Garrett & Canção 1
Francisco R. [Bom - {tal
como as notas seguintes, esta apreciação diz respeito sobretudo à primeira
versão do texto, embora tenha tentado também vigiar a revisão havida}]
Analisando a letra da música «Quando se perde
alguém», dos Santos & Pecadores e
do álbum Os primeiros 10 anos (2003),
podemos comparar alguns dos versos com Frei
Luís de Sousa e com algumas das personagens da peça.
Madalena, mulher de D. Manuel de Sousa Coutinho,
vive constrangida com a morte «de meu senhor D. João de Portugal». Mesmo que
diga «Tentei, tentei esquecer», tem muito medo de se confrontar com coisas que
a lembrem de D. João, mesmo achando que é algo normal «quando se perde alguém».
Telmo, ex-aio de D. João, sente adoração por
ele. Para Telmo, D. João não se encontra morto, como acredita Madalena; para
Telmo, ele irá voltar, esperança semelhante à que tinha em D. Sebastião. Telmo
sente «que tudo voltaria a acontecer», e que talvez reencontrasse o tão amado
amo. Talvez até tivesse mais amor a D. João que do que à própria Madalena, as
saudades que Telmo tinha eram levadas muito a sério («porque quem ama não quer
saber / se o amor dói ou faz sofrer»).
Maria, filha de Madalena e de Manuel, convive
permanentemente com o constrangimento da mãe acerca de D. João, sem saber quem
este era. Ela “vê” pela primeira vez D. João após ter-se mudado para a casa que
pertencera em tempos ao primeiro marido da mãe, observando um quadro na sala
principal, ao lado de Camões e de D. Sebastião. Maria questiona Telmo, que olha
para o quadro do antigo amo, pensando como «é bom, é bom rever», mas sem
conseguir ser esclarecida de quem era a personagem naquele quadro. Então, entra
D. Manuel que lhe explica quem era o «honrado e valente cavaleiro» que ali
estava.
Embora possamos pensar que D. Manuel “odiasse”
D. João, isso não acontece. D. Manuel tem-lhe bastante respeito, até porque
morreu pelo seu país no norte de África, e haverá algumas parecenças entre
eles. D. Manuel era tão patriótico que preferiu queimar a própria casa a
hospedar o inimigo. Se D. João estivesse presente, talvez tivesse dito que «só
pode ser assim» que se mostra quem é um verdadeiro português que, pela nação,
deixa qualquer para trás e sai de cabeça levantada, dizendo «vem para mim».
Guilherme [Bom+/Muito
Bom-]
Na letra escrita por Charles Hart e Richard
Stilgoe, Christine, uma das personagens principais de O Fantasma da Ópera, revela-nos como o Fantasma cuidou dela e a
protegeu desde nova, ensinando-a a cantar. Este assume um estatuto próximo da
figura paternal, como evidenciam os versos “In Sleep He Sang to me, In dreams
he came / That voice that calls to me, / And speaks my name”, o que em
português significa, de uma forma muito grosseira, “Em sono me cantava, em
sonhos vinha / aquela voz que me chama, / e fala o meu nome”. É possível
estabelecer, a partir destes versos, uma analogia válida quer entre Christine e
Maria quer entre o Fantasma e Telmo, dado que este último é como «a sua [de
Maria] aia de criação» e tomou «um ascendente no espírito de Maria», como
menciona D. Madalena, mãe da menina, no acto I, cena II, de Frei Luís de Sousa. Embora possível,
esta analogia não é a mais forte.
Outra possível comparação (e esta mais robusta)
entre o texto garretiano e a letra evocada reside nas semelhanças entre o
Fantasma da Ópera e D. João de Portugal e entre Christine e Dona Madalena.
Tanto nos versos cantados por Christine como nos cantados pelo Fantasma — “And
do I dream again? For now I find / The Phantom of the
Opera is there inside my mind” e “Sing once again with me our strange duet; /
My power over you grows stronger yet. / And though you turn from me to glance
behind, / The Phantom of the Opera is there inside your mind.”, em português,
“Será que sonhe novamente? Por agora encontro / O Fantasma está lá / dentro da minha
mente” e “Canta novamente comigo este nosso estranho dueto; / O meu poder sobre
ti cresce ainda fortemente. / E mesmo que me vires as costas para olhar para
trás, / O Fantasma da Opera aqui lá / Dentro da tua mente” — é possível
compreender que Christine vive atormentada com a constante e obsessiva proteção
do Fantasma, que adora e ama. Da mesma maneira vive Madalena de Vilhena, sempre
atormentada pelo espectro de seu antigo marido, D. João de Portugal. Este
inquieta-a, impede-a de ser feliz com o novo marido, Manuel de Sousa Coutinho:
“este medo, estes contínuos terrores, que ainda me não deixaram gozar um só
momento de toda a imensa felicidade que me dava o seu amor. Oh! que amor, que
felicidade… que desgraça a minha!” (Ato I, cena I).
Um outro elemento análogo, presente no musical
de Andrew Lloyd Webber, inspirado no romance homónimo de Gaston Leroux, e no
texto dramático da autoria de Almeida Garrett, é a existência de um coro,
personagem colectiva que integrava as tragédias gregas e que emite conselhos,
exprime opiniões, coloca questões e, por vezes, toma parte ativa na ação. Em Frei Luís de Sousa, esse papel é
assumido pelas personagens de Frei Jorge e de Telmo (“Que febre que ela tem
hoje meu Deus! queimam-lhe as mãos… e aquelas rosetas nas faces… Se o perceberá
a pobre mãe”, ato I, cena III) e, no musical, pelo coro que canta “He’s there
the phantom of the opera. / Beware the phantom of the opera” (“Ele lá está, o
fantasma da ópera. / Cuidado com o fantasma da ópera”).
Inês C. [Muito Bom]
Num clima como o da peça criada por Almeida
Garrett, Frei Luís de Sousa, recatado, tristonho, fatídico, onde o
sofrimento e o desespero marcam cada cena, a escolha de uma das músicas da
moda, animada e com tanto fogo, escrita por Alicia Keys, parece algo
despropositada. No entanto, a mulher retratada na canção tem semelhanças
evidentes com a pequena filha de D. Manuel Coutinho e de Dona Madalena de
Vilhena, Maria. Também podemos fazer algumas associações entre a letra de “Girl
on Fire” e as outras personagens do drama-tragédia, tanto por semelhanças, como
por antítese.
Frei Luís de Sousa é um texto dramático com
características de tragédia, entre elas o pathos, já que todas as
personagens se mostram num estado de sofrimento mais ou menos evidente (ou
esperando por um amo que já não virá, ou receando
o regresso de quem já não deveria voltar e desesperando pelo regresso de outro,
ou mesmo sofrendo por ver os outros sofrer). Esta técnica permite a criação de
empatia com o espetador e um maior dramatismo, influenciado pelo destino, que
nenhuma das personagens consegue contrariar. Durante a peça, em que um
pressentimento de fatalidade se instala desde o início («que desgraça a
minha!»), todas as personagens se encontram num estado de desconforto. “She's
on fire” (“Ela está a arder”, numa tradução mais literal) poderá tomar uma
aceção mais negativa, se virmos que as personagens se encontram controladas por
um destino irrevogável que, por todos os pecados que percebem ter cometido, os
pode levar ao fogo do Inferno.
