Aula 49-50
Aula
49-50 (13
[5.ª], 16/dez [1.ª, 3.ª], 3/jan [4.ª]) Correção do questionário de compreensão
escrita de dois depoimentos sobre Fernão Lopes (ver Apresentação).
Segue-se uma versão
simplificada do trecho do capítulo 11 da Crónica de D. João I, de Fernão
Lopes, que temos, mas com a grafia antiga, no manual (pp. 81-83, até
l. 74).
Já lemos, e ouvimos, a parte que está deste
lado da folha. Vai lendo o que falta (a página seguinte) e escrevendo o resumo
na folha que também tens à tua frente. Já aí está o resumo da parte que víramos
na última aula. Prossegue tu com o resumo dos primeiros cinco parágrafos da
página seguinte (ou seja, a parte dentro de esquadrilha).
Do alvoroço que foi na cidade cuidando que matavam o Mestre, e como lá foi Álvaro Pais e muitas gentes com ele
O pajem do Mestre, que
estava à porta, como lhe disseram que fosse pela vila, segundo já era
percebido, começou de ir rijamente a galope, em cima do cavalo em que estava,
dizendo altas vozes, bradando pela rua:
— Matam o Mestre! Matam o
Mestre nos paços da rainha! Acorrei ao Mestre que matam!
E assim chegou a casa de
Álvaro Pais, que era dali grande espaço.
As gentes que isto ouviam
saíam à rua ver que coisa era. E, começando de falar uns com os outros, alvoroçavam-se
nas vontades e começavam de tomar armas, cada um como melhor e mais asinha
podia.
Álvaro Pais, que estava
prestes e armado com uma coifa na cabeça, segundo usança daquele tempo,
cavalgou logo à pressa, em cima de um cavalo que anos havia que não cavalgara,
e todos seus aliados com ele, bradando a quaisquer que achava, dizendo:
— Acorramos ao Mestre,
amigos! Acorramos ao Mestre, ca filho é de el-rei D. Pedro!
E assim bradavam ele e o
pajem, indo pela rua.
Soaram as vozes do ruído
pela cidade, ouvindo todos bradar que matavam o Mestre. E, assim como viúva que
rei não tinha, e como se lhe este ficara em logo de marido, se moveram todos
com mão armada, correndo à pressa para onde diziam que se isto fazia, para lhe
darem vida e escusar morte.
Álvaro Pais não quedava de
ir para lá, bradando a todos:
— Acorramos ao Mestre,
amigos! Acorramos ao Mestre que matam sem porquê!
A gente começou de se
juntar a ele e era tanta, que era estranha coisa de ver. Não cabiam pelas ruas
principais e atravessavam lugares escusos, desejando cada um de ser o primeiro;
e, perguntando uns aos outros «quem matava o Mestre?», não minguava quem
respondesse que o matava o conde João Fernandes, por mandado da rainha.
E, por vontade de Deus,
todos feitos de um coração, com talente de o vingar, como foram às portas do
paço, que eram já cerradas, antes que chegassem, com espantosas palavras,
começaram de dizer:
— Onde matam o Mestre? Que
é do Mestre? Quem cerrou estas portas?
Ali
eram ouvidos brados de desvairadas maneiras. Tais aí havia que certificavam que
o Mestre era morto, pois as portas estavam cerradas, dizendo que as britassem
para entrar dentro, e veriam que era do Mestre ou que coisa era aquela.
Uns
deles bradavam por lenha e que viesse lume, para porem fogo aos paços e queimar
o traidor e a aleivosa. Outros se aficavam pedindo escadas para subir acima,
pera verem que era do Mestre. E em tudo isto era o ruído tão grande, que se não
entendiam uns com os outros, nem determinavam nenhuma coisa. E não somente era
isto à porta dos paços, mas ainda ao redor deles por onde homens e mulheres podiam
estar. Umas vinham com feixes de lenha, outras traziam carqueja para acender o
fogo, cuidando queimar o muro dos paços com ela, dizendo muitos doestos contra
a rainha.
De
cima, não minguava quem bradasse que o Mestre era vivo e o conde João Fernandes
morto. Mas isto não queria nenhum crer, dizendo:
—
Pois se vivo é, mostrai-no-lo e vê-lo-emos.
Então
os do Mestre, vendo tão grande alvoroço como este, e que cada vez se acendia
mais, disseram que fosse sua mercê de se mostrar àquelas gentes; de outra guisa
poderiam quebrar as portas, ou lhes pôr o fogo; e, entrando assim dentro por
força, não lhes poderiam depois tolher de fazer o que quisessem.
Ali se mostrou o Mestre a
uma grande janela que vinha sobre a rua, onde estava Álvaro Pais e a mais força
de gente, e disse:
— Amigos, pacificai-vos,
ca eu vivo e são sou, a Deus graças.
