Aulas (3.º período, 2.ª parte: 135-144)
Aula 135-136 [= 14 da
Quarentena] (4
[3.ª, 5.ª, 9.ª], 5/mai [4.ª]) Para aproveitarmos termos lido «A Contrafé» na
última aula, podemos hoje reler (parto do princípio de que todos já leram O Ano
da Morte de Ricardo Reis ou já estão muito avançados) o passo consequente, o interrogatório
nas instalações da PVDE. Eram estas na Rua António Maria Cardoso, que ficou
para sempre a isso associada. A «António Maria Cardoso» ainda é, para a minha
geração ou para a anterior, metonímia de PIDE. Hoje esse prédio está
transformado em apartamentos. Na Apresentação verão várias perspetivas da rua
em causa, acabando nas do 25 de abril de 74, incluindo uma célebre do interior,
e numa do condomínio atual.
O texto intitula-se «Na sede da PVDE», está nas pp. 270 a 274
do manual, é portanto longo, mas já o conhecerão pela leitura do próprio livro
de Saramago. A quem não tenha em casa O Ano da Morte de Ricardo Reis
volto a recomentar o PDF, descarregável aqui.
De qualquer modo, ficam reproduzidas as cinco páginas do
manual. Acrescento uma sexta (p. 275), que apoia a resposta às perguntas da p.
274, sobre Sequências textuais.
Na p. 270, a partir da l. 25, ainda se refere brevemente o
caminho entre o Hotel Bragança e a PVDE, na Rua António Maria Cardoso. Mas o
percurso está mais bem descrito ainda na parte que lemos na última aula (na voz
de Salvador, que o explica a Reis):
«primeiro sobe a Rua do
Alecrim até à esquina da igreja, depois vira à direita, ainda outra vez à
direita, adiante há um cinema, o Chiado Terrasse, do outro lado da rua está à o
Teatro de S. Luís, rei de França, são bons lugares para distrair-se uma pessoa,
artes de luz e de palco, a polícia é logo a seguir, não tem nada que errar, ou
terá sido por ter errado tanto que o chamaram cá» (p. 268 do manual).
Vê esse percurso pelo GoogleMaps (prometo que não te farei
ouvir desta vez uma tentativa minha). Repara que terás de subir toda a Rua do
Alecrim, como fizemos da última vez, só que, chegando ao Chiado-Camões, virarás
à direita para, no fundo, desceres de novo paralelamente ao que subiras, agora
pela António Maria Cardoso. Verás logo no início, à tua direita o que resta do
Chiado Terrasse, um velho cinema (na Apresentação está uma sua imagem ainda
como cinema), pouco depois, mas do outro lado da rua, o Teatro de S. Luís. A antiga sede da PVDE, depois PIDE, pode não se reconhecer muito bem porque é agora um prédio de habitação, mas está à esquerda de quem desce, logo a seguir ao S. Luís, em frente a um outro prédio em obras de «requalificação».
Em vez de
respondermos às perguntas na p. 274, vejamos este quadro que já reúne o
fundamental, que é a caracterização das várias sequências do texto.
Acrescentarás apenas, na coluna da direita, as palavras em falta.
linhas
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sequência
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comentário
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1-25
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argumentativa
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Como
acontece em textos argumentativos, defende-se uma tese, a de que a natureza
não é indiferente às «dores e sentimentos humanos», apresentando-se o ______
de não poder justificar-se de outro modo o temporal que atingia o país há
tanto tempo e dando-se exemplos (a raiva, no Alentejo; as bexigas, o tifo, «as
duzentas pessoas que vivem em três andares», no Porto; a ida de Ricardo Reis
à sede da ___).
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25-72
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narrativa
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Como
é próprio das sequências narrativas, são usados diversos verbos que indicam ações
(«vai», «soprando», «virar», «entra», «mostra», «foi», «leva»,
«precipitou-se», «travou», «Seguiu», «bateu», «abriu-a», «ordenou»,
«pousou-a», «lançou-lhe», «Tirou», «soergueu-se», «leu», «comparou», «tomou»,
«colocou») conjugados no presente do indicativo e no _____ perfeito. São
usados advérbios com valor de tempo («agora»,
«ainda», «depois», «enfim», «depois», «agora», »agora sim») e de ____ («Aqui», «daqui», «por ali», «ali perto»).
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73-163
|
dialogal
|
O
narrador dá a palavra às personagens, num diálogo que parece considerar
suficientemente esclarecedor para dispensar comentários. O inquérito, considerado
pelo próprio Reis como «mais de devassa que de conversa», cobre a vida
pessoal, sem qualquer justificação, criando ciladas e procurando contradições.
Esta sequência dialogal termina com intervenção de ____, cujo cheiro intenso
a cebola e a náusea que provoca podem servir de metáforas para o ambiente
pestilento da opressão e do seu efeito sobre as vítimas.
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164-178
|
descritiva
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Nestas
linhas, o _____ exprime a finalmente a sua posição perante o sucedido. Com
efeito,
o desejo
expresso de um terramoto e, sobretudo, a dúvida sobre se os ossos do agente e
do seu superior algum dia poderiam considerar-se «limpos» são
elucidativos do ponto de vista do narrador.
|
Vê solução na Apresentação:
Dá um título (um título-frase, quase uma epígrafe) ao texto que
estivemos a ler e a que as autoras do manual chamaram «Na sede da PVDE». O teu
título-frase deve ser expressivo, mostrar compreensão do texto e ter uma oração
subordinada adverbial (temporal, causal, condicional, final, concessiva), seguindo-se
a respetiva subordinante. É natural que te venha a ser pedido mais tarde
para copiares esse título em «Gaveta do 12.º 3.ª/4.ª/5.ª/9.ª» (Classroom).
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O ano passado vimos um interrogatório, muito agressivo, a uma
paragem de autocarro ou a caixote de lixo que era testemunha. Não recupero
esse sketch dos Gato Fedorento, que era longo, mas estoutro, que também já
vimos — «Inspetor que não sabe fazer perguntas» —, e ainda «Polícia Bom,
Polícia Bonzinho», que nunca vimos. Todos estes interrogatórios têm polícias
ainda menos inteligentes que o inspetor da PVDE e interrogados muito menos
inteligentes do que Reis.
A prova de exame do ano passado tinha uma pergunta
sobre O Ano da Morte de Ricardo Reis, precisamente sobre a importância
do enquadramento histórico e sociológico. Repara que a pergunta apresentava em
alternativa O Ano da Morte de Ricardo Reis e Memorial do Convento,
porque as escolas podem optar por uma destas duas obras de Saramago. (Isto
aliás lembra-nos que as provas de exame podem fazer o mesmo com outras obras de leitura integral —
Farsa de Inês Pereira ou Auto da Feira, de Gil Vicente; Os
Maias ou A Ilustre Casa de Ramires, de Eça de Queirós — ou mesmo com
Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco.)
Era uma pergunta do Grupo I, mas da parte C, ou seja a que
implica escrever sobre assunto literário mas sem texto prévio:
[Prova
de exame 2019, 1.ª fase]
Grupo I, Parte C
7. Do diálogo de José
Saramago com o «passado» emerge, em romances como Memorial do Convento e
O Ano da Morte de Ricardo Reis, uma visão crítica sobre o tempo
histórico representado e sobre a sociedade desse tempo. Escreva uma breve
exposição na qual comprove a afirmação anterior, baseando-se na sua experiência
de leitura de um dos romances mencionados.
A
sua exposição deve incluir:
• uma introdução ao tema;
• um desenvolvimento no qual explicite dois aspetos que são objeto de crítica pelo narrador,
fundamentando cada um desses aspetos em, pelo menos, um exemplo pertinente;
• uma conclusão adequada ao
desenvolvimento do tema.
Comece
por indicar, na folha de respostas, o título da obra por si selecionada.
Nos critérios de classificação estipulava-se o seguinte:
7. Relativamente à obra
selecionada, devem ser abordados dois dos tópicos seguintes, ou outros
igualmente relevantes.