Maria será a personagem que
melhor se adapta às palavras da cantora. Na verdade, por ser vítima de
tuberculose, Maria apresenta-se, muitas vezes, febril («Que febre que ela tem
hoje, meu Deus! Queimam-lhe as mãos...»), «on fire». Ainda que na canção de
Keys “estar em fogo” seja algo positivo, em Maria poderá ser associado à forma
dolorosa de como morreu, em agonia, tanto física como psicológica, uma vez que já
sabia que «eu hei-de morrer assim».
Podemos, a partir de
caracterizações indirectas, depreender que Maria é uma rapariga muita ativa e
imaginativa, que gostava de cenários de guerra e acção, aventureirices estas
ensinadas pelo seu fiel Telmo. «She got her head in the clouds / And she's not
backing down» (“Ela tem a cabeça nas nuvens / e não irá voltar”) será uma
descrição possível de Maria, já que esta está sempre a sonhar com batalhas
noutros continentes, e, no entanto, deixou de pensar tanto nelas depois do pedido
da mãe (“Lês de mais”), sendo o segundo verso mais adequado para Telmo, que mantém
as suas crenças sebastianistas, acreditando também que o amo ainda voltará, não
querendo aceitar a sua morte.
«She's living in a world, and
it's on fire» (“Ela vive num mundo que está a arder”), não só por tudo o que
Maria conhece estar a desmoronar-se mas também porque a casa onde sempre viveu
foi incendiada pelo pai (acto de coragem e patriotismo que admirou muito).
Podemos assim concluir que é uma família com coragem para enfrentar o destino,
«Cause they can see the flame that's in her eyes» (“Porque conseguem ver a
chama nos olhos dela”), que não esmorece, mesmo quando tudo corre mal. Quando
«Sentem que está a chegar a catástrofe» («Feeling the catastrophe, but she
knows she can fly away»/ «mas ela sabe que consegue voar para longe»), tentam
sempre mostrar o seu valor, mas, ao contrário da personagem da canção, acabam
todos por se vergar ao Destino. E, assim, morre Maria e os pais vão para um
convento, deixando que as chamas “tudo queimem” («Burn it down»), já que não há
mais por que lutar.
Pedro C. [Bom/Bom(-)]
Regressado do cativeiro passados vinte e um
anos, D. João de Portugal encontra a mulher casada com outro homem. É esta a
tragédia familiar da obra Frei Luís de
Sousa, uma peça que, depois de vários presságios e indicações das
personagens, nos leva ao conflito de valores do escudeiro fiel, à desonra da
filha e à tristeza e desgraça de Madalena, Manuel e D. João.
A música que escolhi, “Laços”, dos Toranja, está
relacionada com a peça pelo refrão, onde o autor pede algo de volta, a relação
perdida, a ligação, os laços que deixaram de existir. «Devolve-me os laços, meu
amor» é o que D. João terá pensado ao ver Madalena pela primeira vez e ao
ouvi-la chamar por Manuel de Sousa («Pois por quem?... Não lhe ouves gritar:
“esposo, esposo?”»), se bem que, no final, D. João de Portugal tivesse dito que
já não desejava criar mais desgraça a Madalena («Vai, vai; vê se ainda é tempo;
salva-os, salva-os, salva-os, que ainda podes...»). O enredo alimenta-se da
discussão dos valores da família quando o homem, depois de julgado morto, volta
para a sua mulher agora casada com outro. As várias personagens de Frei Luís de Sousa giram à volta desta
tragédia. Telmo, o fiel escudeiro, sente-se inicialmente obstinado em lembrar
D. João a Madalena mas, quando este volta, o aio fiel lembra-se de Maria, a
filha que criou e que terá de viver em desonra.
A letra da música refere ainda um quadro («Tens
riscos de mais / A estragar-me o quadro»), o que lembra os quadros presentes na
obra de Garrett. O quadro de Manuel de Sousa Coutinho estragado pelo fogo que
ele próprio deflagrou num ato de indignação para com os castelhanos e que viria
a ser muito louvado por Telmo e o quadro de D. João de Portugal que viria a
aterrorizar Madalena e servir para o reconhecimento do Romeiro.
O ritmo, calmo e simples, lembra também o
evoluir da história, começando com os medos e presságios de Madalena na casa de
Manuel de Sousa cheia de quadros e ornamentos familiares passando depois ao
tenebroso palacete de D. João e à cave, onde o cenário é frio, cru e despido.
Frei Luís
de Sousa
termina com a entrada de Manuel e Madalena para ordens religiosas para se
poderem redimir dos seus pecados, porque, como diz a música, «Há que levar o
restolho / Do que o tempo queimou», assim há que olhar em frente depois do
passado pecaminoso.
Rui [Bom-/Bom(-)]
Optei por uma escolha diferente, aventurei-me
numa canção estrangeira, numa música em inglês. Tanto o título como a letra
estão relacionados com vários momentos que facilmente identificamos em Frei Luís de Sousa.
Logo no título («Boarderline»/«Fronteira»)
encontramos uma relação com a peça, na medida em que temos, por exemplo, o
contexto da batalha de Alcácer Quibir ou mesmo a parte que decorre do outro
lado do Tejo. Podemos estabelecer uma relação de distância/fronteira entre os
intervenientes. Esta passagem da canção pode ser utilizada para referir a
distância que separava D. João de Portugal de Madalena, mesmo não sabendo que o
seu ex-marido ainda estava vivo após ter sido mantido em cativeiro em Jerusalém
(«Não os visitei; morei lá vinte anos cumpridos»).
Madalena desempenha um papel de mãe, viúva e
mulher agora de novo casada com outro homem («Meu esposo, meu marido, meu
querido Manuel!») cuja filha está bastante doente e a enfraquecer a cada dia
que passa. Madalena está na base de todas as relações e a sua família vai
acabar por se abater num conflito moral e religioso. O primeiro marido de Madalena
foi D. João de Portugal («bom e generoso homem») que desapareceu na batalha de
Alcácer Quibir. Madalena vai procurá-lo com angústia durante sete anos mas, com
o desenvolver da ação, percebemos que, depois de estar casada catorze anos com
Manuel de Sousa Coutinho, teme o regresso de D. João que aliás não chegou a
amar de verdade. Damos por ela várias vezes na peça desesperada e chorosa à
espera de que o seu amado chegasse («Looking through the coutryside, there are
tears in my eyes» / «”Olhando” através do campo , há lagrimas nos meus olhos»).
Madalena mostra-se uma mulher hesitante, perturbada e agitada, obcecada pelo
passado e temerosa do que possa vir a acontecer no presente ou num futuro
próximo.
D. João acaba por regressar, disfarçado de
romeiro e com uma mensagem para Madalena após ter partido há vinte e um anos
atrás com a esperança de que ela estaria à sua espera («That you will wait for
me until the day there´s no boarderline» / «Se tu vais esperar por mim até ao
dia em que não houver mais fronteira») no dia em que voltasse.
«And my loved one is far away» / «E a minha
amada está longe» pode ser usado em vários dos momentos de impaciência e
saudade de Madalena, quando espera ansiosamente pela chegada de diferentes
personagens.
Já Telmo, apesar de tentar manter-se imparcial
para não magoar nem causar a desgraça na família de Madalena («Showing no
emotion» / «Sem mostrar nenhuma emoção»), não consegue esconder que não
acredita que o seu velho amo tenha morrido. É o único que acredita que D. João
de Portugal está vivo e teme pelo amor de Madalena e pela saúde de Maria, que
lhe é tão querida.
