Saturday, August 25, 2018

Amor de Perdição pelo 11.º 4.ª


Gonçalo (Bom (+))
A vida é bela, filme cuja ação se passa em meados dos anos quarenta do século XX, parece, à primeira vista, apenas mais um dos inúmeros retratos da Segunda Guerra Mundial e do Holocausto. Somos, no entanto, surpreendidos por uma arrebatadora e comovente narrativa de amor e superação entre um pai e um filho que atravessam uma das fases mais escuras da História com alegria e esperança.
Nos capítulos que referirei, as duas personagens principais, Simão e Teresa, vivem ainda na ilusão de que poderão um dia ficar juntos (“súplicas ao seu amor como recompensa dos passados e futuros desgostosos, visões encantadoras do futuro” Cap. IV), tal como Guido sonha em voltar a reunir a sua família separada pela guerra.
Como Simão, Guido dispõe-se a fazer tudo para conseguir o seu último desejo. Simão arrisca a prisão por ódio a Baltasar (“Ir dali a Castro Daire e apunhalar o primo de Teresa na sua própria casa” Cap. IV), Guido arrisca a própria vida e sanidade mental para manter o pequeno Joshua na fantasia de que toda a situação em que se encontravam se tratava apenas de um jogo elaborado pelo pai. O herói da obra acaba por retirar a vida ao seu rival, que perece com “o alto do crânio aberto por uma bala” Cap. XX , e entrega-se às autoridades, por honra, sendo condenado ao degredo. Por paralelismo, também a personagem central do filme de Roberto Benigni, alcança a proeza de manter o filho agarrado à esperança e à alegria até ao fim da guerra e do tempo em cativeiro no campo de concentração   acabando, no entanto, por ser levado por autoridades do campo, podendo adivinhar-se o destino da personagem.
Em ambos os casos, as personagens precisam uma da outra para se manterem sãs e com esperança de que poderão ficar juntas, com normalidade. Assim, são adotados comportamentos que visam esse mesmo objetivo. No caso da película italiana, o pai usa a constante e contagiante energia do filho, onde encontra a força de vontade para ajudar o filho a manter-se alheio à situação em que realmente se encontram através do já mencionado jogo. Por outro lado, os fidalgos que vivem o amor proibido recorrem à escrita de cartas e envio de pequenos bilhetes em que declaram os sentimentos que os percorrem e os planos que têm para quando se reencontrarem (“Simão releu a carta duas vezes [...] eram expressões ternas [...] novos juramentos de constância, e sentidas frases de saudade.” Cap. IV).
Temos duas histórias distintas, em épocas e contextos díspares, mas com o amor em comum: dois amantes separados por assuntos de um passado que não lhes diz respeito, e uma família, castigada por um regime injusto e abusivo, que encontram na pessoa que mais amam a força para enfrentar os seus assustadores destinos.

Tomás (Bom/Bom (-))
Amor de perdição é uma novela portuguesa, escrita por Camilo Castelo Branco, publicada em 1862 e que procura retratar a década inicial de 1800. Já La vita è bella é uma obra cinematográfica Italiana, produzida por Roberto Benigni que, apesar de ter sido elaborada em 1997, remete-nos para a segunda guerra mundial, estabelecendo-se um facto algo curioso: apesar dos 135 anos que separam as suas primeiras publicações, o filme do italiano distancia-se cerca de 140 anos da novela de Camilo, devido ao tema retratado nas obras.
Em La vita è bella, recuamos aos tempos do Holocausto. Estamos nos finais dos anos trinta do séc. XX, Roberto Benigni (Guido Orefice, no filme), que desempenha a personagem principal – tendo recebido em 1998 o prémio de melhor ator pela Academic Awards –, muda-se para Arezzo. É lá que trabalha no restaurante do tio, e é ainda lá que encontra o seu amor. Este amor, porém, era quase impossível. A sua amada, Dora, além de pertencer a uma classe social bastante elevada, era praticamente já casada. Estabelece-se aqui um paralelismo entre as duas obras: em Amor de perdição, Teresa era forçada a casar com o seu primo Baltasar (“Vais hoje dar a mão de esposa ao teu primo Baltasar, minha filha”), sendo ainda a rivalidade entre as famílias dos amados um obstáculo ao amor; em La vita è bella, o amor entre Guido e Dora é restringido pela mãe de Dora, que a obriga a casar com um fascista com grande relevância em Itália.
É após diversas demonstrações de amor entre os apaixonados – em La vita è bella, Guido começa a ganhar a atenção de Dora com os seus “aparecimentos repentinos” e as suas atitudes divertidas, tendo-a conquistado quando, a pedido dela, a levou da festa com o seu futuro marido, a cavalo; em Amor de Perdição, as demonstrações de amor de Simão levaram à morte do pretendente de Teresa, aquando este matou Baltasar (“Baltasar tinha o alto do crânio aberto por uma bala”) – que surge a maior divergência entre as obras. Enquanto Guido e Dora encontram o seu amor correspondido e têm um filho, Teresa e Simão têm os seus destinos despedaçados. Teresa encontra-se num convento, e Simão, devido ao homicídio do primo de Teresa, é degredado para a Índia após lhe ter sido “perdoada” a pena de morte.
E é aqui que La vita è bella nos prende ao ecrã. Quando se pensa que o filme vai acabar, dá-se uma reviravolta e tudo tem um fim. Guido e o seu filho são mandados para um campo de concentração de judeus, no dia de aniversário de Giosué (filho). Dora dá a sua maior prova de amor em todo o enredo: apesar de não ser judia, ordena que a levem para o mesmo campo de concentração da sua família. Guido faz tudo para salvar o filho e a mulher, escondendo de Giosué a cruel verdade daquele campo. Diz-lhe que é um jogo onde o filho tem de fazer o que ele diz, com o objetivo de alcançar mil pontos e receber o prémio final, um tanque. Durante o seu tempo lá, demonstra amor à sua amada: fala-lhe pela rádio do quartel e põe a música deles a tocar. Quando o campo de concentração se aproximava do seu final, com o término da guerra, Guido mascara-se e introduz-se entre as mulheres para salvar Dora, acabando por morrer naquele ato de amor.
A história acaba com Giosué no “prémio final”, um tanque, e um encontro sentimental entre filho e mãe. Em Amor de Perdição, o final assemelha-se, visto que tanto Simão como Teresa morrem. A única diferença é que Guido e Dora puderam deixar uma amostra do seu amor.

Rodrigo (Bom +/Muito Bom -)

O filme O Rapaz do Pijama às Riscas (Mark Herman, The Boy in Striped Pajamas, 2008) centra-se numa das páginas mais negras da história da Humanidade: o Holocausto, uma época bastante caracterizada em muitos livros e filmes, tanto pelos seus horrores indescritíveis como pelos sentimentos de respeito, solidariedade e união que suscita.
Bruno surge como o herói que quebra fronteiras e ultrapassa preconceitos. Sendo muito novo (oito anos de idade), não lhe foi ainda incutido o espírito nazi que inundou a Alemanha nos antecedentes da infame Segunda Guerra Mundial. Ele vê o mundo como uma criança, alheio a todos os crimes de ódio e disputas entre povos. Tal permite-lhe ver o bem nas pessoas de uma forma tão simples e inocente que apela de imediato à empatia de quem assiste, do modo carismático que é típico da sua alegre personalidade.
Simão, herói romântico de Amor de Perdição (de Camilo Castelo Branco; 1862), vai contra a vontade do pai e luta pelo amor que sente por Teresa, filha do inimigo do seu progenitor. Este cenário de guerra entre duas famílias rivais contrasta com a perseguição exercida pelos nazis aos judeus, povo por eles considerado inferior. Bruno também desobedece à família e vai conversar diariamente com Shmuel, um dos prisioneiros da sua idade. Começa uma grande amizade entre os dois rapazes, que, como os amores de Teresa e Simão, desagrada às figuras parentais dos protagonistas (o pai de Bruno, aliás, trabalhava no próprio campo de concentração).
Também a prisão é uma dimensão comum às duas obras. Se, por um lado, os campos de concentração, cenário do filme, eram grandes prisões, por outro, também Simão foi detido, neste caso por ter assassinado Baltasar, primo de Teresa, que se preparava para a desposar (“Eu não fujo – tornou Simão. – Estou preso. Aqui tem as minhas armas.”). O próprio livro se inicia com um segmento em que o narrador se encontra na Cadeia da Relação e se depara com os registos da detenção de Simão, que considera dignos da comoção de qualquer indivíduo (“O leitor decerto se compungia; e a leitora, se lhe dissessem em menos de uma linha a história daqueles dezoito anos, choraria!”).
O desfecho trágico é um elemento comum a filme e livro, em ambos os casos através da morte dos protagonistas. Teresa morre após se despedir de Simão, que, por honra (quase exagerada e roçando o masoquismo), declina toda a ajuda da família e decide enfrentar a sua pena de exílio, acabando também, porém, por morrer depois de poucos dias de viagem. Mariana, cujo pai foi assassinado por vingança do filho de quem ele matara havia anos, suicida-se após a morte do protagonista (“E, antes que o baque do cadáver se fizesse ouvir na água, todos viram, e ninguém já pôde segurar Mariana, que se atirara ao mar.”), terminando assim o ciclo de mortes e tragédia provocado pelo amor de perdição a que o título do livro se refere. No filme, Bruno também morre com honra, vestindo um dos “pijamas às riscas” para ajudar Shmuel a encontrar o seu pai, que tinha sido morto numa câmara de gás. Acaba por ser levado acidentalmente para uma delas, concluindo-se o filme com a morte dos dois rapazes, que morrem asfixiados de mãos dadas, com a família de Bruno impotente para o salvar.
O Rapaz do Pijama às Riscas estabelece uma linha ténue entre o bem e o mal, na qual o protagonista se insere num contexto de ódio e genocídio, estabelecendo uma ponte entre o seu pai, que trabalhava no campo de concentração, e Schmuel, o rapaz que dá o nome ao filme. Também as atitudes de Simão erram pelo espetro da moralidade, sendo tão românticas e nobres de caráter como irracionais e violentas.