Em
O Ano da Morte de Ricardo Reis, é evidente o olhar crítico do narrador
sobre:
‒ a opressão vivida durante o Estado
Novo, patente, por exemplo, no controlo exercido pela PVDE/pela polícia política sobre a população e na existência de delatores;
‒ a repressão de manifestações de revolta, como a
que ocorreu durante a sublevação dos marinheiros;
‒ a manipulação da informação transmitida pelos meios
de comunicação social, por exemplo, sobre as notícias da guerra na Europa;
‒ a propaganda política, patente, por
exemplo, no enaltecimento de Salazar, perspetivado como um modelo para os outros países/como o «salvador» da pátria.
Nota que os critérios apresentam o assunto da crítica de modo
genérico (a opressão durante o Estado Novo ... / a repressão de manifestações ...
/ a manipulação da informação ...) e citam as evidências no enredo da obra
apenas enquanto exemplos (controlo pela PVDE, reação à sublevação dos
marinheiros, notícias ...). Receio que
alguns de vocês passassem diretamente aos exemplos, por não lhes ser fácil
encontrar los tais termos generalizadores. É um treino que é preciso fazer.
Isto também é verdade para o Grupo III: distinguir tese (a
vossa posição quanto ao assunto em causa), argumentos (ou seja em que se
baseiam para ter tomado a posição definida na introdução) e respetivos exemplos
(casos concretos que comprovam o argumento que deram).
Deixo aqui os links da prova e dos critérios de classificação. Sobretudo se estás
a pensar fazer exame de Português, aproveita para ver a estrutura da prova e,
especialmente, o estilo de critérios, com descrições de proficiência em escalas, usado nestas classificações.
Há filmes portugueses recentes cujo enredo envolve bastante a
PIDE. Ficam os trailers de
alguns:
48 (de Susana de Sousa Dias)
Luz Obscura (de Susana de Sousa Dias)
A uma hora incerta (de Carlos Saboga)
Operação Outono (de Bruno de Almeida)
Os dezoito minutos iniciais do documentário «As grades que nos guardaram» também abordam os interrogatórios da PVDE/PIDE (assiste apenas a esses dezoito minutos).
Na penúltima aula usei na apresentação capas de diversas
edições (incluindo estrangeiras) de O Ano da Morte de Ricardo Reis.
Repito-as na apresentação de hoje individualizadas. Pensa tu também numa capa
que criasses para este livro de Saramago. Não a desenharás — a não ser que
queiras ou, num esboço, como ponto prévio do teu trabalho — mas descrevê-la-ás
em poucas linhas (cerca de cento e trinta palavras), o que pode incluir alguma
justificação das opções que tomasses. Guarda esse teu texto por agora.
(Na p. 301 do manual, há uma apreciação crítica a uma capa de
livro, a de uma edição finlandesa de Memorial do Convento. Não é
imprescindível lê-la agora, mas também não se perderia nada. Recomendo este top de capas de livros; bem como este ou este.)
TPC — Escreve em «Gaveta do
12.º 3.ª/4.ª/5.ª/9.ª» o título-frase sobre o texto lido que te pedi no início
da aula de hoje (com oração subordinada adverbial e subordinante).
Aula 137-137R [= 15 da
Quarentena] (5
[5.ª], 6/mai [3.ª, 4.ª, 9.ª]) Um esclarecimento sobre as próximas correções que
faça ao que tem ficado em Classrooms. Não se admirem se comentar ou classificar
as tarefas em Classroom fora da na exata ordem das aulas. Pode acontecer que me
dê jeito começar por algumas das tarefas mais recentes por, por exemplo, serem
mais curtas. (Explicito isto porque poderiam pensar que não me apercebera de
algum escrito que tivessem enviado entretanto e o estar a saltar por não o ter
visto ou estar a esquecer.) É provável que classifique em primeiro lugar a
tarefa da última aula. Já agora, neste caso o que aparecerá é uma nota entre 1
e 5 (recordem a escala do Básico, portanto).
Voltamos a Filipe
Melo. Desta vez, para um documentário. Vão reconhecer neste «O homem
que gostava de zombies» características — pessoanas — da criação de biografias
inventadas para autores de obra efetivamente publicada. Lembra-nos isto, é
claro, o processo da criação de heterónimos, pelo menos por causa da ficção de
vidas que sucede na carta sobre a génese dos heterónimos escrita por Fernando
Pessoa a Adolfo Casais Monteiro (no nosso manual está um excerto, nas pp.
25-27, que lemos; mas também lhes recomendara a versão completa).
Também há neste pastiche de documentário biográfico
características borgesianas (isto é de Jorge
Luis Borges, o autor argentino de «Análise da obra de Herbert Quain»,
que Saramago «cita» Ano da Morte de Ricardo Reis, assumindo a existência
do livro fictício The God of the Labyrinth). Na aula 4 da Quarentena dera-lhes
a ler todo o conto de Borges (recopiei essa parte da aula agora aqui).
Se não leram o conto nessa altura, agendem-no para logo que tenham tempo livre.
Uma característica borgesiana é a de citar textos na verdade
não escritos, autores e obras que um leitor incauto pode julgar existirem
mesmo. Fernando Pessoa
também criou um universo semelhante, pôs, por exemplo, os heterónimos a criticarem-se
entre si, fê-los envolverem-se até em polémicas da «vida real», etc.
Este documentário, de Filipe Melo, é posterior a I’ll see you in my dreams, o filme de terror cujo autor
seria o inventado Eurico Bernardes Catatau, que alguém descreverá como «um
génio de obras incompletas», bom epíteto também para Pessoa.
Vê então o documentário, cuja música é de Mário Laginha e
Bernardo Sassetti. Anota os raros momentos (frases, factos referidos) em que se
deixa perceber que se trata de uma brincadeira, em que o pastiche descamba para
a caricatura e passamos a desconfiar estarmos perante ficção e não face a um verdadeiro
documentário. Regista uns três casos desses.
O homem que gostava de zombies — 1.ª parte
O homem que gostava de zombies — 2.ª parte
O homem que gostava de zombies — 3.ª parte
Referências
demasiado caricaturais que nos permitem inferir que documentário é ficcionado
(e biografia de Catatau inventada):
_______________
_______________
_______________
Na Apresentação, apontam-se exemplos de casos que me parecem
trair a verosimilhança do documentário. Provavelmente, alguns até terão sido da
responsabilidade dos que testemunhavam, dos depoentes mais prestigiados (o
maestro António Victorino d’Almeida, os atores António Feio e Joaquim de
Almeida), cujos improvisos Filipe Melo não terá talvez querido corrigir.
Note-se aliás a estratégia de convocar para prestar depoimentos pessoas
efetivamente ligadas ao meio do cinema, o que confere realismo ao filme.
Dá agora um relance à carta de Pessoa a Adolfo Casais Monteiro,
para ver se há casos também demasiado evidentes de mistificação. Lê primeiro o
passo com as biografias dos três heterónimos — o que reproduzo a seguir —, mas,
se puderes, relanceia depois toda a carta:
«[...] Ricardo Reis
nasceu em 1887 (não me lembro do dia e mês, mas tenho-os algures), no Porto, é
médico e está presentemente no Brasil. Alberto Caeiro nasceu em 1889 e morreu
em 1915; nasceu em Lisboa, mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve
profissão nem educação quase alguma. Álvaro de Campos nasceu em Tavira, no dia
15 de Outubro de 1890 (à 1.30 da tarde, diz-me o Ferreira Gomes, e é verdade,
pois, feito o horóscopo para essa hora, está certo). Este, como sabe, é
engenheiro naval (por Glasgow), mas agora está aqui em Lisboa em inatividade.
