Análise de canção e Memorial do Convento pelo 12.º 1.ª
Classificação que atribuo é a da primeira versão
(a não ser que a reformulação tivesse sido demasiado trapalhona e achasse dever
baixar essa primeira nota). Em alguns casos, o texto foi entretanto bastante
melhorado, mas classificação não se afastará da do que me foi apresentado na
primeira versão.
Algumas das referências podem ser ainda
aperfeiçoadas (letristas e compositores devem ser confirmados, nomes e datas de
álbuns, etc.). A pouco e pouco irei acrescentando esses dados (para o que peço,
é claro, a colaboração dos autores das análises ou de outros colegas).
Francisca
Francisca (Bom-) || “Incondicional”
(Luan Santana e Thiago Servo), Quando
chega a noite, 2012 // José Saramago, Memorial
do Convento, 24.ª edição, Lisboa, Caminho, 1995, pp. ?
A canção que eu escolhi foi “Incondicional” de
Luan Santana, uma vez que tanto em Memorial
como em “Incondicional” a visão é de uma relação inseparável, forte e onde
ambos os intervenientes estão apaixonados. Escolhi-a também por aludir ao facto
de se voar, ainda que não se trate do mesmo tipo de voo de que se fala na obra.
Na letra diz-se que “A gente é assim / tem tanta
coisa em comum / você tem marca em mim (…)” e, embora na obra as duas
personagens não tenham assim “tanta coisa em comum”, partilham um amor que realmente
deixa marca um no outro, uma vez que a sua relação teve um começo um pouco comum
e que só o facto de Sete-Sóis morrer os separou, e apesar da separação física,
Sete-Luas ficou com uma marca do seu agora ex-marido guardada em si — “Desprendeu-se
a vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra
pertencia e a Blimunda.” (p. 359).
Tanto no livro como em “Incondicional” se fala
de voar. Na canção “Eu vou subir nas nuvens (…)”, e, na obra, ao longo da
construção da máquina de voar a que chamaram passarola e no seu voo — “hão-de
fazer voar a passarola (…)” (p. 71) e “A vela correu toda para um lado, o sol
bateu em cheio nas bolas de âmbar e agora, que vai ser de nós. A máquina estremeceu
(…) mas o Padre Bartolomeu Lourenço agarrara-se a um dos prumos que sustentavam
as velas, e assim pôde afastar-se a terra a uma velocidade incrível” (pp. 197 e
198), entre outras citações possíveis. Na obra, o casal apaixonado queria,
juntamente com o padre Bartolomeu, voar, pois acreditava que também tinham essa capacidade e não apenas
os anjos a possuíam, enquanto que na música apenas um dos intervenientes quer
voar para desenhar o sorriso da sua outra metade no céu, talvez pelo facto de
estar apaixonado. Apesar de a intenção de voar ser diferente, em ambos, obra e
música, se verifica esta vontade de largar a terra e chegar às nuvens.
Por fim, o último motivo que me fez escolher
esta música foi simplesmente o facto de falar em sol e na noite (“assim é nosso
amor, tão forte como a noite, prefeito como do dia” e “ E no azul do céu, vou
ver seus olhos brilhando / e em meio às estrelas fico flutuando”). Na obra as
personagens principais são apelidadas Sete-Sóis e de Sete-Luas, Baltasar Sete-Sóis
um homem a menos por não possuir mão esquerda e Blimunda Sete-Luas uma mulher a
mais por possuir poderes. O dia é perfeito pois é aquele que nos “sustenta”, dá
luz e, até certo ponto, alegria. O mesmo acontece com Baltasar pois é Baltasar
que trabalha e não Blimunda, dá-nos luz e alegria, pois apesar de não ter uma
mão, executa todas as profissões a que se propõe como agouçeiro e trabalhador na
construção do convento. Quanto à noite, é forte pois está mais ligada a coisas
místicas e ficcionais como lobisomens, vampiros e outras criaturas místicas. No
livro o papel de personagem mística é desempenhado por Blimunda, que tem o
poder de ver por dentro das pessoas e acaba por ser “forte” porque consegue
aguentar em jejum de forma a ver as vontades dos homens e até mesmo pelo facto
de ver o interior das pessoas e lidar com desilusões.
Pedro
Pedro (Bom -/Bom (-)) ||
“Fire”(Sergio Pizzorno), West Ryder
Pauper Lunatic Asylum, 2009 // José Saramago, Memorial do Convento, 57.ª edição, Porto, Porto editora, 2016
A canção escolhida, “Fire”, enquadra-se na
história de Baltasar Sete-Sóis, Blimunda e Bartolomeu de Gusmão. Em geral
consegue abranger a história dos três personagens, das suas motivações, tanto
na construção da passarola como noutros vividos em Memorial, e das relações existentes entre si. A intensidade da
paixão entre Baltasar e Blimunda está bem representada na letra (“Shake me into
the night [a]nd I'm an easy lover”— Lança-me na noite e sou um amante fácil). A
sua relação, caracteriza-se pela sua proximidade, tanto pela confiança que
tinham um pelo outro como pela proximidade num aspeto mais físico, nas tarefas
que realizavam juntos, como a construção da passarola, e no próprio contacto
físico existente entre o casal. Baltasar e Blimunda tinham um amor único e
verdadeiro.
Baltasar, que começa Memorial do Convento como soldado que perdeu a mão na guerra, foi
durante esta um excelente soldado, como tantos outros que conseguiram ou não
ter a mesma sorte que ele, e um excelente companheiro (“Take me into the fight
[a]nd I'm an easy brother” — Coloca-me no combate e eu sou um irmão fácil) como
se prova através do seu amigo João Elvas. Com o decorrer de Memorial, Baltasar mostrou-se alvo de
julgamento pela inquisição, de entre outros motivos, pela amizade com o padre
Bartolomeu e a consequente adoção de novas verdades, o relacionamento com
Blimunda e a construção da passarola (“Wire me up to machines I'll be your
prisoner [f]ind it hard to believe [y]ou are my murderer” — Prende-me a
máquinas, eu serei teu prisioneiro, acho difícil de acreditar que tu és o meu
assassino), tendo sido a principal razão da sua morte a amizade com Bartolomeu
de Gusmão (“I caught the bullet from the heavens to the one you serve” — Eu
levei uma bala dos céus pelo qual tu és servo” referindo-se neste caso à figura
religiosa representada pelo personagem).
A passarola, projeto iniciado pelo padre
Bartolomeu, tinha como objetivo levar o Homem ao céu onde só os anjos estiveram.
Bartolomeu mostrava uma grande persistência ao tentar levantar a passarola do
chão, estudou no estrangeiro inclusive, mostrava um total empenho no seu
projeto (“I'm coming, you coming, no hiding, my feeling I wanna take it to the
highest over me, yeah...” — Estou a ir, tu a vires, sem esconder, o que sinto,
eu quero levar até o mais alto possível, yeah...). Porém, para a passarola voar
eram precisas as vontades das pessoas. Estas eram recolhidas por Sete-Sóis e
Blimunda daqueles cuja morte estava perto. As vontades eram guardadas em
frascos e tinham a finalidade de erguer a passarola até aos céus, dando
utilidade à alma dos condenados (“Im heading back into the tunnel for my soul
to burn” — Eu estou a voltar para túnel para a minha alma queimar), algo desejado
há muito pelo padre Bartolomeu.
Inês
Inês (Bom -) || «Running with the wolves» (AURORA/AURORA),
All my demons greeting me as a friend,
2016 // José Saramago, Memorial do
Convento, 38ª edição, Lisboa, Caminho, 1994, pp.164-174
A canção “Running with the wolves” (em português, «Correndo com os lobos») é da artista norueguesa
AURORA e relaciona-se com o episódio de Memorial
do Convento em que o trio Baltasar,
Blimunda e Bartolomeu foge da Inquisição.
Depois de a passarola já estar terminada, os três esperavam pelo dia em
que mostrariam o seu projeto final ao rei. Quando a quinta do Duque de Aveiro é
perdida pelo rei, Baltasar e Blimunda preparam-se para sair de lá. Entretanto o
padre encontra-se agitado e preocupado, com medo de ser perseguido pela Santa
Inquisição, que o acusa de ser feiticeiro e judeu (“There's blood on your lies”
/ “Há sangue nas tuas mentiras”). Certo dia, aparece o padre na quinta agitado
e assustado afirmando que o Santo Ofício já o procurava para o prender (“O
padre Bartolomeu Lourenço entrou violentamente na abegoaria, vinha pálido,
lívido, cor de cinza, como um ressuscitado que já fosse apodrecendo,Temos de
fugir, o Santo Ofício anda à minha procura, querem prender-me”, p.164). As outras
personagens acreditam em Bartolomeu e concordam que é necessário fugir, para
salvar o seu amigo, mas ficam sem saber por onde (“There is nowhere for you to
hide” / “Não há nenhum lugar para tu te esconderes”). Como o único modo de
escapar é através da passarola, esta começa a ser preparada para a descolagem,
e é necessário “colocar as bolas de âmbar nos cruzamentos dos arames, abrir as
velas superiores (…), transferir as duas mil vontades (…).” (p.165). Tentam
fazer tudo o mais rápido possível pois não resta muito tempo (“But we're
running out of time” / “Mas estamos a ficar sem tempo”). Quando está tudo
pronto, pedem ajuda ao Anjo Custódio e partem pelos ares à procura de um lugar
seguro (“Go row the boat to safer grounds” / “Vá remar o barco para terrenos
mais seguros”; “But don’t you know we're stronger now” / “Mas tu não sabes que
estamos mais fortes agora”).