Emilly (Suficiente +)

Dirty Dancing, um filme clássico de 1987, relata a história de Frances "Baby" Houseman, que, ao passar férias num resort com a sua família, conhece Johnny Castle, um instrutor de dança com um passado bastante diferente do dela. O seu pai, Jake Houseman, proíbe que Baby tenha algum tipo de relação com Johnny, uma vez que ele é mais velho e não tem as habilitações académicas que Jake projeta para um futuro namorado de Baby.
Também a novela do escritor português Camilo Castelo Branco, um Amor de Perdição, se baseia no tema de amor proibido. Simão Botelho, um jovem, rebelde de temperamento incontrolável, filho de Domingos Botelho, apaixona-se por Teresa de Albuquerque; uma relação entre Simão e Teresa é estritamente proibida, já que as suas famílias são inimigas («Nenhum infame há de aqui pôr um pé nas alcatifas dos meus avós. Se és uma alma vil, não me pertences, não és minha filha, não podes herdar apelidos honrosos, que foram pela primeira vez insultados pelo pai desse miserável que tu amas!»). No caso de Baby e Johnny, a sua relação é proibida visto que Johnny não pode ter relações com clientes do resort e os pais de Baby nunca quereriam que a sua filha estivesse associada a alguém como Johnny.
Simão Botelho é o típico herói romântico. Ele é um homem bonito («belo homem com as feições de sua mãe, e a corpolência dela»), um rebelde, um marginal, instável, violento e impulsivo, «convive com os mais famosos perturbadores da academia, e corre de noite as ruas insultando os habitantes e provocando-os à luta», até o seu próprio irmão teme o seu «génio sanguinário, ainda que o pai dele admire a bravura, comparando-o à «figura e génio de seu bisavô Paulo Botelho Correia, o mais valente fidalgo que dera Trás-os-Montes». No entanto, após ter-se apaixonado por Teresa, mudou por completo; ele passou a lutar por amor ideial, a ser sincero, fiel e honrado, o que o tornou ainda mais num herói romântico. Já Johnny era um homem de grande beleza física, impulsivo, rebelde e espontâneo.
Para contrastar, Dirty Dancing tem o típico final feliz, com Johnny a acabar por ficar com Baby (com o consentimento de seus pais), enquanto que Amor de Perdição acaba com a morte tanto de Simão como de Teresa («É já o meu espírito que te fala, Simão. A tua amiga morreu. A tua pobre Teresa, à hora em que leres esta carta, se me Deus não engana, está em descanso»; «Entrou o comandante com uma lâmpada, e aproximou-lha da respiração, que não embaciou levemente o vidro. /  — Está morto!... — disse ele.»).

Pedro (Muito Bom)

O enredo de Ilha do Medo (Martin Scorsese, Shutter Island, 2010) desenrola-se na década de cinquenta do século XX e descreve a história de Teddy Daniels, um agente policial que é levado a investigar a fuga de uma paciente de um hospital psiquiátrico localizado numa ilha isolada. Esta produção cinematográfica revela múltiplas ligações a Amor de Perdição, romance da autoria de Camilo Castelo Branco.
Mal chegam ao hospício, Teddy Daniels e o seu parceiro Chuck Aule encontram restrições à sua ação policial. A direção da instituição interdita o acesso a determinadas instalações e aparenta ocultar factos relevantes para a resolução do mistério. Contudo, o detetive não se conforma com esta conjuntura e persiste em ultrapassar os obstáculos impostos, evidenciando-se a sua rebeldia e desobediência às normas do manicómio. Na novela, Simão Botelho denota traços semelhantes, característicos do herói romântico, dado que se insurge contra as condições da sociedade e apoia os desfavorecidos, destacando-se o episódio em que protege um criado da ira dos «donos das vasilhas», «parti[ndo] muitas cabeças» e «remat[ando] o trágico espetáculo» ao «quebrar todos os cântaros» num ato de descontentamento social e político.
Numa cena do filme, observa-se a residência de Teddy e sua esposa, Dolores Chanal: uma vivenda situada numa área remota, próxima de um enorme lago e rodeada por uma floresta infindável que lhe conferem uma leve beleza paradisíaca. Retrata-se um cenário idêntico ao idealizado por Simão e Teresa, uma «casinha, defronte de Coimbra, cercada de árvores, flores e aves» onde os amantes passeariam «à margem do Mondego».
No clímax do thriller, descobre-se que o enigma não passava de uma complexa encenação elaborada com o intuito de curar Andrew Laeddis, verdadeira identidade de Teddy, que seria o doente mental mais astuto e perigoso do hospício. Caso a operação se revelasse infrutífera, Andrew seria submetido a uma lobotomia, de modo a deixar de representar uma ameaça para os restantes pacientes.
Tanto Andrew como Simão desempenham um papel preponderante no falecimento de suas amadas. A recusa de Simão em cumprir pena na cadeia de Vila Real arredou de Teresa as derradeiras ilusões de uma união amorosa e desencadeou o sofrimento que culminaria na sua morte, visto que ela própria confessa que «morreu quando [ele] lhe tir[ou] a última esperança». Na fita, Andrew assassina a mulher, que sofria de um distúrbio mental que a levara a afogar os três filhos no lago adjacente à casa. Enquanto abraça o marido desesperado, Dolores suplica-lhe que a “liberte”, contrastando com o que Teresa exigia de Simão, pois queria que desfrutassem da sua paixão. Este terá sido um dos propulsores da patologia do detetive, forçando-o a desenvolver uma complexa narrativa, na qual não teria morto a esposa e o homicídio dos filhos não ocorrera.
Quando Chuck aborda Andrew para atestar a sua sanidade, este apresenta-lhe um discurso que denuncia que ainda estará aprisionado àquela fantasia. No entanto, percebe-se que está ciente das circunstâncias e fá-lo propositadamente, porque prefere viver sem consciência da própria existência a ter de lidar com os horrores que caíram sobre a sua família.
Também Simão sofre por se considerar autor da tragédia que vitimou quem amava («Tanta gente desgraçada que eu fiz!»), tomando uma decisão similar à do polícia: opta pelo degredo na Índia para se distanciar do cenário irremediavelmente trágico («Abomino a pátria, abomino a minha família; todo este solo está aos meus olhos coberto de forcas»).
Os amantes perecem, crendo que se encontrarão na eternidade; Andrew põe termo ao seu intelecto, cavando um fosso perpétuo entre si e a sua mulher.


