Frei Luís de Sousa e canção pelo 12.º 3.ª
Francisca
A esperança que Os Quatro e Meia mostram na sua música
“Terraplanismo” (com melodia e letra autorais) sobre a veracidade - no caso, a
falta dela - da teoria terraplanista, assemelha-se à esperança de Madalena de
Vilhena, de Frei Luís de Sousa, de
que as suas teorias sobre o seu primeiro marido estivessem erradas. O recente
sebastianismo, influência de Telmo Pais, escudeiro da família, que Maria, sua
filha com Manuel de Sousa Coutinho, deixava transparecer, fazia-a lembrar-se do
seu passado com ainda mais frequência, o que lhe dava uma sensação de
inquietação, culpa e angústia constantes, impossibilitando a sua plena
felicidade.
“Espero bem
que o teu terraplanismo seja engano” é o primeiro verso da letra da
música e o primeiro de dois versos, sendo o outro “Espero bem que a tua teoria esteja errada”,
que expressam o desejo semelhante ao de Madalena sempre que Maria aparece com
as suas conjeturas a respeito da Batalha de Alcácer Quibir, onde D. João de
Portugal desaparecera, e de D. Sebastião (“(...) é o outro, é o da ilha
encoberta onde está el-rei D. Sebastião, que não morreu e que há de vir, um dia
de névoa muito cerrada… Que ele não morreu; não é assim, minha mãe?”).
A mãe da jovem já falara com Telmo para lhe pedir que não
falasse “com ela desse modo, nessas coisas” e tenta tirar tais ideias da cabeça
da filha, dizendo-lhe que “O povo, coitado, imagina essas quimeras para se
consolar na desgraça.”. Estas citações levam-me ao refrão da música que reza “Enquanto tu conspiras, à cata de
mentiras”, sentimento também partilhado por Madalena nas falas
sebastianistas de Maria porque, para ela, é exatamente isso que a filha está a
fazer. Por isso, pede-lhe que pare, que seja mais criança por gostar muito da
menina (na canção: “Amarra-te ao que é certo: eu estou aqui tão perto / E só te
quero bem”).
Madalena é uma mãe muito protetora e intensa, por isso consigo
vê-la a, tal como dizem Os Quatro e Meia ”Porque eu vou até ao fim do mundo só
por ti / Nem sei como, ainda não caí”. Também ela faz tudo pela filha e toda a
sua vida, a situação que vive, quase sempre como que a espreitar por cima do
ombro com medo de que o passado que tanto a persegue e assombra se materialize
(na canção “E que a nossa pegada não esteja a ser espiada”), fazem-me
questionar como é que personagem aguentava tudo em simultâneo (tal como diz o
grupo: “Nem sei como nunca me perdi”).
Por fim, é referido na letra que “O mundo vai e vem”, o que se
confirma nesta obra porque, em paralelo com os agouros de Madalena de Vilhena e
o sebastianismo da sua filha e de Telmo, o romeiro foi organizando o seu
regresso e acaba mesmo por aparecer: ele foi e ele veio, tal como o mundo
continua o curso na canção.
Nota (da 1.ª versão): Bom+/Muito Bom-
João G.
Em Frei Luís de Sousa,
de Almeida Garrett, é mostrada de forma trágica a história de Madalena, Manuel
de Sousa Coutinho e Maria, marcada por sacrifícios, dilemas morais e perdas.
Esta peça romântica reflete a tensão entre o dever e o coração e,
convenientemente, a letra de “Estranha Forma de Vida”, de Amália Rodrigues,
consegue refletir alguns dos momentos mais significativos vividos por esta
família. A expressividade deste fado complementa a dor descrita ao longo da
narrativa.
No início da peça, D. Madalena e Manuel vivem sem preocupações
com a filha, tendo uma vida
aparentemente estável. Apesar da dúvida moral do seu casamento, se D. João,
primeiro marido de Madalena, estaria mesmo morto ou não, ambos escolhem
acreditar que sim. Esta harmonia é destruída com a inesperada revelação de que
D. João de Portugal teria de facto sobrevivido à batalha de Alcácer Quibir. D.
Madalena percebe que a sua felicidade não passava de uma ilusão e questiona
Deus (“ também essa Vos dou, meu Deus. E agora, que mais quereis de mim,
Senhor?”). Este sentimento, de como se o destino tivesse definido a sua
miséria, é visível nos versos “Foi por vontade de Deus / Que eu vivo nesta
ansiedade”.
A partir dos versos “Se não sabes onde vais / Porque teimas em correr”, é possível relacionar
a letra da canção composta por Alfredo Rodrigo Duarte com Manuel de
Sousa Coutinho, que, consumido pela dor da destruição da sua vida e, em
desespero, decide impulsivamente abandonar a “família” e tornar-se Frei Luís de Sousa, sofrendo em silêncio e
provando que acredita conseguir alcançar paz sozinho (“encomendemos a nossa
alma a este anjo, que Deus levou para Si. Padre Prior, podeis-me lançar aqui o
escapulário?”). Assim, segue o seu “coração independente”, que não consegue
esquecer o sofrimento, “teimosamente [sangra]” e, tal como o sujeito poético da
canção, vive no conflito entre o amor, a dor e a saudade. A cena final, onde
Manuel pede o “escapulário”, mostra o decorrer desta decisão extrema.