Durante a sua viagem sofrem uma grande variedade de emoções. Após
levantarem voo sentem-se entusiasmados, espantados e felizes com o facto de
todo o seu trabalho não ter sido em vão, de terem sido capazes de finalizar o
seu projeto e que este funcionasse. O desejo que os três tinham em comum e que
os unia realizara-se (“O padre ria, dava gritos, (…).”, p. 167; “(…) e Baltasar
gritou, Conseguimos, abraçou-se a Blimunda e desatou a chorar, (…).”; “O padre
veio para eles e abraçou-se também, (…).”, p. 168); para além disso, estavam
vivos e seguros (“My heart still beats and my skin still feels”/ “O meu coração
ainda bate e aminha pele ainda sente”). Lá do cimo observam a vista. No
Terreiro do Paço, em Lisboa, procuram o padre para o prender. De seguida,
começam a ficar irrequietos porque não está muito vento, logo não estão a
conseguir afastar-se muito, e em breve o sol irá pôr-se, e quando tal suceder,
a passarola deixará de ser atraída por ele, e cairá. Começam a ficar inquietos
e o medo começa-se a apoderar deles (“O sol vai baixando para o lado da barra,
já se estendem as sombras da terra. O padre Bartolomeu Lourenço sente uma
inquietação (…)”, p. 170; “O padre Bartolomeu Lourenço olha indiferente, está
fora do mundo, para além da própria resignação, espera o fim que não vai
tardar”, p. 173), começam a ficar em pânico.
Quando atingem o solo encontram-se perdidos, doridos e sem saber onde
estão. As três personagens esperam o seu fim.
Bea Sá
Bea Sá (Bom -) || «Eu não existo sem você» (Tom Jobim e Vinicius de
Moraes / Maria Bethânia), Alma Gémea,
2005 // José Saramago, Memorial do Convento,
56ª edição, Porto, Porto Editora, 2014
«Eu não existo sem
você», tem, assim como a história de amor de Baltasar e Blimunda, as suas
partes felizes e tristes. Quer em Memorial
do Convento quer na faixa de Maria Bethânia, a artista encara o amor como
algo maravilhoso mas que, por vezes, precisa de ser triste para ser verdadeiro,
tal como acontece com o amor de Sete-sóis e Sete-luas.
«Eu sei e você
sabe, que a vida quis assim, que nada neste mundo levará você de mim» remete
para o facto de o casal se ter conhecido por ação do destino, e não por
interesses de terceiros, como acontecera no caso do rei e da rainha. Foi um
amor repentino que começou num momento delicado (morte da mãe de Blimunda), mas
propício para construir um amor verdadeiro, sem interesses alguns, baseado em
sinceridade, amor e felicidade. Blimunda conseguia ver por dentro das pessoas
quando estava em jejum, mas jurou a Baltasar que nunca o iria ver por dentro: “Quando me dás a mão, quando te encostas a mim, quando
me apertas, não preciso ver-te
por dentro.”
«Eu sei e você
sabe, que a distância não existe» é um verso da canção que nos pode recordar
que, apesar de ter passado nove anos à procura de Baltasar, Blimunda nunca
desistiu até o encontrar, em Lisboa. “Milhares de léguas andou Blimunda, quase
sempre descalça. A sola dos seus pés tornou-se espessa, fendida como uma
cortiça.” com esta frase, o narrador, mostra-nos o esforço a que Blimunda se
submeteu para encontrar o seu verdadeiro amor, e, ainda que, passado nove anos,
a sua esperança não fosse a mesma, e esta estivesse sem forças, não foi nenhum
desses fatores externos que a impediram de procurar aquele que sempre fizera tudo
por ela e que sempre a amara.
O passo da faixa de
Maria Bethânia «Que todo o grande amor, só é bem grande se for triste, por isso
meu amor, não tenha medo de sofrer, pois todos os caminhos, me encaminham pra
você…» lembra um acontecimento inesperado na obra de Saramago, a morte de
Baltasar num auto de fé. Tudo isto foi descoberto por Blimunda enquanto corria
??? para conseguir alcançar o amor da sua vida, tendo passado já seis vezes em
Lisboa, sem nenhum sinal de Baltasar lhe ter sido dado. Blimunda passa a sétima
e última vez no Rossio, onde estava a haver uma cerimónia ou inquisição, e, no
meio de onze pessoas que iriam ser mortas, vê Baltasar.
No meio daquele sofrimento todo, revolta, injustiça, dor, tristeza, incompreensão, Blimunda diz “Vem.” Este “vem” remete para a aceitação, mas, simultaneamente, é um eufemismo usado por Blimunda: iria estar, e ficar bem, e que eles iriam estar sempre juntos fosse em vida ou na morte, acontecesse o que acontecesse: “Desprendeu-se a vontade de Baltasar sete-sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia Blimunda.” Isto mostra o amor verdadeiro de Baltasar para com Blimunda; mesmo depois de morrer, a sua alma estaria sempre, e eternamente, com ela: “Se não houvesse tristeza nem miséria, se em todo o lugar corressem águas sobre as pedras, se cantassem aves, a vida podia ser apenas estar sentado na erva, segurar um malmequer e não lhe arrancar as pétalas, por serem já sabidas as respostas, ou por serem estas de tão pouca importância, que descobri-las não valeria a vida de uma flor.”
No meio daquele sofrimento todo, revolta, injustiça, dor, tristeza, incompreensão, Blimunda diz “Vem.” Este “vem” remete para a aceitação, mas, simultaneamente, é um eufemismo usado por Blimunda: iria estar, e ficar bem, e que eles iriam estar sempre juntos fosse em vida ou na morte, acontecesse o que acontecesse: “Desprendeu-se a vontade de Baltasar sete-sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia Blimunda.” Isto mostra o amor verdadeiro de Baltasar para com Blimunda; mesmo depois de morrer, a sua alma estaria sempre, e eternamente, com ela: “Se não houvesse tristeza nem miséria, se em todo o lugar corressem águas sobre as pedras, se cantassem aves, a vida podia ser apenas estar sentado na erva, segurar um malmequer e não lhe arrancar as pétalas, por serem já sabidas as respostas, ou por serem estas de tão pouca importância, que descobri-las não valeria a vida de uma flor.”
«Assim como o
oceano só é belo com o luar, assim como a canção só tem razão se se cantar, assim como uma
nuvem, só acontece se chover, assim como o poeta só e grande se sofrer» remete-nos
para um diálogo entre Baltasar e Blimunda, em que esta explicara o seu ponto de
vista acerca da morte e vida: “Que sentes tu dentro de ti, Que ninguém se
salva, que ninguém se perde, É pecado pensar assim, O pecado não existe, só há morte e vida, A vida está antes da morte, Enganas-te,
Baltasar, a morte vem antes da vida, morreu quem fomos, nasce quem somos, por
isso é que não morremos de vez, E quando vamos para debaixo da terra, e quando
Francisco Marques fica esmagado sob o carro da pedra, não será isso morte sem
recurso, Se estamos falando dele, nasce Francisco Marques, Mas ele não o sabe,
Tal como nós não sabemos bastante quem somos, e, apesar disso, estamos vivos,
Blimunda, onde foi que aprendeste essas coisas, Estive de olhos abertos na
barriga da minha mãe, de lá via tudo.” Esta longa citação afasta-se um pouco da
obra mas penso que se pode relacionar com a maneira de Blimunda ver as coisas à
sua maneira. Para esta, tudo tem uma razão de ser.
«Assim
como o viver, sem ter amor, não é viver, não há você sem mim, eu não existo sem
você!» ilustra a relação amorosa de Blimunda e
Baltasar, o ideal de uma relação perfeita em que os dois personagens não existem
um sem o outro, (“e se a ele apeteceu, a ela
apetecerá, e se ela quis, quererá ele.”).
Catarina
C.
Catarina
C. (Bom (+)) || “Por fin” (Pablo Alborán/Pablo Alborán), Terral,
2014 // José Saramago, Memorial do Convento,
58.ª edição, Porto, Porto Editora, 2016, pp. 56 e 400
Grande parte da obra Memorial do
Convento é centrada no amor, sendo este representado por diversas
personagens. Se, por um lado, temos, por parte da luxúria, riqueza e realeza
relações ditas “de conveniência”, por outro, temos os representantes do amor
verdadeiro e puro, Baltasar e Blimunda. Estes vêm contrastar com as perspetivas
de sentimentos, afeições e relacionamentos que se passam na realeza, ao mesmo
tempo que representam o povo e a simplicidade no modo de viver e a
autenticidade do amor. “Por fin” (“Por fim”) ilustra tudo o que de genuíno há
no amor, agradecendo-se ao parceiro a entrada deste na vida do eu,
surpreendendo-o pela sua inesperada chegada - “Jamás
pensé que sucediera así / Bendita toda conexión” (“Nunca pensei que se sucederia assim / Bendita toda a
ligação”). Esta “chegada de amor” inesperada pode associar-se ao primeiro (e
deveras definitivo e importante) encontro entre Baltasar e Blimuda que,
inesperada e rapidamente, se encontram e quase de imediato se apaixonam.