Tomi [Bom (-)]
Para ilustrar e estabelecer um paralelo entre a
obra Frei Luís de Sousa e uma canção, escolhi a musica “Está tudo bem,
Mãe (Estou apenas sangrando)”, de Bob Dylan (1965). Logo a partir do título da
canção, “It's Alright, Ma (I'm only Bleeding)”, podemos estabelecer uma
comparação com a atitude de Maria, a filha de D. Manuel Sousa Coutinho e de D.
Madalena, que está doente. Esse facto é
perceptível desde o início, não apenas através dos indícios apresentados
na obra, mas também através do estado de aflição que todos os membros da
família de Maria e Telmo expressam relativamente à vida de Maria, a menina de
treze anos. Maria apresenta sintomas de tuberculose, doença vulgar na época, e,
embora debilitada, tinha uma grande vontade de fazer e saber tudo (“It's
alright, Ma, I can make it./ E está tudo bem, mãe, Eu consigo fazer isto”). Era
uma menina muito curiosa, mas é sua mãe, D. Madalena, que lhe tenta pôr algum
juízo na cabeça e lhe pede para não ler de mais e não se cansar com assuntos
que não lhe competem (“Minha querida
Maria, que tu hás de estar sempre a imaginar nessas coisas que são tão pouco
para a tua idade!”). Maria desempenha um importante papel na peça, pois é ela
que consegue juntar os pais nos momentos mais difíceis e é com ela que a obra
encerra, com a sua morte trágica na Igreja devido ao abandono da vida secular
por parte dos pais.
A separação de D. Manuel e de D. Madalena acontece
por causa do aparecimento de D. João de
Portugal, antigo esposo de D. Madalena, que todas as personagens pensavam
morto, à excepção do fiel aio Telmo Pais, que nunca duvidara do seu regresso (“you
lose yourself, you reappear. / tu te perdes e reapareces”). D. João aparece
disfarçado de Romeiro para dar notícias da sua própria pessoa, vinte e um anos
depois do seu desaparecimento, mas dá a conhecer a sua verdadeira identidade a
Telmo (“O que te ordena teu amo”).
É D. Manuel, com o apoio do irmão Jorge, que
entende que aquele casamento não pode continuar pois está contra os os
princípios da igreja, (“that not much, is really sacred / Que quase nada, é
realmente sagrado”) e considera um pecado gravíssimo o facto de se terem casado
sem a total certeza da morte de D. João e que aquela união nunca deveria ter-se
realizado (“O nosso amor é impossível”).
João [Bom (-)]
Esta música de Rui
Veloso fala sobre uma fase importante da vida de qualquer pessoa, a
adolescência, a juventude. Esta canção pode relacionar-se com certos trechos de
Frei Luís de Sousa.
Na letra da canção, o
verso “Por mais amigos que tenha
sinto-me sempre sozinho” é relacionável com o estado de espírito de Madalena, pois
ela, ao longo da obra, sente-se infeliz e sozinha, mesmo quando acompanhada dos
seus mais amados (a sua filha Maria e o seu esposo Manuel Sousa Coutinho). Conseguimos
perceber que Madalena, ainda que os seus “amigos” estejam com ela, nunca se
sente feliz e descansada. Apesar dos momentos mais infelizes de Madalena, a
presença de Maria deixa sempre um sorriso no rosto da mesma. Ora podemos fazer
uma analogia com a letra da canção, em “Tão depressa o sol brilha como a seguir
está a chover”, em que o sol reflete a alegria que Madalena sente por estar
junto da família que ama, ao mesmo tempo que se sente receosa e nervosa pelo
eventual regresso do seu primeiro marido (“chuva”).
Podemos também estabelecer uma analogia entre o verso “De
manhã ouço o conselho que o velho tem pr'a me dar” e o aio da família, Telmo,
uma vez que, ao longo da obra, Madalena sempre deu muito valor aos seus
conselhos. Percebe-se que Telmo ainda acredita que o seu primeiro amo, D. João
de Portugal, ainda está vivo (ideia que aterroriza Madalena) e que voltará, por
isso Madalena não aprecia a companhia de Telmo, apesar de lhe ter respeito e
amizade.
Como foi já referido, Madalena, ao longo da obra, sente-se
infeliz e perdida, perdida nas suas emoções, já que vive sempre numa angústia e
nunca se sente verdadeiramente tranquila. Penso que o trecho da canção “Vou por
aí às escondidas, a espreitar às janelas / Perdido nas avenidas e achado nas
vielas” se pode relacionar na perfeição com este pensamento. Ainda acerca das
paixões de Madalena, podemos citar a seguinte frase da música: “Mãe, o meu
primeiro amor foi um trapézio sem rede”. A expressão “trapézio sem rede”
significa um “risco grande”, podendo ser relacionada com o casamento de
Madalena com D. João de Portugal (sendo o risco, neste caso, o facto de
Madalena nunca o ter amado verdadeiramente), mas também com o seu actual
casamento (neste caso, o risco seria a incerteza da morte de D. João de
Portugal).
Por fim, na última parte da canção
podemos supor que, para o músico, o único motivo de felicidade é o Rock and
Roll (“Se não fosse o Rock and Roll, o que
seria de mim?”), e podemos traçar um paralelismo com Madalena: o Rock and Roll representaria
Maria, que é a principal razão pela qual Madalena ainda carrega um sorriso no
seu rosto.
Mónica [Suficiente +]
Esta canção, “Se eu não te amasse tanto assim”,
cantada por Ivete Sangalo, poderia servir para explicar muito do que João de
Portugal pensou, ao longo daqueles vinte anos de cativeiro, sobre a sua amada
mulher, Madalena.
A frase, e título da canção, “Se eu não te
amasse tanto assim”, pode aplicar-se na perfeição a João de Portugal, porque,
afinal de contas, o ilustre nobre sempre amara Madalena. Por isso é que ao fim
de vinte e um anos, e por saber que ela já tinha refeito a sua vida com outro
homem, tendo agora uma filha, Maria, teve coragem para aparecer.
Regressou por amar Madalena, por, apesar de
tudo, ainda a amar, ainda a respeitar, ainda a admirar, apesar de magoado e
destroçado. E também para que percebesse que ela não fora a única a sofrer por
tanta espera. João de Portugal também sofrera por saber que os que mais amava o
tinham dado como morto, por ter sido cativo durante tantos anos e por nada
poder fazer quanto ao facto de, estando preso, o terem esquecido aos poucos.
Caso João de Portugal não amasse Madalena, não teria ido ao seu antigo palácio
procurá-la para lhe contar toda a verdade. Fez-se passar por romeiro porque
estava ferido e magoado de mais, desfeito por a vida lhe ter reservado tudo
aquilo que ninguém deseja. E também por, sem dúvida nenhuma, ter ficado
magoadíssimo por Madalena se ter entregado a outro homem e por saber que ela
amava mesmo Manuel de Sousa. A prova disso era Maria, a filha do novo casal.
O verso “Hoje eu sei, eu te amei, no tempo de um
temporal” aplica-se a Madalena. Assim que vira Manuel de Sousa, apaixonara-se
por ele, estando ainda vivo D. João de Portugal. O amor foi mais forte do que a
fidelidade. Madalena sabia que não estava certo apaixonar-se logo por uma
pessoa, sendo casada. Por isso é que, quando João de Portugal apareceu ao fim
de tantos anos, ela sentiu que a sua vida acabara, como, quando tiveram de ir
para o palácio onde vivera com ela, sentiu que estava a trair o seu actual
marido, Manuel de Sousa, ainda que em pensamento, visto que aquele palácio lhe
lembrava João de Portugal e a sua vida
conjunta com ele, sentindo-se angustiada.