Maria, frágil e inocente, acaba por ser a maior vítima das
decisões e do passado dos pais. Os
versos “Para, deixa de bater
/ Eu não te acompanho mais” podem simbolizar a falta de força do seu coração
perante a desagregação da família e a revelação das suas origens, pois, já
doente, piora num ambiente de instabilidade emocional. Como se o coração de
Maria também fosse “perdido entre a gente” e incapaz de encontrar forças para
viver num mundo onde o passado dos pais compromete o seu futuro.
Nota (da 1.ª versão): Bom (-)
Ana Rita
“I look to you”, lançada em 2009 pela
cantora Whitney Houston, é uma música que, a meu ver, tem bastantes pontos
semelhantes com a peça Frei Luís de Sousa,
de Almeida Garrett.
Tal como sabemos, após o regresso de D.
João de Portugal, presenciamos um final trágico para Maria, devido a perceber
que ia ficar sem a sua família, os efeitos da doença e a morte. No final do ato
III, na cena XII, Maria revela uma fragilidade emocional (“Já não é tempo…
Minha mãe, meu pai, cobri-me bem estas faces, que eu morro de vergonha…”), tal
como Whitney Houston na sua música — “About to lose my breath / There’s no more
fighting left”(Quase a perder o fôlego / Já não há mais força para lutar).
Quando Maria morre nos braços da sua mãe,
associo bastante o refrão da música (“I look to you / I look to you” (Eu olho
para ti / Eu olho para ti)) à “reação” que D. Madalena possa ter tido ao olhar
para Maria, morta, depois da tragédia toda que D. João de Portugal causou na
sua família.
Os versos “After
all that I’ve been through / Who on earth can I turn to?” )Depois de tudo o que eu passei / A quem na
Terra me posso recorrer?) relacionam-se bastante com a situação de D. Madalena
que, no Ato III, revela a sua vulnerabilidade e as consequências das
adversidades familiares.
Logo no Ato I (cena I), podemos associar a
canção, com os versos “Winter storms have come / And darkened my sun” (As
tempestades de inverno chegaram / E escureceram o meu sol), à peça e a uma
frase que D. Madalena diria, como se fosse um acrescento ao verso: “Oh! que
amor, que felicidade… que desgraça a minha!”.
”Mas não só, no ato II (cena V) a relação
entre as duas obras acontece mais uma vez — “And when all my strength is gone /
In you I can be strong” (E quando todas as minha forças se forem / Em ti eu
posso ser forte), versos que podiam ser ditos por D. Madalena, tanto como um
acrescento novamente ou substituição de “(...) Todo meu mal era susto; era
terror de te perder
A partir do final do Ato II, a tragédia
inicia com Jorge a perguntar “Romeiro, romeiro, quem és tu?” e o romeiro
responde “Ninguém!” (apontando para o quadro de D. João de Portugal). Com a
família de D. Madalena a “cair” podemos dizer que o verso da canção “Oh, the
rain is falling” (Ah, a chuva está a cair) “resume” um pouco a tragédia da peça
Frei Luís de Sousa.
Nota (da 1.ª versão): Suficiente +
Bea B.
Após algum tempo de
pesquisa e várias indecisões sobre qual canção escolher para a comparar com a
peça de Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa, acabei por escolher Arcade, de Duncan Laurence. Nesta
música, vencedora da Eurovisão 2019, encontrei frases e sentimentos que acho
que se aproximam de certa forma do drama de Garrett. A canção tem uma letra e
uma melodia muito calmas (e, até, partes deprimentes), por isso achei que iria
conseguir relacioná-la bem com a peça.
D. Madalena, depois da
batalha de Alcácer Quibir, acreditou que D. João tinha sido morto, ficando assim
sem o seu companheiro: “A broken heart is all that's left / I'm still fixing
all the cracks” (Um coração partido é tudo o que resta / Eu ainda estou a
reparar todos os pedaços partidos). Nestes primeiros dois versos consigo
relacionar o sujeito da canção com D. Madalena, pelo facto da mesma sentir
falta da presença de João na sua vida, após a sua suposta morte. D. Madalena
ordenou buscas pelo corpo do marido; depois de sete anos desta procura sem
qualquer sucesso, ela tenta seguir em frente e casa-se com Manuel de Sousa
Coutinho; durante catorze anos de casamento tiveram uma filha, Maria e, mesmo
não tendo qualquer certeza da morte de João e nestes anos todos viveram no
palácio de Manuel em Almada.
Nesta época, Portugal
estava sob domínio espanhol. Os governadores castelhanos tinham o plano de ir
de Lisboa a Almada para se instalarem no palácio de Manuel, mas este já sabia
deste plano, então, quando chegou ao palácio, informou de imediato a família de
que deveriam partir naquela mesma noite para o palácio de D. João, pois não via
qualquer mal em se mudarem e viverem na casa do primeiro marido da sua mulher.
Assim o fizeram, mesmo que Madalena tenha pedido ao marido para encontrarem
outro local de refúgio.
D. Madalena, ao entrar no
salão de casa do seu primeiro marido e ver as pinturas que estavam expostas nas
paredes, sente-se deprimida e, até, doente, por voltar àquele antigo ambiente
que já lhe fora muito familiar um dia. Com esta parte da peça, consigo
relacionar os seguintes versos da canção: “Lost a couple of pieces when / I
carried it home / My mind feels like a foreign land / Silence ringing inside my
head” (Perdi alguns dos pedaços quando / Eu os levei até casa / A minha mente
sente-se como uma vila desconhecida / O silêncio está a ecoar dentro da minha
cabeça). Neles vemos, tal como nos sentimentos de D. Madalena, a dor e o
sofrimento de voltar a um sítio onde já se foi feliz um dia. Reviver todas
aquelas memórias que estavam guardadas fazia tantos anos fez com que ela se
sentisse atormentada pelo seu passado.