Apesar das condições em que se conheceram não parecerem
propícias a algum tipo de felicidade e união (conhecem-se durante um auto de fé levado
a cabo pela Inquisição onde a mãe de Blimunda, Sebastiana, iria ser condenada),
a paixão é quase imediata e premeditada pela sua mãe — “e aquele homem quem
será (…) quem é ele, donde vem, que vai ser deles”. Após isto e sentindo algo
que a transcende e que “fala” com ela, Blimunda interpela aquele homem que
estava ao seu lado (“Que nome é o seu”) e bastou a resposta de Baltasar,
simples e direta, para, desde aí, não perderem a ligação. Poderá dizer-se que
foi um popularmente chamado “amor à primeira vista”, bastando este pequeno
dialogo para que um grande amor nascesse, as suas almas e vozes ligando-se — “Entre tu alma y mi voz, sí / Jamás creí que me iba a
suceder a mí”
(“Entre a tua alma e a tua voz, sim / Jamais acreditei que me sucederia a
mim”).
Este amor e união, vai crescendo ao longo da obra, sendo
possível ao leitor a perceção de que Baltasar e Blimunda cada vez se tornam
mais próximos, quase que dependentes um do outro e, por isso, um só. Este ato
de “união” é simbolicamente oficializado quando, uma das personagens determinantes do
relacionamento de ambos (o padre Bartolomeu Lourenço) alcunha Blimunda de
“Sete-Luas”, assemelhando-a a Baltasar, já muito antes alcunhado “Sete-Sóis”
(tendo, na sua primeira interação com Blimunda, feito questão de o mencionar
por ser algo que o definia) — “Has dividido en
dos mi alma y mi ser/Porque una parte va contigo” (“Dividiste a minha
alma e o meu ser em dois/Porque a outra parte vai contigo”). Os dois tornam-se,
oficialmente, duas metades que se completam, simbolicamente.
Mesmo após a morte de Baltasar (na fogueira, pela inquisição)
ambos permanecem juntos pois Blimunda recolhe a sua vontade — “E uma nuvem
fechada está no centro do seu corpo. Então Blimunda disse, Vem. Desprendeu-se a
vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra
pertencia e a Blimunda”. A perenidade do amor foi aqui simbolizada, sendo
importante para a obra pois é assim que termina — “Pero
tu piel y mi piel pueden / Detener el tiempo… / Mejor de lo que era / Aquí nada
es eterno”
(“Mas a tua pele e a minha podem / Parar o tempo / Melhor do que o que era / Aqui
nada é eterno”).
Carolina
D.
Carolina D. (Bom (-)) ||
«I believe I can fly» (R Kelly/Robert Sylvester Kelly), Space Jams, 1996 // José Saramago, Memorial
do Convento, Lisboa, Caminho, 2000,
passim.
«I believe I can fly» transmite-nos a mesma
ideia que nos é transmitida em Memorial
do Convento pela passarola: o sonho de voar e a crença neste sonho, que simboliza
a ligação entre a terra e o céu, a ascendência aos céus, a libertação do
espírito e a passagem para um estado de existir diferente (“(…) o homem,
primeiro tropeça, depois anda, depois corre, um dia voará.”; “faremos como as
aves, que tanto estão no céu como na terra…”; “(…) e quando tudo estiver armado
e concordante entre si, voarei.”)
A passarola, que “(…) parecia uma enorme concha,
toda eriçada de arames, como um cesto que, em meio fabrico, mostra as guias do
entrançado.”, simboliza a harmonia entre o desejo e a sua realização no momento
do primeiro voo.
Era o Padre Bartolomeu que tinha o sonho de
voar, numa máquina, construída pelo próprio homem. Para podermos tornar algo
real, primeiro temos de sonhar. A realidade é depois alcançada, pela vontade, força,
o engenho, e o trabalho.
Na passarola tiveram um papel crucial, Baltasar,
que, apesar de maneta, foi quem teve um papel fundamental na construção, e o
padre Bartolomeu, que foi até à Holanda procurar saber como se podia conseguir
obter o éter (“(...) o éter compõe-se da vontade dos vivos (…) quando vires que
a nuvem vai sair de dentro delas aproximas o frasco aberto, a vontade entrará
nele(…)”), que acreditava ser o elemento essencial para a máquina voar; Blimunda,
que viu os defeitos da máquina para que Baltasar os corrigisse e que recolheu
as vontades de várias pessoas para que a máquina pudesse voar, ainda que adoentada;
Scarlatti, que cura Blimunda através da sua música, tocando no seu cravo toda a
noite (“(…)trarei para cá um cravo e tocarei para eles e para a passarola(…)’’).
Toda dedicação e tempo investidos na construção
da passarola simbolizam a sabedoria do homem, a fé e a vontade — de alcançar o
sonho que é voar — que nos são também transmitidas em «I believe I can fly’’ —
“If I just believe it, there's nothing to it [Se eu simplesmente acreditar, é
tudo]’’, ‘’I believe I can fly [Eu acredito que consigo voar]’’, ‘’I believe I
can touch the sky [Eu acredito que consigo tocar no céu]’’, ‘’I think about it
every night and day [Eu penso nisso toda a noite e todo o dia]’’, ‘’Spread my
wings and fly away [Abrir as minhas asas e voar para longe]’’. O sonho, uniu
Bartolomeu, Baltasar e Blimunda e foi possível juntar a ciência com trabalho, magia
e ainda a arte de Scarlatti.
O sonho torna-se realidade e a passarola voa.
‘’(…) eu Bartolomeu Lourenço de Gusmão (que estou subindo ao céu por obra do
meu génio, por obra também dos olhos de Blimunda(por obra da mão direita de
Baltasar (…) e Baltasar gritou, Conseguimos, abraçou-se a Blimunda e desatou a
chorar(…). O padre veio para eles e abraçou-se também, subitamente perturbado
por uma analogia, assim dissera o italiano, Deus ele próprio, Baltasar seu
filho, Blimunda o Espírito Santo, e estavam os três no céu, Só há um Deus,
gritou, mas o vento levou-lhe as palavras da boca.’’
Adiana
Adiana (Suficiente) || “I Will Always Love You” (Dolly
Parton), The Body Guard: Original
Soundtrack Album, 1992 // José Saramago Memorial
do Convento, 57.ª edição, Porto, Porto Editora, 2014
Ao longo de Memorial
do Convento, há sempre um “adeus”, que é sempre uma despedida ou que talvez
seja um “até nunca” mas com a esperança de volta, que por vezes é difícil. O
amor, as construções e as despedidas estão acima de tudo presentes. Escolhi
esta canção pois talvez tenha algo semelhante com a história.
A canção “I will always love you (Amar-te-ei
sempre)”,que
aqui ouvimos na interpretação de Whitney Houston, nos dois primeiros versos “If
I should stay | I would only be in your way (Se eu ficar | Eu apenas estarei no
teu caminho)”, leva-nos a pensar no capítulo 5, no dia do auto de fé, dia de
alegria para os cidadãos de Lisboa, pois eram condenados os cristãos-novos e os
judeus. Sebastiana Maria de Jesus, mãe de Blimunda, que tinha visões e ouvia “Deus”,
foi condenada ao degredo para Angola.
No livro, lemos estas vozes: “Adeus Blimunda que
não te verei mais | Ali vai a minha mãe”, (p. 56). Se Sebastiana pudesse ficaria
ali com sua filha, junto de quem ela gosta, não ia para um lugar desconhecido.
E, Blimunda, com tristeza e pena, diz que a sua mãe se foi. Penso que ambas têm
a esperança de se encontrarem um dia, mesmo estando longe: o amor de mãe e
filha irá permanecer sempre. Nunca se irá esquecer essa pessoa importante, o que
é semelhante a canção,“So i’ll go but i know |
I’ll think of you every step of the way (Então eu vou, mas eu sei | Que
eu pensarei em ti em cada passo do caminho)”.
“So good-bye | Please don't cry | We both know
I'm not what you, you need (Portanto adeus | Por favor não chores | Pois ambos
sabemos que não sou o que tu, precisa)”, lembra a parte em que Sebastiana sente
que sua filha não pode falar com ela, pois, se souberem que é sua filha é capaz
de ser condenada também. Nesta perspetiva, ela não seria boa para Blimunda; por
isso tinha de ir, para que sua filha tivesse uma vida sem perseguições da
Inquisição. Também na p. 56: “Blimunda, filha minha, e já me viu, e não pode
falar, tem de fingir que me não conhece ou me despreza, mãe feiticeira e
marrana ainda que apenas um quarto, já me viu”. Nesse dia de auto de fé
Blimunda conhece o seu verdadeiro amor, logo depois de não ter mais sua mãe, ao
lado dela. Este homem tem o nome Baltasar e é conhecido como Sete-Sóis. Ao
longo da história, o amor deles cresce cada vez mais, sendo Blimunda batizada
como Sete-Luas. Ambos passaram por dificuldades e perdas, mas o amor ajudou-os
a superá-las sempre.
Nos últimos capítulos, Baltasar não regressou a casa
e deixou Blimunda muito preocupada. De tal modo, que usou os seus poderes e
virtudes para procurar o seu amor. Andou por toda parte de Portugal, procurou
durante nove anos, sem se esquecer um dia que fosse dele. Julgavam que era
doida, mas, incansável, um dia reencontrou Baltasar, no Rossio, a ser condenado
à fogueira, e recolheu-lhe a sua vontade.
“I hope life treats you kind | And I hope you
have | All you've dreamed of | And I wish you joy and happiness | But abouve
all this i wish you love (Eu espero que a vida te trate bem | E eu espero que
tenhas | Tudo que com sonhaste| E desejo para ti prazer e felicidade | Mas,
acima disso tudo, eu desejo para ti, amor)”, palavras que Baltasar não disse
mas deverá ter pensado. Mesmo indo para outro mundo, amará Sete-luas para
sempre, e deseja que sua amada seja feliz mesmo não estando mais juntos.