Inês P. (Bom+/Muito
Bom-)
Uma das personagens em torno das quais se desenvolve Frei Luís de Sousa é Maria, filha de
Madalena e de Manuel de Sousa Coutinho, e íntima amiga do escudeiro do antigo
marido de Madalena, Telmo. Várias passagens de “Read all about it” (“Ler tudo sobre
isso”), de Emeli Sandé, faixa do seu único álbum Our version of events (ou A
nossa versão dos acontecimentos), de 2012, fazem alusão a características
de Maria, que, direta, ou indiretamente, nos são apresentadas ao longo da peça.
A menina sente-se bastante amada pelos pais (“nunca houve decerto filha
querida como eu!) e, tendo apenas treze anos, mostra-se bastante madura, preocupando-se
com a preocupação que espoleta nos progenitores (“estais sempre num sobressalto
comigo?”).
Com Telmo, discute muitos temas da época, sendo o principal o destino
reservado a D. Sebastião e aos soldados que combateram na batalha de Alcácer Quibir,
entre os quais D. João de Portugal, que ambos acreditam estar vivo (“Its about time we got some airplay of our version of
events”, “Já está na altura de divulgarmos a nossa versão dos acontecimentos”),
ao contrário de Madalena, que vive atormentada com essa possibilidade. Juntando
o facto de ser mulher ao de ser filha única de um cavaleiro influente,
intelectual e respeitado, Maria sente-se na obrigação de preencher o espaço de
um filho varão, “capaz de comandar os terços” do pai.
Todo este comportamento de estudo e dedicação
preocupam a mãe, que tenta dissuadi-la (“Lês de mais, cansas-te, não te
distrais como as outras donzelas da tua idade”) de tais práticas (“You've got a
heart as loud as lions / so why let your voice be tamed?”, “Tens um coração que
grita como leões, então porque deixas domar a tua voz?”). A jovem promete parar
(“You've spent a lifetime stuck in silence / afraid you'll say something wrong”,
ou seja “Passaste a vida presa ao silêncio, com medo de dizer algo errado”),
apesar de não pretender cumprir tal promessa a longo prazo, continuando os
estudos em segredo (“os meus papeis, que eu também tenho papeis. Deixai, que lá
na outra casa vos hei de mostrar… Mas segredo!”).
“You've got the
words to change a nation / but your biting your tongue” (“Tens as palavras para
mudar a nação, mas estás a morder a tua língua”) aplica-se ao pensamento
revolucionário e político que Maria desenvolve no momento em que o seu tio,
Frei Jorge, comunica que quatro governadores espanhóis tencionam instalar-se na
sua casa: “Fechamos-lhes as portas, metemos a nossa gente dentro: o terço de
meu pai tem mais de seiscentos homens e defendemo-nos. Pois não é uma tirania?”.
Sendo uma pessoa tão única,
inteligente e talentosa, a sua morte torna-se ainda mais trágica. É o culminar
da tuberculose, evidente ao longo de toda a peça.
Miguel F. [Bom+/Muito
Bom-]
João Pedro Pais, no álbum Tudo bem (2004), dá vida à canção «Lembra-te de mim», que considero
poder ter uma associação bastante próxima à cena XIV do Terceiro ato de Frei Luís de Sousa.
A letra desta canção remete-nos para uma
presumível realidade sofrida por D. João de Portugal em busca de Madalena, sua
mulher (ou, melhor dizendo, ex-mulher), sempre com o objetivo de lhe poder
contar que nunca chegara a morrer em batalha, ao contrário do que todos os seus
amigos e familiares chegados julgavam, com exceção de Telmo. O Romeiro diz trazer
consigo um valioso recado, que um homem de nome desconhecido, mas a quem viu
sofrer muito («com as lágrimas de sangue que lhe vi chorar»; «Ninguém o
consolava senão eu... e Deus!»), mandara a Madalena de Vilhena. Esse homem diz
ter sobrevivido a vinte anos de cativeiro.
A promessa e o recado nunca foram esquecidos pelo
Romeiro, que, mais tarde, sabemos ser D. João de Portugal («Vede se me
esqueceriam as suas palavras» e conforme foi escrito na canção «Não me esqueço
do recado / Nem de um gesto ocasional») e que faz questão de percorrer sem
descanso o caminho desde Alcácer Quibir até ao palácio dos Vimioso, para poder
revelar a Madalena e àqueles que conhecia que nunca morrera em batalha, mesmo
que todos o tivessem julgado morto e prosseguido com as suas vidas («Os mais
chegados, os que eu me importava achar... contaram com a minha morte, fizeram a
sua felicidade com ela»).
Tal como o título da canção «Lembra-te de Mim» sugere,
no fundo, o Romeiro está desesperado por reconhecimento e afeição. Apenas
deseja ser acolhido nos braços de Madalena e de Telmo, mas Madalena tem agora a
vida refeita («Os amores já terminados / São ausência, fazem mal») e Telmo já
não sabe se ama mais a Maria ou ao seu antigo amo. Conseguimos ainda
compreender a mágoa da personagem, quando não é reconhecida por ninguém. A
incapacidade de reconhecimento por parte da mulher de Manuel de Sousa Coutinho
e do frade, dever-se-ão, provavelmente, ao rosto envelhecido, às grandes barbas
e cabelos brancos que cresceram após a longa viagem do Romeiro, que desconfiamos
ser D. João de Portugal («Estou tão velho e mudado do que fui!» e na canção «Os
rostos p’ra quem os viu / Já não são como dantes / Percorro as margens de um
rio / Há já séculos, há instantes»).
A quadra final da canção pode ser relacionada
com o pedido do Romeiro, que afirma não ter tido repouso para poder revelar a
verdade sobre o tão trágico incidente e poder depois morrer descansado («Há
três dias que não durmo nem descanso nem pousei esta cabeça nem pararam estes
pés dia e noite, para chegar aqui hoje, para vos dar o meu recado... e morrer
depois»). Em “Lembra-te de mim”, esta última meta pode ser expressa em «Vivo de
vagas memórias / Onde te espero encontrar / São derrotas, são vitórias / Quero
agora descansar».
Pedro D. [Bom (+)]
A música «Perdi a memória», de António Variações,
enquadra-se na perfeição com o papel de algumas personagens da peça Frei Luís de Sousa, escrita por Almeida
Garrett. Ao analisar a letra da música, de uma forma geral, podemos encaixá-la
em D. João de Portugal. O próprio título, «Perdi a memória», pode representar
as mudanças que esta personagem sofreu na vida ao longo do tempo e a nostalgia
que tem do seu passado feliz com a mulher que amava. «Turvou-se-me o pensamento»
e «Perdi a razão do tempo» refletem um presente muito diferente do passado que
D. João de Portugal viveu.
A promessa que Telmo faz a Madalena de não
contar nada que se possa relacionar com o passado da família a Maria («À fé de
escudeiro honrado, senhora D. Madalena, a minha boca não se abre mais; e o meu
espírito há de… há de fechar-se também…») pode até mesmo integrar-se no verso «Não
posso contar a minha história».