E tanta era a turvação
deles e assim tinham já em crença que o Mestre era morto, que tais havia aí que
aperfiavam que não era aquele; porém, conhecendo-o todos claramente, houveram
grande prazer quando o viram, e diziam uns contra os outros:
— Oh, que mal fez! Pois
que matou o traidor do conde, que não matou logo a aleivosa com ele! Credes em
Deus: ainda lhe há de vir algum mal por ela. Olhai e vede que maldade tão grande!
Mandaram-no chamar onde ia já de seu caminho, para o matarem aqui por traição.
Oh aleivosa! Já nos matou um senhor e agora nos queria matar outro! Leixai-a,
ca ainda há mal de acabar por estas cousas que faz.
E sem dúvida, se eles
entraram dentro, não se escusara a rainha de morte, e fora maravilha quantos
eram da sua parte e do conde poderem escapar.
O Mestre estava à janela e
todos olhavam contra ele, dizendo:
— Ó senhor! Como vos
quiseram matar por traição! Bendito seja Deus, que vos guardou desse traidor! Vinde-vos,
dai ao demo esses paços, não sejais lá mais!
E, em dizendo isto, muitos
choravam com prazer de o ver vivo.
Vendo ele então que
nenhuma dúvida tinha em sua segurança, desceu a fundo e cavalgou com os seus,
acompanhado de todos os outros, que era maravilha de ver. Os quais, mui ledos ao
redor dele, bradavam, dizendo:
— Que nos mandais fazer,
senhor? Que quereis que façamos?
E ele lhes respondia, mal
podendo ser ouvido, que lho agradecia muito, mas que por então não havia deles
mais mister.
Resumo:
O pajem do Mestre, conforme
combinado, cavalgou pela cidade, gritando:
— Matam o Mestre nos paços
da rainha! Acorram!
E chegou a casa de Álvaro
Pais.
O povo, ouvindo o pajem,
juntava-se nas ruas, indignava-se, pegava em armas.
Álvaro Pais, que já estava
armado, cavalgou, com outros companheiros, gritando pelas ruas:
— Acorramos ao Mestre, porque
é filho de D. Pedro!
E assim gritavam ele e o pajem.
Pela cidade se ouviu o apelo.
Todos se deslocaram, armados, para onde se dizia que matavam o Mestre, para o
salvar.
Álvaro Pais continuava a
gritar:
— Acorramos ao Mestre que
matam sem razão!
Muita gente se lhe juntou,
enchendo as ruas. Perguntavam as pessoas «quem matava o Mestre?». Muitos
respondiam que era o conde João Fernandes Andeiro, a mando da rainha.
Todos unidos pela vontade de
o vingarem, e estando as portas do paço fechadas, começaram a perguntar:
— Onde matam o Mestre? Quem fechou estas
portas?
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O Mestre apareceu à janela:
— Acalmai-vos, que estou
vivo e são.
A ansiedade era tanta, que
havia quem asseverasse que o Mestre tinha sido morto, mas, ao verem-no,
alegravam-se e lamentavam:
— Tendo matado o conde,
devia ter aproveitado para matar também a maldosa da rainha (que já nos matou o
rei). Mas ela não perde pela demora!
Se tivessem entrado, nem a
rainha nem os do seu lado teriam escapado.
Todos se dirigiam ao
Mestre (à janela):
— Ainda bem que escapastes
desse traidor! Vinde connosco!
E muitos choravam por o
verem vivo.
Percebendo não haver
perigo, o Mestre reuniu-se aos que o aclamavam, que, alegres, perguntavam:
— Que quereis que façamos?
E, embora mal o pudessem
ouvir, agradeceu e disse que já não precisava deles.
