assustada.
Gaivota medrosa
na areia dourada.
O sol entontece e morde.
Num repente, libertada,
deslizas, pura escultura,
na macia curvatura
de um acorde.

Nos pontos da trajectória
que descreves, transparece
o clamor da longa história.
Tua beleza é vitória,
dura vitória da espécie.

O escopro de milhões de anos arrancou-te à pedra bruta,
modelou-te em pormenor.
O sangue de milhões de homens, em ti, a ferver, se escuta.
A harmonia dos teus gestos foi revolta, treva e luta.
O perfume do teu corpo foi temperado em suor.
António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D’Água, [2004], p. 112
Basquetebol
Cinco contra cinco,
na disputa pela bola,
Cinco de um lado,
todos em busca da vitória.

Cansados e suados,
lutamos arduamente.
Aquele poste bem alto,
com um cesto para lá encestar.

Exigente.
Corres a driblar a bola,
passas aos teus colegas
e lanças ao cesto.
Corres sem a bola,
atrás do adversário
para lhe tirar a bola.

Saltas e cais.
Cais e saltas
e continuas.
Encestas daqui,
dali,
ou noutro sítio qualquer.
Num instante,
estamos a atacar
e noutro, a defender.

E muito rápidas são,
as trocas de bola.
Tanto podem ser
de peito, de ombro,
ou até picado.

Sem darmos pelas horas,
já o jogo terminou.
Olhamos para o resultado,
e com o pé,
esperamos a vitória.

[Diogo]
Joaneida
Aos 16 anos, Rómulo de Carvalho escreveu estas estâncias, que consituem a Proposição de um poema épica a D. João I (ou à Ínclita Geração). Observa que o modelo de Os Lusíadas foi seguido de perto. Escreve a Proposição de um poema épico que pudesses fazer (podes usar os tópicos que prepararas na aula passada ou engendrar outra epopeia).Joaneida

I
Aquele rei ilustre lusitano
Que a Fernando o Formoso sucedeu,
Que no bárbaro campo Tingitano
Os miserandos árabes venceu,
E que em Aljubarrota, o Castelhano,
Com pouquíssima gente combateu,
Em estilo humilde e fraco vou cantar,
Se a filha da Memória me ajudar.

II
E aquele Nuno, heróico Condestável,
Que só a Deus mostrava ter temor,
Que p’la sua coragem indomável,
Em Valverde e Trancoso fez furor,
Levado por uma fé inquebrantável,
Querendo servir ao Santo Criador,
Tornou-se em monge o ínclito guerreiro,
Terminando os seus dias num mosteiro.

III
Canto também aqueles quatro infantes,
Dum nobre rei, ilustre geração:
O sábio Henrique, pai dos navegantes,
Que faz calar a fama do Strabão
E que mandou por esses mares distantes,
Levados pela trombeta de Tritão,
Heróis, aventureiros destemidos,
Procurando lugares desconhecidos.
António Gedeão, Obra Completa, Lisboa, Relógio D’Água, [2004], p. 649
Brasileida

Brasil, grande terra,
Terra de calor e descanso,
Brasil, Terra sem guerra
Terra de povo calmo e manso,
Brasil, com serras e selvas
Terra sem alcance,
De que, logo ao primeiro olhar,
Toda a gente começa a gostar.

[Tatá]