Frei Luís de Sousa pelo 11.º 2.ª
Marta (Bom+/Muito Bom-)
Impondo um contexto
dramático, a canção «Morena dos Olhos d’Água», de Chico Buarque, sugere um
clima romântico — aspetos que facilmente se adaptariam ao drama de Garrett,
cujas personagens sofrem simultaneamente com o passado, o presente e o futuro a
que o amor as conduz. A versão ao vivo, ao lado de Caetano Veloso (1972),
agradaria mais ao dramaturgo português, que preferia a magia da representação e
do espetáculo.
A voz masculina poderia
pertencer a Manuel de Sousa Coutinho, por quem as palavras «Vem ver que a vida ainda vale / o sorriso
que tenho pra lhe dar»
seriam dirigidas a Madalena de Vilhena, logo após aquela «funesta jornada de África», que
a deixou viúva e desamparada. Ao longo de toda a peça, é notória a
predisposição de Manuel para assegurar a Madalena um futuro feliz,
esforçando-se para lhe acalmar o espírito preocupado e negativo. Os constantes
maus presságios de Madalena, que logo na primeira cena se supõe incapaz de
gozar a felicidade, devido aos «contínuos
terrores» e permanente «medo», exaltam no fidalgo a necessidade de a tranquilizar, como
acontece no momento que antecede a partida para a antiga casa de Madalena, em
que lhe diz precisar da «força
do coração».
Contudo, a ideia de um
futuro sorridente ao lado de Manuel, além de prometida pelo marido, fora também
antecipada por Madalena, que era ainda casada com D. João quando sentiu despertar
por ele uma atenção especial. Assim, compreendo que a canção despertasse em si
o desejo de se entregar, de «ouvir
lindas histórias».
Após um ciclo em que se dedicou à perda e ao sofrimento, Madalena desejava,
mais que tudo, viver o amor que nem o passado lhe permitira. Apesar da inquietação
que continuava a encobri-la, Madalena escutou atentamente o sussurro que se
tornava cada vez mais evidente com o fechar do ciclo — « seu homem foi-se embora» — e, assim, pensou desprender-se do
passado. A voz afetuosa do tema lembra-me a esperança a que se agarra Madalena,
quando afirma viverem «seguros,
em paz e felizes».
A canção esconde
tragédia na beleza do amor. Desse modo, seria indubitavelmente bom pretexto a
Telmo, que, menos cego pelas promessas de felicidade, não esqueceria o «prometendo voltar já» que acompanhava a certeza de partida sem
regresso (semelhante à promessa de regressar «vivo ou morto», que
acompanhava a carta que fora entregue a Frei Jorge e que, aos olhos do escudeiro,
certificava que o amo havia de voltar para ver Madalena, mesmo que pela última
vez).
Diz Manuel: «Eu não tenho ciúmes de um passado que não
me pertence. E o presente, esse é meu, meu só, todo meu, querida Madalena…», como se da calma dos instrumentos e
certeza da melodia se tratasse. Mas, aquando de tão sedutora felicidade, resta
a desconfiança, revelada por Telmo e frequentemente escondida por Madalena. Mas
percebemos que não há hora de «partir
ou de voltar» e,
assim, «o constrangimento de
alma, o terror» permanecem,
movidos por passados esquecidos e presentes forçados.
João Pedro (Bom/Bom (-))
A canção “Save Me” (Salva-me) dos Queen pode ser
entendida como os pensamentos de D. João de Portugal e de D. Madalena de
Vilhena nos anos em que estiveram separados.
“They said we made the perfect pair/ (…) / How I
loved you” (Diziam que fazíamos o par perfeito/ (…) / Como te amava) são os
primeiros versos da letra desta canção e, de certa forma, os pensamentos de D.
João de Portugal (e de Madalena) no tempo em que estiveram longe um do outro.
“I love you ‘till I die” (Amo-te até morrer) são as palavras que Brian May
(guitarrista da banda) escolhe e que assentam perfeitamente ao casamento entre
D. João de Portugal e D. Madalena de Vilhena, cuja recordação deixa Madalena
aterrada, quando pensa que terá de voltar à casa onde passou “The years of love
and loyaltie” (Os anos de caridade e lealdade) com o falecido marido. Madalena
mostra-se neste episódio da peça uma pessoa com medo de enfrentar o passado (“o
terror com que eu penso em ter de entrar naquela casa”).
No entanto, é o passado que dá forças a D. João
de Portugal para continua a viver (“I can’t face this life alone”— Não consigo
enfrentar esta vida sozinho), é a esperança de um dia poder voltar para o seu
amor mesmo que, se um dia for libertado, refaça a sua vida com outrem (“To
start again with someone new”— Recomeçar com uma nova pessoa).
Na cena da peça em que D. João de Portugal (sob
o nome de Romeiro) volta a casa depois de ter estado “far from home” (longe de
casa), este fala de si na terceira pessoa do singular como se de um companheiro
de cela se tratasse (“ele também sofreu muito”), o seu “eu” é agora “Ninguém”.
Assim também se sente o sujeito lírico da canção, quando afirma “I have no
heart” (Não tenho coração), pura e simplesmente deixou de existir, à semelhança
de D. João de Portugal.
As noites sozinho, com frio, levaram D. João de
Portugal a inventar alguém com quem desabafar, para quem chorar, alguém que
mais tarde surge sob o nome de Romeiro mas que esconde apenas o nobre D. João
de Portugal. Assim também Freddie Mercury canta as belas palavras de amor de
Brian May: I’m naked and I’m far from home / (…)/ Each night I cry” (Estou nu e
estou longe de casa / (…)/ Choro todas as noites).
Como já referi, D. João de Portugal chega sob a
forma de Romeiro, um velho que viajara dias e noites para entregar uma mensagem
ao seu amor de há vinte e um anos a quem informa que está vivo. Apesar de não o
dizer é percetível que quer que D. Madalena de Vilhena salve D. João de
Portugal de um passado atroz que o retirou do mundo: “Save Me” (Salva-me) é
tudo o que Romeiro quer de D. Madalena que foi durante vinte e um anos a sua
força para continuar a viver.
João S. (Bom+/Muito Bom-)
A canção “Porque é
que vens?”, de Tony Carreira, podia ser facilmente um desabafo de Madalena para
D. João de Portugal, que volta vinte e um anos depois da sua alegada morte, sem
ser desejado, causando a destruição da nova família que Madalena de Vilhena
tinha criado e amava.
