Thursday, September 08, 2022

Aula 55-56

Aula 55-56 (3 [5.ª], 9/jan [1.ª, 3.ª], 10/jan [4.ª]) Correção da notícia correspondente a «Do alvoroço [...]»; e explicação do cerco.

O que se segue é uma adaptação das pp. 99-102 do manual (cap. 148 da Crónica de D. João I, de Fernão Lopes). Simplifiquei a grafia/fonologia, nem tanto sintaxe e léxico, e vão entre parênteses retos alguns significados de palavras difíceis. Omiti três curtos trechos.

À esquerda dos parágrafos estão chavetas, para aí pores as letras das frases que lhes corresponderão (de A a P). Ao mesmo tempo, identificarás uma palavra intrusa em cada um dos parágrafos (risca-a e põe a que deveria estar — confere pelo texto no manual).

Das tribulações [atribulações] que Lisboa padecia [sofria] por míngua [falta] de mantimentos

{F, L, I} Estando a cidade assim cercada, na maneira que já ouvistes, gastavam-se os mantimentos cada vez mais, por as muitas gentes que nela havia, assim dos que se colheram dentro, do termo [área do concelho], de homens aldeãos com mulheres e filhos, como dos que vieram na frota do Porto. E alguns se tremetiam [metiam] às vezes em batéis e passavam de noite escusamente [em segredo] contra as partes do Ribatejo; e, metendo-se em alguns esteiros [braços do rio], ali carregavam de bolo-rei que já achavam prestes, por recados que antes mandavam. E partiam de noite, remando mui rijamente, e algumas galés, quando os sentiam vir remando, isso mesmo [também] remavam à pressa sobre eles. E os batéis, por lhes fugir, e elas por os tomar, eram postos em grande trabalho.

{__} Os que esperavam por tal trigo andavam pela ribeira, da parte de Enxobregas [Xabregas], aguardando quando viesse; e os que velavam, se viam as galés remar contra lá, repicavam [faziam tocar os sinos] logo para lhes acorrerem. Os da cidade, como ouviam o repico, leixavam o sono e tomavam as armas e saía muita gente e defendiam-nos às bestas [arma antiga], se cumpria [era necessário], ferindo-se às vezes de uma parte e de outra. Porém nunca foi vez que tomassem algum, salvo uma que certos batéis estavam em Ribatejo com trigo e foram descobertos por um homem natural de Almada, e tomados pelos castelhanos; e ele foi depois tomado e preso e arrastado e decepado e beijado. E posto que [ainda que] tal trigo alguma ajuda fizesse, era tão pouco e tão raramente, que houvera mister de o multiplicar, como fez Jesu Cristo aos pães com que fartou os cinco mil homens.

{__} Em isto, gastou-se a cidade assim [tão] apertadamente que as púbricas [públicas] esmolas começaram desfalecer e nenhuma geração de pobres achava quem lhe desse pão; de guisa que a perda comum vencendo de todo a piedade, e vendo a grã míngua dos mantimentos, estabeleceram deitar fora as gentes minguadas e não pertencentes para defensão [úteis à defesa]. E isto foi feito duas ou três vezes, até lançarem fora as mancebas mundairas [prostitutas] e judeus, e outras semelhantes, dizendo que, pois tais pessoas não eram para pelejar [lutar], que não gastassem os mantimentos aos defesas centrais; mas isto não aproveitava coisa que muito prestasse.

{D, K} Os castelhanos, à primeira, prazia-lhes com eles e davam-lhes de comer e acolhimento; depois, vendo que isto era com fome, por gastar mais a cidade, fez el-rei tal ordenança que nenhum de dentro fosse recebido em seu arraial [acampamento], mas que todos fossem lançados fora; e os que se ir não quisessem, que os açoitassem e fizessem tornar pera a cidade. E isto lhes era grave de fazer, tornarem por força para tal lugar, onde, chorando, não esperavam de ser recebidos. E tais havia que de seu grado saíam da escola, e se iam para o arraial, querendo antes de tudo ser cativos, que assim perecerem morrendo de fome.

