Thursday, August 23, 2018

Tarefas interessantes (avaliadas e comentadas)



Juntei aqui os trabalhos elaborados a pensar num dos três «concursos interessantes» (Calouste, Olimpíadas da cultura clássica, Inês & Pedro).
O primeiro já se efetuou (Tita ficou em 2.º lugar).
Para o segundo concurso, o de Cultura Clássica, a escola escolherá três trabalhos (dos cinco que reproduzo mais à frente, ou, se houver, dos que saiam de outras turmas) e enviá-los-á a concurso; o resultado nacional saber-se-á em maio, mas, ainda antes disso, lá para finais de abril, saberemos quais os três trabalhos que o júri da escola escolheu [atualização: foram escolhidos os trabalhos de B. Entrezede, Guilherme, Mafalda F., Natacha (11.º 5.ª), «Dido e Eneias, o musical»; Marta (11.º 2.ª), «Perseu e Andrómeda — a magia das armas que sangram amor»; e de Eduardo, Júlia, Margarida, Rodrigo (11.º 4.ª), «Os deuses é que escolhem as maravilhas dos homens»]. Os meus comentários e apreciações aqui não têm que ver com essa escolha e nem serão do conhecimento de quem vai decidir. 
Para enviar ao concurso de Inês e Pedro, a escola só pode escolher um trabalho e terá de o fazer brevissimamente (quando souber mais, lhes direi, embora, também neste caso, não integre o júri) [atualização: foi escolhido trabalho de Joana, Laura & Mafalda (11.º 4.ª), «Pedro e Inês»]. O resultado do concurso propriamente dito saber-se-á a 31 de maio.

Calouste

Tita (11.º 3.ª) — «Intemporalidade fugaz» (Muito Bom)
Sintetizarei o que está dito na memória descritiva apresentada com o trabalho, que dará ideia de que se trata a quem não queira ler o conto todo. O género do texto pode situar-se entre conto e crónica de viagem. Neste último caso, seria uma peripécia de passeio que decorre mais no tempo, propriamente, do que num espaço. Calouste regressa e confronta-se com o que, a pouco e pouco, vai percebendo serem resultados do seu legado. Essa observação, mais saliente à medida que se avança no texto, entrecruza-se alusões de índole memorialística. Reconhecem-se espaços da Lisboa de hoje, filtrados pelo olhar do herói. O narrador não é autodiegético (nem mesmo homodiegético) e, no entanto, através da focalização interna, colocada na perspetiva da personagem Calouste, conseguimos acompanhar o que seria a personalidade do homenageado. Acrescentarei que o conto está muito bem escrito. Só não gosto do título (um pouco pomposo, parece-me).

Inês C. & Inês S. (11.º 3.ª) — «Sonhar é fácil? (peça em três atos muito curtos)» (Muito Bom)
Para dar ideia do trabalho, usarei partes da memória descritiva que acompanhou a peça das Ineses. A peça é um pequeno drama moral, com apenas cinco cenas, que alude à época da formação de Calouste e ao debate íntimo que terá sentido quanto à área de estudos que preferiria prosseguir. Sabe-se que Calouste, depois da frequência do ensino liceal em Londres, no King’s College, ponderava estudar matérias científicas e práticas (geologia, engenharia mecânica), em detrimento dos estudos clássicos para que o pai pensara remetê-lo. O tema interessou as duas autoras porque nele se antecipa uma discussão que sentimos hoje também, no século XXI e em Portugal. Com efeito, os estudantes sensivelmente da idade que tinha o Calouste que frequentava o ciclo secundário em Londres confrontam-se com a mesma necessidade de optarem pela área de formação em que hão de prosseguir os estudos. Podem aliás acontecer, hoje como há centro e trinta e tal anos, pressões no sentido de se enveredar por esta ou por aquela área de formação. Assim, Sonhar é fácil? lembra o caso de Calouste, põe depois estudantes do nosso tempo a viverem a mesma situação e, por fim, a decidirem sobre as suas vidas inspirados no caso do arménio e no trabalho que sobre ele fizeram. É uma excelente peça, bem escrita, que peca só por, nos diálogos em que intervêm os jovens de hoje, a linguagem estar demasiado direta (chega-se logo ao que a personagem quer dizer, quando, na vida real, é tudo menos simples, há matizes).

