Friday, September 06, 2024

Aula 128-129

Aula 128-129 (5 [3.ª], 6 [4.ª], 8/mai [1.ª]) Correção de escrito com atos de fala. Exemplo possível:

— Vê lá, Morten, se não apanhas um amarelo — aconselha o treinador pouco antes da entrada do dinamarquês. [diretivo]

— Prometo, mister, que evitarei os meus socos e pisadelas habituais — respondeu o jogador. [compromissivo]

— O português do Hjulmand já é melhor do que o meu — confessa um dos colegas portugueses. [assertivo]

— Que bom! Estão tão feliz! — grita Rui Borges, depois do segundo golo do Sporting. [expressivo]

— Apresento-lhe cartão amarelo — diz o árbitro para Eduardo Quaresma, por este ter tirado a camisola. [declarativo]

— Fico mesmo ralado com isso! Ai que triste que estou... — comenta o marcador do golo. [diretamente: expressivo; indiretamente: assertivo = essa penalização não é relevante]

O capítulo 1 de O Ano da Morte de Ricardo Reis termina com Reis, instalado confortavelmente no sofá do quarto, a ler o jornal (PE e C 28-31; Mf 21-23):


«[...], são estas as notícias da minha terra natal, e dizem, O chefe do Estado inaugurou a exposição de homenagem a Mousinho de Albuquerque na Agência Geral das Colónias, não se podem dispensar as imperiais comemorações nem esquecer as figuras imperiais, Há grandes receios na Golegã, não me lembro onde fica, ah Ribatejo, se as cheias destruírem o dique dos Vinte, nome muito curioso, donde lhe virá, veremos repetida a catástrofe de mil oitocentos e noventa e cinco, noventa e cinco, tinha eu oito anos, é natural não me lembrar, Letizia e Leonor abraçam-se emocionadas após meses sem se verem, estas ainda não tinham nascido no meu tempo, A mais alta mulher do mundo chama-se Elsa Droyon e tem dois metros e cinquenta centímetros de altura, a esta não a cobriria a cheia, e a rapariga, como se chamará, aquela mão paralisada, mole, foi doença, foi acidente, Quinto concurso de beleza infantil, meia página de retratos de criancinhas, nuazinhas de todo, ao léu os refegos, alimentadas a farinha lactobúlgara, alguns destes bebés se tornarão criminosos, vadios e prostitutas por assim terem sido expostos, na tenra idade, ao olhar grosseiro do vulgo, que não respeita inocências, e associou isso à notícia seguinte Cardeais proibidos de ler jornais, ver TV e usar a Net durante conclave, Prosseguem as operações na Etiópia, e do Brasil que notícias temos, sem novidade, tudo acabado, Avanço geral das tropas italianas, não há força humana capaz de travar o soldado italiano na sua heróica arrancada, que faria, que fará contra ele a lazarina abexim, a pobre lança, a mísera catana, O advogado da famosa atleta anunciou que a sua constituinte se submeteu a uma importante operação para mudar de sexo, dentro de poucos dias será um homem autêntico, como de nascimento, já agora não se esqueçam de mudar-lhe também o nome, que nome, Bocage perante o Tribunal do Santo Ofício, quadro do pintor Fernando Santos, belas-artes por cá se fazem, No Coliseu está A última Maravilha com a azougada e escultural Vanise Meireles, estrela brasileira, tem graça, no Brasil nunca dei por ela, culpa minha, aqui a três escudos a geral, fauteuil a partir de cinco, em duas sessões, matinée aos domingos, O Politeama leva As Cruzadas, assombroso filme histórico, Em Port-Said desembarcaram numerosos contingentes ingleses, tem cada tempo as suas cruzadas, estas são as de hoje, constando que seguiram para a fronteira da Líbia italiana, Ataque a hospital dos Médicos Sem Fronteiras no Sudão do Sul faz pelo menos sete mortos, Lista de portugueses falecidos no Brasil na primeira quinzena de dezembro, pelos nomes não conheço ninguém, não tenho que sentir desgosto, não preciso pôr luto, mas realmente morrem muitos portugueses por lá, Bodos aos pobres por todo o país de cá, ceia melhorada nos asilos, que bem tratados são em Portugal os macróbios, bem tratada a infância desvalida, florinhas da rua, e esta notícia, O presidente da câmara do Porto telegrafou ao ministro do Interior, em sessão de hoje a câmara municipal da minha presidência apreciando o decreto de auxílio aos pobres no inverno resolveu saudar vossa excelência por esta iniciativa de tão singular beleza, e outras, Fontes de chafurdo cheias de dejetos de gado, lavra a varíola em Lebução e Fatela, há gripe em Portalegre e febre tifoide em Valbom, morreu de bexigas uma rapariga de dezasseis anos, pastoril florinha, campestre, lírio tão cedo cortado cruelmente, Cinco pessoas passam trinta e seis horas cercadas por jacarés após avião fazer aterragem de emergência em pântano, Tenho uma cadela fox, não pura, que já teve duas criações, e em qualquer delas foi sempre apanhada a comer os filhos, não escapou nenhum, diga-me senhor redator o que devo fazer, O canibalismo das cadelas, prezado leitor e consulente, é no geral devido ao mau arraçoamento durante a gestação, com insuficiência de carne, deve-se-lhe dar comida em abundância, em que a carne entre como base, mas a que não faltem o leite, o pão e os legumes, enfim, uma alimentação completa, se mesmo assim não lhe passar a balda, não tem cura, mate-a ou não a deixe cobrir, que se avenha com o cio, ou mande capá-la. Agora imaginemos nós que as mulheres mal arraçoadas durante a gravidez, e é o mais do comum, sem carne, sem leite, algum pão e couves, se punham também a comer os filhos, e, tendo imaginado e verificado que tal não acontece, torna-se afinal fácil distinguir as pessoas dos animais, este comentário não o acrescentou o redator, nem Ricardo Reis, que está a pensar noutra coisa, que nome adequado se deveria dar a esta cadela, não lhe chamará Diana ou Lembrada, e que adiantará um nome ao crime ou aos motivos dele, se vai o nefando bicho morrer de bolo en­venenado ou tiro de caçadeira por mão do seu dono, teima Ricardo Reis e enfim encontra o certo apelativo, um que vem de Ugolino delia Gherardesca, canibalíssimo conde macho que manjou filhos e netos, e tem atestados disso, e abonações, na História dos Guelfos e Gibelinos, capítulo respetivo, e também na Divina Comédia, canto trigésimo terceiro do Inferno, chame-se pois Ugolina à mãe que come os seus próprios filhos, tão desnaturada que não se lhe movem as entranhas à piedade quando com as suas mesmas queixadas rasga a morna e macia pele dos indefesos, os trucida, fazendo-lhes estalar os ossos tenros, e os pobres cãezinhos, gementes, estão morrendo sem verem quem os devora, a mãe que os pariu, Ugolina não me mates que sou teu filho, Turista mata prostituta transgénero, retira-lhe o coração e come pulmão direito da vítima.