Blimunda perdeu as pessoas que ama, talvez por injustiça ou por terem
pensamentos diferentes, mas que eles sempre irão amá-la, “They will always love
her”.
Marta
Marta (Bom (-)/Bom -) ||
“Some nights”(Jeff Bhasker, Nate Ruess, André Dost, Jack Antonoff), Some nights, 2012 // José Saramago,
Memorial do Convento, 19.ª edição,
Lisboa, Caminho, 1984, pp. 35-47
“Some nights”, a canção que dá o nome ao álbum
da banda norte-americana Fun, lançado em 2012, conta a história, na primeira
pessoa, de um homem cheio de interrogações no meio de uma guerra. Esta é uma
história semelhante à de Baltasar Mateus, o Sete sóis. Sendo um dos
protagonistas de Memorial do Convento,
Baltasar é um antigo soldado que combateu na guerra entre Portugal e Espanha. Nate
Ruess, vocalista de Fun, canta “Well, some nights I wish that this all would
end” (Bem, algumas noites desejo que isto tudo acabasse), sentimento que Baltasar
certamente viveu quando serviu na guerra, como qualquer pessoa na mesma
situação. Ainda novo partira de Mafra onde vivia com a sua família, do povo, para
ir combater em terras espanholas. Regressa anos mais tarde após ter sido
expulso do exército por lhe terem cortado a mão esquerda (“Foi mandado embora
do exército por já não ter serventia nele, depois de lhe cortarem a mão
esquerda pelo nó do pulso”, p. 35). Baltasar pode ser considerado um sortudo
porque, numa guerra em que morreram centenas, a única coisa que perdeu foi a
mão que mais tarde foi substituída por um gancho de ferro. Vem do Alentejo em
direção a Lisboa com o objetivo de se reunir com a sua família em Mafra, que
dele nada sabe desde que partiu (“Se pai e mãe se lembram dele, julgam-no vivo
porque não têm notícias de que esteja morto, ou morto porque as não têm de que
esteja vivo”, p. 36). O sujeito da canção faz também faz várias referências à
família que deixou para trás: ”I miss my mom and dad for this?” (Tenho saudades
da minha mãe e do meu pai por isto?) e “Sorry to leave, mom, I had to go”
(Desculpa partir, mãe, tive de ir). Inicialmente, Sete sóis pensa que só
pedindo esmola conseguirá dinheiro. Mais tarde, acaba por arranjar trabalho como
talhante. Mas a guerra para Baltasar terminou. Marcou-o quer física quer psicologicamente mas não o
derrotou. A dor das mortes, o sofrimento, o sangue, tudo fica para trás. Ele
volta à vida do dia a dia. Mas também da sobrevivência. Apaixona-se por
Blimunda e ela dá sentido aos seus novos dias. O gancho que lhe substituiu a
mão tem usos que lhe garantem um emprego e trabalha como qualquer outro homem. Ao
contrário do homem da música, que ficou preso no sentido da guerra e na sua
inutilidade, Baltasar prossegue com a sua vida. Não é uma vida fácil: tem de
trabalhar para comer. O herói de pé descalço que José Saramago nos mostra é um
bom exemplo de como vive um pobre no século XVIII. Um grande contraste com a
realeza nas passagens que se referem à corte de D. João V. Uma corte
extravagante, que exibe perante o povo o seu luxo fútil. São os reis e os seus
nobres que mandam os homens, como Baltasar, para a guerra. Ontem como hoje os
homens só podem cumprir ordens. As dúvidas têm de ficar dentro de cada um, como
o homem de que fala a canção.
Maria
Maria (Bom) || «Não vai
dar (parte I)» (Anselmo Ralph/Anselmo Ralph), The Best of Anselmo Ralph, 2009 // José Saramago, Memorial do Convento, 13ª edição,
Lisboa, Caminho, 1984, passim
«Não vai dar», após uma leitura cuidadosa de Memorial do Convento, remete,
imediatamente, para a situação de D. Maria Ana Josefa. Maria Ana Josefa chegou
da Áustria «para dar infantes à coroa portuguesa» (p. 9), chegou a Portugal
para casar com D. João V, Maria Ana, no mundo social, era vista como
culturalmente inferior, a sua existência regia-se por deveres bem determinados,
e não poderia ter sentimentos ou emoções. Era vista como um meio para chegar a
um fim – esse fim seria, então, dar infantes à coroa portuguesa – «[E] até hoje
ainda não emprenhou» (p. 9). Maria Ana era considerada a culpada pela
esterilidade do casal – «Que caiba a culpa ao rei, nem pensar, primeiro porque
a esterilidade não é mal dos homens, das mulheres sim, por isso são repudiadas
tantas vezes» (p. 9).
D. João V, jovem que sonha surpreender o mundo
com a sua grandeza e deixar marca da sua passagem na Terra, promete a Frei
António de São José que mandará construir um convento em homenagem aos
franciscanos, se estes o ajudarem na questão da sucessão – «[S]e vossa
majestade prometesse levantar um convento na vila de Mafra, Deus lhe daria
sucessão (…) É verdade o que acaba de dizer-me sua eminência, que se eu
prometer levantar um convento em Mafra terei filhos (…) Verdade é, senhor,
porém só se o convento for franciscano» (p. 12).
D. Maria Ana já estaria grávida aquando a
promessa foi feita. Nasceu Maria Bárbara, a primeira descendente da coroa
portuguesa. Maria Ana sonhava, secretamente – «Também deste sonho nunca deu
contas ao confessor» (p. 16) – , com seu cunhado D. Francisco – «Há tantas
mulheres por aí e tantos homens por aí. Mas eu fui logo gostar de ti e tu foste
logo gostar de mim».
Não tendo o amor do marido, Maria Ana refugia-se
nas suas crenças e em Jesus Cristo – «[V]ai ao convento das Trinas, e ao
convento das Bernardas, e ao Santíssimo Coração (…) mas aonde ela não se atreve
a ir sabemos nós, é ao convento de Odivelas, todos adivinham porquê, é uma
triste e enganada rainha» (pp. 121-122) –, mesmo que tente evitar o convento
onde se pensa estar a predileta das amantes do rei – «mas ficar contigo é um
pouco mais que complicado».
D. Francisco, ao ter conhecimento dos sonhos de
Maria Ana e, apercebendo-se de que o irmão estaria seriamente doente,
aproveita-se da mesma – «Porém, vossa majestade sonha comigo quase todas as
noites, que eu bem no sei» (p. 123) – para que, se el-rei D. João V falecesse,
se tornasse rei – «Então, morrendo meu irmão, casamos» (p. 123). Maria Ana
desistiu rapidamente da ideia. Não merecia a pena um outro casamento em que os
interesses fossem maiores do que a relação em si – «[A]gora o infante só lhe
aparece para dizer que quer ser rei, bom proveito lhe fizesse (…) Adoeceu tão
gravemente el-rei, morreu o sonho de D. Maria Ana, depois el-rei sarará, mas os
sonhos da rainha não ressuscitarão» (p. 124).
A faixa de Anselmo Ralph sublinha o erro que é
apaixonarmo-nos pelas pessoas erradas. Assim como o amor de Maria Ana e D.
Francisco, a história da canção termina da pior forma: «É melhor ficarmos por
aqui… sabes?». Numa época em que os sentimentos não tinham qualquer valor,
Maria Ana desiludiu-se ao pensar que talvez houvesse uma escapatória, mesmo
sendo errado – «Tu não estás sozinha, tu és a rainha de um outro fulano»; «Este
sentimento temos que arrancar, não podemos nos deixar levar».
Bea
Em Memorial
do Convento a sensação protagonista é o amor, desde a sua mais forte
manifestação, como na relação de Baltasar Sete-Sóis e Blimunda, até à mais
fraca e quase inexistente manifestação deste, nos sonhos eróticos tidos por D.
Maria Ana Josefa com o seu cunhado D. Francisco de Bragança.
Em toda a obra D. Maria Ana apresenta-se como
uma personagem com uma voz abafada. Não vive uma paixão ardente, como
percebemos ser, através dos sonhos com o seu cunhado, o seu desejo. Em vez
disso, a sua relação com D. João V baseia-se no cumprimento dos deveres
conjugais e sociais, na traição por parte do rei, e na repressão dos seus
sentimentos. A canção da banda brasileira Jota Quest, retomada em Portugal por
Paulo Gonzo e Raquel Tavares que dela fizeram o genérico da telenovela
portuguesa homónima, ilustra o constante estado de espírito da rainha, pois
mistura o sentimento de querer estar só em vez de estar com alguém que não a
ama e, no entanto, não ter a força suficiente para o fazer, devido às suas responsabilidades
enquanto realeza e ao seu constante estado de espírito (“Eu quero ficar só mas
comigo só eu não consigo”).
Ao longo da obra temos a sensação de que, se D.
João V desse a D. Maria Ana a atenção que esta pretendera, ter-se-ia
desenrolado o sentimento de amor e cumplicidade entre os dois. Conseguimos
inferir isto através da caracterização da personagem D. Maria Ana como senhora
de paz, meiga, passiva e que, acima de tudo, ainda sofre com a situação em que se encontra (“É
preciso amar para sempre, amar perdidamente, ser amor a qualquer hora, ser amor
de corpo inteiro, amor de dentro para fora, amor que desconheço.”).