A ênfase dada na peça ao retrato de D. João de
Portugal e a pergunta «De quem é este retrato aqui, Telmo?», feita por Maria, assentam
bem à quadra «No meu quadro eu só tenho / esta visão / Tantos olhos apontados /
à minha mão».
D. Madalena, assim como quase todas as
personagens da história, «Não tem sinal nem posição» de D. João de Portugal. Mesmo
assim, a sua memória e o receio de que este volte continuam a angustiá-la («Oh
perdoa, perdoa-me , não me sai esta ideia da cabeça … que vou achar ali a
sombra despeitosa de D. João»). Deste modo, o desejo de Madalena vai no sentido
de não ver mais o marido que já deixou («Não quero ver o que enganei / Nem
quero ter o que eu já dei»).
Manuel de Sousa Coutinho refere-se a D. João de
Portugal como «um honrado fidalgo e um valente cavaleiro», apesar de este ser o
ex-marido da sua mulher. Manuel assume assim um papel de adivinho, olhando para
o futuro e esquecendo o passado, tal como uma das quadras da letra de António
Variações: «Perdi a lembrança / Da mente risquei / A história que não me
interessa / A história que eu não serei.». Manuel de Sousa põe também de lado
os receios que a sua esposa sente em relação à possibilidade de o ex-marido
voltar («Limpei a cabeça / De tudo o que ela não quer»).
O Romeiro era a representação de D. João de
Portugal. Sendo esta a personagem que angustiou Madalena, Frei Jorge, para
comprovar a veracidade das suas afirmações quanto ao paradeiro de D. João,
perguntou-lhe que retrato representava o remetente da mensagem. A sua resposta
foi de tal forma chocante que fez Frei Jorge perguntar: «Romeiro, romeiro, quem
és tu?», levando o Romeiro a responder: «Ninguém!». «Será vossa imagem / Que me
convém / Ao sair da desfocagem / Não vi ninguém.» é uma quadra da música que,
pela negativa, representa a situação de Frei Jorge.
Beatriz [Bom(-)/Bom-]
A canção de Rui Veloso “Nunca me esqueci de ti”, com letra de Carlos Tê, encerra no
título o sentimento geral da memória de D.João de Portugal. Não no sentido
denotativo dado durante a canção (lembrança de um grande amor), mas por
conseguir retratar o sentimento de desespero, cada vez mais desenvolvido e
presente em D. Madalena, pelo regresso do antigo esposo (“que vou achar ali a
sombra despeitosa de D.João, que me está ameaçando com uma espada de dois gumes”).
Este sentimento torna-se ainda mais intenso com
a destruição da casa-palácio de Manuel de Sousa Coutinho. Agora, D. Madalena de
Vilhena está confrontada com um vulcão de emoções, de incertezas que ficam
expressas na canção (“Bato a porta devagar, / Olho só mais uma vez / Como é tão
bonita esta avenida...”). Transporta no presente as sombras do seu passado e
Maria, fruto do amor presente, também não a sossega (“Isso é o que nos aflige,
a teu pai e a mim”). Não se conforma, quer mudar o mundo, mas, ao mesmo tempo,
é frágil!. Agora, vai ter de tornar à casa
onde vivera. É o reencontro com um passado ainda não concluído. D. Madalena
volta ao passado, como que ao encontro do Romeiro.
A passagem para o palácio de D. João de Portugal
“é o cais”, é como uma porta entreaberta. Não consegue fechar o passado e mostra
um presente nu e frágil, pela dúvida do regresso de D. João de Portugal, como
se anuncia na canção ( “Flor do cais: / Águas mansas e a nudez / Frágil como as
asas de uma vida”).
Quanto a Maria, procura novas experiências e
aventuras (“Tomara-me eu já lá”), enquanto
que o agoirento Telmo e os receios e as lembranças de D. Madalena a
trazem constrangida e perturbada. Mas “não podia ser de outra maneira… / é
a sorte, é a sina / Uma mão cheia de
nada / E o mundo à cabeceira”. O presente não consegue apagar-lhe os fantasmas
do passado (“É o riso, é a lágrima / A expressão incontrolada”) e agora ainda
menos, porque vai reencontrá-los no palácio de D. João de Portugal. A morte não
confirmada e o insistente pressentimento de Telmo (“Mas nunca me esqueci de ti /
Não, nunca me esqueci de ti / Eu nunca me esqueci de ti”) acordam memórias e
trazem presenças, já não desejadas, porque irão interromper o presente e
quebrar um equilibrio agora construído.
O temido aconteceu — o regresso do Romeiro.
Concretizam-se os presságios de Telmo, fundamentam-.se as angústias de D.
Madalena e a frágil Maria parte (“Tudo muda, tudo parte/Tudo tem o seu
avesso./Frágil a memória da paixão...”).
Manuel de Sousa, não resiste e entrega-se ao
celibato. Entrega o que lhe restava (“É a lua. Fim da tarde / É a brisa onde
adormeço / Quente como a tua mão”).
Luís
[Bom +]
Os
sentimentos apresentados na canção, de Rui Veloso, “Não queiras saber de mim”,
do álbum A Espuma das canções (2005) — o abatimento de alma e a descrença na alegria de
viver, entre outros — são semelhantes aos
de várias personagens de Frei Luís de
Sousa, principalmente no terceiro acto.
Telmo
sempre desejara e acreditara no regresso de seu «senhor», D. João de Portugal
(«a ninguém mais ficou resto de dúvida. / Telmo — Senão a mim.»). No entanto, quando o seu «amo velho»
regressa, após vinte anos de cativeiro, tal como na canção, o «escudeiro
valido» ficou como quem não se entende, prostrado e «fora de combate», devido
ao amor que nutria por Maria, que se superiorizava ao que tinha pelo seu antigo
amo. Todo este conflito moral entre o velho senhor, a quem sempre fora fiel, e
o «anjo» a que se prende agora leva Telmo a uma disposição, de loucura quase
masoquista, que culmina na descrença em si próprio, análoga aos versos da
composição de Veloso «Não queiras saber de mim / Hoje não me recomendo», mas,
na peça, acentuada, ao ponto de a personagem desejar a morte.
Por
se reportar a D. João, poder-se-á extrair da canção o dístico «quando mais
brilha a tua luz / Mais eu fico apagado». Quantos mais anos passaram da batalha
de Alcácer-Quibir, em que o seu primeiro marido fora dado como morto, mais
Madalena fazia «a sua felicidade» com Manuel de Sousa Coutinho e D. João de
Portugal passava a ser «Ninguém!». De certa forma, os versos «Dança tu que eu fico assim» e «Fico fora de combate / Como se chegasse ao fim» também
se adequariam ao estado de D. João, pois, embora tivesse morrido,
conotativamente, no dia em que Madalena deixara de o procurar, ele, ainda que
“ferido”, continuava a desejar felicidade a quem outrora amara e agora
perdoara, ordenando a Telmo que falasse com Madalena e lhe dissesse «que o
peregrino era um impostor, que desapareceu».
Os sentimentos presentes na canção aplicam-se quase na totalidade a
Manuel de Sousa. No terceiro acto apresenta-se «Afundado no serrim», conforme o
poema de Tê, ou seja, derreado, devido ao desatino causado pelo romeiro — D.
João de Portugal, pela vergonha, que incidiria na sua «desgraçada filha» (que
resulta «do meu pecado (de D. Manuel)»), que seria vítima dos erros de seu pai.
Neste momento de angústia, o pai deseja a morte à sua filha, para que esta não
tenha de lidar com «esta afronta». Este desejo de sangue e morte apoia o
ambiente trágico e dramático que convém à tragédia.