Nota (da 1.ª versão): Suficiente +/Bom -
Henrique
A canção “Encontros e despedidas”, de Maria Rita, no álbum Portugal,
fala sobre uma estação de comboios que recebe e diz adeus a muitos passageiros.
Esse local é entendido como uma metáfora da vida, que é feita de encontros,
reencontros e despedidas. Claramente, o enredo desta música vai ao encontro da
história da peça de Almeida Garrett Frei Luís de Sousa. Nesta obra,
temos personagens que se encontram e se despedem em diferentes fases da sua
vida. Esta canção pode, assim, aludir à vida de várias personagens da obra de
Garrett.
Na peça, os encontros e reencontros são marcados por surpresas
inesperadas, como o regresso de D. João de Portugal, que muda a vida de
Madalena e de Manuel. Esse reencontro entre Madalena e D. João torna-se uma
despedida para a família construída com Manuel de Sousa Coutinho (“Todos os
dias é um vai e vem”, v. 7).
De certa forma, a canção pode ser associada a Maria, cuja vida
se mostra profundamente marcada pelas decisões dos adultos que a rodeiam. A sua
morte precoce simboliza a consequência dos reencontros inesperados e das
separações inevitáveis. Esta despedida, talvez a mais comovente de todas, marca
o fim de uma harmonia familiar construída com esforço e esperança. Os versos “há
gente que chega e quer ficar” e “a hora do encontro é também despedida”
reforçam a ideia de que cada “encontro” é a causa para outras mudanças.
Telmo, sendo uma personagem que vive indiretamente esse “drama
familiar”, também se encaixa na mensagem da canção ao alimentar a esperança de
se reencontrar com o seu antigo amo. Ao vê-lo regressar, percebe que o seu
reencontro traz sofrimento, fazendo-se sentir mais na despedida definitiva de
Maria que o faz sofrer (“Há gente que chega para ficar / Há gente que vai para
nunca mais”, vv. 9-10).
Manuel, ao ver a sua vida desabar com o reaparecimento do
primeiro marido de Madalena, é obrigado a despedir-se da família pois prefere
abdicar da esposa e da filha a viver em pecado ou em desrespeito da lei (“O
trem que chega é o mesmo trem da partida / A hora do encontro é também
despedida”).
A peça, para além de explorar o amor e o patriotismo, enfatiza o impacto dos reencontros inesperados e das despedidas inevitáveis, o que faz com que “Encontros e despedidas” seja quase uma metáfora musical para o trágico drama de Frei Luís de Sousa. Tanto a obra de Garrett como a canção de Maria Rita mostram que a vida é um ciclo contínuo de chegadas e despedidas, em que cada reencontro pode condicionar o nosso futuro.
Nota (da 1.ª versão): Bom -
Sarah
Frei Luís de Sousa de Almeida Garrett, conta a história de
Madalena que, ao acreditar que seu marido D. João de Portugal, desaparecido na
batalha de Alcácer de Quibir, realmente tinha morrido, casa-se com Manuel de
Sousa e tem uma filha chamada Maria de Noronha. No entanto, depois de muitos
anos o seu primeiro marido regressa e faz muitas coisas mudarem, implicando a
separação de Manuel e Madalena. A canção “Outra Vida”, de Armandinho, retrata a
grande vontade de viver uma paixão com o amor da sua vida, mas também um obstáculo
oculto que impedirá então a realização desse desejo, podendo somente realizá-lo
talvez em outra vida. Podemos relacionar várias partes desta canção com a obra Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett, devido à grande semelhança entre o amor
que Armandinho relata e o amor entre Madalena e Manuel de Sousa.
O trecho “Talvez não seja nessa vida ainda / Mas você ainda
vai ser a minha vida”, lembra o momento em que Madalena percebe que o atual
casamento é ilegítimo e que não poderá continuar com Manuel. Assim como na
canção de Armandinho há algo que os impede de continuar juntos, em Frei Luís de Sousa o casamento e o fruto
do casamento —Maria de Noronha — são os grandes obstáculos para o
relacionamento, sendo estes revelados apenas quando D.João regressa vivo. Ou
seja, em ambos os contextos, o final é trágico devido aos fatores externos que
não podem ser mudados.
O facto de que com o regresso de D. João também veio a verdade
pode levar ao pensamento de que tudo aquilo que Madalena e Manuel viveram, foi
desencadeado por uma grande mentira escondida (D. João estar morto), já que, se
D. João não tivesse desaparecido, nada daquilo teria acontecido. Sendo assim,
apenas em outra vida eles poderiam viver sem mentiras para esconder, assim como
diz na canção (“Sem ter mais mentiras”). Além disso, como diz no verso “sem
amor antigo para esquecer”, apenas em outra vida Madalena não teria que
esquecer a existência do seu primeiro marido, D. João.
No momento em que Maria de Noronha percebe que é o fruto de um
pecado cometido pelos seus pais, não aguenta, já doente, e morre. A personagem
não aguenta a vergonha e o peso da culpa que cai sobre seus pais e
consequentemente sobre ela. O verso “Pois não dá para viver nessa vida morrendo
de amor” é apropriado a com este momento, já que em ambos o eu lírico expressa
a impossibilidade de viver plenamente diante de um amor que não pode se
concretizar. Esse amor pelo qual Maria morreu, apesar de ser sincero, aos olhos
da religião e da sociedade da época, era condenado. A morte representa o preço
pago ao amor e intensifica a tragédia, tanto na canção quanto na obra.