Caeiro era de estatura média, e, embora realmente frágil (morreu tuberculoso),
não parecia tão frágil como era. Ricardo Reis é um pouco, mas muito pouco, mais
baixo, mais forte, mas seco. Álvaro de Campos é alto (1m,75 de altura — mais 2
cm do que eu), magro e um pouco tendente a curvar-se. Cara rapada todos — o
Caeiro louro sem cor, olhos azuis; Reis de um vago moreno mate; Campos entre
branco e moreno, tipo vagamente de judeu português, cabelo porém liso e normalmente
apartado ao lado, monóculo. Caeiro, como disse, não teve mais educação que
quase nenhuma — só instrução primária; morreram-lhe cedo o pai e a mãe, e
deixou-se ficar em casa, vivendo de uns pequenos rendimentos. Vivia com uma tia
velha, tia-avó. Ricardo Reis, educado num colégio de jesuítas, é, como disse,
médico; vive no Brasil desde 1919, pois se expatriou espontaneamente por ser
monárquico. É um latinista por educação alheia, e um semi-helenista por
educação própria. Álvaro de Campos teve uma educação vulgar de liceu; depois
foi mandado para a Escócia estudar engenharia, primeiro mecânica e depois
naval. Numas férias fez a viagem ao Oriente de onde resultou o «Opiário».
Ensinou-lhe latim um tio beirão que era padre.» [excerto da «Carta de Fernando Pessoa a
Adolfo Casais Monteiro sobre a génese dos heterónimos», Fernando Pessoa, Cartas,
edição de Richard Zenith, 2007]
________________
Na
Apresentação fica a minha opinião sobre o que possa haver de menos verosímil
nestas três biografias.
Vê
agora o trailer do filme assinado, alegadamente, por Catatau, I’ll see you
in my dreams:
Na literatura portuguesa há outros casos de mistificações
semelhantes, envolvendo autores que, durante algum tempo, se supôs serem
verdadeiros. O caso mais interessante será Carlos
Fradique Mendes, um poeta inventado por Eça de Queirós, Batalha
Reis, Antero de Quental. Fradique seria o autor de Poemas do Macadam.
Poemas soltos de Fradique são, na verdade, da responsabilidade de cada um
daqueles intelectuais da geração de setenta.
Mais tardia é A Correspondência de Fradique Mendes,
escrita já só por Eça de Queirós. Até à
página 125 temos a biografia do suposto poeta. Depois é que vêm as cartas assinadas
por Fradique.
Entretanto, Carlos Fradique Mendes também aparecera como
personagem de O Mistério da Estrada de Sintra, que aliás
parte de uma mistificação igualmente. Eça de Queirós e Ramalho Ortigão
construíram esta novela policial em cartas que iam sendo publicadas no Diário
de Notícias como se enviadas por quaisquer leitores.
Haverá mais casos, é claro. Ocorre-me, mais perto de nós, o das
crónicas de António Sousa Homem,
um memorialista que se sabe ser afinal o escritor e crítico literário Francisco
José Viegas. Em sites de editoras/distribuidoras consta mesmo a biografia de Sousa Homem.
E em Itália, nestes últimos anos, a escritora mais lida tem
sido Elena Ferrante, de existência enigmática e para cujos romances se têm encontrado paternidades várias. Mas
afastamo-nos do conceito de heterónimo ou mesmo de autor fictício que nos
trouxe até aqui.
Como vimos no início do ano, Fernando Pessoa, além dos três heterónimos
e do semi-heterónimo Bernardo Soares, criou ainda muitas outras personalidades
cujos nomes subscreveram textos que criou (quem inventariou melhor os autores
criados por Pessoa foram Jerónimo Pizarro e Patricio Ferrari em Eu sou uma
antologia, que reúne 136 autores fictícios). Também há um caso engraçado de
alegado heterónimo, Coelho Pacheco,
que afinal existiu mesmo. O poema «Para além doutro oceano» ainda está
no Arquivo Pessoa, embora se saiba há muito que Coelho Pacheco era alguém de
carne osso, um amigo de Pessoa. Coitado, não deve ser agradável não ter sequer
o reconhecimento de ser dado como autor do, salvo erro, único texto que
pretendeu publicar (era para sair no Orpheu, no número 3, que ficou em
provas tipográficas). Mas não deixa de ser elogioso terem outros podido pensar
que aquele texto teria sido escrito por Pessoa.
Escreve uma resposta a este item / de uma prova de exame
(inventada por algum heterónimo meu que fosse autor de provas de exame), a
parte C de um Grupo I. Sugiro que escrevas a caneta e talvez em cerca de cento
e cinquenta palavras. À frente acrescentei umas páginas sebenteiras mas não me
parece que sejam muito úteis.
7. O processo da criação de heterónimos é apenas uma face, a
outra face, de características que encontramos na poesia ortónima de Pessoa.
Escreva uma breve
exposição na qual comprove a afirmação anterior, baseando-se na sua experiência
de leitura da poesia de Fernando Pessoa e no que sabe acerca da questão da
heteronímia.
A
sua exposição deve incluir:
• uma introdução ao tema;
• um desenvolvimento no qual explicite dois aspetos que comprovem
a afirmação em cima, fundamentando cada um desses aspetos em, pelo menos, um
exemplo pertinente;
• uma conclusão adequada ao
desenvolvimento do tema.
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Aqui está o filme de terror de Catatau/Filipe Melo, I’ll see you in my dreams, agora
na íntegra:
TPC — Guarda a resposta ao
item 7 pedida atrás. É natural que ta peça proximamente.
Aula 138-139 [= 16 da Quarentena] (7 [9.ª], 8/mai [5.ª, 4.ª, 3.ª]) Queria falar um
pouco da tarefa da aula 9,
que já comentei para boa parte dos alunos das turmas 3.ª e 4.ª (ao longo do dia
de hoje, isto é, de quinta, 7 de maio, espero terminar os comentários do que me
falta da 4.ª e escrever os da 5.ª e da 9.ª).
De qualquer modo, já vou aqui dizer
o que falhou mais frequentemente. Tratava-se de escreverem um texto com Lídia e
em que em cada parágrafo predominasse um dado tipo textual. Creio que muitos não
tiveram a noção de que «sequência textual» significa, no fundo, passo de
um texto em que está sobretudo evidente um certo tipo textual ou um protótipo
textual (estes termos são sinónimos, embora os programas os vão retomando sem
o esclarecer). Os nomes dos tipos textuais também têm oscilado («explicativo»
já foi «expositivo»; «dialogal» também pode designar-se «conversacional»).
Também já se percebeu que os tipos textuais preditivo e instrucional/diretivo
não foram acolhidos neste novo enquadramento enquanto «sequências». Provavelmente,
se estivessem industriados quanto a isto, parte das confusões não teria
acontecido. Foram estas as fraquezas mais comuns:
— explicativo não significa ‘texto
que dá uma justificação’ nem ‘explicação’ em sentido corrente. Explicativo, ou
expositivo, é o texto que trata de uma matéria, definindo-a, ensinando-a. Um
manual didático, nas suas partes de introdução a cada conteúdo, é um exemplo de
sequência explicativa; uma enciclopédia, nos verbetes sobre algum tópico,
também (note-se que, se se tratar de verbetes biográficos, já pode ser mais
importante o tipo narrativo, porque aí far-se-ia o relato da vida dessa pessoa);
— argumentativo quer dizer ‘que apresenta argumentos’.
Num debate, por exemplo, este protótipo será dominante. Manuais didáticos, fora
da parte mais informativa, terão trechos já especulativos, onde poderá haver
mais argumentação do que explicação. Algumas das vossas respostas caíram no
erro de, em vez de pôr Lídia ou o narrador ou alguém a raciocinar, a argumentar,
terem relatado que alguém tinha refutado isto ou aquilo ou achava isto ou
aquilo, enfim que alguém argumentara. Só que referir que alguém alguém
argumentou não implica um texto argumentativo, antes um texto narrativo
(reporta-se uma ação, conta-se que fulano estava hesitante ou estava a discutir);
— narrativo reconhece-se por haver atos realizados, em
princípio numa linha temporal, por alguma personagem. Fica mais claro o texto
narrativo se evitarmos as descrições, embora o mais comum num escrito literário
seja que a descrição se vá misturando bastante com as ações. Alguns dos textos
supostamente narrativos estavam demasiado parados, recheados com pormenores de
caracterização (logo com o protótipo descritivo demasiado presente). Ora se há
mais espaço que tempo, deixamos de ter narração e passamos a ter descrição. O
texto descritivo é uma fotografia, é estático, retrato de pessoas ou de cenários.
