Cruz na porta da tabacaria!
Cruz na porta da tabacaria!
Quem morreu? O próprio Alves? Dou
Ao diabo o bem-star que trazia.
Desde ontem a cidade mudou.
Quem era? Ora, era quem eu via.
Todos os dias o via. Estou
Agora sem essa monotonia.
Desde ontem a cidade mudou.
Ele era o dono da tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou.
Eu passava ali de noite e de dia.
Desde ontem a cidade mudou.
Meu coração tem pouca alegria,
Vejo que a morte está onde estou.
Taipais jazigo — tabacaria!
Desde ontem a cidade mudou.
Mas ao menos a ele, alguém o via,
Ele era fixo. Eu, porque vou,
Não falto; por mim ninguém diria.
Desde ontem a cidade mudou.
Fernando Pessoa, Poemas
de Álvaro de Campos, série menor, edição de Cleonice Berardinelli, Lisboa,
INCM, 1992
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