Wednesday, August 23, 2017

Alguns bibliofilmes de há três anos (2014-2015)


Ficam aqui exemplos de bibliofilmes de há três anos (2014-2015). Como digo sempre, as regras estipuladas podem não ter sido exatamente as mesmas do trabalho que agora peço à geração de 2017-2018.

[10.º 8.ª, 2014-2015]
Zé / Fernando Pessoa & Ofélia Queiroz, Cartas de amor de ... / 18,5 // Pontos fortes Trata-se de criação compósita, que obrigou a planificação cuidadosa e a investimento em áreas variadas: redação (de poesia rimada); representação; cenário-adereços; ... Conseguida transposição de contexto, incorporando-se bem o original (e aliás dizê-lo bem). Aspetos melhoráveis O tipo criado (o do poeta que ilude rapariga) não corresponderá à nossa intuição sobre Pessoa (mas talvez também aqui tenha havido um exercício de transposição de contextos). E talvez tivesse usado mais alguns pequenos fragmentos das cartas.

Madalena B.-J. [10.º 1.ª, 2014-2015]
Madalena B.-J. / Alice Munro, Falsos Segredos /18 // Pontos fortes Ter-se construído criação que implica soluções subjetivas em torno do livro (especificamente, do conto «Entusiasmo»), dando, ao mesmo tempo, conta do que pode interessar outros leitores pelas narrativas de Munro. Texto redigido está sempre bem (ver, porém, a exceção que indico em baixo). Dramatização foi bem preparada (nas representações de ambas as atrizes e nos restantes aspeto necessários à encenação). Quer trechos de leitura em voz alta quer falas das personagens na representação usam estilo relativamente neutro (naturalista) e não têm lapsos. Aspetos melhoráveis Bigodes de Jack (a modos que a cara desenhada por Bean para tentar disfarçar o apagamento da mãe de Whistler). A corrigir: «no hospital [...], anuncia na carta que» (quem anuncia?; esta frase não está gramatical).

Susana [10.º 5.ª, 2014-2015]
Susana / Mário Zambujal, Já não se escrevem cartas de amor / 18 // Pontos fortes Boa planificação de tudo: nestes três minutos certos conseguiu-se dar uma perfeita ilustração de parte do livro (a dramatização percorre vários estilos, a autora desempenha até mais do que uma personagem, o trecho escolhido tem suficiente enredo para resultar sozinho), fazer um comentário que é também sociológico e fechar a imagem dos autores (autor do livro, autora do bibliofilme sobre o livro, autor da autora). Esta faculdade de se condensar muita informação em pouco tempo, característica do cinema, resulta porque há o ritmo devido (que implicou decerto muito trabalho). Boa leitura expressiva/representação. Aspetos melhoráveis A corrigir: em «dile[c]ta» e «afe[c]tuosos», o som /k/ não é para ser dito (mesmo antes do AO, não se dizia; agora, continua a não se dizer e não se escreverá também) — porém como se trata de mimar que está a escrever/ler, a hipercorreção até se compreende; na legenda final, gralha em «[r]reflexão», mas também má regência (dir-se-á ‘reflexão acerca da obra’). Dois pequenos trechos que não compreendi bem:«tem esta o objetivo de lhe comunicar» (é, não é?); «a dita ousadia» (1,18; se calhar, não é como estou a reconstituir).

Madalena S. [10.º 8.ª, 2014-2015]
Madalena S. / Eça de Queirós, O Primo Basílio / 18 // Pontos fortes Reflexão com transposições para época atual, em paralelo com abordagem estilizada (caricatural) da obra original. Planificação e realização (características do cinema), incluindo representação (de Madalena e, também, de Sofia), caracterização, cenário, guarda-roupa, música, estilo «oitocentista» de fotografia. Aspetos melhoráveis Sintaxe do passo a 50’-60’. Na leitura em voz alta, ligeiro excesso de rapidez («sofreguidão» causada pela angústia de se sentir estar a ler para um público). Pronúncia com assimilação em «m[a]ralizadora» (moralizadora).