“Porque
é que vens / quando eu encontrei saída / e refiz a minha vida” serão talvez os versos que
assentam melhor no Romeiro (D. João de Portugal) pois o seu regresso a casa em nada
muda ou contribui para o seu destino final de solidão e tristeza, no fundo, de
um “ninguém”. A sua conversa com Madalena logo na primeira aparição revela que
possuía a informação de que esta era casada, logo, sabia ao que vinha e o que
ia causar. Estava cego de vingança e de mágoa. Porém, mais tarde, ao descobrir
que o procuraram por toda a parte e que o casal tem uma filha que ficará
desonrada, o Romeiro toma consciência do que fez e de como foi “imprudente, foi
injusto, (…) duro e cruel” e que de nada isso lhe serviu (“E para quê?”).
Resigna-se assim “de desonrar a sua viúva”. Descobrimos mais tarde que já não
vai a tempo.
A atitude do Romeiro
é uma atitude que favorece a tragédia, mas também um pouco estranha, vinda de
um homem considerado exemplar. Apenas a raiva e a incompreensão a podem
justificar.
“Porque
é que vens / chamar o passado / já quase apagado / depois de eu tanto sofrer /
(…) matar-me de novo / quando a pouco e
pouco / eu consegui renascer” são versos que quase parecem fazer parte da
própria peça de tal modo se adequavam . Se fossem parte da obra seriam de certo
uma fala de Madalena, uma demostração de frustração, desamparo, impotência e
até inocência em relação à situação que se desenrolou na sua vida. Sobre essa
situação Madalena não possui controlo, nem a pode sequer prever, apesar das palavras
proféticas de Telmo, que sempre acreditou que o seu verdadeiro mestre viria
“vivo ou morto”. Madalena fica numa posição difícil, talvez até um destino não
merecido devido aos esforços na procura de D. João que, por terem sido
inconclusivos, fizeram com que vivesse vinte e um anos em “contínuos terrores
que ainda não deixaram gozar um só momento de toda a imensa felicidade” de
estar casada com Manuel de Sousa Coutinho. Será talvez o facto de não ter amado
D. João o único pecado que se pode apontar a Madalena, que, de resto, foi
exemplar na atitude perante o desaparecimento do marido.
O seu final será,
porventura, o mais trágico juntamente com Manuel. A morte da filha e a
separação do marido, as duas pessoas que mais amava, é o momento crucial que
torna este drama romântico numa verdadeira tragédia.
Afonso (Bom +/Muito Bom -)
“A terra gira
em contramão” assim se inicia o refrão da canção do Grupo Quatro e meia, recordando-nos que tantas vezes na vida “Ficamos
tontos sem direção” – como a própria canção refere – pelos desencontros que
decorrem de situações cujo controlo não está ao nosso alcance. Também o tema
principal da peça Frei Luís de Sousa resulta
de um tremendo desencontro pelo facto de D. João de Portugal ter estado desaparecido
tantos anos, o que levou a que a sua esposa D. Madalena voltasse a casar com D.
Manuel sem saber o que era feito do primeiro marido, desaparecido na batalha de Alcácer Quibir. Nesta obra literária o Homem é
uma marioneta do destino, característica essencial da tragédia antiga, tal como
na canção escolhida “A terra gira”
também a vida segue o seu caminho a um ritmo que ninguém controla.
“Eu não sei / Nem
como, nem quando, aqui cheguei” é o primeiro dístico da canção que, cantada na
voz masculina de um dos vocalistas do grupo, representa bem o sentimento de
muitos soldados que regressam de batalhas e guerras já esquecidas no tempo, com
vidas e sonhos interrompidos. Cantada por D. João de Portugal, poderia ter sido
a sua apresentação quando aparece disfarçado de Romeiro, vinte e um anos depois
de ter partido.
D. João de
Portugal sofre pelo desconhecimento e surpresa do casamento da sua mulher e
pelo tempo que perdeu – “Sem saber / Dou por mim a viver a correr” –, sofre
pelo esquecimento a que foram votados ele próprio e o seu casamento – “E o
mundo segue / Sem olhar para nós” –, sofre pelo abandono que sente – “Queremos
tudo / Mas vivemos tudo a sós” – e sofre por não poder travar a marcha do
destino – “Mal me vi / No caminho até chegar aqui / Sem contar / Corro às cegas
/ Sem saber onde chegar”.
Esta é uma
canção que fala do desencontro amoroso e, também, por este motivo, se articula
com o desencontro entre D. João de Portugal e D. Madalena, um amor que se desencontrou
deixando de ser compatível com a felicidade.
No final da
canção, os versos “Corremos até nos faltar o ar / E a vida vai ficando para
depois / E continuamos os dois a sonhar” permitem fazer o paralelismo com o
desenlace da obra dramática Frei Luis de
Sousa, isto é, com o desespero e inconformismo sentido por D. Madalena, face
à situação de bigamia e à ilegitimidade da filha Maria, em particular no
terceiro ato, cena IX, quando, abraçada à cruz, lamenta a sua desgraça e destaca
o papel da religião como consolo perante a perda da felicidade e da própria
vida. Também D. Madalena “vê a sua vida ficar para depois” com a entrada para o
convento, adiando o futuro e evitando a vida.
O final da
canção é precedido por um instante de felicidade – “adormecemos os dois” – logo
interrompido pela “hora de acordar”, acentuando que o ritmo imposto pela
sociedade é cruel para com a vida dos homens, tal como no drama romântico o destino
se mostra implacável com as personagens.
Cabo (Bom (-))
Esta canção, “Wings”, foi escrita e produzida
por Malcolm McCormick, mais conhecido por Mac Miller. O seu texto é comparável
à situação de D. João de Portugal após chegar a casa e reencontrar a família, que
não via há vinte e um anos, pois mostra o sentimento de deixar o passado para
trás e seguir em frente, como uma pessoa nova. Um recomeço, enfim.
Mac Miller sempre encontrou um refúgio para os
seus dias negros nas drogas, até que começou a namorar com uma rapariga que
conseguiu ajudá-lo a voltar a encontrar equilíbrio na sua vida, o que foi bom
para ele mas mau para ela. Ela não aguentava estar mais com ele então deixou-o,
o que o destruiu. Aqui, a vida do artista e a vida de D. João ficam parecidas.
