Thursday, September 10, 2009

Soluções

Para o grupo I-B:
Experimenta reunir (quase mentalmente, apenas; quando muito, numa lista de tópicos) as ideias em que te fundarias para redigir as respostas completas que corresponderiam a estes itens I-B. (Porei soluções possíveis em Gaveta de Nuvens.)

«Apelidados de ‘Navegadores’, os jogadores que na África do Sul representam Portugal não serão menos glorificados do que os heróis de Camões. Arrostarão com perigos tão grandes como os personificados pelo Adamastor (a clavícula de Nani, o joelho de Pepe, as mãos de Eduardo, o cérebro de Simão, todo Ricardo Costa), mas aportarão decerto à sua ilha de Vénus – sobretudo se Drogba não jogar – e serão tão mitificados como algumas das personagens de que falou o Gama na sua interessante, embora um pouco longa, exposição ao rei melindano.»
Paulo Sérgio, depoimento em http://cabelinhoapaulobento.blogspot.com/ (13-6-2010)

Num texto expositivo-argumentativo bem estruturado, de oitenta a cento e vinte palavras, comente a afirmação de Paulo Sérgio, fundamentando a sua opinião em argumentos decorrentes da sua experiência de leitura de Os Lusíadas.

[Solução minha:
Camões exaltou os heróis da construção do império, mas também os que os precederam: Viriato, ainda antes de criado o Reino; Afonso Henriques, que, estimulado pela presença de Cristo, derrotou em Ourique numeroso exército mouro; Nun’Álvares, que, em Aljubarrota, se revelou líder audaz.
Na conquista do mar, apesar do papel relevante do Gama (não por acaso, relator da maior parte dos feitos gloriosos), os protagonistas são os navegantes anónimos. Esse herói colectivo venceu o cepticismo (Velho do Restelo), a doença (escorbuto), o medo (Adamastor), as artimanhas de Baco (tempestade), e conquistou o conhecimento (fogo de Santelmo; tromba marítima), até chegar à vera Ilha dos Amores. Esta, porém, é mais perene do que a dos nautas futebolistas. E o convívio com os deuses confirma a imortalidade dos heróis de quinhentos.]

«Um dos mitos da Escola Secundária José Gomes Ferreira é o de que, num dia de sol, saídos de uma caverna situada perto da fresca cascata que emoldura o estabelecimento de ensino, regressarão alunos decentes, que não resolvam os exames nacionais à pressa, que releiam tudo, atentos às falhas de pontuação e aos acentos nas esdrúxulas, que procurem sempre no texto da prova onde estará plasmada a resposta aos itens do grupo I, que leiam sem precipitação os enunciados das perguntas, que esbocem um plano para a resposta ao grupo III, que tenham particular cuidado com a qualidade da sua redacção e a inteligência dos seus argumentos, que tragam relógio, garrafa de água, que comam bem ao almoço, que durmam bem na noite anterior. No entanto, acredito mais no regresso de D. Sebastião e na contratação de Coentrão pelo Real Madrid.»
Horácio Braz, De Mensagem às minhas mensagens: memórias de um lutador, Oxford University Press, Oxónia, 2010, p. 666.

A pretexto da citação em cima, escreva um comentário com entre oitenta e cento e vinte palavras que incida num dos mitos presentes em Mensagem.

[Solução minha: D. Sebastião é figura central de três poemas de Mensagem, mas o sebastianismo — ou, um especial sebastianismo pessoano — comparece ao longo de todo o poema épico-lírico, ainda que esteja mais presente na 3.ª parte, cujo título aliás logo remete para «O Encoberto».
D. Sebastião surge como figura messiânica, que salvará Portugal da decadência. A juventude do rei, a loucura, o desaparecimento em Alcácer Quibir favorecem que o poeta veja nele um emblema da redenção que advoga, um exemplo da ousadia, da busca do sonho, a que Pessoa exorta, acreditanto que essa nova glória corresponderá a um poder espiritual português, enfim, ao Quinto Império.]