Ana N. [10.º 12.ª, 2014-2015]
Ana N. / Eça de Queirós & Ramalho Ortigão, O Mistério da Estrada de Sintra / 17,5-18 // Pontos fortes Planificação de tudo (coordenação dos vários elementos: imagem, voz, música; texto do livro em causa e redação da própria autora) — tudo se agrega sem falhas, o que exigiu pensar com cuidado antes de realizar; projetar; ir aos locais; etc. Aspetos melhoráveis Na redação, vejo alguns lugares comuns ou pequenas imperfeições de escolha do léxico: a insistência em «mente(s)»; «criando uma monotonia» (rotina); «mistério e romance» (mistério e paixão), «relembrar» (recordar, lembrar); «a razão principal por ter escolhido este livro» (a razão principal de ter escolhido este livro). A música pareceu-me a do filme, homónimo, de Jorge Paixão Costa (se sim, foi má escolha, porque há até toda a vantagem em não aproximar esta abordagem da do filme).

Ana S. [10.º 12.ª, 2014-2015]
Ana S. / John Green, À procura de Alaska / 17,5-18 // Pontos fortes Música adequada (falta, porém, a respetiva referência). Qualidade do texto redigido, da leitura em voz alta e da realização. Qualidade ainda da fotografia (embora se possa dizer que relação entre texto e imagem é bastante aberta). Aspetos melhoráveis Alguns problemas de sintaxe: «cujas suas expetativas» (cujas expetativas); «como se me magoar fosse um passatempo» (como se magoar-me fosse um passatempo); creio ainda que as lágrimas não marejam os olhos — «marejar» é intransitivo, pode é ser pronominal («os olhos ficam marejados (de lágrimas)». No final, poria algumas referências ou explicações: música; jardim (da Ajuda?).

Catarina [10.º 5.ª, 2014-2015]
Catarina / Wladyslaw Szpilman, O Pianista / 17,5 // Pontos fortes Sentido estético ao longo do filme, quer visual (incluindo lettering) quer em termos de música (incluindo Chopin, precisamente por Spzilman); sensação de que houve gosto em fazer e que ficou tudo bem acabado. Criação de texto próprio, coerente com o contexto, coeso linguisticamente e que foi bem lido. Referenciação no final (embora sem se cumprirem alguns preceitos que fui destacando em aula — «O Pianista» > O Pianista; valia pena pôr o tradutor; e para quê, numa referência única, antepor o apelido?). Aspetos melhoráveis Texto criado não tem erros mas tem alguns quase-lugares comuns (sufoco, coração a parar de bater, quão pesado...). Som da leitura em voz alta fica, por vezes, apagado sob o da música, havendo dois momentos talvez em que não consegui perceber palavras que eram ditas. A corrigir: «houve momentos que» (houve momentos em que).

Bia [10.º 12.ª, 2014-2015]
Bia / Pedro Chagas Freitas, Prometo falhar / 17,5 // Pontos fortes Leitura em voz alta muito perfeita, expressiva e sem falhas (um «custou-lhes» é o único momento que não fica claro), de um texto bem redigido pela autora e que se integra bem na obra lida (cfr. p. 97 do livro: mantém-se apenas a frase inicial do capítulo, «Tenho de regressar obsessivamente a ti»). Apesar da simplicidade da encenação, e do estilo minimal, houve bom gosto, domínio técnico e relativa originalidade na solução para a parte visual do filme. Aspetos melhoráveis Teria preferido outro livro, embora ainda não tenha eu mesmo uma ideia completamente formada sobre a valia deste autor (enfim, desconfio de um livro que teve mais de vinte edições em menos de um ano).

Manel [10.º 5.ª, 2014-2015]
Manel / Frank Miller, O Regresso do Cavaleiro das Trevas / 17,5 // Pontos fortes Sentido de realização fílmica (o conjunto de texto, música, imagens; a dramatização conseguida). Redação. Leitura em voz alta (com momentos de boa expressividade e revelando capacidade de ir alterando os ritmos sem tropeçar). Lettering bem escolhido. Aspetos melhoráveis A corrigir: «tem 2 prémios literários» (tem dois prémios literários); «video» (vídeo). Nas pronúncias de algumas palavras («escuridão», «graciosidade», «sobrevivente», «e-agora-as-teias»), tendência para excessiva rapidez no «ataque à palavra», que leva a que a expressão fique lisboetamente compactada.

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