Constantemente reprimida pelo meio social a que
pertence e pelos seus deveres enquanto parte da realeza, a rainha assume uma
atitude passiva, abstraindo-se do que a rodeia, sentindo, no entanto, uma
tristeza e insatisfação face à vida que leva (“Quero um amor maior, amor maior
que eu”), não tendo, consequentemente, vontade de a viver mais, o que a faz
sentir-se esgotada.
Esta fragilidade, devida à falta de amor e ao
facto de ser humilhada enquanto mulher pelos sucessivos retiros do rei no Mosteiro
de São Dinis para ter relações com as “esposas do Senhor” (p. 100, em Memorial do Convento), resulta numa
solidão (“Eu quero ficar só”) e numa carência afectiva para a qual única
solução que encontra é sonhar.
Através do sonho D. Maria Ana compensa a
carência de atenção emocional e física. Sonha com o seu desejado cunhado D.
Francisco, que, mais tarde, no capítulo dez, se revela um oportunista, o que
causa a D. Maria Ana um certo desapontamento e desgosto, que ela ultrapassa mal
se apercebe do sucedido (“Magoarei mesmo assim, mesmo sem querer, para saber se
é amor, mas estarei mais feliz mesmo morrendo de dor, p’ra saber se é amor”). D.
Maria Ana está confinada a uma relação fria, sem amor e preocupação, o que não
era de todo o pretendido.
Leal
Leal
(Suficiente (+)) ||“Can you feel the love tonight” (Elton John / Tim Rice), Can you feel the love tonight, 1994 //
José Saramago, Memorial do convento, 19.ª
edição, Lisboa, Caminho, 1989, pp. 53-57
Memorial
do convento
anda muito à volta do relacionamento amoroso entre Baltasar e Blimunda, um amor
“puro”, “verdadeiro” que percebemos logo que eles se conhecem e se apaixonam.
Ao ler o livro na parte desse primeiro contacto entre Baltasar e Blimunda e a
primeira noite que passam juntos, lembrei-me automaticamente de uma canção que
todos conhecem, “Can you feel the love tonight”, do emblemático Elton John,
música essa que foi escrita para o filme The
lion king e usada numa cena romântica, como seria de esperar.
A estrofe “An enchanted moment / And it sees me
through / It's enough for this restless warrior / Just to be with you” (Um
momento encantado que passa por mim é o suficiente para este guerreiro inquieto
ficar contigo) faz-me logo lembrar do momento em que Blimunda e Baltasar se
conhecem, pois fala de um momento encantado em que um guerreiro se apaixona,
tal como no livro de Saramago, durante o auto de fé. O que para nós nos parece
um momento algo estranho para Blimunda e Baltasar, é um momento encantado, o do
seu primeiro encontro, o momento em que Baltasar (um soldado, guerreiro) se
apaixona depois de Blimunda ter dito estas simples palavras: “Que nome é o seu”
(p. 54).
O lugar onde Blimunda e Baltasar se conhecem
pela primeira vez não é muito romântico, e é estranha a calma com que Blimunda
reage mesmo sabendo que a sua mãe vai para Angola e que provavelmente nunca
mais a irá ver. É, sem, dúvida, uma altura estranha para se apaixonar, mas essa
calma toda talvez resulte do fato de ela se ter apaixonado nesse momento: o
fato de ter conhecido Baltasar traz lhe calma segurança de que tudo ficará bem.
Na canção que escolhi existe uma estrofe com significado muito semelhante: “There's
a calm surrender / To the rush of day” (Há uma calma rendição à pressa do dia).
Há também outra estrofe que conseguimos associar
à canção com Baltasar, “When the heart of this star-crossed voyager/ Beats in
time with yours” (Quando o coração deste viajante bate ao mesmo ritmo que o
teu). Percebemos que existem algumas parecenças entre Simba, o herói do filme,
e Baltasar pois também sabemos que Baltasar viajou durante algum tempo depois
da guerra para chegar a Lisboa.
No livro, depois deste primeiro encontro, os
dois apaixonados vão para casa de Blimunda onde consomem a sua paixão. Na
música temos também indícios de que isso tenha acontecido em quatro versos que
se repetem ao longo da canção “And can you feel the love tonight? / It is where
we are” (consegues sentir o amor esta noite? está onde nós estamos) “And can
you feel the love tonight / How it's laid to rest?” (consegues sentir o amor
esta noite como está deitado para descansar), mas só conseguimos mesmo perceber
que Simba e a sua amada dormem juntos.
Carolina
S.
Carolina S. (Suficiente
+) || «Por quem não esqueci» (Sétima Legião / Sétima Legião), De um tempo ausente, 1989 // José
Saramago, Memorial do Convento,
Lisboa, Editores Reunidos, 1994, pp. 328-351
A parte que chama mais atenção em Memorial do Convento é, sem dúvida, o
amor. Temos, por um lado, a luxúria, o fingimento e a traição na relação da rainha
e do rei, e, por outro lado, o amor verdadeiro e puro de Baltasar e Blimunda. A
parte que eu penso que é mais chocante e marcante em Memorial é mesmo o desaparecimento de Baltasar, e a longa procura
até à exaustão de Blimunda, e por isso escolhi a música “Por quem eu não
esqueci” dos Sétima legião. Esta música transmite muito o mesmo tipo de ânsia e
de frustração vindas de Blimunda enquanto esta procurava Baltasar. O sujeito da
música, assim como Blimunda, parece procurar alguém que ainda não caiu no
esquecimento e que ainda faz falta.
Já fizera seis meses desde que Baltasar não ia a
Monte Junto cuidar da passarola e dos possíveis estragos feitos pelo passar do
tempo. Certa noite foi Baltasar mostrar a Blimunda as estátuas que tinha
trazido até Mafra e, nesse mesmo passeio, anunciou que iria voltar a Monte Junto.
Desprezando as preocupações de sua mulher, lá partiu, na manhã seguinte, e uma
estranha despedida se deu entre estas duas almas apaixonadas e desesperadas por
estarem juntos de novo (“Adeus Blimunda, Adeus Baltasar.”, p. 328),mal sabia o
casal que seria a última vez que se iriam ver.
Mesmo sabendo que Baltasar apenas poderia voltar
no dia seguinte, Blimunda não descansou, preocupada com o seu homem, com a
esperança de que ele ainda viesse e que o pudesse receber de braços abertos
como sempre o fizera. Na canção existe uma referência a esperar quem não
esquecemos e com queremos ainda estar (“Espero à noite, Por quem não esqueci.”),
o que reflete exatamente o que Blimunda estava a sentir naquele momento: preocupada
com Baltasar, não conseguia descansar enquanto não o tivesse nos seus braços, por
isso esperou. Não dormiu toda a noite e, quando os primeiros raios solares se
deram, saiu à procura do seu amado, andou por onde ele supostamente voltaria. Mal
ela sabia que ele, devido a um mero acidente, tinha partido na passarola —“Blimunda
não nos ouve, saiu já de casa, vai pelo caminho que conhece, aquele por onde
Baltasar virá, não é possível desencontrarem-se.” (p. 332)
Blimunda
não parou uma única vez, nem para comer “ia andando e mastigando”(p. 333), assim
como o “eu” da canção — “Ainda procuro, por quem não esqueci.” —
não parou de procurar. Chegando a Monte Junto, e depois de muito ter gritado
por Baltasar, na esperança de que este respondesse — “por
causa disso gritou, Baltasar.” (p. 334) —,repara que a grande
máquina não estava lá assim como o seu homem. Mostra o desespero que Blimunda
tinha em encontrar o seu amor, o quanto ela gritou, quase como se estivesse a
pedir que alguém lhe dissesse onde poderia encontrar de novo o seu querido
Sete-Sóis — “Eu peço à noite, um sinal de ti. Quem eu não
esqueci…” —, tal como na canção o autor pede um sinal, apenas
um sinal, assim como Blimunda, para encontrar alguém.
Mas Blimunda não perdeu a vontade de encontrar Baltasar.
Continuou e, mesmo depois de existir um pequeno (no entanto bastante
lastimável) incidente com um certo frade, não parou e continuou a sua caminhada
(“Toda a noite Blimunda andou.”, p. 340). Depois de parar durante um tempo em Mafra,
assistindo com a sua cunhada, Inês Antónia à tao esperada inauguração do
convento de Mafra e chegou o fim do primeiro dos oito dias de sagração do
convento, Blimunda parte, com um único objectivo, descobrir de novo o seu amado.
Este sentimento de Blimunda assemelha-se muito a um verso da canção — “Ainda
procuro, por quem não esqueci. Em nome de um sonho, em nome de ti.” —
pois ela não desiste da sua procura pelo amor, segue um único sonho, o de
encontrar Baltasar de novo.
Depois de nove anos de procura em que Blimunda
correu Portugal inteiro à procura do seu amor e sempre sem resposta, foi até à
fronteira e voltou passou pelos mesmos sítios e nunca desistiu de procurar o
seu verdadeiro amor, Baltasar, o seu querido Sete-Sóis que ela já não via desde
aquela manhã em que este partiu para Monte junto, depois de tanto sacrificar
para o encontrar, por fim encontra-o, infelizmente a ter o mesmo desfecho que a
sua pobre mãe, morto, num auto de fé — “Naquele extremo arde
um homem a quem falta a mão esquerda. Talvez por ter a barba enegrecida,
prodígio cosmético da fuligem, parece mais novo.” (p. 351) — mas,
mesmo depois de o ter perdido, Blimunda ainda procura Baltasar (“Ainda procuro,
por quem não esqueci. Por quem já não volta, por quem eu perdi.”), ainda
procura estar unida com ele, e mesmo Baltazar sabe que mesmo após a sua morte o
único sítio a que este pertence é junto ao seu verdadeiro amor, onde a lua e o
sol podem estar unidos para sempre — “Então Blimunda disse,
Vem. Desprendeu-se a vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as
estrelas, se á terra pertencia e a Blimunda.” (p. 351).