O texto narrativo é um filme, decorre ao longo do tempo. Também era preciso ter
em conta que havia que estilizar, exagerar na presença de um só tipo, para
efeitos de exercício, o que é artificial mas fazia parte do nosso trato;
— dialogal foi bem ilustrado nos vossos textos, que ora
se socorreram do discurso direto ora do indireto, ambos aceitáveis. Nem sempre
recorreram à pontuação mais canónica para o discurso direto: travessão, fala,
travessão, verbo dicendi e sujeito que falou.
Deixo-lhes um bom exemplo de texto com as cinco sequências bem
ilustradas, de colega do 12.º 4.ª:
[N] Lídia decidiu cumprir as suas tarefas
domésticas enquanto Ricardo Reis tomava um banho quente. Começou por abrir as
janelas para aliviar o cheiro a mofo e depois mudou os lençóis da cama, limpou
a imundície acumulada na mobília e lavou a loiça espalhada pela cozinha.
Acabara de arrumar os pratos quando o poeta entrou na divisão esfregando uma
toalha no cabelo húmido.
[De] Ricardo Reis estava esplendoroso. A glória do
seu corpo imaculado era acentuada pelo aroma inebriante dos sais de banho e a
frescura da brisa matinal criava uma atmosfera sublime. Lídia entristeceu-se ao
reconhecer-se como intruso destruidor da perfeição, era uma simples criada de
hotel, pobre e quase analfabeta, apoiada numa bancada de mármore, encharcada no
próprio suor.
[Di] — Desculpe-me, senhor doutor, mas tenho de
me ir embora.
Reis,
desiludido, quis perceber a razão do transtorno:
—
Oh, o que se passa?
—
Nada, senhor doutor. Hoje preciso de sair mais cedo, vou visitar a minha mãe,
não a vejo há muitos dias.
[A] É inconcebível, concluiu Lídia ao descer
as escadas da moradia, é impossível estabelecer-se uma ligação íntima e
equivalente entre estratos sociais tão distanciados. Existe uma diferença
acentuada a nível de instrução, elegância e riqueza que não pode ser dissipada,
pois é essa distinção que assegura o funcionamento da sociedade. É a ordem
natural do mundo. De facto, assim o é desde o advento das formas de vida, os
fortes dominam e os fracos aceitam o seu estatuto. Deste modo, não há razão
para chorar, permanecerá fiel à sua função.
[E] A mentira pode definir-se como o oposto da
verdade. Com efeito, verifica-se que um enunciado constitui uma mentira se o
que afirma não corresponde à realidade, mas existem casos em que se diz uma mentira
contando a verdade. Lídia sentiu que o fizera.
[Pedro, 12.º 4.ª]
Duas irrelevâncias ainda antes da aula propriamente de hoje.
Na última aula podia ter assinalado que Carlos Fradique Mendes,
como Álvaro de Campos, tivera experiência oriental (sempre, é claro, segundo as
suas biografias fictícias).
Quando preparo esta aula, vejo na televisão uma reportagem sobre
desconfinamento em Elvas. Um dos entrevistados fala do «víru». Tem de se
escrever assim, porque o simpático alentejano diz a palavra como grave (e
palavras terminadas em -u sem acento gráfico seriam lidas como agudas: cfr.
«peru», «menu», «tabu»). O que é interessante neste «víru» é que resulta de um
processo de derivação não afixal. O falante elvense achou que -os
(-us) do final de «vírus» era uma desinência de número, um plural. Por
derivação regressiva, com toda a lógica, quando quis usar o singular, suprimiu
o -s que considerava servir apenas para marcar o plural: um víru
(ou «um viro»).
Lembramo-nos de outros casos de derivação não afixal
semelhantes: a sande (singular suposto de «as sandes»), o tene
(singular do imaginado plural «os ténis»), o gajo (grau normal do tido
como aumentantivo «gajón» percecionado como «gajão»). Sabemos que os casos mais
comuns de derivação não afixal são os chamados deverbais (nomes
resultantes de verbos, isto é, da interpretação errada da terminação do infinitivo
como um sufixo somado a um nome que houvesse já mas que não existia até então):
«a janta» (< jantar), «a pesca» (< pescar), «um debate»
(< debater). (Sobre derivação não afixal e os outros processos
morfológicos de formação de palavras veja-se aqui.)
Lê o texto «Ricardo Reis e Lídia», na p. 276 do manual
(copio em baixo).
Responde
às perguntas da p. 277, de «Leitura do texto», completando o que já fui
lançando como esboço de solução:
1. [Acrescenta
as formas verbais que suprimi]
No
início do excerto, o sentimento dominante em Lídia __ a tristeza, provocada
pela frustração, pelo vazio, por achar que a sua presença ali _____ de
justificar-se. O reconhecimento e a proximidade de Ricardo Reis ________-lhe
contentamento, realização, plenitude. ________-se, então, a ansiedade e o
desejo.
1.1 [Acrescenta
os nomes em falta]
O
momento de despir a ____ e vestir a sua roupa corresponde ao arrefecimento do
corpo e das emoções. A nudez desvenda-a como ______, liberta de uma qualquer
condição social, que ama e se sente amada.
2. [Acrescenta
os advérbios]
A
metáfora da primavera celebra o amor sensual, o rejuvenescimento tardio, mas
_________ compensador. A modalização final («talvez») _________ se aproxima da
formulação de um desejo, favorecendo a cumplicidade do leitor.
Vê as soluções na Apresentação:
Completa o quadro também na p. 277 («Escrita», 1), substituindo
nas minhas soluções as palavras disparatadas pelas corretas. Na solução para
cada quadrícula pus uma palavra da minha lavra (portanto, disparatada).
Estatuto social — Estatuto social elevado
(encontros ao jantar, na sala de estar do hotel, no teatro, visitas, intensíssimo
contacto físico)
Retrato físico — De aparência muito
jovem e delicada, impossibilitada de usar a mão central.
Familares / — ligação ao
contexto político
— Submissão ao genro / — ligação de cumplicidade passiva com o regime (contacto
com os diversos meios de propaganda, espetáculos, livros, Fátima)
Papel na relação — Papel decisivo na
relação: - marcação do primeiro encontro, visitas (casota e consultório), cartas,
separação. / Separação, permanência num poema.
Vivências de Reis — Curiosidade, pedofilia,
dúvida.
Os nomes / relação
intertextual com as Odes — Nome inscrito num poema escrito depois da
separação (poema existente do heterónimo queirosiano).
(Vê
solução na Apresentação.)
É esta a ode de Reis em que
aparece «Marcenda», ainda que, na verdade, não como nome próprio (maiúscula
deve-se ao facto de a palavra iniciar o verso).
Pensa nas perguntas 2 e 3 no final da p. 277, ambas sobre
Lídia e Marcenda. Relativamente ao ponto 3, sem escreveres propriamente,
regista o que darias como argumentos (dois) e os exemplos respetivos, depois de
decidida a tua posição (que ficaria só numa introdução que houvesse). Antes de
anotares essa espécie de plano, lê os dois textos explicativos, ou expositivos,
na p. 278 (de Clara Fereira Alves e de Maria Alzira Seixo):
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Guarda essas notas.
Por um destes dias de quarentena, no Público aparecia
esta fotografia, com a estátua de Pessoa, do escultor Lagoa Henriques, na
Brasileira, num Chiado deserto.
Escreve um texto, do género que queiras, sobre a imagem (vais
fazer um comentário à fotografia que no jornal vem na secção «Sem comentários»).
Esse teu texto deverá ter a seguinte estrutura:
1.º período — Frase
simples.
2.º período — Subordinada
adverbial concessiva + Subordinante.
3.º período — Subordinada
adverbial temporal + Subordinante.
4.º período — Coordenada +
Coordenada assindética + Coordenada copulativa.
5.º período — Coordenada +
Coordenada adversativa (que será também Subordinante da oração que se segue) + Subordinada
substantiva completiva.
6.º período — Frase
simples.
Estive a experimentar e a mim chegaram-me umas setenta e cinco
palavras. Resolve por isso tudo em cerca de setenta a cem palavras. Estes seis
períodos constituiriam normalmente um único parágrafo, mas admito que, para
efeitos de clareza da resposta, possas pôr cada período num novo parágrafo,
ficando assim com seis parágrafos.