Tanto D. João como o artista ficam perdidos e sozinhos, enquanto as suas
antigas companheiras refazem a sua vida com outra pessoa, porém, enquanto D.
João vagueia pelo mundo, Malcolm vagueia pelo mundo das drogas.
Antes de “seguir em frente”, D. João ainda tinha
de avisar a sua família que estava vivo, o que fez sem se revelar como o
próprio. Agora poderia finalmente ser livre daquele fardo que era, para além de
o facto de a família pensar que ele estava morto, também a saudade. Este
sentimento é representado pela famosa fala do romeiro: ”Ninguém”. Com esta fala
D. João livra-se do seu passado e segue livremente. Também este sentimento é
encontrado na música: “The sun is shining, I can look at the horizon” (o sol
está a brilhar, eu consigo ver o horizonte). Com este verso, o eu afirma que,
depois dos tempos difíceis, consegue, finalmente, ver um futuro melhor.
Apesar de ambos pensarem que estão no caminho
certo e que, finalmente, podem ser felizes, na verdade acabaram por fazer as
coisas ficarem ainda piores. Com a notícia da vinda de D. João, a vida de
Manuel de Sousa e Madalena tornou-se num inferno na Terra, e estes decidem
seguir um rumo religioso, esperando que Deus os perdoe dos seus pecados. Já o
sujeito descobre que na verdade ainda está perdido, o que demonstra no verso:
“I guess i just play it by ear, silence is all that I hear” (Acho que toco de
ouvido, silencio é tudo o que ouço), mostrando que não sabe para onde vai e
está a deixar-se ir com a maré. Malcolm acaba por falecer de uma overdose a 7
de setembro de 2018, descobrindo que aquele futuro melhor que tinha visto, afinal,
era só uma miragem.
Ricardo (Bom (-))
O título da canção, “Se já não me queres”, de
António Zambujo, transporta-nos para a obra de Almeida Garrett, permitindo-nos
estabelecer uma analogia entre a mensagem veiculada pelo músico português e a
personagem de D. Madalena e a sua relação com D. João de Portugal em Frei Luís de Sousa.
D. Madalena evidencia um medo constante do
regresso de D. João de Portugal, seu primeiro marido, desaparecido na batalha
de Alcácer Quibir (“... estes contínuos terrores que ainda não me deixaram
gozar um só momento de toda a imensa felicidade...” — Ato I, Cena I). Apesar de
se terem acionado todos os meios possíveis para o encontrar, nunca houve provas
da morte de D. João e, por isso, Madalena casou-se com Manuel de Sousa
Coutinho, por quem se apaixonara e com quem teria daqui uma filha. A incerteza
do desaparecimento de D. João é intensificada com a fidelidade de Telmo a seu
amo. Os receios de Madalena agudizam-se quando Manuel de Sousa decide pôr fogo
à casa, obrigando a família a mudar-se para o palácio de D. João (“... o terror
com que eu penso em ter de entrar naquela casa. Parece-me que é voltar ao poder
dele...” — Ato I, Cena VIII). O primeiro marido de D. Madalena não está
presente, mas é uma referência constante ao longo do ato I. Entretanto, surge
uma nova personagem na intriga, um romeiro, que traz consigo informações
devastadoras para D. Madalena e a sua família.
É neste ponto do enredo que a letra de Luísa
Sobral melhor se enquadra na obra em estudo. D. João de Portugal regressa
disfarçado de romeiro, percebe que outro homem ocupa o seu lugar e que o seu
próprio aio vive uma grande angústia com o seu regresso, sofrendo por Maria, filha
de Madalena e Manuel de Sousa (“Meu honrado amo, o filho do meu nobre senhor,
está vivo...”,”É que o amor desta outra filha, desta última filha, é maior, e
venceu... venceu... apagou o outro.” — Ato III, Cena IV). Apesar do sofrimento
passado ao longo de vinte e um anos de ausência, D. João reconhece que o amor
da sua esposa já não lhe pertence (“Se já não me queres / Se já não me amas /
Se a tua mente / Sonha apaixonadamente com outro alguém”), o que é visível
quando escuta D. Madalena descrever os seus sentimentos por Manuel de Sousa
(“Marido da minha alma… pelas memórias da nossa felicidade antiga…” — Ato III,
Cena VI). A revolta invade-o (“Ah! E eu tão cego que já tomava para mim!” — Ato
III, Cena VI); no entanto, ao reconhecer a desgraça que se irá abater sobre
todos, prefere anular a sua própria existência para os salvar (“Se já não me
olhas, já não me desejas / Se quando me beijas não são os meus lábios que
queres provar / Então meu amor, faz-me esse favor e vai ser feliz”), pedindo a
Telmo para agir (“Vai, vai: vê se ainda é tempo; salva-os, salva-os, que ainda
podes…” — Ato III, Cena XII). A canção interpretada por António Zambujo
representa o estado de espírito de D. João, um homem triste e cujo sofrimento
não anula a capacidade de continuar a amar a sua mulher, desistindo da própria
existência e preferindo não ser recordado como alguém (“que amou quem não [o]
quis”).
Francisco
B.
(Bom)
Frei Luís
de Sousa
é um drama romântico, escrito por Almeida Garrett, com o objetivo de mostrar,
entre outros, que não é o passado que vem resolver os problemas do presente, isto
é, o regresso de D. João de Portugal da batalha de Alcácer-Quibir não iria
trazer a felicidade de D. Madalena, como se ele fosse um vilão.
Baseado nesta ideia da importância da memória ou
das saudades, pesquisei músicas que tivessem como tema algum regresso ao
passado ou a incapacidade de esquecer um episódio ou uma pessoa. Acabei por
encontrar uma música dos Xutos e Pontapés, intitulada “Para Sempre”. Quando li
atentamente a letra, percebi que o que encontrei era semelhante a um dos
aspetos de Frei Luís de Sousa.
Ao lembrar-me de todas as personagens da obra,
achei que o conteúdo da letra se encaixava perfeitamente em D. João de
Portugal, um nobre que havia partido e também não havia regressado, tal como D.
