Monday, August 29, 2016

Sobre a prova de exame de Português, 1.ª fase (19 de junho de 2017)



Como tantas vezes tem acontecido, esta prova da 1.ª fase (aqui) mostra medo de avaliar. Quanto a mim, tem demasiadas perguntas respondíveis por alunos que não tivessem frequentado o secundário (é o caso, pelo menos, dos itens 4 e 5 do grupo I; de cerca de metade do grupo II; de todo o grupo III). Significa que se favoreceram os alunos que escrevem bem, mesmo que pouco tivessem trabalhado nestes anos, e prejudicaram os que foram trabalhando sempre (e, porventura, não tinham à partida o mesmo «jeito» de leitura-escrita). Na prática, estimula-se os alunos a não lerem as obras, a não investirem no estudo da literatura e da gramática.
Mesmo a parte da prova que exige conhecimentos fá-lo de modo tal que acaba por pouco distinguir o mérito (dois dos raros itens de gramática, o 6 e o 8, são suscetíveis de levar a uma resposta errada mesmo por parte de quem tenha estudado as matérias).
Comento agora os itens. No grupo I-A, as perguntas 1-3 reportam-se a um texto que demos em aula (aula 51-52, p. 81 do nosso manual; cfr. apresentações do 1.º período; cfr. aulas do 1.º período); de qualquer modo, as respostas a estes itens vão ser classificadas muito pela capacidade de redação sobretudo, embora o domínio das características de Caeiro possa ter infuenciado a qualidade da escrita e ter sido útil. Já no grupo I-B ambas as perguntas, 4 e 5, são só de leitura/escrita, não envolvem «matéria». (Reparei entretanto que o item 5, sobre a infância como um «longo inverno», lembra uma tarefa que fizemos logo no início do 10.º ano, quando se tratou de aproveitar, em página de diário escrita por vocês, uma frase de um filme francês que estávamos a ver, o amalucado A História da Minha Vida, em que um escritor-fantasma preparava a autobiografia de um futebolista: «A minha adolescência tem sido um céu baixo e pesado, em que existem, por vezes, pequenas abertas».)
No grupo II, os itens 1-4 são de mera compreensão. A pergunta 5 (função sintática de dois «nos») foi bem treinada (nas aulas e na última sessão de cábulas). A pergunta 6 é de assunto que foi dado em aula muitas vezes, mas é relativamente marginal e causa confusão (na linguística, durante tempo chamou-se «campo semântico» ao que é agora o «campo lexical», que é a resposta correta); na terceira sessão de cábulas, os últimos slides ocupavam-se desta distinção (e temo que tenham sido vistos já à pressa). A pergunta 7 pouco implica de conhecimentos gramaticais (embora uma copulativa que vimos recentemente facilitasse perceber que o primeiro «mas» é que era aditivo). O item 8 é rasteirento (a expressão «à nossa volta» poderia ser considerada ‘deítico espacial’; o «nossa» tem, é claro, carga ‘pessoal’, sendo a resposta certa); este assunto foi revisto na penúltima sessão de cábulas, mas também em cima da hora. O item 9 terá sido bem respondido por quem foi seguindo o trabalho em aula (também na última sessão de cábulas se insistiu de novo nas adjetivas relativas restritivas). O item 10 não é de gramática estrita (embora treinássemos em aula perguntas parecidas). Nestes itens de grupo II a implicarem escrever o termo, o item 8 fugiu ao perfil normal (vimos nas sessões de cábulas os assuntos que eram mais recorrentes: classificação de orações, que saiu; reconhecimento do referente, que saiu; identificação de função sintática, que não saiu).
O tema do grupo III até me parece interessante (pensando melhor: como em muitas outras dissertações, há o perigo de os alunos se refugiarem em exposições decorrentes do que tivessem estudado em Psicologia ou em História — apesar de o enunciado solicitar um ponto de vista pessoal). E espero que não tenham usado o clássico «hoje em dia, cada vez mais».
Boa sorte, caros alunos e amigos, sobretudo para quem trabalhou bastante, é claro, mas até igualmente para quem não trabalhou assim tanto (embora estes já tivessem tido a sua dose de sorte, dado o tipo de prova que saiu).