Reproduzo uns quadros que recordam orações (tirados ambos de Gramática
de Português, de Maria Regina Rocha):
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A aula de hoje foi pequena para te dar tempo para o que peço
no tepecê, mas também para sugerir que dês agora um golpe de vista a Menina
e Moça, de Bernardim Ribeiro, novela que vimos ser referida no cap. III de O
Ano da Morte de Ricardo Reis (volto a pôr em baixo essa passagem, muito
intertextual, do cap. III) e já nos aparecera igualmente em Frei Luís de
Sousa (mencionada por Maria). Uma edição de Menina e Moça (ou História
de Menina e Moça) foi agora disponibilizada pela INCM em PDF. Relanceia-a
aqui (texto da novela começa na p. 55). É um livro estranho.
TPC — Além da pequena redação «gramatical»
sobre a imagem de Pessoa no Chiado (tarefa desta aula 16), lança em
«Gaveta do 12.º 3.ª/4.ª/5.ª/9.ª» a tarefa da aula 15, resposta a item 7 de exame sobre processo
heteronímico e idiossincrasia do ortónimo, ou, se preferires, a tarefa de
escrita da aula 14, a descrição de projeto de capa (mas só uma delas; podes
descarregar em Word ou por fotografia do manuscrito).
Aula 140-141 [= 17 da Quarentena] (11 [3.ª, 5.ª, 9.ª], 12/mai [4.ª]) Terão
reparado que, antecipando-a a outros trabalhos, classifiquei já a tarefa da
aula 14, título com subordinada adverbial + subordinante. A classificação
era até 5 (tipo 3.º ciclo).
Resumirei os problemas mais frequentes.
(i) pedira que a frase-título fosse expressiva e implicasse
compreensão do texto. Ora muitos não escreveram frases expressivas (mas quase
frases de mero exemplo de gramática) nem que transmitissem o essencial do texto.
Vários referem que Reis se dirigiu à PVDE, o que me parece ser apenas um
prólogo deste texto. Devo dizer que acabei até por perdoar demasiado a falha
destes dois aspetos, porque me foquei mais na questão gramatical (e, por
momentos, até julguei não ter imposto aqueles dois requisitos). Há uns 5/5 que
não estão assim tão expressivos...
(ii) na parte de gramática, alguns não fazem frase (com verbos),
mas título do tipo grupo nominal, logo sem orações. Outros fazem mais do que as
duas orações (por exemplo: Subordinada adverbial, Subordinante, mas depois desta
ainda outra adverbial — ou uma adjetiva relativa incorporada numa das outras). Alguns
recorrem a orações não finitas (participais, gerundivas, infinitivas), o que,
não sendo erro, não sei se terá sido voluntário: «Saindo pela manhã», por
exemplo, é uma oração gerundiva, equivalente a «Quando saía pela manhã»;
«Interrogado Reis» seria uma oração participial correspondente a «Depois que foi
interrogrado»; etc. Houve quem escolhesse como Subordinada adverbial uma
consecutiva, o que impedia um dos dos requisitos, que era a ordem ser a de,
primeiro, a subordinada e, só depois, a subordinante (com consecutivas, a
subordinante vem sempre primeiro). A ordem foi realmente outro problema, já que,
por vezes, começaram com uma subordinante.
Uns dez bons títulos (entre muitos outros que podia pôr aqui):
Ainda que receies, não podes vacilar. (Francisco, 12.º
3.ª)
Caso se revolte, faça-o silenciosamente. (Beatriz,
12.º 3.ª)
Quando a opressão exige obediência, há quem usufrua da sabedoria na
desconversa. (Mafalda, 12.º 4.ª)
Embora se sentisse desconfortável com a conversa,
nada era pior que o cheiro a cebola. (Diana, 12.º 4.ª)
Para que pudesse sentir um
cheiro particularmente agoniante na capital, teve de ser interrogado pela PVDE.
(Ana, 12.º 5.ª)
Antes que o temporal leve o meu chapéu, faça o
favor de varrer a sede da PVDE e o seu rasto repulsivo de cebola. (Joana 12.º 4.ª)
Se estas paredes pudessem falar, contariam histórias de injustiças. (Beatriz
P., 12.º 5.ª)
Apesar de não ser nenhum retornado revolucionário, fui caçado por cebolas
andantes. (Tiago, 12.º 9.ª)
Mesmo que não tenhas nada a esconder, olha sempre por cima do ombro neste
lugar. (Margarida P., 12.º 9.ª)
Se o vento te guiar à PVDE, contém a respiração.
(Luísa, 12.º 9.ª)
Hoje chegamos ao cap. XIII de OAMRR. Podemos retomar
aquele exercício com sínteses de cada capítulo que fizéramos até ao cap. IX.
Preencherás agora as sínteses dos capítulos 10 a 13.
Cap. X — Ricardo Reis escreve a Marcenda para a
informar da nova morada. Dias depois deixa o hotel. Na sua primeira noite na
casa alugada, recebe a visita de Fernando Pessoa e falam sobre solidão.
Cap. XI — Lídia vai visitar Ricardo Reis para
verificar se está bem instalado e ele acaba por beijá-la na boca. Dias depois,
recebe a visita de (n) ______, que, pela primeira vez na vida, é beijada
por um homem.
Cap. XII — Lídia prontifica-se a cuidar da limpeza
da nova casa e os dois acabam por se envolver.
Ricardo Reis escreve uma carta confusa a
Marcenda. Começa, entretanto, a trabalhar, substituindo temporariamente um
colega especialista em coração e pulmões. Esta situação leva-o a escrever novamente
a Marcenda. Entretanto, quase ao fim de um mês, recebe (o). _______ da
jovem, de Coimbra, anunciando que o visitará no consultório.
Cap. XIII — Ricardo Reis encontra-se com Fernando
Pessoa junto à estátua do Adamastor e os dois conversam acerca da relação de
Reis (p) ______ e sobre a vida e a morte.
Ao chegar a casa, Ricardo Reis depara-se
com (q) _______ e, a propósito disso, falam da ida de Ricardo Reis à
polícia, de Salazar e de Hitler.
Lídia, enquanto faz limpeza, é seduzida por
Reis. Contudo, percebendo que está com um problema de impotência, o médico
repele-a, o que a deixa tristíssima e sem perceber o que se passava.
Marcenda aparece no consultório e Ricardo
propõe (r) ______. Ela recusa, alegando (s) ________.
(Cfr. com as correções na Apresentação, que aliás estão
todas erradas.)
No texto «Ricardo e Fernando» (pp. 279-280) o diálogo
entre as personagens do heterónimo e de Pessoa acaba por ser pretexto para se abordar
assuntos de «política».
Faz-se uma caracterização quase expositiva acerca do Estado
Novo e de Salazar (parágrafo das ll. 1-21), alude-se também a Hitler e ao
advento do nazismo na Alemanha (22-40) — de certo modo, este tópico implica uma
espécie de «prolepse subentendida», na medida em que supõe que os leitores
sabem o que se passaria depois já no enquadramento da Segunda Grande Guerra,
mesmo se os acontecimentos referidos não são posteriores ao tempo da ação do
romance (1935-1936). Só que o destaque dado ao nacional-socialismo alemão e a
Hitler justifica-se por factos que ainda não sucederam. A partir da l. 41,
aproveita-se a caracterização da situação alemã para se retomar a crítica ao
Estado Novo, agora sobretudo às ligações entre a Igreja e o Estado.
O manual assinala uma referência intertextual («agora é que
Portugal vai cumprir-se» alude ao último verso de «Infante», o primeiro poema
da segunda parte de Mensagem).
Mas, mais explicitamente, também «quando na Mensagem chamei santo a Portugal,
lá está, São Portugal» (ll. 51-52) retoma também outro poema de Mensagem,
«Nun’Álvares Pereira», no seu antepenúltimo verso.
Relê então:
Responde às perguntas 1.1 e 1.2 da p. 281, completando o que
já está lançado:
1.1 [o que falta são só
contrações de preposição + artigo (nunca preposições simples portanto)]
Um retrato crítico de
Salazar, acentuado ____ designação de partes («um quarto»...) é dado ____
enumeração ___ diversas facetas que este combinava — o paternalismo, a
utilização ___ religião como um ___ pilares ___ seu poder, o discurso
profético, a representação ___ papel de salvador ___ Pátria, a política ___
«mão de ferro», continuadora de Sidónio Pais.
