Percurso de Ricardo Reis no capítulo 3
O que se segue procura ajudá-los a perceber o percurso do passeio que Ricardo Reis empreendeu no último dia do ano de 1935 (a partir do quarto parágrafo do capítulo III: «Deixou de chover, o céu aclarou, pode Ricardo Reis, sem risco de molha incómoda, dar um passeio antes do almoço»).
Vou aproveitar um vídeo (em captura da imagem do computador comigo a usar o GoogleMaps e a comentar o passeio). Tenham piedade da minha falta de jeito: fiz isto há uns anos, quando começou a pandemia e tínhamos de dar aulas não presenciais; e, neste dia, estava terrivelmente constipado. Tive de
dividir o percurso em dois filmes (um de cerca de doze minutos; o outro, de
três), porque não conseguia acertar com a Rua do Século. Até a conheço
relativamente bem, mas sempre tive esta dificuldade em escolher a entrada a partir do Príncipe Real.
Ainda
a propósito deste passeio no capítulo III, chamo a atenção para menções intertextuais (à Divina Comédia, aos Três
Mosqueteiros, à Eneida — lembremos sempre que é modelo preferencial, embora não único,
dos Lusíadas —, ao Dom Quixote), ficam a seguir uns vídeos
educativos acerca destas obras.
A Eneida está imitada nos Lusíadas logo no verso inicial,
precisamente o citado em O Ano da Morte
de Ricardo Reis e escandido (dividido na métrica) no vídeo.
E,
depois, a Divina Comédia, de Dante. (À margem: o vocábulo «dantesco» está a ser por estes dias tão mal usado. «Dantesco» = 'que lembra o horror das descrições de Dante na sua Divina Comédia'.)
Mas
regressemos a O Ano da Morte de Ricardo
Reis. É ainda no terceiro capítulo que, regressado ao hotel, nessa última
noite do ano, Reis recebe a visita de Pessoa (que estava morto — lembro, desde
30 de novembro de 1935 — mas dentro dos nove meses que seriam permitidos para a
transição vida-morte, simétrica da gestação na barriga da mãe).
A
propósito, tenho de lhes aconselhar Numa
Casca de Noz, de Ian McEwan, um livro de género híbrido, entre o policial, o
drama leve, com ironia, de autor que já conhecemos (no 10.º ano vimos Expiação, uma adaptação a filme que respeita muito o livro de
McEwan).
Em Numa Casca de Noz temos a preparação de um
crime na perspetiva do bebé na barriga da mãe que pensa cometer esse crime (em
colaboração com o amante). O narrador é o ser em gestação, que se vai
apercebendo, inferindo, nem sempre bem, dos passos da execução dessa tramoia
(cuja vítima deverá ser o seu pai). Ou seja, os nove meses, neste caso, são
concedidos ao narrador, que, tal como Pessoa em OAMRR, também não é a personagem principal (em OAMRR é Reis; na novela de
McEwan será a mãe).
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