«Da estabilidade emocional de Bruno Alves ou da confiança de Cristiano Ronaldo dependerá o desfecho do Portugal-Costa do Marfim, já que são jogadores determinantes nas acções, defensiva e ofensiva, da equipa das quinas» (Alguém).
Refira dois traços do carácter de D. João V também eles determinantes na acção de Memorial do Convento, fazendo alusões pertinentes à obra. Escreva um texto de oitenta a cento e vinte palavras.

[Solução retirada de uma sebenta: No romance Memorial do Convento, os dois principais traços do carácter de D. João V são a megalomania e a prepotência.
O soberano apresenta-se-nos, ao longo da acção, sobretudo preocupado com o investimento da riqueza vinda do Brasil, no cumprimento dos seus projectos megalómanos, o mais importante dos quais é a construção do Convento de Mafra. A par disso, para impor as suas decisões, não hesita em recorrer à mobilização forçada de trabalhadores para as obras de Mafra, numa atitude de inaudita prepotência que ainda hoje nos indigna. Saramago retrata-nos um rei ridiculamente megalómano e prepotente que, para realizar os seus caprichos e ostentar as suas riquezas, não hesita em escravizar o povo que devia proteger.]

A melhor biografia de Pessoa, que é da autoria de Robert Bréchon, intitula-se Estranho Estrangeiro [Étrange étranger — une biographie de Fernando Pessoa] (Lisboa, Quetzal, 1996). Fernando Pessoa, que, adolescente, conheceu as paragens — então colonizadas pelos ingleses — onde, por estes dias, Duda, Daniel Fernandes ou Beto exibem as suas capacidades — como se sabe, muitas —, foi realmente um estrangeiro até de si mesmo.
Num texto de oitenta a cento e vinte palavras, desenvolva esta ideia, corroborando-a ou rebatendo-a, não se esquecendo de mencionar quer o ortónimo quer o processo heteronímico.

[Solução minha: O título escolhido pelo biógrafo francês de Pessoa aproveita o facto de o poeta de Mensagem ter como primeira influência a cultura inglesa, o que resulta de, enquanto criança e adolescente, na África do Sul, ter frequentado o sistema de ensino britânico. Por outro lado, a fragmentação a que, na escrita, se quis submeter (ora pelo desdobramento que configura a heteronímia ora pela obsessão de se procurar compreender, num processo, quase cubista, em que, ao aproximar-se dela, autonomiza características da sua personalidade) constitui um distanciamento de quem se estranha e se analisa de fora, por assim dizer, como «estrangeiro de si mesmo». Para se reconhecer, o poeta precisa de «fingir» e precisa de ser outros.]

A mulher de José Mourinho chama-se Matilde; a esposa de Jorge Jesus chama-se Blimunda. Esta extraordinária coincidência, que aproxima as mulheres dos dois grandes treinadores das duas protagonistas femininas das obras que lemos (enfim...), lembra-nos que as duas personagens — respectivamente, do drama de Sttau Monteiro e da ficção de Saramago — têm entre si mais circunstâncias que as identifiquem do que características que as oponham.
Parta da ideia acima, para redigir um comentário, de oitenta a cento e vinte palavras, em que se centre naquelas duas heroínas (nas das obras, claro).


[Solução minha: Blimunda e Matilde são duas sobreviventes. Da trindade de heróis de Memorial do Convento é Blimunda o elemento que resiste, ainda que a vontade de Baltasar se conserve também (mas, note-se, recolhida pela sibilina filha de Sebastiana). Aos nove anos durante que Blimunda procurou Sete-Sóis corresponde, em Felizmente há luar!, a indómita luta de Matilde em defesa de Gomes Freire. Faltam-lhe, é certo, os poderes mágicos daquela que Bartolomeu crismou como Sete-Luas, mas sobra-lhe a mesma irreverência e o inconformismo de quem ama incondicionalmente. São duas mulheres, de raízes populares, em que narrativa e drama se focarão ainda mais à medida que se aproxima o desfecho de ambas as obras, constituindo então a voz dos maridos e o espelho da força dos oprimidos.]