Miguel B. (11.º 2.ª) — «Contradições» (Suficiente +/Bom-)
O autor adotou o formato de poema, ainda que sem rima nem regularidade métrica. Desta preferência pelo modo lírico mas sem as convenções da poesia mais formal resulta uma «voz» que soa enigmática, contraditória, complexa, como seria talvez a personalidade de Calouste Sarkis Gulbenkian. Essencialmente, trata-se das consequências da exploração do petróleo, com um olhar ecologista. É um tema mais do século XXI, e da segunda metade do século passado, que Calouste não podia valorizar como fazemos hoje. Ponto de partida foi bem escolhido. No entanto, para efeitos de concurso, poema teria de ser mais longo. Não seria aliás difícil encontrar mais «contradições» na figura que se homenageava.

Camily (11.º 2.ª) — [Pequeno texto de cariz narrativo em torno de Calouste e prisão] (Bom -)
Entre parênteses retos já sintetizei o tema da redação de Camily, que já constituía uma segunda versão de texto que me foi apresentado (e que não publico porque não foi enviado a concurso e não tenho comigo agora o texto que li). Como digo no comentário ao poema de Miguel, faltou maior desnvolvimento (e, talvez também, investigação mais profunda). Narrativa estava bem escrita.

Cultura clássica

[Dido e Eneias]

B. Entrezede, Guilherme, Mafalda, Natacha (11.º 5.ª) — «Dido e Eneias, o Musical» (Muito Bom)
Já o tenho dito outras vezes. O vídeo, o cinema, implica planificar, coordenar, obriga a que nada seja feito sobre o joelho (texto, música, espaços). Também é uma arte de composição a partir de outras artes. Ora, neste trabalho, entrou a literatura — escrita de poemas e de texto —, a literatura-história — o conhecimento da Eneida e da mitologia —, a música — criação das composições —, a dança/ginástica — coreografia e execução —, a própria história do cinema, na medida em há uma óbvia intertextualidade com filmes musicais. O grande mérito deste grupo foi saber planear tudo de modo a que, em relativamente pouco tempo de filme, tenhamos imensas coisas e tão diversificadas. Todas as peripécias do mito em causa — que, como sempre nas narrativas da antiguidade e na mitologia, não são poucas — são percorridas por alusões em composições musicais, na história de adormecer ou na representação. Só não gosto, no genérico final, de «lyrics» (preferia, em português, «letra da canção»). Aí, no genérico, anotei que um dos «câmaras» foi o Tiago.

[Perseu e Andrómeda]

Marta (11.º 2.ª) — «Perseu e Andrómeda: a magia das armas que sangram amor» (Muito Bom)
Tal como em outros vídeos de Marta fugiu-se à abordagem informativa ou de simples relato do tópico de que se trata e preferiu-se adotar formato de criação mais poética que, ainda assim, tem como pano de fundo o mito de Perseu e Andrómeda. O resultado é requintado, metafórico, difícil (permite muitas leituras), constituindo um objeto com bom gosto (destaco também o tratamento da imagem e do som), que vale por si próprio, mesmo fora do contexto escolar ou de concurso sobre cultura clássica.