Logo podemos perceber que ambas histórias falam sobre amores
que não puderam se concretizar. Isso mostra como o amor, mesmo em contextos tão
distintos, um mais recente e outro mais antigo, continua a colocar “problemas”
semelhantes.
Nota (da 1.ª versão): Bom (-)
Madalena
A canção “In My Blood”, de Shawn Mendes, aplica-se
perfeitamente à tragédia Frei Luís de Sousa. Nesta obra, Madalena de
Vilhena e Manuel Sousa Coutinho casam-se e constituem família. No entanto,
Madalena vive com receio de que o seu primeiro marido, D. João de Portugal,
regresse. Esta canção tem um tom melancólico e tem alguns aspetos que se
assemelham a esta obra.
Na canção, o sujeito poético está a passar por uma depressão e,
por isso, está a viver momentos muito complicados, e até confessa que “Sometimes,
I feel like giving up / But I just can’t / It isn’t in my blood [Às vezes,
sinto vontade de desistir / Mas não posso / Não está no meu sangue]”. Esta
sensação de angústia e tristeza assemelha-se à de Madalena, que no início da
peça está a ler Os Lusíadas, no passo de Inês de Castro. A personagem é
facilmente comparada a Inês, visto que tinha tudo para ter uma vida feliz, na
medida em que tinha uma vida estável, com um marido e uma filha que a amavam.
Contudo, vivia atormentada pelos fantasmas do passado, visto que tinha receio
de que, D. João de Portugal, pudesse regressar (“este medo, estes contínuos
terrores, que ainda me não deixaram gozar um só momento de toda a imensa
felicidade que me dava o seu amor.”). Uma das principais razões para que
Madalena não quisesse que D. João regressasse, era Maria, que se tornaria filha
ilegítima.
Ao longo da obra, percebemos que todos os detalhes, como o
espaço, contribuíram para piorar o comportamento de Madalena. Também nos dão a
intender que irá acontecer uma tragédia. Inicialmente, a família vivia no
palácio de D. Manuel, um local luminoso e luxuoso, posteriormente, muda-se para
o palácio de D. João de Portugal, que era bastante escuro e fechado.
Já no Ato II, Manuel tem de ir a Lisboa para agradecer ao
arcebispo, por ter ajudado a que o conflito com os espanhóis tivesse terminado.
Maria também queria ir para “ir àquele convento para conhecer a tia D. Joana.”.
Madalena fica em choque (“Oh Maria, Maria…também tu me queres deixar! Também ti
me desemparas… e hoje!”) visto que naquele dia iriam cumprir-se vinte e um anos
depois que D. João desaparecera.
Já no final do obra, quando D. João regressa, disfarçado de
Romeiro, Manuel percebe que o seu casamento com Madalena deixa de ser válido, o
que é relacionável com o verso da canção “It's like the walls are caving in [É
como se as paredes se estivessem a desmoronar]”. Para além disto, esta família
acaba por ficar destruída e Maria acaba por morrer. Devido a toda esta
situação, Madalena e Manuel procuram a religião para os ajudar a serem pessoas
melhores, e a perdoar os seus pecados (“Vós ambos, que já fostes nobres
senhores do mundo, e aqui estais prostrados no pó da terra, nesse humilde
hábito de pobres noviços, que deixastes tudo, até vos deixar a vós mesmos…
filhos de Jesus Cristo, e agora de nosso padre S. Domingos, recebei com este
bento escapulário”).
Nota (da 1.ª versão): Bom -
Dinis
Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett, tratando-se de um
texto dramático com diversas vertentes temporais e espaciais, sentimentais e de
momentos históricos portugueses, e que faz referência a outras obras nacionais,
pode ser relacionado em certos aspetos e momentos com a canção “Bigger than the
whole sky” do álbum Midnights (Versão 3 AM edition (2022)), de Taylor
Swift.
Exemplos desta relação por similaridade de contextos pode ser
observada nos diferentes atos. Por exemplo, no Ato I, o momento em que Manuel
de Sousa Coutinho pega fogo ao palácio para
que os castelhanos não o ocupem, mostrando a sua honra e o seu amor à pátria,
preferindo desprender-se dos objetos físicos mostra a sua falta de materialismo
por um bem maior. “Quem sabe se eu morrerei nas chamas ateadas por minhas
mãos?”, Ato I, Cena XI, relaciona-se com “Every single thing to come has turned
into ashes” (em português: “Tudo o que estava por vir transformou-se em
cinzas”). No verso transcrito, o eu afirma que tudo aquilo em que toca se transforma
em cinzas, uma vez que acaba por ser destruído; por esse motivo, pode
relacionar-se com o incêndio causado pelas ações de Manuel, que acabam por
tornar todo um ambiente de luxo em restos que apenas servem de fonte para
aumentar o sentimento de tragédia que se adensa e se percebe que estará por
vir.
Outro exemplo da correspondência desta canção com momentos da
obra poderá ser na conclusão, Ato III, Cena XII, o momento da morte de Maria,
filha agora ilegítima de Madalena e Manuel, que provoca a dissolução da
família, causando incerteza e trazendo um momento de revelação, carregado de
dor e que trará aos seus pais um ponto de mudança definitivo (momento da sua
morte social e mudança interior). Após a morte da filha, ambos decidem seguir o
caminho da igreja. Manuel passa a ser Frei Luís de Sousa.