Madalena
Madalena
(Bom) || «Verdade» (Domingos Coimbra, Francisco
Ferreira, Manuel Palha, Salvador Seabra e Tomás Wallenstein), Gazela , 2011
// José Saramago, Memorial do Convento, 46.ª edição, Lisboa, Caminho,
1994, pp. 63-69
No álbum Gazela, dos Capitão Fausto,
encontramos a faixa “Verdade” — escrita com o intuito de criticar a sociedade
por esta banalizar a verdade. Podemos notar que a canção torna possível criar
um paralelismo com o propósito dos autos de fé relatados em Memorial
do Convento, nos capítulos V, XXV.
A canção “Verdade” critica a banalização da verdade, independentemente de o seu conteúdo
ser verdadeiro ou não — “A verdade é uma coisa qualquer / faça aquilo que
fizer”. Em Memorial do Convento, este início da canção não seria bem
visto pois a verdade era o que a Inquisição e o Santo Ofício decidiam — “e aquele é Domingos Afonso Lagareiro, (...), que fingia visões para
ser tido por santo, e fazia de curas usando de bênçãos palavras e cruzes e
outras semelhantes superstições”(p. 68) — daí os sentenciados que diziam ter visões e serem
santos terem sido julgados e degradados. Independentemente de o indivíduo
possuir aqueles dons, ele teve de ser julgado pois a sua verdade não era
compatível com a verdade da Inquisição.
Sebastiana
Maria de Jesus (mãe de Blimunda) foi outra da vítimas do auto de fé — “e esta sou, Sebastiana Maria de Jesus, um quarto cristã-nova, que
tenho visões e revelações, mas disseram-me no tribunal que era fingimento”(p. 68).
Neste trecho podemos ver que o tribunal não acreditara em Sebastiana e que esta
fora condenada a oito anos de degredo em Angola, por apenas dizer a verdade.
Quando Sebastiana foi julgada em tribunal foi considerada “blasfema, herética,
temerária” (p. 68), e esta sentiu que
“sobre aquilo que eu disser / é levado a peito e acabo sem ver / O que alguém
quis responder”. É caso para dizer que Sebastiana sabia o que deveria responder
em tribunal, no entanto limitou-se a dizer a sua verdade.
Estes
autos de fé serviam para mostrar o poder que a Igreja tinha sobre o povo e a
falta de condescendência com o mesmo. Esta falta de liberdade faz com que o
leitor pense que “Mais valia que a verdade fosse a verdade / e que se ouvisse
quem quiser falar”. Em toda a narrativa sobre os autos de fé, o narrador intervém
usando a ironia sempre com um lado pejorativo — “Porém, hoje é dia de alegria
geral, (...), juntando-se no Rossio para ver justiçar a judeus e cristãos-novos,
a hereges e feiticeiros”(p. 64), “nunca se chegará a saber de que mais gostam
os moradores, se disto (auto de fé), se das touradas” (p. 65) — criticando a alegria do povo português perante uma situação de
julgamento em praça pública, pois foi graças a este que os setenciados foram
apanhados (“correm boatos ao amanhecer / sobre aquilo que eu disser”).
Tanto
a narrativa sobre os autos de fé como a canção “Verdade” criticam a falta de liberdade
e a credibilidade da “verdade”. Em Memorial do Convento não existe uma
verdade que se “dogmatize”, nem nada que possa provar a verdade dos sentenciados.
É caso para dizer que “A verdade é que a verdade nem sempre é verdade / E que o mundo ainda tem de crescer”.
Jacemila
Jacemila (Suficiente (-))
// "A bússola" (Luan Santana), Ao
vivo no Rio, 2011 // José Saramago, Memorial
do Convento, 13.ª edição, Lisboa, Caminho, 1984
A música que eu escolhi foi "A
bússola" de Luan Santana, uma vez que tanto na obra como em "A
bússola" a visão é de uma relação inseparável, forte e em que ambos os
intervenientes estão apaixonados. Escolhi-a também por aludir ao facto de
"andar por uma selva de perigos", ainda que este último ponto não
seja o mesmo tipo de perigo de que se fala na obra.
Na música diz-se "Eu precisava de uma
bússola / alguma coisa para me guiar (...)" e, embora na obra as duas
personagens estivessem à procura de alguém para as guiar, tanto na obra como em
"A bússola" se fala de amor descontrolado.
Também na música se diz "Só preciso da
bússola que me tirou do escuro (...)" e as duas personagens partilham um
amor que realmente fez marca um no outro. As duas personagens da obra (Baltasar
e Blimunda) não têm nada em comum, conheceram-se durante um auto de fé levado a
cabo pela inquisição, o de 26 de julho de 1711, e nunca se deixaram de amar.
Viveram um amor sem regras, natural e instintivo. Baltasar é maneta, perdeu uma
mão na guerra. E Blimunda tem um poder de ver por dentro das pessoas e acaba
por ser forte porque consegue aguentar em jejum de forma a ver as vontades dos
homens e até mesmo pelo facto de ver dentro das pessoas e lidar com desilusões.
A sua relação teve um começo um pouco comum e só o facto de Sete-sóis morrer os
separou, mas, apesar da separação, Sete-luas ficou com uma marca do seu
ex-marido guardada em si: "Despertou-se a vontade de Baltasar Sete-sóis,
mas não subiu para as estrelas se à terra pertencia a Blimunda." (p. 359).
Os versos da canção "E se eu for para o Sul
mesmo que seja sem querer / Você me traz para o leste para ver o sol
nascer" fazem lembrar a procura de Blimunda por Baltasar, durante noves
anos, incansável. Tal como na obra, na música também se fala de perigos. A
frase "Por uma selva de perigos / Não consegui escapar" faz-me
lembrar do perigo que Baltasar sofreu durante a guerra (ele é um ex-soldado,
que perdeu a mão durante a guerra).
A frase da canção "Vou para a guerra do seu
lado" mostra um amor verdadeiro, em que a personagem faz de tudo para
viver um amor e estar ao lado da pessoa amada. Em Memorial do Convento, as duas personagens, Blimunda e Baltasar,
vivem um amor verdadeiro. Não é aquele amor que algumas amigas dizem sentir
umas pelas outras, uma semana depois de se conhecerem, ou daquelas pessoas que
têm relações apenas por interesse, como acontece também em Memorial do Convento entre D. João V e D. Maria Ana. O amor que
existe entre Blimunda e Baltasar é um amor que tem a capacidade de unir duas
pessoas numa só, capaz de fazer ultrapassar os mais variados obstáculos, capaz
de dar forças nos momentos mais críticos ou mais difíceis ou também de
tristeza.
Tiago
Tiago
(Suficiente +) ||«Protagonista» (Dillaz), Reflexo, 2016
// José Saramago, Memorial do Convento, 46.ª edição, Lisboa, Caminho,
1994, pp. 60-65
Podemos fazer um paralelismo entre a canção “Protagonista”,
de Dillaz, do álbum Reflexo, e o
desejo de voar de Bartolomeu Lourenço de Gusmão. Um dos acontecimentos mais
marcantes deste grande romance é a construção da passarola, idealizada pelo
padre Bartolomeu, mas construída por dois amores, Sete-sóis e Sete-luas (Baltasar
e Blimunda), que tiveram um pequeno apoio do músico Scarllati. Embora a
construção da passarola tenha sido consentida por D. João V, a vida do padre
jesuíta nem sempre fora fácil pois nem todos acreditavam nas suas capacidades, tanto
a gente do povo como a das classes mais altas.
Bartolomeu era conhecido por todos como “Voador”
– “Aquele que ali vem é o padre Bartolomeu Lourenço, a quem chamam o Voador,”
(p. 61) – mas, para além de voador, ele também poderia ser chamado inovador,
inventor e sonhador, pois são adjetivos que o descrevem e definem. Para
construir a passarola Bartolomeu não teve só de a idealizar mas também de passar
por várias situações em que desistir seria o mais fácil. E entanto, não
desistiu. Podemos fazer um paralelo com a canção “Regra número um / Tenta expandir a vista /
Faz pela tua conquista / O protagonista és tu / Regra número dois / Não deixes
para outra hora / Tu tenta fazer agora / Para repetir depois / Regra número
três / É obrigatório sorrir / E no caso de caíres / Vais levantar-te outra vez /
Regra número quatro / Quem conta com a sorte / Não volta mais forte / Acaba por
ser fraco”, pois parece que o padre seguiu cada uma destas regras para que a sua
viagem na passarola se tivesse concretizado. Ele, de acordo com a primeira
regra, abriu horizontes e conseguiu ir onde até então só Deus e as aves tinham
podido ir, tornando-se o “protagonista” da sua história e da história da
humanidade. Depois guiou-se pela segunda regra e não deixou passar a oportunidade
de começar o seu projeto, especialmente depois de conseguir a ajuda dos seus
grandes companheiros, Baltasar e Blimunda, que também fizeram a viagem com ele.
