Thursday, September 08, 2022

Aula 49-50

Aula 49-50 (13 [5.ª], 16/dez [1.ª, 3.ª], 3/jan [4.ª]) Correção do questionário de compreensão escrita de dois depoimentos sobre Fernão Lopes (ver Apresentação).

Segue-se uma versão simplificada do trecho do capítulo 11 da Crónica de D. João I, de Fernão Lopes, que temos, mas com a grafia antiga, no manual (pp. 81-83, até l. 74).

Já lemos, e ouvimos, a parte que está deste lado da folha. Vai lendo o que falta (a página seguinte) e escrevendo o resumo na folha que também tens à tua frente. Já aí está o resumo da parte que víramos na última aula. Prossegue tu com o resumo dos primeiros cinco parágrafos da página seguinte (ou seja, a parte dentro de esquadrilha).

Do alvoroço que foi na cidade cuidando que matavam o Mestre, e como lá foi Álvaro Pais e muitas gentes com ele

O pajem do Mestre, que estava à porta, como lhe disseram que fosse pela vila, segundo já era percebido, começou de ir rijamente a galope, em cima do cavalo em que estava, dizendo altas vozes, bradando pela rua:

— Matam o Mestre! Matam o Mestre nos paços da rainha! Acorrei ao Mestre que matam!

E assim chegou a casa de Álvaro Pais, que era dali grande espaço.

As gentes que isto ouviam saíam à rua ver que coisa era. E, começando de falar uns com os outros, alvoroçavam-se nas vontades e começavam de tomar armas, cada um como melhor e mais asinha podia.

Álvaro Pais, que estava prestes e armado com uma coifa na cabeça, segundo usança daquele tempo, cavalgou logo à pressa, em cima de um cavalo que anos havia que não cavalgara, e todos seus aliados com ele, bradando a quaisquer que achava, dizendo:

— Acorramos ao Mestre, amigos! Acorramos ao Mestre, ca filho é de el-rei D. Pedro!

E assim bradavam ele e o pajem, indo pela rua.

Soaram as vozes do ruído pela cidade, ouvindo todos bradar que matavam o Mestre. E, assim como viúva que rei não tinha, e como se lhe este ficara em logo de marido, se moveram todos com mão armada, correndo à pressa para onde diziam que se isto fazia, para lhe darem vida e escusar morte.

Álvaro Pais não quedava de ir para lá, bradando a todos:

— Acorramos ao Mestre, amigos! Acorramos ao Mestre que matam sem porquê!

A gente começou de se juntar a ele e era tanta, que era estranha coisa de ver. Não cabiam pelas ruas principais e atravessavam lugares escusos, desejando cada um de ser o primeiro; e, perguntando uns aos outros «quem matava o Mestre?», não minguava quem respondesse que o matava o conde João Fernandes, por mandado da rainha.

E, por vontade de Deus, todos feitos de um coração, com talente de o vingar, como foram às portas do paço, que eram já cerradas, antes que chegassem, com espantosas palavras, começaram de dizer:

— Onde matam o Mestre? Que é do Mestre? Quem cerrou estas portas?

Ali eram ouvidos brados de desvairadas maneiras. Tais aí havia que certificavam que o Mestre era morto, pois as portas estavam cerradas, dizendo que as britassem para entrar dentro, e veriam que era do Mestre ou que coisa era aquela.

Uns deles bradavam por lenha e que viesse lume, para porem fogo aos paços e queimar o traidor e a aleivosa. Outros se aficavam pedindo escadas para subir acima, pera verem que era do Mestre. E em tudo isto era o ruído tão grande, que se não entendiam uns com os outros, nem determinavam nenhuma coisa. E não somente era isto à porta dos paços, mas ainda ao redor deles por onde homens e mulheres podiam estar. Umas vinham com feixes de lenha, outras traziam carqueja para acender o fogo, cuidando queimar o muro dos paços com ela, dizendo muitos doestos contra a rainha.

De cima, não minguava quem bradasse que o Mestre era vivo e o conde João Fernandes morto. Mas isto não queria nenhum crer, dizendo:

— Pois se vivo é, mostrai-no-lo e vê-lo-emos.

Então os do Mestre, vendo tão grande alvoroço como este, e que cada vez se acendia mais, disseram que fosse sua mercê de se mostrar àquelas gentes; de outra guisa poderiam quebrar as portas, ou lhes pôr o fogo; e, entrando assim dentro por força, não lhes poderiam depois tolher de fazer o que quisessem.

Ali se mostrou o Mestre a uma grande janela que vinha sobre a rua, onde estava Álvaro Pais e a mais força de gente, e disse:

— Amigos, pacificai-vos, ca eu vivo e são sou, a Deus graças.