Sebastião, da batalha no Norte de África. Este homem era casado com D. Madalena
e amava-a profundamente. Tanto assim é que, quando ele desaparece e está vinte
e um anos sem dar notícias, o seu aio fiel, Telmo Pais, recorda a D. Madalena
um bilhete que o marido havia escrito no próprio dia da batalha e que dizia:
«Vivo ou morto, Madalena, hei-de ver-vos pelo menos ainda uma vez neste mundo»,
o que a deixa desesperada (pois agora está casada com Manuel de Sousa, com quem
é muito feliz e de quem tem uma filha – D. Maria de Noronha), mas consola o aio,
que anseia pelo regresso do seu amado amo: “o Senhor Manuel de Sousa Coutinho é
guapo cavalheiro, honrado fidalgo, bom português…,mas não é, nunca há-de ser
aquele espelho de cavalaria e gentileza, aquela flor dos bons… Ah! meu nobre,
meu santo amo!”.
Na letra da canção, podemos ver que há alguém
extremamente apaixonado por outra pessoa (“O nosso amor de sempre / Brilhará,
p'ra sempre”), que identifiquei como D. João que sempre amou a sua mulher e que
apenas conseguiu suportar os anos de cativeiro recordando-se dela e esperando
encontrá-la uma vez mais, como nos diz também a letra: “Juro, meu amor que
sempre/Voltarei, p'ra sempre”. Vemos essa paixão profunda e intensa no Frei Luís de Sousa, quando o Romeiro diz
trazer um recado dirigido a D. Madalena: “Ide a D. Madalena de Vilhena e
dizei-lhe que um homem que muito bem lhe quis aqui está vivo por seu mal e
daqui não pode sair nem mandar-lhe novas suas de há vinte anos que o trouxeram
cativo”. Desta forma, percebi que foi o amor pela mulher que o manteve vivo
todos esses anos.
Assim, apesar de a obra terminar em morte – de
Maria, filha do casal – parece-me que D. João também acabou por ser uma vítima,
já que, ele, ao regressar, apenas queria voltar para os braços da mulher amada
e não queria destruir ninguém, mas ela nem o reconheceu. A letra também nos
mostra isso: “Ai, meu amor / O que eu já chorei por ti / Mas sempre / P’ra,
sempre / Vou gostar de ti”.
Cardoso (Bom)
Podemos
ouvir bastantes vezes a alusão a algo que nos lembra um sentimento de dor, de
mágoa e de culpa por não ter sido melhor enquanto pôde, deixado por alguém que
o sujeito poético, assumido pelo cantor Bastille e pelo produtor Marshmello no
seu single de êxito “Happier” (do
inglês mais feliz), realmente amava – “Lately, I've been, I've been thinking, I want you to be happier, I want you to
be happier” (Ultimamente, eu tenho, eu tenho pensado, Quero que sejas mais feliz, quero que sejas mais
feliz). Apesar de, a ideia principal do tema ser sobre se querer a pessoa que
se ama feliz, na peça da autoria de Almeida Garret Frei Luís de Sousa, o antigo Dom João de Portugal, agora como
romeiro, produz o efeito contrário na mulher que ama, ao entrar em cena. Provoca
infelicidade, tristeza e até um ligeiro delírio em Dona Madalena de Vilhena
(“Minha filha, minha filha, minha filha! Estou… estás… perdidas, desonradas…
infames!”), não obstante o seu amor pela sua amada, o nobre cavaleiro não morto
em batalha não havia previsto essa situação, tudo o que quis foi ter a sua
amada consigo. Após descobrir que a sua mulher havia casado com outro homem, o
romeiro transforma a sua conduta, ainda que, o aniquile a ideia de Madalena não
o amar “And the image of you being with someone else, well, that's eating me up inside” (e a imagem de tu
estares com outra pessoa está-me a destruir por dentro), ele continua
apaixonado por ela, se não, não teria aguentado (“vinte anos de cativeiro e
miséria, de saudades, de ânsias que por aqui passaram”) mais de duas décadas
preso.
Percebemos
então, o quanto realmente ama Dom João Dona Madalena (“Basta: vai dizer-lhe que
o peregrino era um impostor, que desapareceu, que ninguém mais houve novas
dele, que tudo isto foi vil e grosseiro embuste de inimigos de… dos inimigos
desse homem que ela ama. E que sossegue, que seja feliz.”) ao pôr a felicidade
de Madalena à frente da sua. Se atentarmos na letra da canção, percebemos que a situação do romeiro é bastante
semelhante à situação que o sujeito poético da canção nos relata. Ao ouvirmos “Then
only for a minute, I want to change
my mind, 'Cause this just don't feel
right to me, I want to raise your spirits,
I want to see you smile but, know that means I'll have to leave” (Então só por um
minuto, eu quero mudar de ideias, porque isto não é certo para mim, eu quero te animar, eu quero te ver sorrir, apesar de
saber que isso significa que eu terei que partir) recordamos o amor
incondicional que D. João sente por Madalena, mesmo passados tantos anos sem
ter notícias dela. “Even though I might not like this, I think that you'll be happier, I want you to be
happier” (mesmo que eu não goste disto, acho que serás mais feliz, quero que
sejas mais feliz) o nobre cavaleiro descendente dos condes do Vimioso, teria
morrido em Alcácer Quibir por Madalena, se necessário.
Francisco
A.
(Suficiente)
Desde
os primeiros segundos da música, composta por Pedro Ayres Magalhães e
interpretada pelos Madredeus, que somos recebidos por um instrumental dramático
e de alta intensidade, algo que se relaciona bem com Frei Luís de Sousa de Almeida Garrett.
Os
versos “Ai que ninguém volta/Ao que já deixou/Ninguém
larga a grande roda/Ninguém sabe onde é que andou” encaixam-se muito bem na
situação em que foi posto D. João de Portugal. O primeiro dístico, “Ai que
ninguém volta/Ao que já deixou”, pode-se interpretar como referente á partida e
á chegada de D. João. Tendo ele partido havia mais de vinte anos já não poderia
regressar ao seu passado. Também se pode interpretar pelo lado mais literal do
significado da canção; que ninguém volta da morte, mas, aos olhos de D.
Madalena e da sociedade, foi exatamente isto que ele fez. A roda referida em “Ninguém
larga a grande roda/Ninguém sabe onde é que andou” pode ser a vida, ou o
destino aquele que não se pode ignorar: apesar de querer estar ao lado de
Madalena, este seu destino foi algo cruel, levando-o por outro caminho, um em
que “Ninguém sabe onde é que andou”.