Eduardo (Suficiente +/Bom -)
Ponyo À Beira-mar foi um filme escrito por Hayao Miyazaki e produzido pelo Studio Ghibli. Este filmezinho retrata uma improvável história de amor entre um rapaz e uma rapariga de cinco anos. A improbabilidade desta história vem do facto de que a rapariga é um peixe, filha de um feiticeiro que teria renunciado à sua humanidade há muitos anos e da poderosa Rainha do mar. Apesar de ser um filme bastante inofensivo acaba por ter muitas parecenças com a grande novela de Camilo Castelo Branco, o Amor de Perdição.
Um dos aspetos mais incisivos de que gostaria de falar é o herói presente em ambas as histórias. Enquanto que na obra de Camilo Castelo Branco temos Simão Botelho como o herói romântico, o herói impulsivo e independente que vai contra todas as normas da sociedade e que atravessa todos os obstáculos para alcançar a sua grande amada, no filme do amor entre rapaz e peixe temos a Ponyo, que renunciará a tudo para estar de volta com o rapaz humano que conheceu há menos de uma hora (o muitíssimo realístico amor à primeira vista estando sempre presente).
Antes de entrarmos mais concretamente nesta ideia dos heróis românticos gostaria de estabelecer outra parecença e contraste entre a obra camiliana e o filmezito, bastante importante, o conflito entre as “famílias” dos dois personagens principais. Em Amor de Perdição temos Tadeu de Albuquerque e Domingos Botelho que, por razões puramente formais, estão constantemente a batalhar um contra o outro. Devido a esta rivalidade, Simão e Teresa rapidamente percebem que o seu amor seria atribulado e repleto de obstáculos como Tadeu ameaçar enviar Teresa para um convento se esta não renunciasse ao amor por Simão casando-se com o primo Baltasar (“Hás de casar! Quero […] Morrerás num convento!”). Em Ponyo À Beira-mar temos também um conflito que acaba por intervir na história de amor entre Ponyo e Sosuke, o conflito entre a Natureza e a Humanidade. O maior interveniente neste conflito é o pai de Ponyo, o feiticeiro Fujimoto, que, no primeiro ato do filme rejeita completamente a ideia da filha de querer viver como um ser humano. Para prevenir que Ponyo volte a encontrar Sosuke, o feiticeiro acaba por prender a filha numa bolha (veremos mais à frente que talvez esta não tivesse sido a melhor ideia). Um contraste interessante entre a obra e o filme é que na obra temos Domingos e Tadeu a tentar pôr um fim ao amor entre Teresa e Simão, enquanto que, no filme, só Fujimoto quer impedir o amor entre Ponyo e Sosuke, sendo Lisa, a mãe de Sosuke até bastante recetiva a esta história, não entrando em conflito com o pai de Ponyo (isto está parcialmente incorreto se virmos que, mesmo no início do filme, o feiticeiro procura pela filha-peixe fingindo, que está a regar plantas ao pé da casa de Lisa, esta fica imediatamente suspeita, dizendo-lhe ele que não pode usar herbicidas em plantas, o que é um pouco irónico, já que Fujimoto é apologista da natureza).
Retomando finalmente a ideia dos heróis românticos, gostaria de me focar num dos eventos mais importantes das suas histórias, sendo o evento de Ponyo quase paralelo ao evento de Simão. O acontecimento na obra de Camilo Castelo Branco é o momento em que Simão mata a tiro o primo Baltasar no seu desespero e impulsividade de estar com Teresa. O acontecimento na história de Ponyo sucede pouco depois de o pai a prender numa bolha na tentativa de impedir a sua transformação num ser humano. Ela facilmente consegue fugir da bolha e, na sua alegria e impulsividade para se transformar em humana para voltar a estar com Sosuke, liberta os seus poderes, causando um enorme desequilíbrio na natureza, afundando debaixo do mar a aldeia em que Sosuke vivia. Estes dois momentos identificam perfeitamente os nossos protagonistas como heróis românticos, podendo ver-se a sua impulsividade para estar com aqueles que eles mais amam, o desejo de liberdade e os riscos que estão prontos a passar para alcançarem aquilo que mais desejam.
Concluindo, gostaria de referir o que os dois heróis sacrificaram para poderem alcançar o seu amor. Simão sacrificou a sua vida no final da obra para conseguir encontrar Teresa no Paraíso onde poderiam ficar juntos para sempre. Ponyo sacrifica os seus poderes, restaurando o equilíbrio da natureza e transformando-se num ser humano permanentemente para poder ficar com Sosuke. Ambas estas histórias (apesar de uma ser ligeiramente mais trágica que a outra) apresentam-nos o Amor como algo que transcende mundos e que liga as pessoas mais improváveis. É essa a lição que as tragédias e histórias de amor nos ensinam, o amor existe sempre desde que as duas pessoas estejam juntas (o que não acontece sempre) contra tudo e todos, seja no Paraíso, no Oceano ou na Terra.

Júlia (Bom +)
A história narrada por Noah em O diário de nossa paixão (Nick Casavetes, The notebook, 2004), filme dramático baseado no romance homónimo de Nicholas Sparks, focaliza-se na sua relação proibida com Allie devido às suas divergências de classes sociais, sendo ele o narrador homodiegético de toda a trama. Mesmo que por razões distintas, pode-se relacionar o drama com o romance Amor de perdição, de Castelo Branco, visto que em ambas as situações há amor correspondido, mas interrompido por suas famílias.
De forma abrangente, pode-se comparar o amor impossível que o filme relata com o amor não correspondido que Mariana nutre por Simão (“E o coração da pobre moça [Mariana], avergando ao que a consciência lhe ia dizendo, chorava”, cap. X), sendo este, todavia, realmente impossível, visto que Simão se encontrava apaixonado por Teresa, opondo-se à situação retratada no filme: o sentimento era recíproco, mas impedido.
Ademais, elementos com extrema importância em ambas as tramas tornam-as ainda mais próximas, tais como a relevância das cartas em cada uma delas, mesmo que de maneiras antagónicas. No filme, após os obstáculos postos pela família de Allie, o casal de namorados evita a segregação imposta através da troca de cartas, visando prolongar o seu amor. Todavia, a entrega destas, sempre direcionadas para a casa de Allie, possibilitou à mãe da jovem recebê-las todas e escondê-las da filha, alegando estar a protegê-la de um futuro que não lhe pertencia – a pobreza –, forçando-a a desistir do seu suposto não correspondido amor, uma vez que nunca recebia respostas de Noah. Em Amor de perdição, a relevância das cartas advém de ser essa a maior comunicação entre os apaixonados, visto que, devido às proibições por parte especialmente da família Albuquerque, o contato físico entre eles era quase nulo. O contraste presente deve-se a, no romance de Castelo Branco, haver a intervenção de terceiros na entrega das cartas, tais como Mariana – “Sou uma portadora desta carta para a vossa excelência./É de Simão! – Exclamou Teresa.” (cap. X) –, tornando possível a entrega recíproca das cartas.
Porém, a maior distinção encontrável nas histórias é, definitivamente, os desfechos das mesmas, visto que são completamente opostos. Em O diário de nossa paixão, a história apresenta um enredo dramático que os separa mas, no final, após sete anos separados – e Allie já ter noivado com outro homem –, o previsível torna-se realidade, considerando que Allie decide regressar ao local onde conheceu Noah e, por impulsos de amor, rompe o relacionamento com o seu noivo para viver com aquele que sempre amara. Ao contrário, o desfecho de Amor de perdição revela-se mais longínquo do tradicional e esperado, tendo um final triste e dramático, com a morte das duas personangens principais, tendo Teresa deixado as últimas cartas para Simão antes de falecer, onde anunciava a morte – “É já meu espírito que te fala, Simão. [...] A tua pobre Teresa, à hora que leres esta carta, se Deus não engana, está em descanso.” (cap. XX) –, enquanto que Simão, após saber que a amada o deixara, sente-se mal e acaba por morrer – “Entrou o comandante com uma lâmpada, e aproximou-lha da respiração [...] Está morto!... – disse ele.” (cap. XX) –. Assim, ao contrário do que se poderia esperar, Teresa e Simão não conseguem ultrapassar as medidas impostas pelas famílias rivais, rendendo-se à incapacidade de amar um ao outro e, consequentemente, perdendo-se por amor.

João (Suficiente (+))
O filme Wild at heart, de David Lynch, de 1990, é uma história de amor forte que decorre num ambiente de violência. Por isso, tem pontos em comum com Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco.
Sailor é um jovem criminoso que sai da prisão, depois de ter morto um homem com as suas próprias mãos, para defender a sua amada. Também Simão Botelho é preso por ter morto um homem, Baltasar, por ter ciúmes da sua amada.
Sailor, com a sua namorada Lula, viajam pelo Sul desértico da América numa fuga desesperada. Os dois tentam escapar da mãe de Lula, que surge como uma bruxa que se recusa a ver a filha com o homem que anos antes a rejeitou.
Simão e a sua amada Teresa não conseguem fugir juntos, mas sofrem com a perseguição das suas famílias que, sendo inimigas, não aceitam que eles fiquem juntos.
No decorrer da viagem, os dois enamorados do filme conhecem estranhos personagens e descobrem que o mundo é perigoso. Sailor cai numa armadilha e volta a ser preso durante seis anos.
Passado esse tempo, Lula espera-o com o filho e chegam à conclusão que não podem viver um sem o outro, que não podem fugir do amor. Percebemos que, se não ficassem juntos iriam morrer, tal como no Amor de Perdição.
No Amor de Perdição, Simão apaixona-se por Teresa, filha de uma família inimiga. O romance era proibido e foi mantido em segredo, mas um dia o seu pai descobre e começa o seu sofrimento.
Quanto ao pai de Teresa, promete a mão da filha ao sobrinho Baltasar, mas quando a jovem se recusa, decide que ela se casa ou vai para um convento.
Entretanto, Simão pede ajuda a um amigo, João da Cruz, para tentar ficar com a sua amada. Esse amigo tem uma filha, a Mariana, que se apaixona perdidamente por Simão.
Como Teresa se recusa a casar, é encarcerada num convento. Impedido de ficar com a sua amada, Simão acaba por matar o seu rival Baltasar, o que o leva à condenação à morte. O seu pai consegue anular essa decisão e Simão tem que optar: dez anos de prisão ou no exílio na Índia.
Com a partida de Simão, Teresa adoece de tanta tristeza e morre. Simão quando sabe da sua morte também adoece, com febre e delírios e acaba por morrer durante e viagem de barco. Mariana cuidou dele sempre com dedicação e quando o corpo é amarrado e lançado ao mar, Mariana não resiste e joga-se também ao mar, junto ao corpo, acabando igualmente por morrer.
A história do filme passa-se nos Estados Unidos, nos anos oitenta, as personagens não têm o mesmo destino que em Amor de Perdição, mas a história é igualmente forte e dramática.