E tanta era a turvação deles e assim tinham já em crença que o Mestre era morto, que tais havia aí que aperfiavam que não era aquele; po­rém, conhecendo-o todos claramente, houveram grande prazer quan­do o viram, e diziam uns contra os outros:

— Oh, que mal fez! Pois que matou o traidor do conde, que não matou logo a aleivosa com ele! Credes em Deus: ainda lhe há de vir algum mal por ela. Olhai e vede que maldade tão grande! Mandaram-no chamar onde ia já de seu caminho, para o matarem aqui por traição. Oh aleivosa! Já nos matou um senhor e agora nos queria matar outro! Leixai-a, ca ainda há mal de acabar por estas cousas que faz.

E sem dúvida, se eles entraram dentro, não se escusara a rainha de morte, e fora maravilha quantos eram da sua parte e do conde poderem escapar.

O Mestre estava à janela e todos olhavam contra ele, dizendo:

— Ó senhor! Como vos quiseram matar por traição! Bendito seja Deus, que vos guardou desse traidor! Vinde-vos, dai ao demo esses paços, não sejais lá mais!

E, em dizendo isto, muitos choravam com prazer de o ver vivo.

Vendo ele então que nenhuma dúvida tinha em sua segurança, desceu a fundo e cavalgou com os seus, acompanhado de todos os outros, que era maravilha de ver. Os quais, mui ledos ao redor dele, bradavam, dizendo:

— Que nos mandais fazer, senhor? Que quereis que façamos?

E ele lhes respondia, mal podendo ser ouvido, que lho agradecia muito, mas que por então não havia deles mais mister.

Resumo:

O pajem do Mestre, conforme combinado, cavalgou pela cidade, gritando:

— Matam o Mestre nos paços da rainha! Acorram!

E chegou a casa de Álvaro Pais.

O povo, ouvindo o pajem, juntava-se nas ruas, indignava-se, pegava em armas.

Álvaro Pais, que já estava armado, cavalgou, com outros companheiros, gritando pelas ruas:

— Acorramos ao Mestre, porque é filho de D. Pedro!

E assim gritavam ele e o pajem.

Pela cidade se ouviu o apelo. Todos se deslocaram, armados, para onde se dizia que matavam o Mestre, para o salvar.

Álvaro Pais continuava a gritar:

— Acorramos ao Mestre que matam sem razão!

Muita gente se lhe juntou, enchendo as ruas. Perguntavam as pessoas «quem matava o Mestre?». Muitos respondiam que era o conde João Fernandes Andeiro, a mando da rainha.

Todos unidos pela vontade de o vingarem, e estando as portas do paço fechadas, começaram a perguntar:

— Onde matam o Mestre? Quem fechou estas portas?

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O Mestre apareceu à janela:

— Acalmai-vos, que estou vivo e são.

A ansiedade era tanta, que havia quem asseverasse que o Mestre tinha sido morto, mas, ao verem-no, alegravam-se e lamentavam:

— Tendo matado o conde, devia ter aproveitado para matar também a maldosa da rainha (que já nos matou o rei). Mas ela não perde pela demora!

Se tivessem entrado, nem a rainha nem os do seu lado teriam escapado.

Todos se dirigiam ao Mestre (à janela):

— Ainda bem que escapastes desse traidor! Vinde connosco!

E muitos choravam por o verem vivo.

Percebendo não haver perigo, o Mestre reuniu-se aos que o aclamavam, que, alegres, perguntavam:

— Que quereis que façamos?

E, embora mal o pudessem ouvir, agradeceu e disse que já não precisava deles.

Enquanto estiveres a ver o filme Língua — vidas em português, vai preenchendo os espaços que estão sublinhados:

País, Cidade

Personagem / Ocupação

Variedade geográfica, social, situacional

Características (que exemplificam algum tipo de variação)

Índia, Goa (Panjim)

Rosário / padeiro

Português ainda sobrevive, mas num contexto em que outras ____ predominam

Interferências do inglês («Eu prefer»).

Portugal, Lisboa

Belarmindo / guarda-freio

Variante (variedade) ___ do português; dialeto de ___ {Lisboa / Beira / Alentejo}

«tem que» (por «tem de»).

Brasil, Rio de Janeiro

Márcio / vendedor de rua

Variante ___ do português, num socioleto ___ {popular / culto}, em contexto relativamente ___ {formal / informal}.

Sintaxe: próclise («___ chama»); «nessa manhã» (por ‘___ manhã’); Léxico: «bala» (‘guloseima’). Fonética: palatalização de t: «tris[txi]» («triste»); ditongação em «ma[i]s» («mas»). Tratamento: você + ___ pessoa.