A terceira regra pode dizer-se que ele já a sabia porque um dia disse a Baltasar
que “O homem primeiro tropeça, depois anda, depois corre, um dia voará” (p. 63),
devido ao facto de este desconfiar de que Bartolomeu conseguisse mesmo um dia
voar. E, por fim, também respeita a quarta regra pois não foi com sorte que ele
conseguiu pôr a passarola a voar, mas com vários anos de trabalho árduo, de
pesquisa, na Holanda e em Coimbra, e de recolha de vontades.
Contudo, antes de conseguir concluir os seus
objectivos, as ideias do padre Bartolomeu não foram bem aceites pela sociedade
pois, para a época, estas geravam uma desconfiança geral já que, até à altura,
ninguém tinha ainda posto à prova as leis da gravidade. Também devido ao seu
sonho de voar foi gozado na corte, apesar da proteção e do apoio real – “Tenho
sido a risada da corte e dos poetas, um deles, Tomás Pinto Brandão, chamou
o meu invento coisa de vento que há-de
acabar cedo, se não fosse a proteção de el-rei não sei o que seria de mim,” (p.
64) – e, na canção, o eu lírico diz “Tu tens a arte no organismo e não te dão
valor”, o que significa que o “eu”, tal como o padre, tem um grande talento mas
não o valorizam por isso.
Porém, no final todo o esforço compensou e, como
diz a canção, “ao fim da escuridão tu tens aquela luz divina”. Depois de tantas
dificuldades e de tantos obstáculos, o padre e os seus dois amigos conseguiram
finalmente voar.
Joana
Joana (Bom -) || “Autopilot”
(Garrigan, Prendergast, May), Coming Up
For Air, 2015 // José Saramago, Memorial
do Convento, Lisboa, Caminho, 2000, pp. 134-146
“Autopilot”
(em português, “Piloto Automático”) trata-se de uma canção da banda indie irlandesa Kodaline. Pertencente ao
álbum Coming Up For Air, lançado em
2015, a letra pode ser relacionada com a fuga à Inquisição, por parte de
Bartolomeu, Blimunda e Baltasar. Localizado no capítulo XVI, este episódio
sucede ao acabamento da passarola, sendo nele que se realiza o primeiro voo da
“máquina de voar”.
Baltasar
e Blimunda encontram se em S. Sebastião da Pedreira do Duque de Aveiro. Pensam
em voltar para Mafra. Bartolomeu diz que aguardaram a vinda de El-rei para o
mesmo fazer a “prova da máquina, e, correndo bem tudo, como se espera, para
todos haverá glória e proveito”. No entanto, o Padre andava inquieto e com medo
do Santo Ofício, já que, se o encontrassem, poderiam acusá-lo de ser feiticeiro,
considerando que pudesse existir alguma “arte demoníaca nesse voo”.
Passou-se
o tempo sem El-rei aparecer e a máquina necessitava de sol para se erguer do
chão. Até que um dia, o Padre Bartolomeu Lourenço chega à quinta: “vinha
pálido, lívido, cor de cinza”, afirmando que o Santo Ofício andava à sua
procura para o prender e que precisavam fugir. Fugiriam na passarola.
Preparam-se
para a viagem. Partiriam pelos ares, até onde o destino os quisesse levar (“I
just need a place to hide / Somewhere to make you right [Eu apenas preciso de
um sítio para me esconder / Algum lugar para te fazer certo]”).
Acabados
os preparativos, levantaram voo, deixando para trás o cravo e destruindo a
abegoaria (“a abegoaria é só paredes”).
No
ar, Baltasar e Blimunda encontravam-se “assustados com a sua própria coragem”, enquanto
o Padre “ria, dava gritos”. Estavam “loucos” e deslumbrados. Passaram por
momentos de medo, de euforia, de deslumbramento e de felicidade. Do céu via-se
Lisboa, o Terreiro do Paço.
A
quadra "I'm trying to connect with you / To see the world the way you do /
Try 'n' understand what's in your head / I'm hearing what you said” (“Eu estou
a tentar conectar-me contigo / Para ver o mundo como tu o vês / Tento entender
o que está na tua cabeça / Eu estou a ouvir o que estas a dizer”) pode
relacionar-se com as emoções vividas e a necessidade de decifrar o que cada um
sente ao estar a sobrevoar Portugal na passarola. Ao mesmo tempo, no “Rossio, do palácio dos
Estaus” informaram “que fugiu o padre a quem iam buscar para o cárcere.”
Quando
começa a anoitecer, os três sabem que, quando “o sol se puser, descerá
irremediável a máquina” e “talvez cais, talvez se despedace e todos morrerão” (“Maybe
you lost control / Fallen into a hole [Talvez tenhas perdido o controlo / Caído
em buraco]”). Contudo, mesmo com dificuldades, conseguem aterrar sem ferimentos
em terra firme. Não sabiam onde se encontravam e o padre Bartolomeu mostrava-se
desanimado e achava que, mais cedo ou mais tarde, o iriam encontrar e matar
(“Por enquanto ainda estamos vivos, Amanhã estaremos mortos”), por outro lado,
Blimunda e Baltasar estavam confiantes e pretendiam seguir viagem na manhã seguinte.
Decidiram descansar e, durante a noite, o padre, que parecia doente, tinha em
suas mãos “um ramo inflamado que pegava fogo à maquina”. A passarola pôde ser
salva pelo casal, mas, na manhã seguinte, Bartolomeu havia desaparecido.
Isabela
Isabela
(Suficiente) || «Outro: Wings» (BangTan Boys [방탄소년]), Wings. You never walk alone, 2016 // José Saramago, Memorial do
Convento, 57.ª ed., Lisboa, Porto Editora, 2014, pp. 63-67
No
início do romance Memorial do Convento, de
José Saramago, o padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão é apelidado de “o Voador”.
Este apelido tem origem no seu sonho de voar. Assim, ao longo do romance,
Baltasar e Blimunda construíram a máquina que o padre acreditava que o poderia
levar o mais perto do sol, a Passarola.
Desta forma, o
livro é relacionável com a letra da música do grupo BTS (BangTan Boys [방탄소년단]) na canção
“Outro: Wings”. Quando Baltasar pergunta ao padre sobre o seu apelido “o Voador” o
padre, incomodado afasta-se pois já sabia qual seria a sua reação. Como esperava
Baltasar, desconfiado, afirma, ao padre: “Com perdão da confiança, só os
pássaros voam” (p. 66). Porém o padre declara que, assim como um pássaro, ele
próprio já voou (“Como um pássaro, eu vou a lugares que me dizem pra não ir,
faço coisas que me dizem para não fazer. [새처럼, 가지 말라는 길을 가고 ,하지 말라는 일을 하고]”). Assim sendo, o padre
explica a Baltasar os seus feitos, como há dois anos voou, como conseguiu fazer
com que os seus balões voassem. Mesmo ninguém acreditando nas suas palavras,
mesmo sendo ridicularizado, como foi por João Elvas (“Mas ao Voador não
cresceram bastante as asas”, p. 63), o padre Bartolomeu Lourenço seguia com
ambição e vontade, mantinha a cabeça erguida seguindo o seu sonho (“Eu me
esforço. Eu confio em mim. [난 날 밀어. 난 날 믿어 내 등이 아픈 건]”).
Mesmo sendo o seu sonho, o padre sabe que aquilo que
deseja é difícil ou até mesmo impossível, tratando-se de algo que as pessoas
pensavam que se acontecesse seria obra de magia negra e não seria confíavel.
Mesmo numa situação como esta, ele nunca se deixou afetar, e manteve-se
concentrado no seu objetivo (“O homem primeiro tropeça, depois anda, depois
corre, um dia voará”, p. 66), sabendo que poderia levar muito tempo (“Eu não
chorarei na estrada que escolhi, eu não curvarei minha cabeça. Lá em cima é o
céu e eu estarei voando, voarei. [내가 가는 길에 울지 않고, 고개 숙이지 않아, 거긴 하늘을 테고 날고 있을 테니까,
fly]”). O padre é diferente de todas as outras pessoas da sua época, pois tinha
a capacidade de visualizar aquilo que outros não podiam ver, mas isto era
diferente das capacidades de Blimunda; ele foi capaz de perceber que algo o
poderia levar aos céus, e depois de diversas tentativas falhadas de o comprovar
ele continua a acreditar (“primeiro fiz um balão que ardeu, depois construí
outro que subiu até ao teto duma sala do
paço, enfim outro que saiu por uma janela da Casa da Índia”, p. 66), ele
confiava que um dia, com certeza, iria conseguir por isso, não pensava em
desistir (“Eu acreditarei incondicionalmente, é hora de ser corajoso. Eu não
estou com medo. [조건 없는
믿음을 가지겠어, It’s time to be brave I’m not
afraid. 날 믿기에]”).
Na última parte da música, reforça-se a ideia de que
apesar de todos estarem contra o padre Bartolomeu Lourenço, ele,
independentemente de todas as opiniões negativas, afirma confiantemente “voar é
sair da terra para o ar, onde não há chão que nos ampare os pé, Faremos como as
aves, que tanto estão no céu com pousam na terra” (p. 67). Assim ele começa
como alguém que tinha um sonho e acaba como alguém que construiu uma máquina
capaz de voar, a Passarola (“Eu acredito em mim, eu posso ser fraco agora. Mas,
no final,
será um incrível salto. Voar, sobrevoar o céu. Voar,
sobrevoar bem alto. [날 널 믿어 지금은
미약할지언정. 끝은 창대한 비약일
걸. Fly, fly up in the sky Fly, fly get ’em up high]”).