Francisca (Muito Bom -)
O filme Ligações Perigosas (Stephen Frears, Dangerous Liaisons, 1988), conta-nos a história de uma aposta entre Marquesa de Merteuil e o seu ex-amante, o Visconde de Valmont. Merteuil pretende vingar-se de um dos seus ex-amantes, que se vai casar com a jovem Cécile, e pede a Valmont que a seduza. No entanto, este acha que seduzir uma jovem ingénua não é um desafio para ele, propondo-se conquistar Madame de Tourvel, uma mulher casada e virtuosa. A Marquesa promete-lhe, então, que, caso tenha sucesso no seu plano, que poderão voltar à sua antiga relação.
Tal como no livro Amor de Perdição, temos conhecimento dos acontecimentos através de cartas, trocadas entre as personagens. No filme, existe a troca de cartas entre o Visconde e a Marquesa mas estas em nada se comparam com as que são trocadas entre Simão e Teresa. As cartas destes são cartas de amor inocente, puro e jovem enquanto as dos aristocratas revelam um jogo de sedução entre um homem e uma mulher, perversos e controladores, que desprezam o amor sublime e virtuoso (como o dos protagonistas do livro de Camilo Castelo Branco).
Em ambas as obras, encontramos um retrato das sociedades, dos séculos XVIII e XIX, e da maneira como as convenções influenciam as relações dos protagonistas e, consequentemente, a sua própria vida. Assim, no romance, a felicidade dos protagonistas é impedida pela rivalidade entre as famílias: Simão e Teresa tentam ir contra as normas sociais, rebelando-se, mas sem frutos. No filme, por sua vez, os protagonistas cumprem de forma hipócrita as normas convencionadas pela sociedade, ao passo que, na sua intimidade, são perversos e debochados. Um outro aspeto contrastante, no que diz respeito às normas sociais, é o papel da protagonista feminina. Teresa, enquanto mulher, tinha de obedecer à vontade do pai (“É preciso que te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que deres este asso difícil, conhecerás que a tua felicidade é daquelas que precisam de ser impostas pela violência. […] a violência de um pai é sempre amor.”) que a queria obrigar a casar com o primo Baltasar. Quando esta não cedeu, enclausurou-a no convento. A Marquesa, no entanto, é-nos apresentada quase como o oposto. É uma personagem manipuladora e inteligente que se encontra sempre um passo à frente daqueles com quem convive. É uma mulher independente que não pretende submeter-se às vontades de qualquer homem, afirmando que “nasceu para dominar o sexo oposto”
Focando-nos no final de ambas as obras, podemos encontrar algumas semelhanças, contando, desde logo, com o final trágico: separação e morte dos amantes.
Simão e Teresa são obrigados a separarem-se, Simão seria condenado ao degredo e Teresa permaneceria no convento. O Visconde e Madame de Tourvel também se separam mas por orgulho da parte do protagonista masculino. Este apaixonou-se pela sua presa mas não o consegue admitir. O desgosto amoroso leva Madame de Tourvel, tal como Teresa, a entrar num convento. Após a separação, ambas as personagens femininas adoecem gravemente.
A Marquesa declara guerra ao Visconde e este luta contra o seu novo amante, sendo gravemente ferido. Antes de morrer, Valmont entrega ao seu adversário um maço de cartas, muito parecido com aquele que Teresa enviara a Simão e este confia a Mariana. Os primeiros a morrer, Visconde e Teresa, encontram-se assim ligados. Nos seus últimos momentos de vida conseguem a redenção e confessam os seus sentimentos a quem amam através de uma carta final.
Ambas as histórias são reveladas ao público com as cartas, no entanto despoletam sentimentos diferentes em quem as lê. Em Amor de Perdição as cartas que revelam a história dos apaixonados suscitam indignação em relação à sociedade, são dignas de comoção, compaixão e lágrimas (“Essa, a minha leitora […] não choraria se lhe dissessem que o pobre moço perdera honra, reabilitação, pátria, liberdade, irmãs, mãe, vida, tudo, por amor da primeira mulher que o despertou do seu dormir de inocentes desejos?!”). Em Ligações Perigosas, as cartas também provocam sentimentos de indignação, mas em relação à personagem (Marquesa de Merteuil) e às suas ações, dignas de desprezo.

Madalena (Bom (-))
A Bela e o Monstro é um clássico que tem vindo a marcar corações desde 1991 – ano em que saiu a versão original de animação. Em 2017, o mesmo filme foi recriado por personagens vivas. Numa noite escura, um velho homem, já doente, é apanhado em plena estrada pelo Monstro e é feito refém no seu castelo. Bela, uma linda rapariga, parte com o objetivo de trazer o seu pai para casa, mas vê-se obrigada a trocar a sua vida pela dele e é, assim, uma esperança na quebra do feitiço que fora lançado ao castelo e a todos que o habitavam. Ao longo do tempo, uma grande cumplicidade é criada entre ela e o Monstro, que mais tarde se desenvolve numa grande história de amor.
Em Amor de Perdição, o amor de Simão e Teresa é rejeitado por ambas as famílias, que tentam ao máximo eliminar o contacto entre os dois – no caso de Teresa, o pai convoca o primo Baltasar para a obrigar a casar com ele (“Hás de casar! Quero que cases! Quero!”). Teresa tenta refutar sempre essa hipótese, pois está apaixonada por Simão. Uma mendiga proporciona o contacto dos dois, através de cartas.
No filme, a rejeição é feita por parte do pai de Bela, amigos e conhecidos que vivem na cidade, pois não aceitam a paixão que ela tem por Monstro, tentando mesmo, numa emboscada, matá-lo. Eles rejeitam Bela, e a sua relação, por acharem que Monstro tem maldade dentro de si e que nunca conseguirá amar alguém.
Entretanto, Simão continua com a revolta de não poder estar junto do seu amor – estando o seu pai por trás disso, dado não aceitar que ele namore uma Albuquerque – e tem comportamentos desadequados que o levam a castigos muito severos. Enlouquecido, Simão encontra Teresa à entrada de uma igreja e, para matar a saudade, aproxima-se dela; ao atravessar-se no seu caminho, o primo Baltasar é rapidamente abatido por ele.
Em A Bela e o Monstro, quem tenta atravessar na história amorosa de Bela, é Gaston – o seu fiel pretendente, que acredita que um dia ainda se irão casar. Nessa mesma emboscada – quando tentam matar Monstro –, dá-se uma luta e é Gaston quem acaba por morrer (abatido pelo mesmo).
Amor de Perdição é uma história de amor trágica, pois Simão e Teresa acabam por morrer, nunca tendo aproveitado momentos juntos com liberdade. Pelo contrário, no conto de fadas, Monstro tem uma paixão verdadeira por Bela e juntos conseguem quebrar a maldição e ser felizes (para sempre).

André (Bom (-)/Bom)
Aproveito-me do filme Paixões perdidas, criado por Anne Fontaine em meados de 2013, para o comparar com a tão famosa novela de Camilo Castelo Branco, Amor de perdição. O filme de Anne Fontaine fala de duas amigas, que se conhecem desde os tempos da escola, que acabam por se apaixonarem pelos filhos uma da outra, o que acaba por não correr bem. Estamos perante uma espécie de um amor proibido, muito à semelhança do que ocorre na novela de Camilo, com Simão e Teresa a apaixonarem-se um pelo outro. O caso de Simão e de Teresa é ligeiramente diferente pois, apesar de os seus pais se conhecerem, não são bons, amigos como no filme de Anne Fontaine. mas sim inimigos.
Tanto no filme como na novela de Camilo, verificam-se vários impedimentos na paixão das personagens. No filme vemos passagens em que os filhos são proibidos de sair de casa, com medo que cometam algum erro de que possam vir a arrepender-se. Já no filme, os impedimentos principais são da parte do pai de Teresa, Tadeu de Albuquerque, que proibe a filha de sair de casa e, quando este a tenta casar com Baltasar, primo de Teresa: “Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltasar, minha filha”( Capítulo IV).
Cronologicamente, o filme de Anne Fontaine afasta-se muito da obra de Camilo, tratando-se de épocas completamente distintas. O filme localiza-se no século XVI, e as personagens mostram ter mais liberdade, não estando constrangidos pelas ordens das mães, neste caso. Na obra de Camilo, como a ação decorre  na época do romantismo no século XIX, época completamente distinta da do filme, vemos comportamentos muito diferentes. Vemos os pais de ambas as personagens a escolherem com quem estes se devem casar e vemos Tadeu a enviar a sua filha para um convento após esta desobedecer às suas ordens.
Volta a haver uma aproximação entre a obra cinematográfica e a novela de Camilo, quando no filme os dois filhos tentam afogar o outro, ação que evidencia raiva e frustração, e quando na novela de Camilo Simão acaba por matar o pretendente de Teresa, Baltasar, baleando-o (“ Baltasar tinha o alto do crânio aberto por uma bala”).
Estamos perante um filme e uma novela em que o amor é um sentimento mais forte do que os outros, levando as personagens dos mesmos a agirem sem pensar. Simão apaixona-se por Teresa, assim que cruzou o seu olhar com o dele e, até morrer, o seu sentimento por Teresa não muda. No filme o mesmo acontece, apesar da atração não ser imediata, mas, até ao fim do filme, os sentimentos dos filhos pelas mães nunca mudam, apesar de viverem um amor proibido.