Termina assim o momento de adensamento da tragédia que se
vinha a construir desde o início da mesma e dando um significado mais profundo
à morte da personagem, quando morre pela sua condição crónica (tuberculose) e
pela “vergonha” (“que morro de vergonha…”, Ato III Cena XII) num momento de
despedida (“Goodbye, goodbye, goodbye”, (“Adeus, adeus, adeus”).
Por fim, a adesão ao convento como solução dos problemas e
como procura de respostas mostra que, pelo menos, no final da obra as
personagens acreditam que poderá existir um poder divino que os redime da sua
tragédia, o que se pode relacionar também com parte da letra da canção (“Did
some force take you because I didn't pray?” (“Alguma força te levou (de mim)
porque eu não rezei?”).
Nota (da 1.ª versão): Bom -/Bom (-)
Clara
A música “Olá solidão”, dos Quatro e Meia, pode ser
relacionada com a tragédia romântica Frei Luís de Sousa a partir da solidão
sentida pelo sujeito poético da canção e das várias personagens da tragédia
romântica — D. Madalena, Maria e D.
Manuel — ao longo da história.
Madalena vive com um peso do passado, pois não consegue
esquecer a memória de D. João, mesmo se voltou a casar e refez a sua vida.
Continua a sentir-se dividida entre passado e presente e emocionalmente isolada
— “Depois que fiquei só, depois daquela funesta jornada de África que me deixou
viúva, órfã e sem ninguém.” Madalena, já depois de casada com D.Manuel, ainda
conversa sobre as tristezas passadas, com Telmo; podemos relacionar esta fala
com o verso “Olho em volta,
agora estou sozinho” da canção “Olá solidão” que remete para a solidão
que Madalena ainda sente.
Maria, uma criança frágil, devido à sua doença, acaba por se
isolar; a presença constante de segredos que não compreende, pois é muito
jovem, e o medo constante de tudo o que ama estar a desabar fazem-na sentir-se
só. Este sentimento de solidão aumenta até morrer, no fim.
D. Manuel, ao perceber que o seu amor seria “proibido”,
escolhe afastar-se da família e tornar-se frade — Frei Luís de Sousa — podemos
percebê-lo quando diz — “Minha irmã, rezemos por alma. Encomendemos a nossa
alma a este anjo, que Deus levou para si. Padre Prior, podeis-me lançar aqui o
escapulário?” — que se entrega à Fé Cristã. Comparando com a canção, podemos
usar os versos “Não liguei
às placas no caminho / Nem parei p'ra perguntar a direção”, que remete
para a despedida de D. Manuel, deixando a filha e a mulher para trás.
Além disso, o tema musical e a peça mostram uma aceitação em
relação à solidão. Em “Olá solidão”, podemos perceber esta aceitação quando o
sujeito poético diz: “Melhor
só que mal acompanhado”, onde se convence que estar “só” pode ser algo bom uma
vez que, estar rodeado de uma má companhia, seria pior. Em Frei Luís de Sousa esta aceitação acontece também com as várias
personagens quando se rendem ao sentimento de solidão pois não o conseguem
contornar. Por este motivo, aceitam-no e são capazes de viver com ele.
Almeida Garrett conta uma tragédia, mas sem ser muito
dramático, tal como a canção que não utiliza uma melodia que remeta para a
tristeza, mas, sim para algo calmo mas, ao mesmo tempo, com sentimento.
Assim, podemos ver como os autores da canção e Almeida Garrett
exploram a solidão, que não é apenas a ausência de pessoas ao nosso redor, mas
também um sentimento devido a acontecimentos passados ou preocupações.
Nota (da 1.ª versão): Bom -
Beatriz
“Ouvi Dizer”, dos Ornatos Violeta (1999), é uma canção que
retrata a perda de alguém que o protagonista ama e a angústia causada por esta
perda. Ao longo da canção musical é possível estabelecer um paralelismo entre a
letra da canção e a história de Frei Luís
de Sousa.
“Ouvi dizer que o nosso amor acabou/Pois eu não tive a noção
do seu fim” é exatamente o que Madalena viveu. Durante anos, Madalena não
acreditava na morte do seu primeiro marido, D. João de Portugal, (“[...]
incrédula a tantas provas e testemunhos da sua morte[...]”). Esta incredulidade
assemelha-se ao sentimento do protagonista de não ter tido a noção do fim do
amor, não por “estar distraído” mas por não querer acreditar que este acabara
mesmo.
O incêndio da casa em Almada, na cena XI, ato I, pode ser
interpretado como “o fim do mundo” devido ao seu nível de perigosidade. Nos
versos “Ouvi dizer que o mundo acaba amanhã/e eu tinha tantos planos pra
depois”, os “planos pra depois” correspondem às memórias e aos objetos deixados
naquela casa, que, como na música, foram destruídos pelo fim do mundo.
Ainda no tópico do incêndio, Manuel de Sousa, após ter
incendiado a própria casa para poder fugir (“Tenho que não hei de sofrer esta
afronta… e que é preciso sair desta casa, senhora.”), dá a entender que, se
fosse possível “pagar de outra forma”, ou seja, não ter de queimar a casa, o teria feito, da mesma forma
que o sujeito poético da canção afirma que, se pudesse pagar de outra forma sem
ser com a raiva, teria escolhido essa opção.