Já
perto do fim da peça, “Ao largo ainda arde/A barca da fantasia”, a fantasia acalentada
por Madalena de poder viver uma vida harmoniosa com Manuel e Maria. Destruída
pela chegada do romeiro com as notícias de D. João de Portugal ainda ser vivo,
algo que impossibilita o seu casamento com Manuel e torna Maria de Noronha numa
filha ilegítima, algo que na época em que decorre a história seria um pecado
muito grave, Madalena não queria “Acordar” desta fantasia de felicidade
inalcançável.
O
“largo a arder” também nos remete para o fogo posto na casa de D. Manuel, que
simbolizava os desastres que iriam cair sobre a família.
O
verso “Deixa a alma de vigia” aplica-se a várias personagens de formas
diferentes. Por exemplo, a Telmo, que esteve de “vigia” durante todos aqueles
anos, sem nunca deixar de acreditar que o seu amo estaria vivo. Ou a Madalena
que, dizia viver sobre um “medo” e “contínuos terrores” que “não deixaram gozar
um só momento de toda a imensa felicidade” que o amor de Manuel lhe dava,
estando de “vigia” aterrorizada pela ideia do regresso do seu antigo marido.
Criando uma situação quase de Sebastianismo inverso para Madalena e Manuel, em
vez de esperarem ansiosamente pelo seu salvador, aterroriza-os a ideia do
regresso de D. João, porque este iria significar o fim da sua vida juntos.
Camily (Bom)
A
canção “Você Não Me Ensinou a Te Esquecer”, de Caetano Veloso, simboliza, na
minha perspetiva, os sentimentos tanto de D. João quanto de D. Madalena na obra
de Almeida Garrett.
Como
podemos claramente perceber, D. Madalena nunca se esqueceu de seu primeiro
marido e amor, D. João de Portugal. Já no começo da peça Madalena confessa não
conseguir pôr de lado o seu ex-marido e ser feliz com Manuel de Sousa (“este medo, estes contínuos terrores, que ainda me não deixaram gozar um
só momento de toda a imensa felicidade que me dava o seu amor.”) e sabemos que Madalena esperou o seu amado
por muito tempo antes de voltar a casar-se e, mesmo depois de quase vinte e um
anos, continuamos sem ter a certeza de que a donzela esteja de facto convencida
de que D. João morreu, sendo isto evidenciado na primeira conversa que tem com
Telmo onde, apesar de se mostrar decidida no começo, a meio nota-se certa
dúvida em suas palavras quando o aio a relembra da carta entregue por Jorge que
rezava a volta de João estando ele “vivo ou morto”. Porém, essa mesma frase e
título da canção, adequa-se, ainda, a Madalena e Manuel de Sousa. Já no ato
terceiro, Madalena desespera-se com a possibilidade de ter de deixar o seu
segundo esposo e amado para viver como devota à igreja e podemos ainda afirmar
que nunca esquecerá Manuel de Sousa.
Olhando agora para a canção na perspetiva de D.
João, a letra traz ainda um significado mais forte. É a partir do ato terceiro,
na cena cinco, que sentimos ainda mais o amor do Romeiro por Madalena. Ao saber
que seu amor procurou-o por sete anos antes de se casar outra vez, D. João
aceita, por momentos, o destino, e pede a Telmo que desminta a sua história e
afirma que “D. João de Portugal morreu no dia em que sua
mulher disse que ele morrera.”. Comprando a música de Caetano Veloso com a atitude do Romeiro,
podemos afirmar que, além de ainda amar D. Madalena, como é dito na canção, não
sabe o que fazer sem seu amor, (“Agora, que faço eu da vida sem você?”),
preferindo até a “morte” que viver sem ela.
Já numa outra parte da música, “Você não me
ensinou a te esquecer/ Você só me ensinou a te querer”, pode-se relacionar com
a reação do nobre cavalheiro quando ouve a voz de Madalena e ilude-se com suas
doces palavras, acreditando que ela chama por ele e quer voltar atrás na sua
decisão, até aperceber-se de que ela chama por Manuel de Sousa, não por ele.
A
canção, em toda a sua extensão, descreve as duas histórias de amor impossível
(D. Madalena e D. João/ D. Madalena e Manuel de Sousa) e retrata o sentimento
das personagens: desespero, saudade e amor. Estas personagens agora terão
apenas a memória e, com toda a certeza, esta será inesquecível, tanto para
elas, como para o público.
Amaral (Bom -)
Tendo um começo que pode parecer, aqui e ali,
mais leve – mas sempre pontuado pelos agoiros de Telmo e as angústias de Madalena –, a obra Frei Luís de Sousa termina num fim pesado, relacionado com
morte, desgraça e amor. Este tipo de ambiente relaciona-se perfeitamente com esta
música do autor Slow J, «Teu Eternamente».
A primeira estrofe, encaixa perfeitamente no fim
peça, podendo ser o mesmo um diálogo entre Madalena e Manuel sobre o pesadelo
que penetrou a sua vida e o sonho que é o passado. “Eu sei que ‘tás
aqui ao lado mas hoje sinto-me tão distante / E o nosso silêncio diz tanto”:
estes dois versos explicam que, apesar de permanecerem juntos, a força do amor
entre Manuel e Madalena não é suficiente para os manter unidos durante os
momentos difíceis e que o final, que mostra a redenção de Madalena e Manuel,
através da igreja, apesar das poucas palavras ditas pelos dois, significa o
embaraço e a desolação por parte do casal.
“Eu juro queria
ajudar-te e tentei” serve quase como um pensamento geral, por parte de todo o
elenco, dirigido a Maria, após a sua morte, ou mesmo nos momentos prévios a
esse acontecimento. A morte de Maria causa dor emocional a todas as personagens
e coloca um fim muito dramático à peça. Tal como esta morte, também a
composição mostra um sentimento de culpa e desolação por parte do “eu”, que se
debate com um sentimento de perda e depressão por amor.
Todo o final, mais triste e dramático, é muito
representativo do fim e de tentativas de redenção ou desespero, como a
tentativa de D.João de remediar a situação, pedindo a Telmo que dissesse que “o
peregrino era um impostor”, ou a maneira de Manuel e Madalena exprimirem os
seus pecados ao se devotarem à igreja. O autor da canção também se pretende
redimir (não aos olhos da igreja, mas neste caso, aos olhos da mulher que ama),
mostrando que pretende mudar e pedindo para o desculpar por erros passados.
Por fim, talvez a
semelhança não mais óbvia, mas a com mais impacto: o próprio título da música.