Hugo (Bom +)
War Horse (Cavalo de Guerra) é um filme norte americano, lançado em 2012, dirigido pelo icónico e reconhecido Steven Spielberg. War Horse, adaptado da obra homónima de Michael Morpurgo, retrata a história da amizade singular entre Albert (Jeremy Irvine) e o seu cavalo Joey. Durante a Primeira Guerra Mundial, Albert vê o seu cavalo a ser recrutado para a cavalaria inglesa. Destroçado, Albert alista-se no exército inglês com o objetivo de recuperar o fiel companheiro.
Mais de um século e meio antes (1862), Portugal conheceu uma das obras mais ilustres da sua história: Amor de Perdição, novela portuguesa escrita por Camilo Castelo Branco, cuja ação remonta até à década inicial do século XIX.
A novela portuguesa contém um enredo romântico: Simão Botelho e Teresa de Albuquerque, filhos de famílias rivais, apaixonam-se. Tadeu de Albuquerque, ao conhecer aquela situação, obriga a sua filha a casar com Baltasar Coutinho, primo e seu prometido (“Vais hoje dar a mão de esposa ao teu primo Baltasar, minha filha”). Ao rejeitar aquele cenário, Teresa é enviada para o convento de Monchique, no Porto. Simão, motivado pela raiva, espera a família Albuquerque à saída de Viseu e mata Baltasar, entregando-se logo à justiça, sendo condenado ao degredo na Índia  (“Baltasar tinha o alto do crânio aberto por uma bala”).
Tanto no filme War Horse como em Amor de Perdição, é visível o que o amor e paixão despoletam nas pessoas. Em War Horse, o amor familiar é o mais presente. O simples facto de Albert ter-se alistado no exército, percorrendo um longo e perigoso caminho até ao reencontro com o seu cavalo, é algo que emociona e capta o espectador.
Em Amor de Perdição, o tópico mais presente é a paixão. Apesar das adversidades, tanto Simão como Teresa lutam um pelo outro, na esperança de que poderão ficar juntos. As cartas e a utilização de Mariana como Cupido são formas de luta para que possam ficar juntos, afastando-se dos problemas familiares.
Para além da divergência de épocas e de temáticas, existe também uma disparidade nos finais das duas obras. Em War Horse, a perseverança de Albert dá frutos.
Com o final da guerra, dá-se o reencontro de dois amigos, inteiramente motivados pelo amor que sentem um pelo o outro.
Em Amor de Perdição, injustamente, o desenlace não é o mesmo. Ao embarcar em direção à Índia, Simão avista Teresa, que se despede dele, já condenada à desgraça. Horas depois, Simão toma conhecimento da morte de Teresa e, após dez dias de puro sofrimento, morre também.
Em ambos os casos, é visível como as personagens dependem uma da outra e é isso que as faz ultrapassar todas as barreiras que são impostas ao seu amor.

Lourenço (Suficiente +/Bom -)
Sing, é um filme animação produzido pela companhia Illumination Entertainment, visualizado a dada altura em aulas de Português.
Trata-se da história de Buster Moon, um coala detentor de um teatro praticamente falido e à beira de ser despejado e ficar sem local de residência (já que o teatro era a sua casa). A dada altura, Moon tem a brilhante ideia de criar um concurso de canto que se torna viral e muito desejado devido ao seu prémio de cem mil dólares, acidentalmente impresso nos panfletos.
Com o objetivo de concorrer, vários animais foram aos castings. Cinco deles destacaram-se: Johnny (gorila), Ash (porco-espinho), Meena (elefante), Rosita (porca) e Mike (rato).
Através de Johnny e seu pai podemos traçar um contraste entre Simão e Domingos Botelho, a relação entre pai e filho, visto que, em Amor de Perdição, Simão revela ser rebelde, marginal, revoltando-se contra as regras impostas pela sociedade, assumindo o papel de herói romântico (“o corregedor admira a bravura de seu filho Simão”) e seu pai revela ser calmo, ponderado e, mais tarde, não concorda com a atitude Simão. Em Sing, o pai de Jonnhy mostra ser rebelde, intempestivo e marginal ao contrário de Jonnhy, que mostra ser calmo, frágil e nunca concordando com a conduta do seu pai, havendo uma “troca de papéis”, no que toca à relação entre pai e filho. À semelhança de Simão, o pai de Johnny é preso, reforçando-se em ambos os casos a sua marginalidade e a rebeldia.
Entretanto, Mike que enganou três ursos num jogo de cartas, ficando como dinheiro deles, é ameaçado e forçado a devolvê-lo. Mike disse que o dinheiro estava no baú que pertencia ao vencedor do concurso e, quando o urso partiu o baú, repararam que não havia dinheiro. Moon ficou com a situação mais complicada quando o tanque de água se partiu e destruiu o teatro. O banco condenou Moon e ficou com o que restava do teatro, uma vez que Moon não pagava as contas. Simão, à semelhança de Moon, também é condenado. Simão, que matou Baltasar Coutinho, é condenado à forca (“Baltasar tinha o alto do crânio aberto por uma bala”, “ Simão, que conservava o dedo no gatilho da outra pistola.”), pena que foi alterada para dez anos de degredo na cadeia de Vila Real.
O final de ambas as histórias é muito distinto, visto que no caso de Amor de Perdição há um final trágico da morte de Simão seguida com a morte de Mariana. Em Sing, Moon realiza um espectáculo sem fins monetários para os participantes e consegue angariar dinheiro suficiente para reconstruir o teatro.

Botea (Bom +/Muito Bom -)

Por um Punhado de Dólares é a primeira película da singular Trilogia dos Dólares. O primeiro dos magistrais Spaghetti Westerns de Sergio Leone é um ícone — não só inventou um subgénero cinematográfico completamente novo e fez de Clint Eastwood uma lenda de cinema, como também rejuvenesceu o previamente moribundo Faroeste. O filme segue a história do Homem Sem Nome, um pistoleiro solitário que chega à aparentemente inerte vila de San Miguel e decide servir-se de uma sangrenta rivalidade entre duas famílias para encher os seus bolsos.
A disputa entre duas famílias rivais é um tema recorrente tanto na obra do romancista português como no Western. Em Amor de Perdição, aparecem os Botelho e os Albuquerque num conflito alimentado pelo ódio que os patriarcas de ambas as famílias partilham um pelo outro. Em Por um Punhado de Dólares, surgem-nos os Rojos contrapostos aos Baxters, estando os primeiros, um gangue fora-da-lei, e os segundos, a família do xerife e os seus associados, num constante conflito por dinheiro e pelo monopólio de San Miguel.
Entrevejo no Homem Sem Nome bastantes traços de Simão Botelho, numa fase inicial da novela-romance. Por um lado, temos um protagonista autónomo e lacónico adubado por uma rigidez e vigor inéditos; um herói imensamente proficiente com armas — talvez o homem mais perigoso que alguma vez viveu, como o trailer sugere —, o perigo assenta-lhe como uma luva. Por outro, temos um jovem que, no início, da história aparece delineado como um rebelde e um marginal, imprevisível, pronto a revoltar-se contra as regras impostas pela sociedade. Segundo o seu irmão mais velho, que se encontra «temeroso do seu génio sanguinário» (cap. 1), este «emprega em pistolas o dinheiro dos livros [e] convive com os mais famosos perturbadores da academia». A sua índole excecional, de quem está sempre pronto para lutar e nem se submete às regras, impressiona Domingues Botelho.
Tal como Simão Botelho, que, durante a totalidade do primeiro capítulo, partilhava a companhia da ralé, também o Homem Sem Nome escolhe para seus comparsas o dono da taberna e o construtor de caixões. Simão, orientado por sentido de justiça, defende um criado e acaba por partir «muitas cabeças» e quebrar «todos os cântaros». No segundo capítulo, perseverante e exortado por princípios de liberdade, divulga em Coimbra os ideais da Revolução Francesa. Também o protagonista do Western, compelido pelo mesmo sentido de justiça, compromete o seu próprio bem-estar ao ajudar Marisol a escapar às garras do vilão principal, o cabecilha dos Rojos, Ramón, e a reunir-se com a sua família. Também Ramón Rojo seria comparável a Baltasar Coutinho, na medida em que ambos contendem com a principal figura feminina da sua respetiva obra e, ulteriormente, são mortos pelo protagonista.
Ainda que sejam, à partida, obras bastante divergentes, noto em ambas semelhanças: duas famílias rivais numa odiosa disputa, o destemor dos protagonistas, norteados por um espírito de justiça, em enfrentar os mais poderosos e o individualismo.