A folha que tais horrores explica tranquilamente cai sobre os joelhos de Ricardo Reis, adormecido. Uma rajada súbita fez estremecer as vidraças, a chuva desaba como um dilúvio. Pelas ruas ermas de Lisboa anda a cadela Ugolina a babar-se de sangue, rosnando às portas, uivando em praças e jardins mordendo furiosa o próprio ventre onde já está a gerar-se a próxima ninhada.

(i) Circunda o que não é texto dos jornais nem comentário de narrador/personagem, mas assunto que preocupa Reis e interfere na sua leitura;

(ii) Sublinha as cinco notícias que acrescentei (tiradas de jornais de anteontem).

Escreve na coluna focalização N (= citação de notícia), P (= citação de anúncio publicitário), RR (comentário de Ricardo Reis), narr (= discurso do narrador):

Trecho do final do cap. I de O Ano da Morte de Ricardo Reis

linha

focalização

O chefe do estado inaugurou a exposição...

1-2

 

não se podem dispensar as imperiais comemorações

2-3

 

Há grandes receios na Golegã

3-4

 

ah Ribatejo

4

 

nome muito curioso

5

 

veremos repetida a catástrofe de mil oitocentos e noventa e cinco

5-6

 

meia página de retratos de criancinhas, ... inocências

11-14

 

... na sua heroica arrancada ...

17-18

 

No Coliseu está

23

 

A última Maravilha, com a azougada e escultural Vanise Meireles, estrela brasileira

23-24

 

As Cruzadas, assombroso filme histórico,

26

 

lavra a varíola em Lebução e Fatela

37

 

Responde ao item 1 de em «Entre textos» (p. 281 do manual):

a. Ricardo Reis traz consigo bens pessoais, livros e folhas com poemas de Fernando Pessoa.

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b. A ação inicia-se no final do mês de dezembro de 1935.

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c. O título e o nome do autor do livro que Ricardo Reis trouxe do Highland Brigade sugerem a indefinição e a dimensão labiríntica do percurso pessoal e social que o heterónimo fará em Lisboa.

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d. Durante o primeiro jantar no hotel, Ricardo Reis vê pela primeira vez Lídia.

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Completa, no estilo das frases que já lancei, o acróstico com «Poetas Contemporâneos», título da unidade que o manual dedica a Miguel Torga, Alexandre O’Neill, Nuno+ Júdice, Ana Luísa Amaral.

Vai consultando o livro, mas não transcrevas passos (pelo menos, literalmente). Evita os dados biográficos ou aspetos meramente informativos e factuais. Tenta aproveitar mais os estilos de cada poeta, as linhas de sentido mais comuns nos seus textos, as características da sua escrita.

Seria interessante incluir citações dos poemas também, naturalmente curtas.

P    ublicidade — Ter Alexandre O’Neill trabalhado como copywriter talvez tenha contribuído para o estilo sintético, incisivo, alegre, visual, de boa parte sua poesia.

O   ________________

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E     ________________

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T     ________________

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A    ________________

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S     ________________

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C    ________________

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O   ________________

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N    ________________

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T    elúrica — Diz-se da poesia de Miguel Torga, que

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E    ________________

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M   iguel — Quando se aborda o pseudónimo escolhido por Adolfo Rocha, salienta-se sempre o iberismo de «Miguel», primeiro nome dos escritores espanhóis Cervantes e Unamuno.

P    ________________

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O   ________________

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R    ________________

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    ncoras — Por vezes, os poemas de Ana Luísa Amaral aproveitam o quotidiano («Pequenos ritos: o lavar dos dentes / ao abrir o dia»), que, claro, não podemos jurar corresponda ao dia a dia da autora.

N    ________________

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E    ________________

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O   ________________

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S     ________________

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TPC — Lê o conto de Jorge Luis Borges «Análise da obra de Herbert Quain». Vai revendo gramática (começa por funções sintáticas; depois, orações). E, claro, continuando sempre a leitura de O Ano da Morte de Ricardo Reis.

 

 

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