1.2 [o que falta são duas
citações]
Exprimem a crítica as
afirmações: «__________»; «__________».
(Vê as soluções na Apresentação.)
Sobre Sidónio Pais, não deixes de ver a nota na p. 279. Pessoa
também terá sido, a dada altura, sidonista. Relanceia este longo «À memória doPresidente-Rei Sidónio Pais», poema que Pessoa escreveu em 1920, que também tem
laivos de sebastianismo, do messianismo, que conhecemos de Mensagem.
Se neste passo de OAMRR, passado em 1936, Fernando Pessoa
é chamado a esclarecer Ricardo Reis sobre Salazar e o Estado Novo, em 1935, na
sua vida real e nos poemas que escreveu, Pessoa teve uma fase especialmente
antissalazarista. As razões dessa reação do poeta contra Salazar são conhecidas
(expliquei o que acirrou mais Pessoa contra Salazar num artigo que, desculpem a
presunção, lhes volto a recomendar: «O melhor do mundo não são as crianças»).
Há uns vinte anos, editei os textos de Fernando Pessoa dos
anos 1934-1935 (Fernando Pessoa, Poemas de Fernando Pessoa. 1934-1935,
edição de Luís Prista, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2000).
Recentemente, tenho andado a rever essa edição modernizando a ortografia dos
poemas. Resolvi juntar os textos contra Salazar, ou contra o Estado Novo, que
pus a seguir (não liguem à numeração dos poemas; é relativa à tal edição de
2000). Em geral, não são grandes textos, são brincalhões, panfletários. Um
deles, «Liberdade», como já lhes expliquei, tem sido erradamente interpretado
(figurando nos manuais do básico ou do secundário como se fosse texto sobre
crianças, natureza, etc.). Relanceia mesmo estes textos (não é ler para
perceber tudo, é só ler na diagonal), bem como, se não o fizeras antes, este
artigo (mas também só de relance e talvez não agora já; primeiro, os textos de
Pessoa, que estão seguir):
288 [118-55r]
LIBERDADE
Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doura
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa.
Livros são papéis pintados com
tinta.
Estudar é uma coisa em que está
indistinta
A distinção entre nada e coisa
nenhuma.
Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as
danças...
Mas o melhor do mundo são
crianças,
Flores, música, o luar, e o sol,
que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
O mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse
biblioteca...
16-3-1935
289 [33-61r]
Um dia baço mas não frio...
Um dia como
Se tivesse paciência p’ra ser
dia,
E só num assomo
Num ímpeto vazio
De dever, mas com ironia,
Se desse luz a um dia enfim
Igual a mim,
Ou então
Ao meu coração
Um coração vazio
Não de emoção
Mas de buscar um fim —
Um coração baço mas não frio.
18-3-1935
290 [92U-32r]
António de Oliveira Salazar.
Três nomes em sequência regular...
António é António.
Oliveira é uma árvore.
Salazar é só apelido.
Até aí está bem.
O que não faz sentido
É o sentido que tudo isto tem.
29-3-1935
291 [92U-32r]
Este senhor Salazar
É feito de sal e azar.
Se um dia chove,
A água dissolve
O sal,
E sob o céu
Fica só o azar, é natural.
Oh, c’os diabos!
Parece que já choveu...
29-3-1935
292 [92U-32r]
Coitadinho
Do tiraninho!
Não bebe vinho,
Nem sequer sozinho...
Bebe a verdade
E a liberdade,
E com tal agrado
Que já começam
A escassear no mercado.
Coitadinho
Do tiraninho!
O meu vizinho
Está na Guiné,
E o meu padrinho
No Limoeiro
Aqui ao pé,
Mas ninguém sabe porquê.
Mas, enfim, é
Certo e certeiro
Que isto consola
E nos dá fé:
Que o coitadinho
Do tiraninho
Não bebe vinho,
Nem até
Café.
[29-3-1935]
293 [129-52ar]
Mata os piolhos maiores
Essa droga que tu dizes.
Mas inda há bichos piores.
Vê lá, se arranjas veneno
(Ou grande ou médio ou pequeno)
Para matar diretrizes.
4-4-1935
294 [129-51v]
Vai p’ra o seminário
Vai
O vento é contrário
Vai des-can-sar.
Já fizeste contas
Até que os tresleste.
Vê lá se me encontras
Do lado de leste.
[post 6-2-1935]
296 [66-55]
À EMISSORA NACIONAL
Para a gente se entreter
E não haver mais chatice
Queiram dar-nos o prazer
De umas vezes nos dizer
O que Salazar não
disse.
Transmitem a toda a hora,
Nas entrelinhas das danças,
“Salazar disse” Emissora
E aí vem essa senhora
A Estada Nova com tranças.
Sim, talvez seja o melhor,
Porque estes homens de estado
Quando falam, é o pior,
E então quando são do teor
Do chatazar já citado!
[post primavera
de 1935]
297 [66-58r,
59r, 60r]
Solenemente
Carneirissimamente
Foi aprovado
Por toda a gente
Que é, um a um, animal,
Na assembleia nacional
Em projeto do José Cabral.
Está claro
Que isso tudo
É desse pulha austero e raro
Que, em virtude de muito estudo,
E de outras feias coisas mais
É hoje presidente do conselho,
Chefe de infernanças animais,
E astro de um estado novo muito velho.
Que quadra
Isso com qualquer coisa que se faça?
Nada.
A Igreja de Roma ladra
E a Maçonaria passa.
E eles todos a pensar
Na vitória que os uniu
Neste nada que se viu,
Dizem, lá se conseguiu,
Para onde agora avançar?
Olhem, vão p’ra o Salazar
Que é a puta que os pariu.
[post 5-4-1935]
308 [92U-30]
Sim, é o Estado Novo, e o povo
Ouviu, leu e assentiu.
Sim, isto é um Estado Novo,
Pois é um estado de coisas
Que nunca antes se viu.
Em tudo paira a alegria,
E, de tão íntima que é,
Como Deus na teologia
Ela existe em toda a parte
E em parte alguma se vê.
Há estradas, e a grande Estrada
Que a tradição ao porvir
Liga, branca e orçamentada,
E vai de onde ninguém parte
Para onde ninguém quer ir.
Há portos, e o porto-maca
Onde vem doente o cais.
Sim, mas nunca ali atraca
O paquete Portugal
Pois tem calado de mais.
Há esquadra... Só um tolo o cala,
Que a inteligência, propícia
A achar, sabe que, se fala,
Desde logo encontra a esquadra:
É uma esquadra de polícia.
Visão grande! Ódio à minúscula!
Nem para prová-la tal
Tem alguém que ficar triste:
União Nacional existe,
Mas não união nacional.
E o Império? Vasto caminho
Onde os que o poder despeja
Conduzirão com carinho
A civilização cristã,
Que ninguém sabe o que seja.
Com “diretrizes” à arte
Reata-se a tradição,
E juntam-se Apolo e Marte
No Teatro Nacional,
Que é onde era a Inquisição.
E a fé dos nossos maiores?
Forma-a, impoluta, o consórcio
Entre os padres e os doutores.
Casados o Erro e a Fraude,
Já não pode haver divórcio.
Que a fé seja sempre viva,
Porque
a esperança não é vã!
A
fome corporativa
É
derrotismo. Alegria!
Hoje
o almoço é amanhã.
29-7-1935
315 [63-37r]
Dizem que o Jardim Zoológico
Tem sido mais concorrido
Por prolongada assistência
Atenta a cada animal.
Mas isso que é senão lógico
Se acabou
A concorrência
Porque fechou
A Assembleia Nacional?
18-8-1935
329 [144F-9v]
Eu falei no “mar salgado”,
Disseram que era plagiado
Do Corrêa de Oliveira.
Ora, plagiei-o do mar
Eu sou tal qual Portugal
Faz-me sempre mal o sal
E ando sobretudo com azar.