Leonor (Bom -/Bom (-))

Escolhi Romeu e Julieta, uma história trágica e revoltante de um jovem casal que se amava intensamente, mas cujas famílias os proibiam de se amar. Esta adaptação de uma das mais famosas obras de Shakespeare ao mundo do cinema, publicada em 2013 e dirigida por Carlo Carlei, é um ótimo objeto de comparação com Amor de Perdição de Camilo Castelo Branco, pois ambas tratam do mesmo tema: amores proibidos.
Julieta, uma das protagonistas do filme, interpretada por Hailee Steinfeld, pertence a uma das famílias mais ricas de Verona, cidade de Itália, os Capuleto, que tem como rival a família igualmente rica e privilegiada, os Montecchio, à qual pertence Romeu, interpretado por Douglas Booth. Em Amor de perdição o caso é semelhante. Simão Botelho pertence a uma classe mais alta, apesar de defender e lutar pelos direitos da plebe. Os Botelho e os Albuquerque, famílias de Simão e Teresa, respetivamente, são rivais.
Há várias gerações que ambas as famílias, as de Romeu e de Julieta, não convivem em harmonia, após uma batalha entre os Montecchio e os Capuleto, acordou-se que nenhum membro teria qualquer tipo de interação com outro da família oposta. Mas foi num baile de máscaras organizado pelos Capuleto que Romeu, ao ter entrado às escondidas para ver Rosalina, por quem se encontrava apaixonado, se deparou com Julieta e logo se apaixonou pela belíssima filha dos Capuleto, esquecendo tudo o que sentia por Rosalina pois a seu ver, Julieta seria uma figura angelical (“Oh, fala outra vez anjo de luz, pois é assim que te vejo”). Na obra de Camilo Castelo Branco, apesar de Simão não demonstrar qualquer sentimento de paixão por outra personagem, este vê Teresa pela primeira vez através da janela de seu quarto e o seu coração não hesitou em se apaixonar. Era amor à primeira vista em ambos os casos.
Apesar de, em ambas as histórias, existir rivalidade, proibição e até ódio entre famílias, sempre existiram exceções, personagens que eram a favor do amor entre ambos os jovens casais. No caso de Romeu e de Julieta, é possível destacar o comportamento de Frei Lourenço, que sempre apoiou o casal e fez tudo o que pôde para que os dois apaixonados conseguissem ficar juntos e, até mesmo, fugirem juntos para onde ninguém os pudesse impedir de serem felizes. Outras personagens como Benvólio, primo de Romeu, e a ama de Julieta também demonstram empatia com o casal, apesar de estes mostrarem algum receio perante a situação. Em Amor de Perdição, é a irmã mais nova de Simão, Rita, que mais demonstra determinação para que o irmão e Teresa fiquem juntos. João da Cruz é outro personagem a favor e sua filha, Mariana, que apesar de amar Simão, também se resolve a ajudar o casal: entrega cartas a pedido de Simão e leva-lhe mensagens de Teresa.
Ambas as histórias terminam tragicamente. Em Romeu e Julieta, Romeu descobre que Julieta havia “morrido” e convence-se a fazer o mesmo. Para passar o resto da eternidade junto do seu amor, o protagonista decide suicidar-se. Julieta acorda subitamente do seu sono, quando encontra Romeu morto a seu lado. A jovem Capuleto, vendo o cadáver de Romeu, escolhe também atentar contra a própria vida, terminando a história com a morte do casal. No caso de Amor de Perdição, Teresa adoece e, quando Simão vai preso, implora-lhe que cumpra a pena de dez anos na prisão de Vila Real, mas o herói romântico escolhe o degredo. Teresa acaba por falecer, pois o seu estado de saúde havia piorado bastante. Simão, durante a sua viagem rumo à Índia, apanhou uma febre maligna que também lhe viria a causar a sua morte.

Mafalda (Muito Bom (-))
A obra-prima dirigida por Cristopher Nolan O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008) apresenta-nos um combate entre Batman e Joker: a ordem e o caos, que põe em causa o ténue limite entre o bem e o mal. Somos confrontados com o amor e a tragédia, similarmente ao que acontece quando lemos Amor de Perdição de Camilo Castelo Branco.
Batman, duplo do milionário Bruce Wayne, é um justiceiro oculto, combatente contra a corrupção e o crime que violam a sociedade, numa caracterização de herói contrastante com a idealização do herói romântico, seguida por Camilo na construção do seu protagonista.
Simão Botelho luta contra a norma e as convenções sociais, sendo «[n]a plebe de Viseu [...] que ele escolhe amigos e companheiros». Revela-se um jovem «avesso em génio», orgulhoso e individualista, vincando o seu egoísmo quando, nem por a mulher que ama, que lhe implora, aceita sacrificar-se e permanecer na prisão em Portugal, preferindo o longínquo degredo. Prioriza a sua liberdade e a sua honra, que o impedem de agir de outra forma e se revelam um forte traço da sua personalidade, capaz, até, de superar o amor. A própria Teresa deseja que ele reconheça: «Está morta, e morreu quando eu lhe tirei a última esperança».
Apesar de Bruce ver nos outros a sua prioridade, independentemente de a sua segurança ser colocada em causa, e de não agir pela honra, mas para prestar serviço à sociedade, o que indica um caráter muito distinto do de Simão, esta personagem também vive por valores capazes, em certa medida, de suplantar o amor. Partilhar a sua vida arriscada com Rachel colocá-la-ia em perigo, mas nada poderia colocar-se entre si e o seu dever de proteger a sociedade, nem mesmo o seu amor.
Mantendo a distância da mulher que ama, Bruce mostra a capacidade de dominar a razão em falta a Simão. Este, guiado pelo seu desejo de estar com Teresa quando o ódio entre as suas famílias os quer manter distantes, revela-se impulsivo, chegando a matar, mais por raiva e orgulho ferido do que por amor, o primo e pretendente de Teresa, Baltasar.
Em Amor de Perdição, Simão é acompanhado nos seus confrontos por João da Cruz, que escuta «com boa vontade» por saber «que quer o [seu] bem». No filme Batman também é auxiliado na sua luta, pelo tenente Jim Gordon e por Harvey Dent, que se encontra num relacionamento com Rachel. Tanto João como Harvey sofrem de destinos cruéis: enquanto o primeiro é morto, o segundo é sujeito à dor da perda, à dor física de ter metade do corpo gravemente queimada e à malignidade de Joker, que o levarão a tornar-se no Duas Caras.
Desde que a conhece até ao final trágico, Simão pode contar com o cuidado fiel de Mariana («O Anjo da compaixão sempre co[nsigo]»), que o ama verdadeiramente mesmo com o conhecimento de que esse amor nunca será recíproco e de que não existe a possibilidade de ficarem juntos. Apesar de ligado ao protagonista por um sentimento diferente, o mordomo Alfred é, tal como Mariana, o cuidador fiel com quem Batman pode sempre contar.
Nem sempre a razão consegue prevalecer e é no momento mais crítico que Batman segue o seu coração. Quando tem de escolher entre salvar Harvey e Rachel que se encontram em edifícios distantes prestes a explodir, escolhe-a, mas tarde demais descobre que fora enganado por Joker: salva Harvey enquanto Rachel explode com o edifício. O amor de Bruce, que, tal como o de Mariana por Simão, não foi abalado pela impossibilidade de ser vivido, culmina numa morte trágica como o de Simão, Teresa e Mariana em Amor de Perdição, apesar de Bruce, contrariamente a Simão, ter feito tudo pela pessoa que amava.

Joana (Muito Bom -/Bom +)
A ação do filme Troia (Troy, 2004) contém, tal como muitos outros filmes, longas batalhas e amores impossíveis. O filme de Wolfgang Petersen, uma adaptação do poema épico Ilíada, de Homero, recorda-nos a guerra entre gregos e troianos pelo controle da cidade-estado nos anos 1100 a.C. O realizador recria minuciosamente a Grécia Antiga, um mundo de imensas galeras de guerra, inesquecíveis batalhas e feitos de armas, cidades-fortaleza e o lendário Cavalo de Troia. A ação desenrola-se com a fuga da rainha Helena de Esparta. O princípe de Troia, Páris, seduz Helena num banquete organizado por Menelau, rei de Esparta, e, mais tarde, leva-a consigo para Troia. Ao descobrir tudo, o rei de Esparta não conseguindo tolerar essa afronta, declara um ataque à cidade de Troia. Essa paixão irá desencadear uma guerra e devastar toda uma civilização. A chave da derrota ou da vitória sobre Troia reside em Aquiles, tido como o maior guerreiro vivo, o qual se pode comparar com o Simão do Amor de Perdição.
Aquiles e Simão, apesar de terem vivido em épocas tão distantes, têm vários aspetos em comum. Ambos se confrontam com as consequências dos seus atos e o amor que nutrem pelas suas amadas tem um fecho.
Semi-deus arrogante, rebelde e aparentemente invencível, Aquiles não tem lealdade a nada nem a ninguém, a não ser à sua própria glória. Também Simão é rebelde, impulsivo, recusa-se à submissão ao poder; é individualista, com um “génio sanguinário” e, tal como Aquiles, a defesa da honra é um dos seus principais ideais. A beleza física é partilhada por ambos. Simão é um “belo homem”, tendo nos seus “quinze anos (...) aparência de vinte”, e Aquiles é um jovem alto atraente de cabelos loiros. Têm a obsessão de obter “triunfos e glórias e imortalidade” dos seus nomes.
Quando o primo de Aquiles, Pátroclo, morre numa das batalhas, o herói é invadido por uma sede de vingança o que faz com que desafie Heitor, filho mais velho do rei Príamo de Troia e comandante dos exércitos. Aquiles sai vitorioso neste combate e não tem qualquer piedade com o corpo do morto. Entretanto Simão, em defesa da sua própria honra (“Não era o sobressalto do coração apaixonado: era a índole arrogante que lhe escaldava o sangue.”, ll. 2-3, p. 208), mata o primo de Teresa, Baltasar. Tanto Heitor como Baltazar eram primos das apaixonadas destes dois heróis.
Podemos também relacionar Briseis, prima de Heitor e sacerdotisa de Apolo, e Teresa, amada de Simão, pois ambas se apaixonam pelo inimigo. Briseis, que fora capturada pelos gregos enquanto estava no templo, apaixona-se por Aquiles, um soldado inimigo. Teresa, filha de Tadeu Albuquerque, amava Simão de Botelho, filho de um velho inimigo de seu pai. Tadeu de Albuquerque é contra esta paixão e planeia o casamento da filha com o primo Baltasar, de modo a que ela se afaste de Simão. Quando se apaixona por Briseis, Aquiles deixa de combater e deseja, finalmente, uma vida pacífica ao lado do seu amor, tal como Simão e Teresa desejavam (“Estou vendo a casinha que tu descrevias defronte de Coimbra, cercada de árvores, flores e aves.”, ll. 42-43, p. 223). A paixão de Aquiles não é apoiada pelo rei Agaménon (irmão de Menelau), que ansiava conquistar Troia a todo o custo. A morte do primo muda os objetivos de Aquiles e fá-lo voltar para a batalha.
Tanto no filme como no livro, o amor tira vidas, causa sofrimento e destruição. O desenrolar da história do Amor de Perdição e de Troia captam-nos pelo extraordinário poder do amor. Simão e Aquiles são dois heróis, um romântico, outro épico, que, apesar de afastados no tempo por vários séculos, estão ligados pela mesma linha de um destino impiedoso. Uma nação reduzida a cinzas, tantas vidas desfeitas.... tudo devido a um amor de perdição.