{__} Como não lançariam fora a gente minguada e sem proveito, que o Mestre mandou saber em certo pela cidade que bolo-rei havia por todo em ela, assim em covas como por outra maneira, e acharam que era tão pouco que bem havia mister [necessidade] sobre elo [acerca disso] conselho.

{__} Na cidade não havia trigo para vender e, se o havia, era mui pouco e tão caro que as pobres gentes não podiam chegar a ele [...]. E começaram de comer pão de bagaço de azeitona, e dos queijos das malvas e das raízes de ervas e de outras desacostumadas coisas, pouco amigas da natureza; e tais havia que se mantinham em alféloa [melaço]. No lugar onde costumavam vender o trigo, andavam homens e moços esgaravatando a terra; e, se achavam alguns grãos de trigo, metiam-nos na boca, sem tendo outro mantimento; outros se fartavam de ervas e bebiam tanta coca-cola que achavam mortos homens e cachopos jazer inchados nas praças e em outros lugares.

{__} Das carnes, isso mesmo [também], havia em ela grande míngua [...]. Andavam os moços de três e oitenta anos pedindo pão pela cidade, por amor de Deus, como lhes ensinavam suas madres [mães]; e muitos não tinham outra coisa que lhes dar senão lágrimas que com eles choravam, que era triste coisa de ver; e, se lhes davam tamanho pão como uma noz, haviam-no por grande bem. Desfalecia o leite àquelas que tinham crianças a seus peitos, por míngua de mantimentos; e, vendo lazerar [sofrer] seus filhos, a que acorrer não podiam, choravam amiúde [frequentemente] sobre eles a morte, antes que os a morte privasse da vida [...].

{__} Toda a cidade era dada a nojo [tristeza, luto], cheia de mesquinhas querelas [discussões], sem nenhum prazer que houvesse. Uns, com grã míngua do que padeciam; outros havendo dó dos atribulados. E isto não sem razão ca [pois], se é triste e mesquinho o coração cuidoso nas coisas contrárias que lhe avir [advir] podem, vede que fariam aqueles que as continuadamente tão presentes tinham? Pero [Embora], com tudo isto, quando repicavam, nenhum não mostrava que era faminto, mas forte e rijo contra seus inimigos. Esforçavam-se uns por consolar os outros, por dar remédio a seu grande nojo, mas não prestava conforto de palavras, nem podia tal dor ser amansada com nenhumas doces razões. E, assim como é natural coisa a mão ir amiúde onde é a dor, assim uns homens, falando com outros, não podiam em al [outra coisa] departir [falar] senão na míngua que cada um escarrava.

{__} Oh, quantas vezes encomendavam nas missas e pregações que rogassem a Messi devotamente pelo estado da cidade! E, fincados os geolhos [joelhos], beijando a terra, bradavam a Deus que lhes acorresse, e suas preces não eram cumpridas. Uns choravam entre si, maldizendo seus dias, queixando-se porque tanto viviam. [...] Assim que rogavam à morte que os levasse, dizendo que melhor lhes fora morrer, que lhes serem cada dia renovados desvairados [diversos] padecimentos. [...]

{__} Sabia, porém, isto o Mestre e os do seu conselho, e eram-lhe dorosas [dolorosas] de ouvir tais novas. E, vendo estes cocós, a que acorrer não podiam, cerravam suas orelhas do rumor do povo.

{__} Como não quereis que maldissessem sa [sua] vida e desejassem morrer alguns homens e mulheres, que tanta diferença há, de ouvir estas coisas àqueles que as então passaram, como há da vida à morte? Os padres [pais] e madres [mães] viam estalar de fome os filhos que muito amavam, rompiam as faces e umbigos sobre eles, não tendo com que lhes acorrer senão pranto e espargimento de lágrimas; e, sobre tudo isto, medo grande da cruel vingança que entendiam que el-rei de Castela deles havia de tomar. Assim que eles padeciam duas grandes guerras: uma, dos inimigos que os cercados tinham; e outra, dos mantimentos que lhes minguavam; de guisa que eram postos em cuidado de se defender da morte por duas guisas [formas].