Assim, o segundo marido de D. Madalena de Vilhena perde «toda a graça»,
caindo na austera clausura monástica, acompanhado de sua mulher, após a morte
de sua filha Maria, para que o desenlace possa ser o mais taciturno possível.
Noorani [Bom -]
Na canção “Primavera”, dos The gift, são várias
as associações que podem ser feitas relativamente às personagens de Frei Luís de Sousa.
«Se perder vou tentar esquecer-me de vez, conto
até três / se quiser ser feliz». O trecho calharia bem a D. Madalena de
Vilhena, casada pela segunda vez com D. Manuel de Sousa Coutinho e ex-mulher
de D. João de Portugal, desaparecido na Batalha de Alcácer Quibir. Alguns
anos após o desaparecimento, D. Madalena ainda conserva a sua infelicidade e
angústia pela incerteza da morte de D. João, e está atormentada por ter
começado a amar D. Manuel. Sete anos passados sobre a batalha, estava na altura
de seguir em frente e dar um novo rumo à sua vida, ao lado do seu amado, não
deixando que o medo do passado que a persegue a impeça de lutar pela felicidade
(«eu resolvi-me por fim casar com Manuel de Sousa»).
Ainda em relação a D. Madalena, podemos associar
este mesmo excerto ao incêndio ocorrido no palacete de D. Manuel, com a chegada
dos governadores, que implicou a grande mudança da família e dos seus para o
palácio de D. João de Portugal, para grande desaprovação e sofrimento de D. Madalena
(«tu não sabes a violência, o constrangimento»). É que, para ela, era como se o
passado lhe tivesse caído de novo em cima. Depois de várias tentativas para não
regressar ao antigo palácio («Meu esposo, Manuel, marido da minha alma (...)
mas para ali não, oh, não!»), sem alternativa, teve de se adaptar a estas novas
condições, assim obrigada a confrontar-se com a sua vida passada.
«Criei o paraíso assim»; «Algo me diz que há
mais amor aqui»; «Se há tulipas / No teu jardim / (...) / Meu amor eu sou tudo
aqui». O romance de D. Manuel e de D. Madalena ou, mesmo, a relação desta com
D. João de Portugal, embora com mais importância por parte de D. João, visto este
gostar mesmo de Madalena («Oh Telmo, Telmo, com que amor a amava eu!»), poderia
eventualmente ser associado a esta “Primavera” dos The Gift.
«Hei-de te amar, ou então hei-de chorar por ti /
Mesmo assim, quero ver-te sorrir...». Este excerto poderia ser associado a
Telmo, que sentia um carinho muito especial por Maria, filha de D. Manuel e D. Madalena,
que apresentava indícios de doença. Telmo via Maria como uma filha, gostava tanto
dela que chegou a pedir a Deus a vida dela em troca da sua, pois era capaz de
fazer tudo para ver Maria feliz e com vida.
O romance e a tragédia desta obra conseguem dar
mais realce e significado a esta canção.
Yara
[Suficiente +]
A música «Comfortably Numb» («Confortavelmente Entorpecido») dos Pink Floyd, gravada no álbum duplo The Wall, de 1979, encaixa perfeitamente em algumas cenas e a
algumas personagens da peça Frei Luís de
Sousa, de Almeida Garrett, até logo no título, pois é num estado de
entorpecimento que vive a personagem Madalena de Vilhena.
Começando pelo início da música, encontramos o
verso “I hear you're feeling down” (“Ouvi dizer que se sente deprimido”), que
se enquadra perfeitamente na cena I, do ato primeiro, no qual D. Madalena de
Vilhena, num monólogo, lamenta a sua infelicidade, os terrores em que vive há
vinte e um anos: “Este medo, estes contínuos terrores, que ainda me não deixam
gozar um só momento de toda a imensa felicidade que me dava o seu amor”.
Os versos seguintes são “I'll need some
information first / Just the basic facts / Can you show me where it hurts” (“Vou
precisar de algumas informações primeiro / Apenas coisas básicas / Podes mostrar
onde dói?”) e retratam a angústia e o receio de Madalena, acerca do que
realmente aconteceu a D. João de Portugal. Angústias e receios, muitas vezes
agravados pelos agoiros de Telmo: “E a ninguém ficou resto de dúvida… (…)
Dúvida de fiel servidor, esperança de fiel amigo, meu bom Telmo, que diz com
vosso coração, mas que tem atormentado o meu…”.
O verso “A distant ship's smoke on the horizon /
You are only coming through in waves / Your lips move but I can't hear what
you're saying” (“Uma fumaça de um navio distante no horizonte / Vejo-te a
chegar por entre ondas / Os seus lábios movem-se, mas eu não consigo ouvir o
que estás dizendo) identifica-se com a obra, pois, quando o romeiro chega, não
é reconhecido por ninguém, nem mesmo por Madalena: “Tudo! Quem sabe? Eu
parece-me que não. Olha, eu sei…mas não daríamos nós, com demasiada
precipitação, uma fé tão cega, uma crença tão implícita a essas misteriosas
palavras de um romeiro, um vagabundo… um homem enfim que ninguém conhece? Pois
dize…”.
Madalena, tal como o sujeito poético da música,
vive no terror de conhecer a verdade, recusando-se mesmo a reconhecer D. João de
Portugal, pois sabe, no mais íntimo do seu ser, que ele está vivo e que a sua
felicidade com Manuel e Maria é apenas aparente. Telmo nunca a deixará esquecer
a sua vida anterior: “Now I've got that feeling once again / I can't explain,
you would not understand / This is not how I am / I have become comfortably
numb” (“Agora eu tenho essa sensação mais uma vez / Eu não posso explicar, não
irias compreender / Isto não é o que eu sou / Estou me tornando
confortavelmente entorpecido).
Com o regresso do Romeiro, “The dream is gone” (“o
sonho acabou”), para Madalena, Manuel e Maria: “É aquela voz, é ele, é ele! Já
não é tempo… minha mãe, meu pai, cubra-me estas faces, que morro de vergonha…
morro, morro… de vergonha.”.
Miguel M. [como me parece haver bastante
ajuda adulta, é difícil dar uma nota, o que não significa que não haja
também mérito do autor]
“Se eu Voltar” é o
título de uma música de Pedro Abrunhosa lançada no álbum Tempo, de 1996, que faz lembrar o drama vivido por D. João de
Portugal em Frei Luís de Sousa, que passou
vinte e um anos em cativeiro.
Esta personagem chega
disfarçada de romeiro, para não dar indícios de quem era, para que pudesse trazer
a mensagem de que estava vivo e preparar o seu regresso. Ao perceber que a
mulher já tem outra família, fica com o orgulho ferido, o que se pode
relacionar com o segundo verso da canção, “tanto orgulho ferido, tanta paz por
vencer”. A segunda parte deste verso pode mostrar o contraste entre o
sofrimento passado por D. João de Portugal durante a guerra e o sofrimento que
enfrenta agora, apesar de estar em paz.
De facto, se alguma
esperança havia de poder reconstruir a sua vida com D. Madalena, que podia ser ilustrada
pelo refrão da canção (“se eu voltar atrás, / será que dizes que sim outra vez,
/ tomas conta de mim de vez em quando, / se eu voltar”), esta desapareceu no
momento em que percebe que o seu regresso não beneficiará ninguém, conforme se
verifica na fala da cena V (“com a mão que deu a outro riscou-me do número dos
vivos, (…) mas salva-a a ela da vergonha, e ao meu nome da afronta”).