“Fui eu quem virou as páginas / Na pressa de chegar até nós”
lembra o discurso de Madalena perante Jorge, quando esta desabafa que pecou por
não ter a certeza de que D. João de Portugal estivesse morto antes de ter
casado com Manuel de Sousa: “Este amor, que hoje está santificado e bendito no
céu, porque Manuel de Sousa é meu marido, começou com um crime, porque eu
amei-o assim que o vi… e quando o vi, hoje, hoje… foi em tal dia como hoje, D.
João de Portugal ainda era vivo!”.
Finalmente, depois da vinda de D. João de Portugal, resta o
convento a Manuel de Sousa Coutinho, o silêncio a Madalena, que sucumbe a um
estado apático (“Pobre mãe! tu não podes… coitada!... não tens ânimo…”), e a
morte a que Maria que estava destinada. Aqui, as três personagens são “forçadas
pela realidade” a aceitar o seu destino, podendo assim relacionar-se este final
com os versos “Sobre a razão estar cega / Resta-me apenas uma razão”.
Nota (da 1.ª versão): Bom
Tomás
Os principais temas da canção “D.O.R”, de
Papillon, que mostra o impacto que a morte de um ente próximo pode ter na vida
de alguém, estão presentes em Frei Luís de Sousa, peça de Almeida Garrett
que retrata assuntos difíceis, como a culpa e a tristeza, através da personagem
de D. Madalena.
Em primeiro lugar, em Frei Luís de Sousa, Madalena vive
com um enorme sentimento de culpa, visto que casou com Manuel de Sousa Coutinho
sem ter a certeza de que o seu antigo marido, desaparecido em batalha, estava
morto. Quando se confirmou que D. João de Portugal tinha sobrevivido, este
sentimento intensificou-se, porque fez de Maria, fruto do segundo casamento de Madalena,
filha ilegítima. Este acontecimento era algo que a sua mãe temia muito, dado
que chegou a dizer a Telmo, quando soube que este falava de D. João à filha,
para não “levantar esse fantasma, cuja sombra, a mais remota, bastaria para
enodar a pureza daquela inocente, para condenar a eterna desonra a mãe e a filha!”.
Já na canção de Papillon, o sujeito poético demonstra o seu sentimento de culpa
através do arrependimento de não ter sido o melhor para o seu pai (“eu faria
diferente / Não seria desobediente, nem seria indiferente / Daria mais abraços,
mais a mão, mais ouvidos), refletindo sobre isso apenas depois da sua morte,
percebendo que “que já é tarde / Que o passado não vai mudar”.
Para além disso, por causa desta culpa já referida e do medo de
que algo acontecesse, Madalena vivia muito infeliz, sempre a rezar para que
conseguisse ter um simples “engano de pouco instantes” de que era feliz,
mostrando que tinha dificuldade em viver normalmente sem mostrar a sua desgraça
aos mais próximos. Por outro lado, o sujeito poético de “D.O.R” também
demonstra dificuldade em continuar com a sua vida após a perda do pai,
acontecimento que molda toda a sua vida, chegando a revelar que não consegue
interessar-se da mesma forma pelos seus antigos passatempos (“o tempo passa por
mim mas essa dor não passa/ E o que antes era passatempo agora não tem graça”).
Posto isto, concluímos que tanto o sujeito poético do tema
musical do álbum Jony Driver como Madalena, da peça de Almeida Garrett,
sofrem com o sentimento de culpa e têm dificuldade em seguir em frente depois
de um evento marcante, a mãe de Maria pelo desaparecimento de D. João de
Portugal e incerteza quanto à sua vida e o “eu” da canção pelo falecimento do
pai.
Nota (da 1.ª versão): Bom +/Bom (+)
João C.
Ao ouvir a canção “Primavera”, dos The Gift, percebi que havia pontos
em comum com a peça Frei Luís de Sousa,
de Almeida Garrett. Apesar de pertencer a épocas diferentes e a géneros
diferentes, têm alguns pontos em comum, como a falta de esperança e a força do
destino. Neste comentário, irei comparar estas duas obras, que, por difícil que
pareça, têm muito em comum.
Na composição musical em questão, o verso “É a
primavera / Mas eu não sei / Não sinto nada”, revela que o sujeito está
emocionalmente vazio, mesmo sendo um tempo de felicidade. Da mesma maneira, em Frei Luís de Sousa Maria passa um tempo
de sofrimento, por causa da sua doença, da incerteza do seu passado e da
certeza da sua morte, mesmo sendo tão jovem, ao dizer: “A vida para mim foi
sempre um sonho...Um sonho que acaba.” Em ambas as partes, as personagens já
não conseguem alcançar a esperança, mesmo quando tudo à volta parece estar a
ficar bem.
Outro aspeto importante é o sentimento do
destino trágico, que está evidenciado na personagem Manuel de Sousa Coutinho.
Quando Manuel se apercebe de que o primeiro marido de D. Madalena pode estar
vivo, sente que a sua vida e o seu casamento não fazem mais sentido. Por ser um
homem digno, decide tornar-se religioso, dizendo: “Não posso viver sem honra.”,
mostrando que se sente arrependido. Na música, esse mesmo sentimento é
apresentado nos versos “Dizem que é a primavera / Mas tudo me parece igual.”,
em que, apesar da chegada desta estação do ano, o sujeito sente que nada mudou,
tal como Manuel, que percebe que não consegue não sentir desilusão.
Além disso, tanto na peça como na canção, é
destacado um ambiente de desespero e instabilidade emocional. Em Frei Luís de Sousa, esse ambiente
sente-se na casa da família, mostrada pelo silêncio e pela ânsia constante.