[1935]
333 [63-50r]
Meu pobre Portugal,
Dóis-me no coração.
Teu mal é o meu mal
Por imaginação.
Tão fraco, tão doente,
E com a boa cor
Que a tísica põe quente
Na cara, o exterior.
Meu pobre e magro povo
A quem deram, às peças,
Um fato em estado novo
Para que o não pareças!
Tens a cara lavada,
Um fato de se ver
Mas não te deram nada,
Coitado, que comer.
E aí, nessa cadeira,
Jazes, apresentável.
O transeunte amável.
8-11-1935
334 [63-51r
a 53r]
POEMA
DE AMOR EM ESTADO NOVO
Tens
o olhar misterioso
Com
um jeito nevoento,
Indeciso,
duvidoso,
Minha
Maria Francisca,
Meu
amor, meu orçamento!
A
tua face de rosa
Tem
o colorido esquivo
De
uma nota oficiosa.
Quem
dera ter-te em meus braços,
Ó
meu saldo positivo!
E
o teu cabello — não choro
Seu
regresso ao natural —
Abandona
o estalão-ouro,
Amor,
pomba, estrada, porta,
Sindicato
nacional!
Não
sei porque me desprezas.
Fita-me
mais um instante,
Lindo
corte nas despesas,
Adorada
abolição
Da
dívida flutuante!
Com que madrigais mostrar-te
Este
amor que é chama viva?
Ouve,
escuta: vou chamar-te
Assembleia
Nacional,
Câmara
Corporativa.
Como
te amo, como, como,
Meu
Ato Colonial!
De
amar já quase não como,
Meu
Estatuto do Trabalho,
Meu
Banco de Portugal!
Meu
crédito no estrangeiro!
Meu
encaixe-ouro adorado!
Serei
sempre o teu romeiro...
Pousa
a cabeça em meu ombro,
Ó
meu Conselho de Estado!
Ó
minha corporativa,
Minha
lei de Estado Novo,
Não
me sejas mais esquiva!
Meu
coração quer guarida
Ó
linda Casa do Povo!
União
Nacional querida,
Teus
olhos enchem de mágoa
A
sombra da minha vida
Que
passa como uma esquadra
Sobre
a energia da água.
Que aristocrático ri
O
teu cabelo em cifrões —
Finanças
em mise-en-plis!
Meu
altivo plebiscito,
Nunca
desceste a eleições!
Por
isso nunca me escolhes
E
a minha esperança é vã.
Nem
sequer por dó me acolhes,
Minha
imperialmente linda
Civilização
cristã!
. . .
. . . . .
. . .
. .
Bem
sei: por estes meus modos
Nunca
me podes amar.
Olha,
desculpa-mos todos.
Estou
seguindo as diretrizes
Do
Professor Salazar.
O demo-liberalismo Maçónico-comunista.
8/9-11-1935
Num único período com três orações sintetiza o que se pretende inculcar (o que
se quer defender) neste específico diálogo entre Pessoa e Reis que é o texto que
leste («Ricardo e Fernando»). A tua frase deve ser constituída por Oração
subordinada final + Oração subordinante (que será também coordenada com a seguinte) + Oração coordenada sindética
(que poderá ser, é claro, copulativa, adversativa, disjuntiva, explicativa ou conclusiva).
Escreverás a tua resposta em «Tarefa da aula 17 da Quarentena» (Classroom).
Na última aula, podia ter explicado melhor o nome «Marcenda»
(que, repito, na ode de Reis não nome próprio). Para me poupar tempo, remeto-os
para esta explicação: http://aprender-ate-morrer.blogspot.com/2019/02/marcenda.html
E pedia-te que escrevesses, a caneta, um comentário, de cerca
de cento e cinquenta palavras, que aproximasse as personagens Lídia e Marcenda
(de OAMRR) de, respetivamente, Mariana e Teresa (de Amor de Perdição). Depois te direi o
que se fará com esse texto.
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TPC — Lê as pp. 242-244 do
manual, que tratam de Salazar, e a p. 239, que é sobre «A Alemanha nazi». Copio esses textos aqui em baixo.
Aula 142-142R [= 18 da Quarentena] (12 [5.ª], 13/mai [3.ª, 4.ª, 9.ª]) A aula de
hoje decorrerá à volta do tópico da quarentena. Em quarentena estava a personagem
Inês quando começava a Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente. Lembram-se
decerto; e, se não se lembrarem, é também por isso que convém hoje recordar a peça.
Seguem-se três páginas do manual do 10.º ano:
O monólogo de Inês constitui a cena I da peça (que não
explicita as cenas, note-se).
1. Nesses
vv. 1-38, Inês Pereira mostra-se-nos como se estivesse numa verdadeira
quarentena ou em confinamento.
Desenvolve esta ideia num curto comentário
que inclua passagens textuais e que caracterize situação e psicologia da
protagonista. (Cerca de setenta palavras. A caneta; guarda a resposta contigo.)
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Chega a Mãe e começa a segunda cena.
2. Distingue
as perspetivas que têm a mãe e Inês (sempre citando também o texto),
aproveitando para aproximar o papel da mãe do que têm as mães nas cantigas de
amigo. (Cerca de cem palavras. A caneta, guardando contigo a resposta-)
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(Cfr. as tuas respostas com as na Apresentação.)
Na cena terceira, junta-se à Mãe e a Inês a personagem Lianor
Vaz, uma alcoviteira talvez menos interesseira do que outras de Gil Vicente mas
que, apesar da indignação inicial, parece afinal toda contente por um clérigo a
ter tentado seduzir. Depreende-se até que o encontro com o padre se concretizou.
Lembro estas três cenas iniciais numa encenação que não foi a que
fomos seguindo mais há dois anos. As três cenas que lemos há pouco correspondem
a pouco mais do que os primeiros seis minutos. Vê só esses talvez:
Podemos ainda lembrar que Inês vai sentir-se de novo confinada
quando, já depois de casada com um escudeiro que a tratava mal, fica fechada em
casa, vigiada pelo Moço, enquando o marido vai guerrear para o
Norte de África. Só alcançará o «desconfinamento» com a morte, cobarde aliás,
do marido, que lhe parecera tão galante no início e lhe fora proposto por judeus casamenteiros. (Mas, antes de tudo isto, ainda rejeitara Pero Marques.)
Por estes excertos de outra encenação da peça, a que seguimos
mais há dois anos, recordarás a maioria das peripécias. Lembra-te que o enredo
procura provar o mote dado a Gil Vicente: «mais quero asno que leve que cavalo
que me derrube».
O argumentista e escritor Filipe
Homem Fonseca suscitou uma série de pequenos filmes em torno da
quarentena, as «chamadas para a quarentena».
Como reparei pelo exercício que corrigi na última aula, a
atribuição de um título, uma frase, um aforismo ou mote que sinterizem
expressivamente a lição de um texto não é a praia de muitos de vocês. Notem como o mote dado a Gil Vicente seria uma boa síntese expressiva da Farsa de
Inês Pereira, se acaso não se tivesse dado tudo ao contrário (foi a peça que veio
acomodar-se ao mote).
Enfim, queria que treinassem o jeito para dar títulos, frases,
expressivos a histórias ou textos, recorrendo agora aos episódios de
Chamadas para a quarentena.
Ficam aqui os episódios 1, 3, 4, 6 e 7. Atribui a cada um
deles o tal título-fase expressivo e, ao mesmo tempo, capaz de apanhar o
essencial da situação (ou a sua moralidade). Escreve-os depois no Classroom,
não deixando de indicar o número do episódio. Começo pelo 4, que é o escrito
pelo próprio Filipe Homem Fonseca:
Ep. 4 — Na casa do ex
Ep. 1 — Joana
e Guilherme
Ep. 3 — O que calçar no confessionário
Ep. 6 — Mas a minha mãe
faz anos
Ep. 7 — Enquanto os homens
vão à bola
TPC — Vê aqui ou descarrega o PDF de volume que é uma
análise intercalada com o texto da Farsa de Inês Pereira. É o fascículo
intitulado Inês (da Quimera; por Cristina Almeida Ribeiro; em coleção
coordenada por Osório Mateus). Leres, ou apenas relanceares, esta edição é uma
boa maneira de recordares toda a farsa.