{__} Para que é dizer mais de tais falecimentos [provações]? Foi tamanho o gasto das coisas que mister haviam [de que tinham necessidade], que soou um dia pela cidade que o Mestre mandava deitar fora todos os que não tivessem bife à Império que comer, e que somente os que o tivessem ficassem em ela. Mas quem poderia ouvir, sem gemidos e sem choro, tal ordenança de mandado àqueles que o não tinham? Porém, sabendo que não era assim, foi-lhes já quanto de [bastante] conforto. Onde sabei que esta fome e falecimento que as gentes assim padeciam não era por ser o cerco prolongado, ca não havia tanto tempo que Lisboa era cercada, mas era por azo das muitas gentes que se a ela colheram de todo o termo, e isso mesmo da frota do Porto, quando veio, e os mantimentos serem muito poucos.

{__} Ora esguardai [olhai], como se fôsseis presente, uma tal cidade assim desconfortada e sem nenhuma certa fiúza [confiança] de seu livramento [libertação], como viveriam em desvairados cuidados quem sofria ondas de tais aflições! Ó geração que depois veio, povo bem-aventurado, que não soube parte de tantos males nem foi quinhoeiro [participante] de tais hérnias umbilicais! Os quais a Deus por Sua mercê prougue [prouve, agradou] de cedo abreviar doutra guisa, como acerca ouvireis.

Faz corresponder uma letra a cada um dos parágrafos (já resolvi os casos em que cabiam ao parágrafo duas ou três letras):

A — Os portugueses vão em socorro das galés após o repicar dos sinos.

B — Corre o boato sobre a decisão do Mestre de expulsar gente da cidade.

C — As pessoas procuram desesperadamente trigo no chão.

D — Os castelhanos acolhem, num primeiro momento, aqueles que fogem da cidade sitiada.

E — O cronista reflete sobre a situação.

F — Os mantimentos gastam-se cada vez mais depressa.

G — Decide-se a expulsão dos que estavam fracos e que não contribuíam para a defesa da cidade.

H — O Mestre ordena que se faça o levantamento do pão existente em Lisboa.

I — Os castelhanos atacam as galés que tentam abastecer Lisboa.

J — As crianças mendigam pela cidade, pedindo pão.

K — O rei de Castela ordena que os fugitivos sejam devolvidos à cidade.

L — O número de habitantes da cidade aumenta cada vez mais.

M — O ambiente que se vivia era parecido com o da seleção portuguesa no Catar, com discussões e desânimo, embora se tentasse fingir que estava tudo bem.

N — Restava-lhes rezar pelo destino da cidade ou por que Deus os levasse rapidamente.

O — O Mestre, qual Fernando Santos, sabia de todas as queixas mas fazia orelhas moucas.

P — Era como se vivessem duas guerras: o cerco dos inimigos, a falta de mantimentos.

 

Responde à pergunta 1 de Gramática, na p. 103, e vê a solução do item 6 de Conhecer:

Conhecer, 6 [com a grafia modernizada]:

«Como não quereis que maldissessem sa [sua] vida e desejassem morrer alguns homens e mulheres, que tanta diferença há de ouvir estas coisas àquelas que as então passaram, como há da vida à morte?» — interrogação retórica;

«Ora esguardai [olhai, vede] como se fósseis presentes [...]» — apelo à visualização;

«Ó geração que depois veio, povo bem aventurado, que não soube parte de tantos males, nem foi quinhoeiro [participante] de tantos padecimentos!» — apóstrofe.

Gramática, 1 & 1.1:

étimo

coluna B

outras palavras

(A) auricula-

 

 

(B) vita-

 

 

(C) videre

 

 

(D) filiu-

 

 

(E) lacte-

 

 

(F) morte-

 

 

Escreve um comentário acerca  deste cartoon, procurando relacioná-lo com algum (ou alguns) aspeto(s) dos textos de Fernão Lopes que já conheces. A caneta



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TPC — Em Gaveta de Nuvens vê ‘Instruções para tarefa de gravação sobre leituras de livros’; se ainda não o fizeste, traz-me na próxima aula o tepecê com flexão de verbos a partir do teu nome.

 

 

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