Laura (Bom +/Muito Bom -)
O filme 12 Anos Escravo (Steve McQueen, 12 Years a Slave, 2013), adaptação cinematográfica da obra autobiográfica de Soloman Northup, cuja ação se passa no século XIX, retrata a história verídica de Solomon Northup, um homem negro nascido livre que vivia com a sua mulher e filhos, em Nova Iorque. Northup era conhecido pelo seu incondicional talento para a música, nomeadamente para o violino, e era, por isso, convidado para inúmeras festas para fazer a sua magia ao som das cordas de um violino e alegrar os convidados, que, entretidos, dançavam encantados com as suas melodias. Era um homem de certo prestígio, respeito e admiração, embora mal possuísse economias suficientes para sustentar a família. No entanto, a sua vida muda drasticamente quando, em 1841, ao ser abordado com uma proposta de trabalho em Washington, D.C, que aceita, é sequestrado e acorrentado e vendido como escravo. Northup é, posteriormente, levado para Louisiana, Estados Unidos, onde trabalha com outros escravos em plantações, nomeadamente nas do mestre Epps, durante doze anos.
No filme, enquanto está nas plantações, o protagonista convive com outros escravos que, ao contrário dele, acreditam que «uma vez escravos, para sempre escravos» («once a slave, always a slave») e, vencidos pela dor de uma injustiça que lhes tira tudo, que já não há qualquer esperança na vida, restando apenas a morte (o que chega até a ser o desejo de alguns em comparação com a vida de escravo). Contudo, Soloman não desiste de lutar, não se rende ao que lhe chamam (escravo) e não se submete aos mestres, arriscando a sua vida numa luta pela liberdade que sempre lhe pertenceu e a que sempre teve direito  ̶  «Eu não quero sobreviver, eu quero viver» («I don’t wanna survive, I wanna live»). Assim, o protagonista do filme, que luta contra a norma e pela sua liberdade (atos de rebeldia e tamanha bravura), apresenta vários traços característicos dos heróis românticos, como Simão Botelho, personagem de Camilo Castelo Branco. Simão, tal como Soloman, é errante e destemido, luta por aquilo a que acredita ter direito, não se submete às vontades do pai e nunca desiste do seu amor por Teresa, por quem está disposto a fazer tudo, entregando-se à emoção e impulsividade, que o dominam («Ir dali a Castro Daire e apunhalar o primo de Teresa na sua própria casa, foi o primeiro conselho que lhe segredou a fura do ódio»).
Por outro lado, ao contrário de Simão, que sempre foi insofrido e rebelde, com um espírito individualista e ganancioso, Soloman Northup, antes da reviravolta da sua vida, era um homem de talento, ilustre e respeitado por todos. Assim, enquanto Simão era o desgosto e a vergonha de seu pai («Domingos Botelho bramia contra o filho, e ordenava ao meirinho-geral que o prendesse à sua ordem»), Northup era o orgulho e a salvação da sua família.
A adaptação cinematográfica da obra autobiográfica de Soloman Northup retrata a dura, infeliz e injusta vida de escravo e, do mesmo modo que, se os escravos não obedecerem às ordens do mestre, são chicoteados e torturados desumanamente vezes sem conta, na novela de Camilo, Teresa é obrigada a ir para um convento se não obedecer à vontade do pai, Tadeu de Albuquerque, e casar com o seu primo Baltasar («Hás de casar! Quero que cases! Quero!… Quando não, amaldiçoada serás para sempre Teresa! Morrerás num convento!»).
Tanto no filme como em Amor de Perdição existe uma personagem secundária que, ao conhecer o protagonista, fica sempre a seu lado e faz tudo para o ajudar. No filme, essa personagem fá-lo, apesar de isso colocar a sua vida em risco, o que demonstra uma elevada compaixão e lealdade. No filme, Samuel Bass, um empreiteiro canadense, interpreta esta personagem, enquanto na novela é Mariana. Ambas as personagens entregam cartas aos entes queridos dos protagonistas; no caso de Soloman, Samuel presta-se a entregar uma carta do escravo à família, carta que exige os documentos que comprovam que é um homem livre, e, no caso de Simão, é Mariana que entrega todas as suas cartas a Teresa, permitindo a continuação secreta do seu inocente romance («Sou uma portadora desta carta para vossa excelência»).
É, no entanto, bastante contrastante o desfecho final da novela de Camilo e a obra de Northup, pois enquanto Camilo acaba com um final trágico que se resume na morte de quase todas as personagens, nomeadamente Simão, Teresa, Baltasar, Mariana e João da Cruz, a história de vida de Soloman tem um final feliz, pois, após Samuel Bass ter enviado aquela carta, foram-lhe reconhecidos os seus direitos enquanto homem livre e ele foi levado de volta para junto daqueles de quem nunca devia ter sido separado.
Não só ambos os autores que dão vida à personagem principal das suas obras escreveram obras a contar as suas experiências de vida (embora a de Camilo não seja tão literal e com mais desvios à realidade), Soloman através de 12 Anos Escravo e Camilo através de Amor de Perdição, como em ambas as histórias, verídica ou novela, respetivamente, há um determinado momento em que a vida dos protagonistas muda incondicionalmente e sem qualquer controlo por parte deles (Soloman, quando é sequestrado, enganado e vendido como escravo, e Simão, quando vê Teresa pela primeira vez).

Adolfo (Suficiente (+))
Titanic é um filme que estreou em 1997, e que relata a história romântica de Jack e Rose, numa viagem deslumbrante pelo Atlântico na embarcação de nome Titanic. O filme relaciona-se com o livro Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco, devido às várias semelhanças desde o ínicio até ao desenrolar do fim trágico que afeta todos os que  o enredo envolve.
No começo, Jack vê Rose no convés e apaixona-se quando impede que Rose se suicide atirando-se para o oceano. Este momento assemelha-se à situação de Simão, quando vê Teresa pela janela e se apaixona, e, por cartas, consegue ter um refúgio mental.
Mas em ambos os casos o amor é impossibilitado, por diversas razões, como a rivalidade. No livro, a rivalidade entre duas famílias é um obstáculo para o amor, no filme a rivalidade entre classes: Rose, sendo de classe alta e Jack de classe baixa, a restrição social impede a aproximação dos dois. Em ambos os casos, Rose e Teresa são forçadas a casar com alguém que não amam (“Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltasar, minha filha”).
Apesar destas barreiras que se impõem aos dois protagonistas românticos, Simão e Jack, isolados devido às pressões sociais que os rodeiam, seguem o instinto do coração, com Jack a morrer pela Rose para ela se salvar, e Simão a matar o Baltasar para Teresa ficar livre (“(...) Baltasar tinha o alto do crânio aberto por uma bala, (...)”. A combinação de todas as ações que os protagonistas praticaram por Rose e Teresa deu para uma evolução de amor entre as personagens, mesmo se fossem a si mesmo se prejudicaram e foram quase até masoquistas.
Nos últimos momentos das duas obras, dá-se o desfecho trágico, com a morte de Simão quando seperado da Teresa, enquanto Jack morre ao sacrificar a sua vida para dar abrigo a Rose das águas geladas do oceano, acompanhando-a até morrer. A situação não só é similar como Jack dispõed o seu bem-estar pelo seu amor, como Simão fez, o que nos lembra o amor incondicional da Mariana, que se atira ao mar para seguir Simão, mesmo nos seus últimos momentos.
Em conclusão, o paralelo entre Titanic e Amor de Perdição têm dá-se não só pelas características do herói romântico, que lutam contra as pressões sociais, mas também pela devoção dos homens, e as extensões que estão dispostos a percorrer para chegar a um final feliz ou, no mínimo, justo.