“Teu eternamente” pretende simbolizar o amor que o cantor retém e diz-nos que
esse amor se manterá para sempre, mesmo depois de tudo o que enfrentaram e
enfrentarão. Frei Luís de Sousa mostra o amor eterno por Maria e podemos
ver isso apenas pela disforia que a sua doença traz à peça. Ambas as obras têm
o amor como um símbolo e ambas o representam através do desespero e de uma
promessa de mudança.
Ângelo (Suficiente -)
Esta canção é
perfeita para o triângulo amoroso presente em Frei Luís de Sousa, obra de Almeida Garrett, entre D. João de
Portugal, Madalena e Manuel de Sousa Coutinho. D. João, primeiro marido de
Madalena, desaparece na batalha de Alcácer Quibir e, passado sete anos, Madalena
casa-se com Manuel Coutinho, o que para foi normal, uma vez que D. João de
Portugal foi dado como morto.
A canção «Betrayal»
de Yao Si Ting encaixa perfeitamente na obra de Almeida Garrett logo por causa
do título (traição), uma vez que, em Frei
Luís de Sousa, Madalena casa-se com Manuel de Sousa Coutinho. Apesar de
Madalena não saber que D. João de Portugal ainda estava vivo em cativeiro,
muitos acharam que este casamento seria uma traição.
Logo na primeira fala
a cantora diz «My love has gone away / Quietly after a hundred days» (O meu
amor foi-se embora / Silenciosamente após cem anos). Apesar de que na obra de Almeida
Garett não foram cem dias mas sim
sete anos, podemos dizer que o amor de Madalena por D. João de Portugal foi
desaparecendo ao longo do tempo, o que é normal devido à evidência que lhe foi
mostrada em relação à morte do seu marido. O pensamento «How can i put someone
to the test / When i thought i got the best» (Como é que posso testar alguém /
Quando eu pensava que tinha o melhor) enquadra-se bastante com o pensamento de
D. João de Portugal, pois ele sempre achou que Madalena era a mais honrada dama
de Portugal, até que, após o seu regresso, descobriu que Madalena se tinha
casado com outro homem, Manuel de Sousa Coutinho. Yao Si Ting também diz «Until
the taste of bitterness then i regret / but still that I won’t detest, / the
love I can’t forget,» [Até ao gosto da amargura então eu arrependo-me / mas mesmo
assim eu não irei detestar, / o amor que eu não posso esquecer] quando D. João
de Portugal teve uma surpresa amarga, pois descobriu que Madalena se tinha
casado com outro mesmo assim D. João de Portugal não se esquece do seu amor com
Madalena, nem de Madalena, uma vez que foi a sua primeira e única mulher, antes
de ter desaparecido na batalha de Alcácer Quibir, o que também é dito pela
cantora na parte final da canção: «who i can never forget» (alguém que eu nunca
vou esquecer).
Diogo S. (Bom -)
A frase da canção
“Quem de nós dois / Vai dizer que é impossível / O amor acontecer”, versão
recente cantada em dueto entre Paulo Gonzo e Ana Carolina (2014), pode muito
bem aplicar-se ao amor entre Madalena e Manuel de Sousa, que casaram sete anos
depois de D. João de Portugal ter supostamente morrido em Alcácer Quibir.
Porém, o aparecimento do “defunto”, catorze anos depois do casamento de
Madalena e Manuel de Sousa, fez com que o casamento fosse um pecado, e sua
filha Maria, fruto de um amor proibido.
A expressão usada na
música “Sinto dizer que amo mesmo / Tá ruim pra disfarçar” adapta-se bem ao
sentimento do Romeiro, que continuava a amar D. Madalena sem o esconder de
ninguém. Só que esse amor
não era correspondido, como podemos observar no comentário de Telmo quando diz a Madalena “Que o pobre de meu amo... respeito, devoção, lealdade, tudo lhe tivestes, como tão nobre e honrada senhora que sois... mas amor!”. Já Telmo nunca se esquecerá de como o seu amo, D. João, era um homem gentil e cavalheiro, afirmando que Manuel “...nunca há-de ser aquele espelho de cavalaria e gentileza...” correspondendo à expressão usada na música “E quando finjo que esqueço / Eu não esqueci nada”.
não era correspondido, como podemos observar no comentário de Telmo quando diz a Madalena “Que o pobre de meu amo... respeito, devoção, lealdade, tudo lhe tivestes, como tão nobre e honrada senhora que sois... mas amor!”. Já Telmo nunca se esquecerá de como o seu amo, D. João, era um homem gentil e cavalheiro, afirmando que Manuel “...nunca há-de ser aquele espelho de cavalaria e gentileza...” correspondendo à expressão usada na música “E quando finjo que esqueço / Eu não esqueci nada”.
Quando Manuel
incendeia a sua casa para não deixar que seja ocupada pelos governantes, este,
Madalena, Maria e Telmo mudam-se para casa de D. João. Mais tarde João aparece
a Madalena, inicialmente apresentando-se como um “ninguém”, mas, depois, Jorge
(irmão de Manuel) apercebe-se de que é D. João.
Os versos “Entre nós
dois / Não cabe mais nenhum segredo” transmitem bem o que D. João sentiu quando
contou a verdade a Telmo.
A separação de Manuel
e Madalena, provocada pelo aparecimento do Romeiro, deixou Madalena triste e
desesperada, ainda tentando arranjar uma solução. Mas Manuel não deu esperanças
a Madalena dizendo-lhe “Todas estas coisas são já indignas de nós’’. Mesmo sabendo que continuava a amá-la, Manuel
fugiu dizendo “Adeus, adeus!”, como na canção, modístico “Eu procurei qualquer
desculpa pra / Não te encarar”.
Toda esta situação (o
aparecimento de D. João, a vergonha de ser o fruto de um amor proibido
tornando-a uma bastarda e a separação dos pais) agravou o estado débil de
Maria, o que, sofrendo de tuberculose, a levou à morte, sendo as suas últimas palavras “...cobri-me bem
estas faces, que morro de vergonha...morro, morro... de vergonha’’.
Sebastião (Bom-)
A canção “A Thousand Years” (Mil Anos), de Christina Perri, da banda
sonora do filme The Twilight Saga:
Breaking Dawn, Pt. 1, pode ser interpretada em função dos sentimentos de D.
João de Portugal e Telmo na peça Frei
Luís de Sousa.