Os três primeiros
versos da terceira estrofe desta canção podem sugerir as tentativas que D. João
teria feito para contactar com D. Madalena, o que lhe é revelado na voz do
Romeiro enquanto mensageiro de D. João: “e daqui não pode sair nem mandar-lhe novas
suas, de há vinte anos que o trouxeram cativo”.
Por outro lado, a
primeira estrofe também podia ser relacionada com D. Madalena na abertura da
peça, na medida em que manifesta a sua angústia por não conseguir ser feliz,
devido a um sentimento de culpa que se intensifica a cada premonição: “tanto
orgulho ferido, tanta paz por vencer“. O seu receio de que o primeiro marido pudesse
voltar faz com que viva “sempre longe do mundo, sempre perto do fim”, não sendo
capaz de aproveitar o amor de D. Manuel: “este medo, estes contínuos terrores,
que ainda me não deixaram gozar um só momento de toda a imensa felicidade que
me dava o seu amor”.
Pedro
M. [Muito Bom -]
O sebastianismo está presente ao longo de todo o
Frei Luís de Sousa, drama romântico
escrito por Almeida Garrett em 1843, que reflete a matriz cultural dessa época.
Para fazer alusão a esta obra e ao sebastianismo nela presente, decidi utilizar
a canção “Os Demónios de Alcácer Quibir”, de Sérgio Godinho, escrita em 1976.
D. João de Portugal, que «foi para
Alcácer-Quibir de lança na mão a investir a investir» e acabou prisioneiro em
Jerusalém durante vinte anos, não regressa a casa como um herói emergindo do
nevoeiro, como seria imaginado o regresso de D. Sebastião tão esperado pelos
sebastianistas (incluindo D. Maria de Noronha e Telmo Pais), mas na forma de
Romeiro e comportando-se como um anti-herói, que, em vez de paz e bem, traz a
completa destruição da agora família de Madalena, o que
ela tanto temia e que acaba na morte de Maria («apanhou tal dose do tal
nevoeiro que a tuberculose o mandou para o galheiro»; «cobri-me estas faces que
morro de vergonha (cai e fica morta no
chão)»).
Maria é uma personagem pura, frágil, sonhadora,
inteligente e matura para a sua tenra idade, cujo entusiasmo e ávida emoção, em
conjunto com a influência de Telmo (condenada por Madalena), a leva a partilhar
a esperança dos sebastianistas.
Telmo, fiel escudeiro da família, acreditava no
mito sebastianista, pois aí (e na carta deixada por D. João — «vivo ou morto,
hei-de ver-vos pelo menos ainda uma vez neste mundo») residia a sua esperança
no regresso do querido amo. Ora ele, de facto, regressa, o que origina um
conflito de sentimentos em Telmo, pois agora tem um novo amor, Maria.
D. João vem abalar a teoria sebastianista de Telmo
e Maria, mostrando a impossibilidade do regresso do passado. Encontrou Madalena
em sua casa, mas com outro dono («ao voltar cá encontrou a vizinha espanhola
sentada na cama deitada no trono e o país mudado de dono»).
D. João de Portugal, no fundo, é mais uma vítima
de toda esta situação, para quem ninguém contribuiu diretamente, mas de quem
toda a gente acabou por sofrer de uma maneira ou de outra (arrependimento de D.
João; solidão de Telmo; morte de Maria; sofrimento de Madalena e Manuel, que
recebem o escapulário). Apesar de ter chegado como castigador do pecado («isto
aqui é só meu vamos lá trabalhar que quem manda sou eu»), acabou por tentar
remediar a situação que causou («Agora é preciso remediar o mal feito… Vai,
vai; vê se ainda é tempo»), mas sem sucesso.
Dona Madalena de Vilhena, personagem romântica,
frágil, infeliz, angustiada, cheia de temores («o estado em que eu vivo… este
medo, estes contínuos temores») e obsessivamente centrada na felicidade
familiar, desde o início da peça (através da leitura dos Lusíadas) que temeu que aquela tragédia acontecesse (e, no fundo,
até sentia que o merecia, embora o negasse a todo o custo — «a morrer sim mas
devagar»), sofria de pressentimentos angustiantes de tragédia e da sua
separação de Manuel, que atribui à culpa que sente por o ter amado ainda quando
era casada com D. João.
Manuel de Sousa Coutinho transforma as suas
características ao longo da peça, passando de um homem patriota, racional e
corajoso, que não ouve os agoiros da esposa, a uma pessoa assolada pelo
desespero e culpa, que apenas age pela honra e dever, não cumprindo, tal como
Madalena, o pedido da filha na hora da sua morte.
«e etecetera e tal viva Portugal»
Sempi [Suficiente (+)]
Os versos “eu tenho dois amores / mas não tenho
a certeza de qual eu gosto mais”, da música “Eu tenho dois amores”, cantada por
Marco Paulo, encaixa perfeitamente na dúvida que Telmo sente, já que, de facto,
Telmo tem dois amores (D.João de Portugal e Maria) e considera ambos como seus
filhos (”o filho que eu criei nestes braços”; “desta última filha”).
Primeiro, vejamos o verso “eu tenho dois
amores”. Apesar de todos os indícios apontarem para a morte de D.João de
Portugal, Telmo nunca deixara de acreditar na possibilidade do regresso do amo
(”MADALENA — Tudo inútil; e a ninguém mais ficou resto de dúvida / TELMO — Senão
a mim / MADALENA — Dúvida de fiel servidor, esperança de leal amigo, meu bom
telmo… E então sem nenhum fundamento, sem o mais leve indicio”).
Enquanto isto não acontecia, o velho escudeiro
foi criando laços ainda mais fortes com a filha de Maria de Vilhena e de Manuel
de Sousa Coutinho (”MADALENA — És muito amigo dela, Telmo? / TELMO — Se sou! Um
anjo como aquele… uma viveza, um espírito!... e então que coração!”).
Vejamos agora o verso “mas não tenho a certeza
de qual gosto mais”. Quando o regresso de D. João de Portugal acontece, Telmo,
por uma lado, preferia que o seu velho amo não tivesse regressado, porque vinha
prejudicar a vida de Maria, o seu outro amor, e fá-la-ia cair em vergonha, pois
ela seria vista como uma bastarda. Por outro lado, tem remorsos por estar a
atraiçoar o seu velho senhor e amigo com estes pensamentos. Por isso, podemos
dizer que está indeciso entre os seus “dois amores” (”TELMO — Virou-se-me a
alma toda com isto (...) Veio, e fiquei mais aterrado, mais confuso que
ninguém! Meu honrado amo,o filho do meu nobre senhor, está vivo (…) era um milagre
que eu esperava sem o crer! — eu agora tremo”)
No entanto, Telmo Pais acaba por perceber que
ama mais Maria e que preferia que o seu desejo nunca se tivesse concretizado.
Apesar de se sentir culpado, pede a Deus que o perdoe por estar a cometer tal
pecado e que refaça as coisas (”é que o amor destrouta filha, desta última
filha, é maior e venceu... venceu… apagou o outro (…) Perdoai-me, Deus, se é
pecado (…) Se ela me viverá, se escapará desta crise terrivel?”.