Margarida (Muito Bom)
Camilo Castelo Branco foi condenado por adultério e encontra-se preso na Cadeia da Relação do Porto. Em apenas “quinze atormentados dias”, escreve Amor de Perdição. Não obstante a voragem com que foi escrito, este romance é unanimemente considerado uma das obras-primas da literatura portuguesa do século XIX.
Também nada faria prever que Casablanca viesse a ser um êxito intemporal. Este filme foi realizado por Michael Curtiz, mas apenas porque William Wyler, entre outros, declinou o convite que lhe foi dirigido. E, se o filme é protagonizado por Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, é porque Ronald Reagan não aceitou o papel de Rick Blaine e Ann Sheridan não quis o papel de Ilsa Lund.
A improbabilidade do sucesso de qualquer destas obras, a circunstância de ambas se debruçarem sobre amores infelizes mas de, ao mesmo tempo, serem profundamente diferentes, fez que se tornasse irresistível comparar o livro camiliano com a película dos argumentistas Murray Burnett e Joan Alison.
Tanto no livro como no filme, o contexto dificulta o florescimento da relação amorosa entre as personagens principais. Porém, enquanto em Amor de Perdição, o amor entre Simão e Teresa é contrariado por familiares e pelas convenções sociais (“Hás-de casar!” com o primo Baltasar Coutinho), em Casablanca a Segunda Guerra Mundial é o principal fator que impossibilita Rick e Ilsa de viverem cabalmente sua paixão.
Simão e Rick são heróis envolvidos em amores, mas têm temperamentos opostos e reagem às circunstâncias adversas de forma distinta. Simão é dado a fúrias e desvarios, sente um amor egoísta e possessivo e chega mesmo ao ponto de matar Baltasar. Aceita o seu trágico destino “como se [o] ignorasse”. Já Rick é forte e calmo e, sob uma aparente indiferença, mostra-se cavalheiresco e impõe o sublime sacrifício dos amantes de Paris, pondo os interesses da humanidade à frente dos seus sentimentos. Apesar de acreditar no destino – “de todos os bares, de todas as cidades, de todo o mundo, [Ilsa] tinha de entrar no meu” e de atrever-se a pedir que fosse tocada a famosa As time goes by –, Rick não se subjuga ao mesmo.
A forma distinta como Simão e Rick se relacionam com as suas amadas resulta não só da personalidade de ambos, mas também da diferença de idades e, consequentemente, de maturidade entre os membros de ambos os casais. Simão é muito jovem e Teresa é “uma menina de quinze anos regularmente bonita”. Vivem um amor epistolar, espiritual e até metafísico (“Há um segredo que só no sepulcro se sabe. Ver-nos-emos?”). Ao contrário, a relação entre Rick e Ilsa é cúmplice, mas também carnal e decorre quando ambos visivelmente já têm mais de trinta anos. Paradoxalmente, pode considerar-se que Ilsa se mostra mais submissa a Rick do que Teresa a Simão, pois Ilsa acata as instruções para embarcar no avião para Lisboa com o marido Victor Lazsló, mas Teresa não aceita uma vida sem o seu amor e decide-se a morrer em face da condenação ao degredo do amado (“Adeus. À luz da eternidade parece-me que já te vejo Simão”).
No inesquecível final de Casablanca, Rick preserva as suas recordações, opta pelo sacrifício do seu amor, recusa embarcar no avião para Lisboa e despede-se de Ilsa, exclamando de forma pungente “We will always have Paris” (“Teremos sempre Paris”). No trágico final de Amor de Perdição, Simão recusa o sacrifício de passar dez anos pelo cárcere e opta pela “liberdade do degredo”, apesar dos pedidos de Teresa.
Creio que, se se tivessem conhecido, não teria havido entre Rick e Simão “the beginning of a beautiful friendship” (“o começo de uma bela amizade”).

Clara (Bom/Bom (+))
Moulin Rouge é um filme musical dirigido por Baz Luhrmann, cuja história decorre em Paris no século XIX. Christian é um rapaz que ruma à cidade luz para se tornar num escritor. Acaba por escrever uma peça para um grupo de atores que atuam num bordel, o Moulin Rouge, acabando por se apaixonar por uma das atrizes, Satine. No entanto, a atriz já estaria comprometida com um homem rico que iria financiar a peça. Depois de muitas escolhas e de muitas desavenças, o amor prevalece acima de qualquer outro valor. Satine, entretanto, adoece e acaba por morrer de tuberculose. 
Este filme retrata em muitos aspetos os sentimentos e situações do livro Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco. Tanto Simão como Christian são irreverentes e rebeldes. Simão desobedece constantemente a seu pai. Até o seu irmão mais velho diz não conseguir viver com ele pois está “temeroso do génio sanguinário dele”. Da mesma forma, Christian decide mudar-se para Paris, mesmo sem a aprovação do pai.
  As semelhanças mais evidentes entre estas duas histórias são os problemas associados ao romance entre as personagens. Tanto a novela de Camilo como o musical de Luhrmann tratam de romances proibidos e de amores tão grandes que ultrapassam quaisquer barreiras. Teresa e Simão são dois jovens enamorados, cujo amor é proibido devido a desavenças entre as respetivas famílias. Teresa já estaria destinada a casar com o seu primo Baltasar, mesmo sendo “mais certo odiá-lo [eu] sempre”. Da mesma forma existe uma intromissão no amor entre Satine e Christian, por parte de Duke, o pecunioso financiador da peça. Tanto Duke como o primo Baltasar são apresentados como personagens que interferem na paixão das personagens principais.  Inicialmente, ambos têm o prepósito de assassinar o amante das mulheres pelas quais estão apaixonados. No entanto, o desfecho destas duas situações é bastante diferente. Enquanto na novela Baltasar, ao tentar assassinar Simão, acaba por perder  “o vigor dos dedos” pois “tinha o crânio aberto por uma bala” lançada por Simão, no filme, embora o Duke também não consiga matar o seu rival, sai impune da situação.
Nem o filme nem o livro evidenciam um desfecho animador. No romance camiliano, Teresa não consegue conformar-se com o fim da relação e prefere não viver, a viver uma vida sem Simão (“(...) e morro, porque não posso, nem poderei jamais resgatar-te.”). O herói romântico falece também a caminho do desterro, levando Mariana consigo, ela que não conseguiria viver sem ele. Da mesma forma, Moulin Rouge tem um final dramático. No final do filme, Satine acaba por morrer de tuberculose, deixando Christian com uma depressão.
Ao terminarem as narrações destas duas obras, o leitor/observador constata que o enredo seria uma analepse de tudo o que teria acontecido, e voltamos ao presente. No caso do musical a história a que temos acesso é a história que Christian prometera escrever a Satine na altura da sua morte, enquanto no caso da novela voltamos ao primeiro plano da narração onde um prisioneiro investiga a vida de um familiar antigo.

Diana (Bom/Bom (+))

A paixão entre Olly e Madeleine, personagens do filme Amor Acima de Tudo (Stella Meghie, Everything, Everything, 2017), é mais um daqueles amores que parece impossível, como o de Simão e Teresa, em Amor de Perdição.
Madeleine é uma rapariga de dezoito anos que sempre sofreu de uma doença que não lhe permitia sair de casa devido ao elevado risco de apanhar infeções que a podiam levar à morte. Apenas a sua mãe, a enfermeira e Rosa, a filha da enfermeira, podiam entrar em sua casa. O seu maior sonho era ver o oceano e nadar. Um dia, Olly muda-se para a casa ao lado da de Madeleine. Os seus olhares cruzam-se pela primeira vez, quando ambos olham pela janela dos seus quartos, apaixonando-se de imediato. Também Simão e Teresa estavam à janela quando repararam um no outro.
No livro, os pais de Simão e de Teresa eram contra esta relação devido às divergências entre as duas famílias. O pai de Teresa, Tadeu de Albuquerque, manteve-a fechada em casa e, mais tarde, em conventos, dificultando o contato entre os dois, que, mesmo assim, se conseguiram encontrar sem o seu conhecimento.Tadeu de Albuquerque disse também que Teresa já não era sua filha (“Se és uma alma vil, não me pertences, não és minha filha, não podes herdar apelidos honrosos”). Em Amor Acima de Tudo, era a doença da protagonista que a mantinha afastada de Olly. Apenas conseguiu que ele a visitasse em casa duas vezes, também sem o conhecimento da sua mãe. Mais tarde, Madeleine veio a descobrir que não sofria de nenhuma doença. A sua mãe só a queria proteger do mundo pois, quando o seu marido e o seu filho morreram, Madeleine era a única pessoa que lhe restava. Assim, pode-se concluir que, em ambos os casos, são os pais os grandes obstáculos a estas relações: no filme, por amor à filha, apesar de lhe ter causado mais sofrimento;  em Amor de Perdição, mais por ódio e orgulho.
Mesmo sem o consentimento dos pais, em ambas as relações, a comunicação é mantida e é o que “alimenta” a paixão. Simão e Teresa comunicam essencialmente por cartas (“É já o meu espírito que te fala, Simão. A tua amiga morreu. A tua pobre Teresa, à hora em que leres esta carta, [...], está em descanso.”) ou por recados de uma rapariga do povo, Mariana (“Sou uma portadora desta carta para vossa excelência.”, “A filha do ferrador [Mariana] deu o recado, e sem alteração da palavra”). Já Olly e Madeleine, que vivem, obviamente, numa época mais recente, comunicam através do telemóvel.
Arriscar também é um aspeto em comum entre o livro e o filme. No primeiro, Simão arrisca a vida e a relação com a família para ir ver Teresa quando esta sai do convento, mesmo sabendo que lá iriam estar presentes o pai e o primo de Teresa. No outro caso, Madeleine põe em risco a sua vida quando decide ir para o Havai com Olly. É certo que Maddy tinha o sonho de sair de casa e ver o oceano desde muito pequena, mas ela própria afirma que não o teria feito se não tivesse conhecido Olly, que lhe dera uma maior vontade de viver em vez de apenas sobreviver.

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