“I have died everyday waiting for you” (Eu tenho morrido todos os dias
esperando por ti) é o primeiro verso do refrão da canção e descreve
perfeitamente os pensamentos de D. João de Portugal depois da perda da guerra
de Alcácer Quibir. Ele passou os vinte e um anos seguintes a tentar regressar a
casa, e cumprir o que tinha escrito na sua carta antes de ir para à guerra:
“Vivo ou morto, Madalena, hei de ver-vos pelo menos ainda uma vez neste mundo”.
Esses sentimentos de persistir e lutar estão presentes na canção — “I will be
brave / I will not let anything take away / What's standing in front of me” (Eu
vou ser corajoso / Eu não vou deixar levar nada / Do que está à minha frente).
Os versos “I have loved you for a thousand years / I’ll love you for a
thousand more” (Eu tenho te amado por mil anos / Eu vou te amar por mais mil
anos) também podem ser descritos como os pensamentos de Telmo, um amor de
amigo, que nunca esqueceu o seu amo e sempre ficou com ele no seu coração, —
“(...) não sei ler latim como o meu senhor... quero dizer como o Senhor Manuel
de Sousa Coutinho, …” —; neste exemplo, Telmo sugere que o seu amo continua a
ser D. João de Portugal, duvidando aliás da morte do seu amigo (o Romeiro — que
é D. João de Portugal disfarçado — para Telmo: “Tu, bem que duvidaste sempre da
minha morte”).
Inicialmente, o Romeiro fica zangado com a descoberta de que D.
Madalena se casou e tem uma filha. Posteriormente, Telmo conta-lhe dos anos em
que ela ficou à espera dele. O Romeiro apercebe-se da miséria e dor que ele
causou à família. Decide deixá-los e pede a Telmo que minta, pede para ele
dizer à família que era um impostor. Assim, o Romeiro tenta despedir-se do seu
amor, mas apercebe-se de que este faz parte eternamente da sua vida, tal como a
canção implica que ele tem de ser forte, continuar e ir em frente mesmo sofrendo,
tal como dizem os versos “But watching you stand alone? / All my doubt suddenly
goes away somehow” (mas ver te levantares sozinha / todas as minhas dúvidas
desapareceram de alguma forma). Posteriormente, apercebemo-nos de que ele já
vai tarde...
Pedro P. (Suficiente +)
A canção “Let it be”, dos Beatles, teria dado
bons conselhos a D. João de Portugal se existisse há quatro séculos na altura.
Logo a partir do nome da canção, “Let it be”, se D. João de Portugal tivesse apenas
deixado Madalena e a sua família continuarem as suas vidas e não tivesse
voltado, tinha evitado as confusões criadas dentro desta família, como a
separação de Manuel de Sousa e Madalena de Vilhena.
O
verso “And in my hour of darkness she is standing right in front of me” fez-me
lembrar um dos momentos mais dolorosos desta história para D. João de Portugal,
a cena em que Madalena acha que Telmo está a falar com Manuel de Sousa dentro
da igreja e Madalena implora por uma última conversa com o seu esposo, quando,
na realidade, é João de Portugal que está por detrás da porta em frente dela
(“Esposo, esposo! Abri-me, por quem sois”, “Marido da minha alma, pelo nosso
amor, pelos doces nomes que me destes”). A última frase convence João de
Portugal durante poucos momentos, o que cria um esclarecimento doloroso quando
Madalena diz “(…) meu Manuel”.
Apesar
de os Beatles cantarem o verso “For though they may be parted, there is still a
chance that they will see” com o intuito de duas pessoas que se amam reatarem a
sua relação, podemos interpretar o verso noutro sentido mais relacionado com o Frei Luís de Sousa. Mesmo quando achamos
que alguém não irá voltar, existe sempre uma possibilidade de o voltarmos a
ver, querendo ou não, como acontece na obra, na qual Madalena acha que o seu
ex-marido, D. João de Portugal, morreu na batalha de Alcácer-Quibir, no
entanto, sempre com alguma dúvida, o que a atormenta ao longo da peça,
especialmente no dia do vigésimo primeiro aniversário da batalha (“Hoje…hoje!
Pois hoje é o dia da minha vida que mais tenho receado… que ainda temo que não
acabe sem muita grande desgraça”).
Esta
canção também poderia ser boa para Telmo, pois este, no meio do caos em que
esta família está a entrar, tem sempre alguém por quem é capaz se de sacrificar
até ao fim da obra, Maria: “And when the night is cloudy there is still a light
that shines on me”. Funciona ela como luz que brilha nele no meio da escuridão:
”Que há um anjo… uma outra filha minha senhor,que eu também criei…”.
Ivo (Suficiente +/Bom-)
A canção “Por amor” é de André Mingas, músico e
compositor angolano, um monstro sagrado da cultura e política de Angola, tendo
sido em tempos ministro da Cultura do país. André Mingas foi o criador do semba
jazz, uma mistura do jazz com a música tradicional angolana e foi um dos
fundadores da União de Artistas Angolanos. André Mingas, juntamente com o seu
irmão, Ruy Mingas, foi o compositor do hino nacional angolano.
Esta música pode ser um desabafo de D. João de
Portugal, que volta vinte e um anos depois da sua alegada morte. Após tanto
tempo perdido em terras africanas, D. João de Portugal regressa de Alcácer-Quibir.
No regresso a casa, D. João de Portugal, que assume a figura de Romeiro,
descobre que a sua antiga mulher, D. Madalena de Vilhena, já está casada e com
uma filha. O sentimento de raiva e vingança tomam conta do Romeiro, que tem a
intenção de desonrar a alegada viúva e a sua família.
O Romeiro acaba por anunciar a D. Madalena de
Vilhena e a seu cunhado, Frei Jorge, que D. João de Portugal estava vivo, uma
atitude fora do normal por parte da personagem, dado que era uma pessoa honrada
e exemplar.
Os versos “Os beijos que eu tinha para dar /
ficaram no mar” e “Veio a voz e eu não quis nem falar / Voltei pra te ver
regressar” são os que encaixam melhor nas atitudes do Romeiro.
D. João de Portugal percorreu tantos caminhos
durante todos anos para voltar a ver a sua amada, que, ao ouvir falar de D.
Madalena, teve de retrair os seus sentimentos. Mas, mais tarde, ao ver o estado
de D. Maria de Noronha, filha de D. Madalena e Manuel de Sousa Coutinho, decide
não progredir com o plano de desonrar a viúva. Entretanto, D. João de Portugal
reúne com o seu antigo aio, Telmo, que sempre acreditou que o seu amo iria
acabar por voltar a casa, e, agora, ouve a sua intenção.