Ana, Beatriz Pi, Leonor, Rita (11.º 5.ª) — «A História de Perseu e Andrómeda» (Bom+)
Começo pelo que me parece ter falhado, e aliás um pouco desnecessariamente, que corresponde sobretudo à fase de acabamento ou edição (a leitura em off — Beatriz conseguiria fazer muito melhor, se tivesse tido tempo para ensaiar; de resto, havia no grupo quem também conseguisse fazer muito boas leituras, mas percebe-se que, nessa fase final, foi tudo já terminado pela responsável pela edição, em esforço para cumprir prazo, decerto apressadamente —; o fundo musical escolhido, quanto a mim, não resulta bem). Que faltou mais tempo é percetível também no texto, que me pareceu pouco elaborado. Com a mesma base informativa, mais ou menos wikipédica, era fácil escrever texto criativo, com ironia ou com observações mais subjetivas, embora aproveitando os mesmos dados. Quanto ao resto, só tenho a dizer bem. As imagens recolhidas mostram boa planificação (incluindo representação, adereços, escolha de cenário, diversidade das imagens), constituem uma boa ilustração das complicadas peripécias mitológicas e devem ter dado muito trabalho a planear e executar (e algum gozo a serem recolhidas). Há ritmo na forma de apresentar a intriga, há o poder de síntese e a velocidade que o cinema exige. Houve igualmente competência técnica, criatividade, não pouca informação.

[Maravilhas da antiguidade]

Eduardo, Júlia, Margarida, Rodrigo (11.º 4.ª) — «As sete maravilhas do mundo antigo [proponho eu este outro título: ‘Os deuses é decidem as maravilhas dos homens’]» (Muito Bom)
Receava que o tratamento de um assunto destes tivesse demasiado de wikipédico e pouco de literário, criativo, expressivo. Ora o grupo teve uma ideia engenhosa, a de pôr deuses a eleger as maravilhas dos humanos: com isso, alargou o assunto clássico à mitologia e conseguiu pretexto para situação paródica, que levou a um texto bem escrito, engraçado, inteligente, sem humor falhado (não é fácil!) e a bons exercícios de representação (destaco Eduardo, num papel com mais risco). Fizeram-no sem erros (e não é fácil citar tantos nomes antigos sem cair em algum lapso). A ideia foi além disso bem acabada, não ficou a meio (veja-se a solução para a maravilha egípcia e para as outras que ficavam a faltar ainda). Assumira-se entretanto que a parte informativa era momento secundário, sem que se deixasse de ir debitanto os dados que o assunto do concurso exigia, mas não investindo demasiado nesses assumidos trechos de leitura de cábulas.

Francisco B. (11.º 2.ª) — «[As maravilhas das capacidades do ser humano]» (Bom(-))
A ideia de passar das maravilhas monumentais da antiguidade para feitos de superação desportiva é bem achada. A concretização da ideia é prejudicada por se ter centrado na figura de um surfista em particular, o que exigiu o uso extensivo de imagens não originais (teria sido preferível fazer abordagem mais genérica, por exemplo, sobre o surf enquanto maravilha, recorrendo a imagens de surf mas da responsabilidade do autor; e calculo que não fosse difícil, se pensado com mais tempo de antecedência). Quanto ao texto lido em off, como se detém muito em dados sobre o desportista em causa, acaba por não poder ser muito criativo, mas está correto, sem nenhuma falha de sintaxe ou qualquer outro lapso. Também foi bem lido e com o cuidado de procurar ser expressivo (talvez no limite do natural uma vez ou duas).

Inês & Pedro

Ivânia (com Francisco) (11.º 9.ª) — «O amor também é uma pessoa» (Muito Bom(-))
Trabalho agradável, feito com cuidado e elegância, com texto bem escrito (um ou outro lugar comum da linguagem romântica) e com leitura em voz alta segura e na velocidade certa. Imagens e som também acompanham o texto com inteligência, no ritmo e variedade ideais, tendo sido montados com saber e gosto (não são imagens de ilustração do que é dito, articulam-se com o que é dito sem perderem a importância que as imagens têm num filme). Dir-se-á que não há muito Inês e Pedro, mas um dos tópicos que se podiam desenvolver era o da narrativa que desse conta de paixão, o que o filme cumpre.