Moçambique, Maputo

Mia [Couto] / escritor

Variante ____ {africana / europeia} do português

Léxico: «normar» (‘regulamentar’).

Índia, Goa (Panjim)

Rosário

Rosário, além de português, fala hindi, inglês, «arabic».

Dificuldades no conjuntivo: «talvez faleceu» (‘talvez ____’).

Portugal, Lisboa

Zulmira e Paulo / reformados

Dialeto: ___; socioleto: ___.

Ligeiras hesitações: «niveles» (‘níveis’); «li[v]erdade» (‘liberdade’).

Portugal, Lisboa, Belarmindo

 

 

Moçambique, Maputo

Izdine / radialista

Como se trata de programa de rádio, o meio ___ {oral / escrito} é um tanto falso: o discurso está preparado e o registo só aparentemente é ___ {formal / informal}.

Fonética: vocalismo menos reduzido: «Beir[á]».

Moçambique, Beira

Dinho / estudante

Variante ____ do português, por parte de adolescente que terá outra língua materna (talvez uma língua do grupo bantu).

Sintaxe: «ele» como complemento direto: «conheço ele» (‘conheço-o’); ênclise nas subordinadas: «quando desligou-se energia» (‘se desligou’). Léxico: «já» (por ‘logo’).

Brasil, Rio de Janeiro

Rejane / vendedora de imobiliário

O registo não pode ser muito ___, já que se fala com clientes.

Sintaxe: próclise: «__ perdoe» (‘perdoe-me’).

Brasil, Rio de Janeiro

Rogério [e Márcio] / pregador

Socioleto: português popular (com infrações várias à norma culta brasileira).

Sintaxe: marcas do plural simplificadas («essas bala»; «elas pesa»); «mim» como sujeito («para mim organizar»). Léxico: «tem» (‘há’); «açougue» (‘talho’). Fonética: epêntese («corrup[i]ta»); cr por cl («cic[r]one»); -r omitido («ri» por «___»); vocalismo átono pouco reduzido («porqu[ê]» por «porque»).

Moçambique, Beira

Dinho [e Deolinda]

 

Léxico: «a caminho de mais velha»; «dar uma mão direita».

Moçambique, Inhaca

Mia Couto

Tratando-se de escritor inventivo, é difícil distinguir o que é «neologístico» e o que é devido à variante __.

Léxico: «normar» (‘regulamentar’); «os mais velhos»; «outras» (‘diferentes’).

Brasil, Rio (Barra da Tijuca)

Rejane

 

Fonética: r final omitido («m[á]» por «___»); palatalização de t e d («gen[txi]», «ver[dxi]»); ditongações («l[uis]» por «__»).

Moçambique, Beira, Dinho

 

Sintaxe: possessivo sem artigo («__ duas irmãs»).

Moçambique, Inhaca, Mia Couto

 

 

Portugal, Lisboa

Uliengue e Sofia / estudantes

Nascidos em Angola e Moçambique.

Fonética: vocalismo átono menos reduzido. Sintaxe: ênclise («Todos os vizinhos ___») em casos de próclise no português europeu.

Portugal, Lisboa

José Saramago / escritor

Variante ___ do português. Dialeto de ___.

 

Índia, Goa (Loutolim)

Mário e Emiliano / proprietários

 

 

Portugal, Lisboa

José Saramago

Registo formal, mas não demasiado «purista».

«tinha que» (por «tinha de»).

O filme Expiação (Atonement) é baseado num romance de Ian McEwan. Tem o interesse de salientar a diferença entre narrador (e, também, sujeito lírico ou sujeito poético) e escritor. Habitualmente, a confusão entre estas duas entidades é relativamente fácil de se fazer — e, ainda mais, quando a narração usa a 1.ª pessoa.

Expiação organiza-se em, pelo menos, dois níveis narrativos. O protagonista de um deles — uma escritora —, supostamente identificável com o narrador da história primeira, vai comprovar-nos a distinção que referi. Mas só o perceberemos no final.

Na parte inicial, fica sobretudo evidente a diferença entre diegese (história, realidade) e discurso (narração). Temos, por exemplo, uma mesma parte da ação mostrada duas vezes, sem cumprir, no tempo do discurso, a ordem do tempo da diegese, e vincando a faculdade narrativa de se variar a focalização (o ponto de vista segundo o qual os acontecimentos nos são apresentados).

TPC — Vai lendo livros combinados, ponderando nova leitura assim que termines o que estejas a ler. (Se não o fizeste ainda, responde na Classroom acerca de livros a ler).

 

 

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