D. Madalena, ao saber que o seu antigo marido
estava vivo, encontra-se numa situação de angústia, impotência e frustração depois
de tanto dinheiro, empenho e esforço gastos para procurar o seu marido, que, sete
anos depois ao seu desaparecimento, está vivo e que a sua filha estava doente
com tuberculose e a sua morte podia estar próxima.
No entanto, o Romeiro assume a atitude de que
todos nós estávamos à espera, decide não seguir com o seu plano e pede ajuda a
Telmo, pedindo para que afirmasse que a notícia da volta de D. João de Portugal
era falsa.
Este final é trágico para todos nós D. Maria de
Noronha, no leito da sua morte, descobre a separação dos seus pais e
considera-se a “filha do pecado” e o Romeiro diz a Telmo para que ajude a
família despedaçada.
D. João de Portugal talvez vá fugir para não ter
que confrontar o seu passado e acabe por morrer sozinho, André Mingas acaba por
morrer em dois mil e onze como uma lenda viva angolana depois de trinta anos de
êxitos e glórias.
Miguel B. (Bom +)
Subtil, no sentido de
“lenta e singelamente”, foi a forma como D. Madalena substitui D. João de
Portugal por D. Manuel de Sousa, mas também o nome do autor de uma das minhas
canções favoritas, “Difícil de Explicar”, que sem grande dificuldade consegue
ilustrar parte da obra teatral Frei Luís
de Sousa.
“Amor é difícil de
explicar / difícil como o facto de o querer / perceber sem o encontrar / sem o
olhar, sem o tacto”, o início da canção lembra uma das bases de conflito no
desenrolar da ação quando D. Madalena decide começar uma nova vida, casando de
novo. Sem saber se D. João ainda seria vivo depois de ter partido numa aventura
de que, na época, eram poucos os que regressavam com vida, a falta do tato e do
olhar constante não perdoa. Se para uns faz esquecer o passado, como
aparentemente fez D. Madalena ao casar com D. Manuel, a outros dá forças para
regressarem aos braços de quem mais gostam, como acontecera com D. João.
Seriam inúmeros os
guerreiros que combatiam não só ao lado de D. João, mas também contra ele, que
de certeza muitas vezes pensaram na sua família e, em particular, na sua amada.
Contudo, a parte do refrão que citarei – “E quando a dor se impõe / Não há
volta a dar / Alguém repõe o teu lugar” – representa o que aconteceu a D. João –
a inevitabilidade de ser substituído por D. Manuel perante a dor de D. Madalena.
Neste caso, não é uma dor de amor, mas uma dor de perda, de tempo perdido em
dedicação e de esforço fora cumprir o seu papel de esposa fiel quando,
referindo-se a D. João, D. Madalena confronta Telmo por este aludir incessantemente
ao regresso do amo (“Sabeis como chorei a sua perda, como respeitei a sua
memória, como durante sete anos, incrédula a tantas provas e testemunhos de sua
morte, o fiz procurar por essas costas de Berberia”).
É também uma dor de
não conseguir ser totalmente feliz com o homem que ama, evidenciada num momento
de meditação sobre o que tem sido a sua vida com D. Manuel (pensando em D.
Manuel, exclama: “Oh! Que não o saiba ele ao menos, que não suspeite o estado
em que vivo… este medo, estes contínuos terrores que ainda não me deixaram
gozar um só momento de toda a imensa felicidade que me dava o seu amor. Oh! que
amor, que felicidade… que desgraça a minha!”). Há, assim, o desejo, de alguma
forma oculto, de que D. João não volte. Este desejo assume paralelismo com o
pedido de libertação de uma relação, também expresso na canção: “Vai e não
voltes mais / Não, não, voltes mais”.
Henrique (Suficiente)
Os versos “Ain't nobody hurt you like I hurt you
/ But ain't nobody love you like I do” (“Ninguém nunca te magoou como eu te
magoei / Mas ninguém te amou como eu”), da canção “Happier”, de Ed Sheeran,
artista britânico muito famoso pela qualidade das suas composições, podem-se
relacionar com o romeiro ou D. João de Portugal, uma personagem da peça Frei Luís de Sousa. Embora ele não tenha
magoado propositadamente Madalena (pois, na altura, não havia maneira de
comunicar a sua sobrevivência à família que vivia em Portugal), Madalena
sentia-se, por vezes, culpada pelas suas atitudes depois do desaparecimento de
D. João. Este, parecendo sentir mágoa, decidiu reaparecer nas vidas destas
pessoas, provavelmente pelo amor que sentia por Madalena, no entanto não se
apercebeu das consequências que essa decisão poderia causar.
“Promise that I will not take it personal, baby /
If you're moving on with someone new” (“Prometo que não vou levar para o lado
pessoal, querida / Se você está seguindo em frente com alguém novo”). Ao dizer
“Que lho leve Deus em conta e lhes perdoe como eu perdoei já” (ato 3, cena 2),
o romeiro mostra-se recetivo ao facto de Madalena superar o seu desaparecimento
e começar uma vida nova, e, embora esteja triste, prefere alimentar a
felicidade da sua ex-mulher: “Cause baby you look happier, you do” (“porque tu
pareces mais feliz, querida, pareces mesmo”).
Mesmo perdoando o “pecado” de Madalena, o romeiro
não consegue evitar a tragédia final. No século XVI, o que Madalena fez é
considerado pecado e muito mal visto pela sociedade; por isso, logo a seguir a
se descobrir a verdadeira identidade do romeiro, Madalena decidiu separar-se de
Manuel de Sousa e ambos se dedicaram completamente a Deus. No entanto, ao
tomarem essa decisão, deixaram a sua filha Maria (que estava doente)
desamparada, o que poderá ter contribuído para a sua morte.
Depois deste acontecimento, D. João sentiu-se
culpado, tendo mais ou menos o mesmo sentimento que Madalena tinha no início da
peça. No entanto, D. João fizera o que fez por amor, mas, mais importante,
fizera-o para trazer a felicidade de volta àquela família. Apenas não sabia as
consequências do seu ato e estas acabaram por acontecer da pior maneira. Tal
como a música ilustra, o bem que se quer de uma pessoa está acima do amor que
se tem por esta. Acho que João seguiu esta regra e tomou a decisão certa, só
que teve azar nas suas ações.
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