Joana, Laura, Mafalda (11.º 4.ª) — «Pedro e Inês» (Muito Bom(-))
Lado criativo, poético, até quase onírico, foi plenamente conseguido. Embora saiba que se optou por não ancorar o filme em dados concretos do mito de Inês-Pedro, creio que podia haver, ainda assim, um pouco mais de «intertextualidade» com a história de amor de Inês de Castro (sim, bem sei que há a reveladora menção dos nomes, quase no final). Muito bons tanto o texto como a leitura em voz alta. Talvez se pudesse ter intercalado um ou dois momentos de diálogo, para esbater o largo predomínio da narração em off, mas o ritmo e variedade das imagens (bem tomadas e montadas), a música (e quase dança), os momentos finais em que a ação é mais nítida, passando-se de um foco lírico para outro mais narrativo, fazem que o filme não seja monótono, antes um clip (mais que filme) com a síntese e apelo emocional-sensorial que convém ao género.

André, D. Botea, Tomás (11.º 4.ª) — «O meu único amor é a língua portuguesa» (Muito Bom(-))
É um trabalho que se nota ter sido planificado, concebido com criatividade e bastante saber técnico. A pós-produção (montagem, efeitos, legendas) é muito rigorosa. O texto foi bem representado, bem filmado. A escrita com humor não é fácil, por isso o grupo tem o mérito de não ter caído em passos falhos de inteligência, ainda que nem todos os momentos em que se procura ser irónico ou absurdo resultassem ao mesmo nível: há uns bem achados e há outros assim assim (nem incluo nestes os casos da caracterização muito radical da personagem desempenhada por Daniel, que têm óbvias desvantagens para efeitos de classificação em concursos promovidos por instituições bem comportadas, como é o caso da Fundação Inês de Castro). Conseguiu o grupo resolver com originalidade a necessidade de referir o episódio de Inês (a leitura de Os Lusíadas, depois a tentativa de reconto do mito) e a necessidade também de lhe não dar grande continuidade (a pretexto dos erros, o desfecho passa a orientar-se para a língua portuguesa).

Pedro e Teresa (11.º 3.ª) — «[Cartas entre Inês e Pedro]» (Bom+)
Escrita, leitura, domínio da técnica de vídeo mostram-se competentes, sem nenhuma falha apontável (embora a «os seguintes doze anos» se deva preferir «os doze anos seguintes»). E, no entanto, perpassa a noção de que não houve especial envolvimento criativo, como se se tratasse de tarefa que havia que cumprir e se resolvesse limpamente, com a destreza habitual dos autores mas sem especial originalidade. A solução de ocupar boa parte das imagens com o texto das cartas, que tem a virtude de nos mostrar que não há erros de redação, é a confissão de falta de tempo para fazer cinema (ao contrário, destaco como boa ideia o separador entre as várias missivas, o momento em que cai o objeto que referencia a carta).

Eduardo, Francisco, Miguel (11.º 3.ª) — «[Amores de Manuel Inês Joana Pedro]» (Bom+)
Vídeo mostra planificação, trabalho, domínio técnico, embora sem arriscar muito em efeitos ou estrutura de montagem complexa. Textos de narração e de monólogos muito bem escritos (no entanto: «era apaixonado» > «estava apaixonado»). Leitura em voz alta no ritmo certo por Eduardo (certa lentidão, certo escandir das frases são corretos, é mesmo essa a forma que deve usar a locução em televisão). Boa representação por Francisco (no entanto: um «e» seguido de pausa a tentar lembrar-se do texto, pareceu-me; e, ainda, na primeira cena, não totalmente disfarçada procura de leitura do texto ao longe). Solução do ecrã sem imagem aquando da narração é aceitável (económica, é claro, mas coerente porque usada sempre); no fundo, a estrutura corresponde a cinco atos-cenas de uma peça de teatro que fosse filmada, ligados por comentário em off. Talvez tivesse sido possível encontrar alusões mais explícitas ao mito Inês/Pedro (não sendo aspeto obrigatório no regulamento do concurso, seria decerto fator de valorização).

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