Fica
também a síntese do Caderno oferecido ao aluno:
Aula 143-144 [= 19 da Quarentena] (14 [5.ª], 15/mai [3.ª, 4.ª, 9.ª]) Comentei já os
vossos trabalhos sobre os trailers de filmes cujo argumento adotou livros de Ian McEwan.
É incrível a quantidade de vezes em
que títulos de livros e de filmes surgem entre aspas ou sem nada. Era em itálico
(ou, para os que carregaram imagem do manuscrito, sublinhado): Na praia de
Chesil, por exemplo. (Nos comentários e enunciados de tarefas no Classroom posso ter de usar aspas mas apenas porque não há itálico. No vosso Word não têm esse constrangimento; e, se for em manuscrito, sublinhariam.)
Também continua a ser usado
«romance» no sentido de ‘paixão’, ‘amor’. Ora, quando se trata de literatura, o
termo «romance» deve ficar reservado para a aceção ‘formato’, ‘género incluído na forma natural de literatura narrativa, tal como o conto, a novela, a epopeia’.
Gostei de ver alguns dos
comentários em imagem do manuscrito (o escreverem à mão faz que haja menos
trapalhices). Nestes casos, convém zelar para que a imagem fique na direção
correta, para eu não ter de virar o computador nem ficar com um torcicolo.
Também reparei que alguns já não se
lembravam de que chegámos a ver em aula, no décimo ano, Atonement (Expiação).
A aula de hoje será a última aula longa, de bloco de noventa minutos, «de quarentena». Segundo o que se sabe, a partir da próxima semana (18 de maio-...) haverá, semanalmente, uma aula de Português presencial de 90 minutos (dada a duas metades de turma — aula que eu repetirei oito vezes, portanto, ...) e uma aula de 45 minutos a distância (que continuarei a dar neste estilo: Gaveta de Nuvens + Gaveta no Classroom).
Nas aulas presenciais falarei menos do que tenho falado aqui, e não é apenas pela máscara, que me embacia os óculos. É que vamos aproveitar essas aulas (no fundo, cinco ou seis aulas presenciais até ao fim do ano) para fazer o que foi um pouco descartado à distância: questionários de compreensão de textos, tarefas de gramática, certo tipo de escritos (cujo transporte passará a ser de novo mais fácil). Ainda não decidi se vou retomar a tarefa de recitação com Mensagem ou que tarefa «grande» lhes pedirei.
Como sempre disse, no caso do Português, não sentirei falta de elementos de avaliação e, como também já disse, não considero fechadas as classificações — este 3.º período acabou até por ser maior do que o que se previa. É importante que não deixem tarefas para trás. Não há muitos casos desses, mas há quem tenha de recuperar tarefas rapidamente se não quiser baixar muito a nota no final do ano.
Hoje vamos aproveitar um poema de Fernando Pessoa, ortónimo, escrito em 1934, portanto perto da época (1935) dos poemas antissalazaristas que vimos há poucos dias e dos anos (1935-1936) que José Saramago ficcionou em O Ano da Morte de Ricardo Reis.
Nas aulas presenciais falarei menos do que tenho falado aqui, e não é apenas pela máscara, que me embacia os óculos. É que vamos aproveitar essas aulas (no fundo, cinco ou seis aulas presenciais até ao fim do ano) para fazer o que foi um pouco descartado à distância: questionários de compreensão de textos, tarefas de gramática, certo tipo de escritos (cujo transporte passará a ser de novo mais fácil). Ainda não decidi se vou retomar a tarefa de recitação com Mensagem ou que tarefa «grande» lhes pedirei.
Como sempre disse, no caso do Português, não sentirei falta de elementos de avaliação e, como também já disse, não considero fechadas as classificações — este 3.º período acabou até por ser maior do que o que se previa. É importante que não deixem tarefas para trás. Não há muitos casos desses, mas há quem tenha de recuperar tarefas rapidamente se não quiser baixar muito a nota no final do ano.
Hoje vamos aproveitar um poema de Fernando Pessoa, ortónimo, escrito em 1934, portanto perto da época (1935) dos poemas antissalazaristas que vimos há poucos dias e dos anos (1935-1936) que José Saramago ficcionou em O Ano da Morte de Ricardo Reis.
Este poema tem o interesse especial de ser sobre um poeta que
Pessoa e a sua geração muito estimavam, Camilo
Pessanha. Podemos dizer que, dos poetas portugueses que precederam a
geração modernista, Camilo Pessanha e, um pouco antes, Cesário Verde
(1855-1886), foram os mais admirados por Pessoa.
Pessanha (1867-1926), na verdade, foi contemporâneo destes
poetas ligeiramente mais jovens (Pessoa era mais novo vinte e um anos, mas só
lhe sobreviveu nove). Estava, porém, quase sempre longe de Lisboa, em Macau, o
que também contribuiu para a aura romântica que tinha junto desta geração, que
era sobretudo do Chiado e da Baixa lisboeta.
Mostro primeiro o manuscrito e depois a decifração (no autógrafo, a cruz ao lado da segunda estrofe significa que Pessoa
ainda não estava decidido quanto a esses versos):
135 [62A-43r]
Ah, como eu
quereria
Ser como
aqueles em quem
A inspiração
é já poesia
E a forma
toda a alma tem!...
Meu mestre
Camilo Pessanha!
Como
sentias? Por que modo
O que em ti
é matéria estranha
Era teu
natural, teu todo?
Ninguém
sabe. E teus versos são
Como o que
passa no sonhar
E que é
melhor que uma visão
Sem que haja
de que despertar.
7-8-1934
Fernando Pessoa, Poemas de Fernando Pessoa. 1934-1935, Lisboa,
INCM, 2000
Neste poema em três quartetos, a homenagem a Pessanha inclui
elementos que podemos relacionar com linhas temáticas sempre atribuídas à
poesia ortónima.
O que o sujeito poético declara invejar em Pessanha tem que
ver com aquele dilema tão tratado da impossível compatibilização do sentir e
do pensar (talvez também ao tema da fragmentação do eu) e constitui
uma aproximação, de novo, à teoria pessoana do fingimento poético.
À mão, a caneta, comenta a ideia defendida no parágrafo
anterior, não deixando de citar, aqui e ali, o poema, e, ao mesmo tempo,
mostrando conhecimento das mencionadas linhas temáticas recorrentes no Pessoa
ortónimo. (Cerca de cento e cinquenta palavras. Guarda o texto contigo. Direi
depois o que se fará com ele.)
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A vida de Camilo Pessanha dava um filme. A longa estada em
Macau envolve muito ópio, vida com concubinas chinesas, etc. O ópio
lembrar-lhes-á «Opiário», do Álvaro Campos jovem.
E lembra outra experiência de «paraíso artificial», a dos
cogumelos alucinogénios de O Último a sair:
Lê esta ficha informativa sobre processos fonológicos (evoluções fonéticas, dizia-se à
vezes):
Apoiando-te na ficha em cima, resolve estes exercícios que
roubei a Maria Regina Rocha, Gramática de português, Porto, Porto
Editora, 2016, pp. 190-191.
Vê soluções dos itens 6, 7, 8 na Apresentação (a cara da capa é a de Camilo Pessanha, é claro, cheia de alusões macaenses):
Vê o documentário sobre Camilo Pessanha que está imediatamente
a seguir (Camilo Pessanha, um poeta ao longe) e/ou relanceia qualquer um dos três em baixo. Não tens de ver tudo, mas relanceia o suficiente.
Recentemente, a INCM disponibilizou uma boa edição de Clepsidra, de Camilo Pessanha — descarregável, ou visível, aqui. Os poemas só começam depois das primeiras cinquenta páginas; lê mesmo alguns. Entretanto, neste dicionário sobre Modernismo temos um bom verbete dedicado a Camilo Pessanha. Também pode merecer
consulta o site de Pessanha na Biblioteca Nacional.
TPC — Aproveita para pôr em
dia as tarefas que tenho pedido. Relanceia as aulas se não as tens seguido
sempre. É natural que ainda te venha a pedir a tarefa de escrita feita hoje.
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