Joãozão
Joãozão (Suf+/Bom-) || «Mais
um dia» (José Cid), Coisas do amor e do
mar, 2009 // José Saramago, Memorial
do Convento, 19.ª edição, Lisboa, Caminho, 1989, pp. 69-70, p. 493
“Mais um dia”, de José Cid, é uma canção que
descreve bem o sentimento partilhado entre as personagens Baltasar Sete-Sóis e
Blimunda Sete-Luas. É uma música com um olhar forte sobre a paixão, como aquela
que é contada por José Saramago em Memorial
do Convento, uma verdadeira história de amor. Trata-se de uma história de
amor fora do comum, logo pelo contexto em que essa história se inicia. Não
podia haver pior cenário para se dar uma ligação destas: o primeiro contacto entre
estas duas personagens dá-se num contexto de sofrimento e dor, para alguns;
para outros, era a única distração que tinham nas suas vidas mundanas, um auto
de fé onde a mãe de Blimunda está a ser julgada perante o olhar sofredor da
filha, que nada pode fazer a não ser conter o seu sofrimento para que ninguém
se aperceba da ligação materna que a julgada tem com a espetadora, que,
certamente, desejava partilhar mais um dia com sua mãe (“Eu só queria mais um
dia de magia de ternura e emoção”). Foi nessa altura que Blimunda se dirige a
Baltasar pela primeira vez: “e Blimunda disse ao padre, Ali vai minha mãe, e
depois, voltando-se para o homem alto que lhe estava perto, perguntou, Que nome
é o seu, e o homem disse, naturalmente, assim reconhecendo o direito de esta
mulher lhe fazer perguntas, Baltasar Mateus, também me chamam Sete-Sóis” (p. 69).
Enquanto Blimunda dialoga com o padre e olha sua mãe, Baltasar observa
atentamente outro “espetáculo”, Blimunda, cujo olhar desperta nele um
sentimento diferente (“Baltasar Mateus, o Sete-Sóis, está calado, apenas olha
fixamente Blimunda e de cada vez que ela o olha a ele sente um aperto na boca
do estômago…”, p. 72), olhos tem tais que Baltasar nunca havia visto uns assim,
“porque olhos como estes nunca se viram” (p. 72). Foi um verdadeiro amor à
primeira vista, Baltasar Sete-Sóis sentiu-se “preso”, “encantado” pela jovem
Blimunda de dezanove anos: “Não tenho forças que me levem daqui, deitaste-me um
encanto” (p. 74); “Eu, não sei explicar o que senti, Como na primeira vez,
encontrei o teu olharNessa magia me perdi.” Foi um amor comum aos outros o vivido
por este casal que, “casado” (“Aceitas para a tua boca a colher de que se
serviu a boca deste homem, fazendo seu o que era teu, agora tornando a ser teu
o que foi dele, e tantas vezes que se perca o sentido do teu e do meu, e como
Blimunda já tinha dito que sim antes de perguntada, Então declaro-vos casados.”,
p. 73) por um padre com ideias por alguns mal vistas, teve que manter a sua
verdadeira em união segredo (“Guardar num cofre, o segredo que há em nós”). Por
forças do destino, foram “obrigados” a separar-se, e durante longos nove anos
Blimunda procurou o seu amado Baltasar, que voltou a encontrar, tragicamente no
mesmo cenário em que inicialmente se haviam conhecido: Baltasar encontrava-se
num auto de fé em S. Domingos, fora queimado por ordem do tribunal da inquisição,
mas, antes de a sua vontade poder deixar o seu corpo, Blimunda apreendeu-a (“Desprendeu-se
a vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra
pertencia e a Blimunda”, p. 493), pois, assim como é referido na música, também
Blimunda desejava poder passar mais tempo com Baltasar, que tanto amava — “Eu
só queria mais um dia, para viver essa paixão. Mais um dia de magia, de ternura
e emoção. Dizer-te meu amor, que me ao pegar, nós ficámos sempre assim”.
Catarina F.
Catarina F. (Suficiente + / Bom -) || “Loucos” (Matias Damásio), Por Amor, 2016 // José Saramago, Memorial do Convento, Porto, Porto
Editora, 2014, passim
Ao longo do romance
de José Saramago, Memorial do Convento,
o amor entre Baltasar e Blimunda vai crescendo, tornando-se num dos principais
assuntos da narrativa.
Baltasar Sete-Sóis
foi soldado na guerra da sucessão espanhola. Mandaram-no embora do exército
pois ficara maneta da mão esquerda. Blimunda de Jesus, posteriormente alcunhada
de Sete-Luas pelo Padre Bartolomeu Gusmão, possui o dom de ver o interior das
pessoas.
Muitas diferenças e,
no entanto, tudo em comum. Baltasar e Blimunda, no texto, são vistos como um
só, completam-se, são o exemplo do casal perfeito. Identicamente, na música
“Loucos”, o eu afirma também ser um “exemplo do paraíso, formamos um par
perfeito”.
Este amor começa no
momento em que se conhecem no auto de fé, no qual a mãe de Blimunda é condenada
ao degredo, e onde predestina filha a Baltasar (“que nome é o seu”; cap. V, p.
57).
Desde esse momento,
nasceu um amor puro e verdadeiro (“e a nossa chama espalha, o sorriso encontra,
como é doce o beijo”), um amor sentido por todos e que levou Blimunda a
entregar-se por completo.
Vão trabalhar juntos
na construção da passarola, sob a direção do padre Bartolomeu Gusmão: Baltasar
ajuda na construção e Blimunda apanha as vontades para que esta voe. E
conseguem-no. A passarola voa e voam também, felizes por alcançarem o seu objetivo
e por o terem feito juntos: “nuvens formaram nossa imagem no céu”.
Tanto a música como o
livro referem-se a um amor inocente, puro e indescritível (“Camões não inventou
palavras para exprimir esse momento”) que serve como lição de vida. Apesar de
todos os obstáculos, este casal termina sempre junto.
A passarola
despenhou-se e, tempos depois, Baltasar como já costumava fazer, decide visitar
o local onde o incidente ocorrera, para verificar a passarola. Desde o dia em
que partiu, Blimunda nunca mais o vira e decidiu começar a procurá-lo,
revisitando todos os locais onde ele pudesse estar, durante nove anos
consecutivos.
O sujeito da canção,
ao dizer “mas o mundo nos chama loucos porque contamos estrelas no céu”, o que
realmente quer dizer é que, num paralelo com a história, todos os julgam
“loucos” porque, por amor, fazem o possível e o impossível. O amor é das
maiores forças que movem uma pessoa.
Com essa força,
Blimunda finalmente encontra Baltasar. Encontra-se num auto de fé, pelo que vai
ser morto, e Blimunda diz-lhe “vem. Desprendeu-se a vontade de Baltasar
Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia e a Blimunda”.
Bruno
Bruno (Suficiente -) || “Amar
Pelos dois” (Luísa Sobral), 2017 // José
Saramago, Memorial do Convento, 13.ª
edição, Lisboa, Caminho, 1984, caps. XXIV, XXV
“Amar pelos dois” retrata uma forma intensa de
se viver uma paixão, como o amor que Blimunda e Baltasar partilham em Memorial do convento. Blimunda conhece
Baltasar num ao auto de fé, onde via a sua mãe a ser condenada. Seus olhos
encantaram logo Baltasar, que foi convidado por Blimunda a passar a noite com
ela, deixando-se ambos levar pelo prazer. Depois de descobrir o segredo de
Blimunda, Baltasar decide ajudar o padre Bartolomeu a completar o projeto da
passarola. Concluída esta, decidem rumar nela com o intuito de fugir da
inquisição.
Depois do desaparecimento de Baltasar numa das suas
jornadas para preservar a passarola , Blimunda percorreu, durante nove duros
anos, imensas terras para tentar encontrar a sua alma gémea, chegando mesmo a
pedir que algo o trouxesse de volta.
“Amar pelos dois”, com os versos “Meu bem, ouve as minhas preces / Peço
que regresses”, apesar de as situações serem bastante diferentes, já que a
canção fala de um amor bastante intenso mas só de um dos lados, pode-se
encaixar na vontade da Blimunda de encontrar o seu Sete-Sóis, que não via há
nove anos, desde que saíra para verificar a passarola.
No final de Memorial,
Blimunda, em jejum e fraca, reencontra Baltasar que estava a ser julgado no
auto de fé, pois tinha sido apanhado a voar na passarola, um erro que cometeu
sem querer, ao encontrá-la.
Ao quebrar a única promessa que tinha feito a
Baltasar, Blimunda vê-o por dentro, vê a sua nuvem fechada, e captura a sua
alma, “que pertencia à terra e a Blimunda”.
Saramago, com estas personagens fictícias, quis
mostrar o que as pessoas de baixo escalão social, o povo, passavam no século
dezoito: a perseguição, o sofrimento, e o único sentimento com que se podia
contar, o verdadeiro amor.
No final, vemos Blimunda a ficar com a vontade
de Baltasar. Memorial eleva o amor
intenso já demonstrado nos capítulos anteriores, para o amor eterno, uma nova
forma de um romance ser épico e, ao mesmo tempo, cativar e emocionar os
leitores.
“Amar pelos dois” expressa essa interpretação de
amor eterno mostrada em Memorial,
sendo Blimunda e Baltasar unidos num só. O último verso da canção — “o meu coração
consegue amar pelos dois” — mostra tudo o que o fim de Memorial queria demonstrar.
#
<< Home