No entanto, é estranho que, apesar de tanto amor
que tinha a ambos, Telmo não chegasse a cumprir a vontade de D. João de
Portugal (que coincidia com o bem estar de Maria), já que, a instâncias de frei
Jorge, não salvou a família como lhe tinha sido ordenado e deixou Maria morrer
em desonra.
Marta [Suficiente]
No acto primeiro,
cena II, Telmo fica contente com a obra escolhida por D. Madalena. Mostra
fidelidade, ao seu primeiro amo, D. João de Portugal. Madalena tem uma filha,
Maria, que é bastante frágil (“Frágil como as asas de uma vida”). Telmo ama-a
como se Maria fosse sua filha e tem com ela uma relação muito próxima, apesar
de não ter gostado dela quando nascera, por lealdade ao seu primeiro amo. Com
isto, concluo que a canção de Rui Veloso possa estar relacionada com Telmo e
Maria, pelo facto de Maria ser tão frágil e já se saber que vai morrer nova;
sabemos também que eles têm uma estima grande um pelo outro e, assim, esta
música poderia ser de Telmo para Maria (“Mas nunca, Me esqueci de ti”, “Frágil
a memória da paixão...”, “Não nunca me esqueci de ti”).
D. João de Portugal
desapareceu na Batalha de Alcácer Quibir havia vinte e um anos, mas Telmo não
acredita que ele tenha morrido e crê no seu retorno. Madalena vive apavorada
com esta ideia, tem pesadelos e fica afectada emocionalmente. Madalena tem
todas as razões para ser feliz, mas não o é, pelo medo que sente de que o
primeiro marido volte e destrua o seu casamento actual. Assim, percebemos que,
de acordo com a canção, Telmo e Madalena nunca se esqueceram de D. João de
Portugal (amo e marido).
No acto segundo, cena
I, Maria desabafa com o Telmo, dizendo-lhe como D. Madalena, sua mãe, ao entrar
no palácio, ficara aterrorizada com o retrato de D. João de Portugal. Na cena
V, D. Madalena “afirma que está curada do seu mal”, o de perder Manuel de
Sousa, pelo receio de que D. João de Portugal não esteja morto e regresse, mas
continua a mostrar-se preocupada ao longo de toda a cena V. Estes aspectos
revelam o facto de Madalena nunca se esquecer de D. João de Portugal, o que
relaciono com a música “Nunca me esqueci de ti”, de Rui Veloso.
Na cena X, D. Madalena
conta a Frei Jorge que se apaixonou por Manuel de Sousa desde o primeiro dia em
que o viu, era ainda casada com D. João de Portugal, e que, por isso, tem medo
de ser castigada. Com isto tudo, chego a mais uma conclusão: Telmo nunca
esquecerá D. João de Portugal , ele será sempre o seu “melhor” amo e o homem
mais corajoso e fiel ao seu país. Madalena, por outro lado, nunca esquecerá D.
João de Portugal porque foi o seu primeiro marido, um homem fiel e digno,
corajoso e um herói. Por outro lado, ela nunca o esquecerá por motivos mais
negativos: porque, se D. João de Portugal voltar, “destruirá”, provavelmente, o
seu casamento com Manuel de Sousa (já referido em cima) e afligirá Maria. Por
estas razões todas, é impossível para Madalena esquecê-lo, sendo esse o motivo de
ela passar grande parte da peça aterrorizada. A Telmo é impossível esquecê-lo
pois D. João de Portugal é para si como um “ídolo”.
Francisco S.
[Suficiente+/Bom-]
A música "Burn it down", dos Linkin Park
(banda americana de rock alternativo), do álbum Living Things (2012), pode ser interpretada como uma alusão a
certos factos da história e pode considerar-se interessante para descrever a
situação de Madalena para com D.João de Portugal e o seu atual marido, D.Manuel.
Assinala também, por exemplo, o final do ato I, quando, num ato patriótico, D.
Manuel incendeia a sua própria casa. Esta música, na minha interpretação,
talvez se debruce sobre uma difícil relação amorosa. É marcada pelo exagero e
pelo uso de metáforas. São facilmente encontrados sentimentos contraditórios e
alusões à importância que aquele "you"(em português, "tu")
tem para o autor da canção (sendo a contradição, o exagero e o sofrimento características
que podem ser identificadas na obra Frei
Luís de Sousa).
A ironia de D.Manuel («Ilumino minha casa para receber os
muito poderosos e excelentes senhores governadores destes reinos. Suas
Excelências podem vir, quando quiserem») expressa a sua revolta para com os
governadores castelhanos que pretendem instalar-se na sua própria casa,
levando-o a tomar uma difícil decisão que passa por a abandonar e instalar-se
na casa de D.João de Portugal, mesmo contra a vontade de D.Madalena. «We can't wait / To burn it to the
ground [Não podemos esperar / Para queimar até o chão]» são dois versos que
traduzem muito bem o estado de espírito de D. Manuel, que, apressado por os
governadores espanhóis estarem a caminho, teve de tomar a decisão de incendiar
a própria casa.
O incêndio é o motivo do regresso de Madalena à antiga
residência de D. João de Portugal, onde se desenrolam os atos ll e III. D. Manuel,
que, a princípio, apenas era o recetor dos receios de Madalena, depois do
incêndio, pressentindo o destino, prepara o clima trágico («Meu pai morreu desastrosamente sobre a própria espada. Quem sabe
se eu morrerei nas chamas ateadas pelas minhas mãos?»).
Existe uma parte da música em que Chester Bennington
(vocalista da banda Linkin Park) diz «Caught
in the burning glow [Preso no brilho do fogo]» e «And fan the flames as your blazes burn [E avivar o fogo enquanto as suas chamas queimam]», o que poderá, de uma
maneira engenhosa, representar o quadro de D.Manuel, um elemento simbólico
criado por Garrett, que, ao ser devorado pelas chamas, funciona como indício de
desgraça. Madalena queria a todo o custo salvar esse retrato («Meu Deus, meu
Deus!... Ai, é o retrato do meu marido!... Salvem-me aquele retrato!»), uma reação que traduz a inquietação, o
receio e ansiedade de Madalena (o que é comum a quase toda a peça de Garrett).
Os seguintes versos da canção «All that I needed / Was
the one thing I couldn't find [Tudo o que necessitava / Foi a única coisa que
não consegui encontrar]» retratariam a falta de paz de espírito de Madalena. Vivia
num enorme terror e aflição por não saber se D. João de Portugal estava vivo ou
morto. E, também, por estar mergulhada em remorsos que os agouros de Telmo
avivavam. Amou Manuel de Sousa, logo que o viu, ainda em vida de D.João de
Portugal («...porque eu amei-o assim que o vi... D.João de Portugal ainda era
vivo! O pecado estava-me no coração; a boca não o disse... os olhos não sei o
que fizeram, mas dentro da alma eu já não tinha outra imagem senão a do
amante...»).
No terceiro ato, o sentimento de Madalena quando
D.Manuel decide entrar para o convento pode ser representado pelos versos «We're
building it up [Estamos a construi-lo]» e «To break it back down [Para acabar
com tudo]», sendo o seu destino converter-se também (o que acontece mesmo
depois da morte de Maria). A palavra "construção" significará neste
contexto "amor", e o termo "tudo", a relação entre Madalena
e Manuel de Sousa.
O título da canção "Burn it down [Queimar tudo]"
poderá aplicar-se ao desfecho, visto que Maria morre e os seus pais vão para um
convento (desfecho bastante trágico e radical) para se redimirem dos pecados
cometidos.
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