Enquanto estiveres a ver o filme Língua — vidas em português, vai preenchendo
os espaços que estão sublinhados:
País, Cidade Personagem / Ocupação |
Variedade geográfica,
social, situacional |
Características (que exemplificam
algum tipo de variação) |
Índia, Goa (Panjim) Rosário
/ padeiro |
Português
ainda sobrevive, mas num contexto em que outras ____ predominam |
Interferências
do inglês («Eu prefer»). |
Portugal, Lisboa Belarmindo
/ guarda-freio |
Variante
(variedade) ___ do português; dialeto de ___ {Lisboa / Beira / Alentejo} |
«tem
que» (por «tem de»). |
Brasil, Rio de Janeiro Márcio
/ vendedor de rua |
Variante
___ do português, num socioleto ___ {popular
/ culto}, em contexto relativamente ___ {formal / informal}. |
Sintaxe: próclise («___ chama»);
«nessa manhã» (por ‘___ manhã’); Léxico:
«bala» (‘guloseima’). Fonética:
palatalização de t: «tris[txi]» («triste»); ditongação em «ma[i]s» («mas»). Tratamento: você + ___ pessoa. |
Moçambique, Maputo Mia
[Couto] / escritor |
Variante
____ {africana / europeia} do português |
Léxico: «normar» (‘regulamentar’). |
Índia, Goa (Panjim) Rosário |
Rosário,
além de português, fala hindi, inglês, «arabic». |
Dificuldades
no conjuntivo: «talvez faleceu» (‘talvez ____’). |
Portugal, Lisboa Zulmira
e Paulo / reformados |
Dialeto:
___; socioleto: ___. |
Ligeiras
hesitações: «niveles» (‘níveis’); «li[v]erdade» (‘liberdade’). |
Portugal,
Lisboa, Belarmindo |
|
|
Moçambique, Maputo Izdine
/ radialista |
Como
se trata de programa de rádio, o meio ___ {oral / escrito} é um tanto falso: o discurso está preparado e o
registo só aparentemente é ___ {formal
/ informal}. |
Fonética: vocalismo menos reduzido:
«Beir[á]». |
Moçambique, Beira Dinho
/ estudante |
Variante
____ do português, por parte de adolescente que terá outra língua materna (talvez
uma língua do grupo bantu). |
Sintaxe: «ele» como complemento
direto: «conheço ele» (‘conheço-o’); ênclise nas subordinadas: «quando
desligou-se energia» (‘se desligou’). Léxico:
«já» (por ‘logo’). |
Brasil, Rio de Janeiro Rejane
/ vendedora de imobiliário |
O
registo não pode ser muito ___, já que se fala com clientes. |
Sintaxe: próclise: «__ perdoe»
(‘perdoe-me’). |
Brasil, Rio de Janeiro Rogério
[e Márcio] / pregador |
Socioleto:
português popular (com infrações várias à norma culta brasileira). |
Sintaxe: marcas do plural simplificadas
(«essas bala»; «elas pesa»); «mim» como sujeito («para mim organizar»). Léxico: «tem» (‘há’); «açougue»
(‘talho’). Fonética: epêntese («corrup[i]ta»);
cr por cl («cic[r]one»); -r omitido
(«ri» por «___»); vocalismo átono pouco reduzido («porqu[ê]» por «porque»). |
Moçambique, Beira Dinho
[e Deolinda] |
|
Léxico: «a caminho de mais
velha»; «dar uma mão direita». |
Moçambique, Inhaca Mia
Couto |
Tratando-se
de escritor inventivo, é difícil distinguir o que é «neologístico» e o que é
devido à variante __. |
Léxico: «normar» (‘regulamentar’);
«os mais velhos»; «outras» (‘diferentes’). |
Brasil, Rio (Barra da Tijuca) Rejane |
|
Fonética: r final omitido («m[á]» por «___»); palatalização de t e d («gen[txi]», «ver[dxi]»); ditongações («l[uis]» por «__»). |
Moçambique, Beira, Dinho |
|
Sintaxe: possessivo sem artigo («__
duas irmãs»). |
Moçambique,
Inhaca, Mia Couto |
|
|
Portugal, Lisboa Uliengue
e Sofia / estudantes |
Nascidos
em Angola e Moçambique. |
Fonética: vocalismo átono menos
reduzido. Sintaxe: ênclise («Todos
os vizinhos ___») em casos de próclise no português europeu. |
Portugal, Lisboa José
Saramago / escritor |
Variante
___ do português. Dialeto de ___. |
|
Índia, Goa (Loutolim) Mário
e Emiliano / proprietários |
|
|
Portugal, Lisboa José
Saramago |
Registo
formal, mas não demasiado «purista». |
«tinha
que» (por «tinha de»). |
O filme Expiação
(Atonement) é baseado num romance de Ian McEwan.
Tem o interesse de salientar a diferença entre narrador (e, também, sujeito
lírico ou sujeito poético) e escritor. Habitualmente, a
confusão entre estas duas entidades é relativamente fácil de se fazer — e,
ainda mais, quando a narração usa a 1.ª pessoa.
Expiação
organiza-se em, pelo menos, dois níveis narrativos. O protagonista de um deles
— uma escritora —, supostamente identificável com o narrador da história
primeira, vai comprovar-nos a distinção que referi. Mas só o perceberemos no
final.
Na
parte inicial, fica sobretudo evidente a diferença entre diegese
(história, realidade) e discurso (narração). Temos, por exemplo, uma
mesma parte da ação mostrada duas vezes, sem cumprir, no tempo do discurso,
a ordem do tempo da diegese, e vincando a faculdade narrativa de se variar
a focalização (o ponto de vista segundo o qual os acontecimentos nos são
apresentados).
TPC — Vai lendo livros
combinados, ponderando nova leitura assim que termines o que estejas a ler. (Se
não o fizeste ainda, responde na Classroom acerca de livros a ler).
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