Maria sente o sofrimento dos pais, o que contribui para a sua indisposição,
dizendo: “A minha mãe chora às escondidas, e o meu pai não fala…”. Já na
canção, o sujeito sente-se vazia emocionalmente apesar das mudanças de estação.
Em ambos os casos, os espaços que seriam de conforto, a casa e a primavera,
respetivamente, são agora espaços de desilusão e tristeza profunda, refletindo
o interior das personagens.
Concluindo, ambas as obras mostram o sofrimento
e a desilusão. A Primavera, sendo um símbolo de esperança, transforma-se num
sinal de tristeza. E, em Frei Luís de
Sousa, revela-se como o passado pode desmoronar famílias, mesmo quando há
amor.
Nota (da 1.ª versão): Bom (-)
Bea A.
A obra Frei Luís de
Sousa, um drama de Almeida Garrett, assemelha-se à composição musical
“Someone Like You”, da cantora Adele, e a “Now We’re Strangers”, de Central
Cee, pela sua dimensão trágica e carácter romântico. É possível ainda
relacionar mais profundamente as três obras artísticas ao associarmos cada
música a uma das personagens: “Someone Like You”, a D. João de Portugal; e “Now
We’re Strangers”, a Madalena.
O nome da canção de Central Cee, “Now We’re Strangers”, que é
idêntico ao primeiro verso da música, representa exatamente a situação de
Madalena anos após o desaparecimento de D. João de Portugal na Batalha de
Alcácer Quibir, porque realmente ele era um desconhecido para Madalena pelo
facto de não o ter reconhecido imediatamente quando D. João regressou mas
também por já não se conhecerem um ao outro a nível emocional. O passar dos
anos impossibilitára que Madalena reconhecesse o seu primeiro marido, porque
este envelhecera. Ainda na primeira estrofe encontramos dois versos, “I still
hope you find your way / Find your way back home”, que retratam as expectativas
de Madalena ao longo destes catorze anos em relação ao regresso de D. João.
No corpo da música podemos comparar vários versos com o estado
de espírito e situação de Madalena: “I could still
drive all the way to yours with no sat nav of course” (o que o cantor quer
dizer com este verso é que ainda sabia exatamente onde era a casa do seu
anterior amor, tal como Madalena sabia onde era a casa do seu primeiro marido); “You can leave, but we can't erase the
memories” (ao longo da obra é referido que Madalena possui um pensamento
constante de D. João e do tempo que passaram juntos); a forma como Madalena
seguiu em frente com a sua vida ao arranjar um novo marido e sair da sua casa
com D. João é refletida no verso “I'm
preein' what's ahead of me, and tryna leave the bullshit in the past”, onde o
sujeito poético consegue ver um futuro para além do presente e quer deixar tudo
o que aconteceu no passado; por último, e talvez o verso que mais caracterize o
estado de Madalena, é “But I'm feelin' sad, and I'm really numb inside”.
É possível equiparar os temas centrais da canção
“ Someone like you” com a situação de D. João de Portugal. Uma das principais
características do sujeito poético é ter o coração partido e um sentimento de
tristeza e solidão por saber que o seu antigo amor está num relacionamento novo
(“I heard that you're settled down / That
you found a girl and you're married now / I heard that your dreams came true /
Guess she gave you things, I didn't give to you”), correspondendo à realidade
de D. João de Portugal: Madalena seguiu em frente e casou com Manuel Coutinho.
Outro aspeto semelhante é a aceitação do sujeito poético e de D. João do facto
de terem sido trocados e de que nunca mais ficariam com o seu amor. Este aspeto é
transmitido nos versos “Never mind, I'll find someone like you / I wish nothing
but the best for you, too”. Outra
semelhança entre as obras é a nostalgia e memórias passadas, sempre muito
presentes no desenrolar da história. D. João de Portugal, após catorze anos de
sofrimento, decide aparecer inesperadamente na casa de Madalena sem saber o que
ela sentia em relação a ele. Este momento remete-nos para os versos “ I hate to
turn up out of the blue, uninvited / But I couldn't stay away, I couldn't fight
it” com tal precisão, que até poderiam ser usados no diálogo de Madalena com D.
João.
Nota (da 1.ª versão): Bom
Joana
A tragédia romântica Frei
Luís de Sousa, de Almeida Garrett, centra-se
num dilema moral fatal. O amor entre Madalena de Vilhena e Manuel de Sousa
Coutinho, vivido durante mais de vinte e um anos, é subitamente posto em causa
pelo regresso inesperado de D. João de Portugal, o marido de Madalena dado como
morto desde a batalha de Alcácer-Quibir. Maria, a filha do casal, símbolo da
inocência e pureza nascida desse amor ilegítimo, acaba por sofrer pelo peso da
verdade e da culpa. Resignado pela culpa, Manuel de Sousa Coutinho refugia-se
no convento, onde se tornará Frei Luís de Sousa. Já Madalena, dominada pela
vergonha e culpa, abdica da sua identidade e do amor, mergulhando num silêncio
forçado.
É neste contexto de julgamento social e perda que a canção
“Because I Liked a Boy”, lançada por
Sabrina Carpenter em 2022, parece ligar-se inesperadamente à figura de
Madalena. Apesar da distância temporal e cultural, algumas partes desta música
poderiam ser adotadas por Madalena de Vilhena, visto que se destacam
semelhanças entre a sua história e o retrato lírico da mulher injustamente
julgada.
O refrão “All
because I liked a boy. [Tudo
porque eu gostava de um rapaz]” parece simplificar até ao absurdo aquilo que,
na verdade, é o ponto de partida de toda a tragédia, onde tudo se desmorona
porque Madalena ousou amar. Tudo o que Madalena perde, tudo o que desaba à sua
volta, como a ilegitimidade da sua filha, tornando-se fruto de um pecado, ou a
sua morte mundana e a do seu amado, levando posteriormente ao ingresso na vida
religiosa, acontecem apenas porque se limitou a amar alguém. Um amor puro e
feliz, sim, mas não legitimado, tal como o amor do sujeito lírico da canção
(“Fell so deeply into it / It was all so innocent [Caí tão profundamente nisso /
Era tudo tão inocente]”).
Madalena já era condenada por agir segundo o seu coração mesmo
antes do aparecimento de D. João de Portugal como Romeiro no Ato II. “ You
said I was the devil, and you were the saint.. [Tu disseste que eu era o diabo, e tu eras o santo…]”— este verso poderia ser o reflexo da voz
interior de Madalena, ou da imagem que dela constrói Telmo, já que Madalena
sofreu muitas vezes julgamento por parte de Telmo, velho aio e companheiro do
seu primeiro marido, não apenas pelo que fez, mas pelo que sentia ou pelo que
nunca sentiu (“Mas amor! amor!... que lhe nunca tiveste.”). Madalena para se
justificar e consolar, acreditava que o amor não se pode comandar
(“"Telmo, ao amor não está em nós dá-lo, nem quitá-lo...").
“Now I'm a homewrecker,[...], I'm a hot topic on your
tongue...[Agora eu sou uma destruidora de lares,[...], Eu sou o tema quente na
tua língua]”: a voz feminina vê-se
perseguida e reduzida a rótulos, tal como Madalena que foi marcada pelo peso da
reputação e do dever. O conflito interior, o remorso e o peso da culpa social
corroeram-lhe a identidade, ao ponto de ela já não saber quem era. É nesse
sentido que o verso da canção “Tell me who I am, guess I don’t have a choice.[
Diz-me quem eu sou, acho que não tenho escolha.]” adquire força trágica.
Madalena deixou de se reconhecer como mulher, como esposa e como mãe: tinha
morrido espiritualmente, entregou-se ao convento, pedindo a Frei Jorge que a
acolhesse, visto que já não encontrava em si nenhuma resposta.
Em “When everything went down, we’d already broken up [Quando
tudo isso aconteceu / Nós já tínhamos terminado]” reflete-se bem o dilema de
Madalena. Quando decidiu casar com Manuel de Sousa, já acreditava que era viúva
há sete anos e que o primeiro casamento tinha acabado, não por escolha, mas
pela grande probabilidade da morte de D. João. Esperou sete anos, viveu no luto
e só então voltou a casar. Por isso, não devia ser vista como adúltera porque
nunca traiu o primeiro marido e assistiu tudo a ruir por algo que ela julgava
legitimamente encerrado.
Assim, a música de Sabrina Carpenter serve quase como um eco
moderno da dor de Madalena, mostrando a injustiça que uma mulher enfrenta
apenas por amar. Mesmo separadas por séculos, as vozes da canção e da
personagem revelam o sofrimento causado por uma sociedade que não perdoa
escolhas feitas com o coração.
Nota (da 1.ª versão): Bom
Jair
Em Frei Luís de Sousa,
há dois momentos em que os personagens necessitam de sair das duas cidades e/ou
casas, ou seja, da sua zona de conforto pessoal, para proteger o que defendiam,
as suas ideologias políticas, principalmente nacionalistas.
Na canção “Deslocado”, dos Napa, o sujeito lírico trata do
problema de ter saído da sua terra, a sua zona de conforto, de modo a obter uma
vida melhor na capital.
Na peça de Garrett, num primeiro momento, D. João de Portugal
desloca-se de Portugal para ir à guerra, em Alcácer Quibir, defender a sua
terra pois era nacionalista. D. João, de certo modo, ao ser capturado durante
anos pelos mouros, encontrava-se num sítio de desconforto total, porque não era
bem tratado mas, principalmente, porque sentia saudades da sua casa e nostalgia
da sua vida pré-guerra. Entretanto, depois de vinte e um anos fora, sendo que
D. Madalena, a sua mulher, já tinha perdido a esperança do regresso de D. João
e já havia tido uma filha com o seu novo marido, Manuel, D. João, ao regressar,
apercebe-se de que ficara "sem teto" e que havia perdido a mulher.
Num outro caso, podemos relacionar a canção com a peça quando
Manuel de Sousa Coutinho queima a casa em protesto contra os governantes espanhóis,
que, por haver uma peste em Lisboa, iam ficar na casa de Manuel, que se situava
em Almada.
Manuel, Maria e Madalena tiveram de se descolar para a antiga
casa de Madalena, o palácio de João de Portugal, pois era o único sítio que tinham
para viver mas que, como na canção, não trazia conforto nenhum à família.
Assim, tanto na obra como na canção, temos situações em que o
eu sente-se afastado de casa. Por isso, na canção, quando o eu vai voltar para
casa, destaca as suas saudades (“com
a mala arrumada / já quase não cabia/ a saudade acumulada”), desconfortável
pela situação vivida mas com nostalgia positiva do seu passado (“A saudade acumulada / do azul, vejo o
jardim / mesmo por trás da asa”)
e com saudades imensas.
Nota (da 1.ª versão): Suficiente +
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