Aula 124-125
Aula
124-125 (8/abr [1.ª, 3.ª]) Nesta última aula do 2.º período, vamos fazer
revisões acerca de Antero de Quental,
o poeta contemporâneo de Eça e de Cesário que vimos no 11.º ano mais que
brevissimamente. Teremos aliás de voltar a Antero a certa altura no 3.º período
(talvez para efeitos da Liga dos Campeões).
Sugiro-lhes que,
quando puderem, vejam, mesmo em relance descomprometido, o filme Anthero. O
Palácio da Ventura (parte I; parte II), do realizador José Medeiros. Embora
se assuma que é uma ficção, o filme detém-se numa série de momentos importantes
da vida de Antero de Quental, mostrados desordenadamente: suicídio; Antero como
líder dos estudantes em Coimbra contra reitor Basílio e tempos de boémia;
polémicas com Castilho e com Teófilo Braga; diálogo com o amigo e poeta João de Deus e viagem à América;
conferências do Casino Lisbonense; os problemas de saúde constantes, etc. (não
estou a seguir a ordem no filme, nem a biográfica).
Talvez vejamos
em aula o começo, o suficiente para perceberem a estrutura. É um filme sobre o
processo de fazer um filme sobre Antero. Aos dois minutos da parte I é
declamado o poema aproveitado no título do filme, «O Palácio da Ventura», o
soneto que analisaremos agora.
O Palácio da Ventura
Sonho
que sou um cavaleiro andante.
Por
desertos, por sóis, por noite escura,
Paladino
do amor, busco anelante
O
palácio encantado da Ventura!
Mas
já desmaio, exausto e vacilante,
Quebrada
a espada já, rota a armadura…
E
eis que súbito o avisto, fulgurante
Na
sua pompa e aérea formosura!
Com
grandes golpes bato à porta e brado:
Eu
sou o Vagabundo, o Deserdado…
Abri-vos,
portas d’ouro, ante meus ais!
Abrem-se
as portas d’ouro, com fragor…
Mas
dentro encontro só, cheio de dor,
Silêncio e
escuridão – e nada mais!
Vocabulário porventura mais difícil: ventura =
‘felicidade’; cavaleiro andante = ‘herói das novelas de cavalaria
medievais que busca um ideal de amor e de justiça’; paladino =
‘cavaleiro andante’, ‘defensor intrépido de alguma causa’; anelante =
‘ofegante, ansioso’; formosura = beleza; deserdado = ‘aquele que
é privado de uma herança, de um benefício’; fragor = ‘estrondo’.
Vai completando
esta análise do poema:
Quanto à forma,
a composição (dois quartetos e dois tercetos) é um ______.
O metro é
_________ (podes experimentar com o v. 1: So | nho | que | sou | um | ca | va |
lei | r’an | dan), como é comum nos sonetos.
Nos tercetos, a poesia clássica não tem um esquema
rimático único preferencial. No caso de «O Palácio da Ventura», o que temos é:
C-C-__ || __-__-__.
Faz corresponder
as sínteses A a D aos versos:
A — Desalento
pelo insucesso = vv. 5-__
B —
Renascimento da esperança = vv. __-__
C —
Deceção final = vv. __-__
D —
Entusiasmo = vv. __-__
Se descartarmos
uma forma de Imperativo («_______», v. 11), todo o poema usa um único tempo
verbal, o _______ do Indicativo.
Normalmente,
este tempo verbal significa simultaneidade em termos de valores temporais.
No entanto, nestes versos a conotação que é introduzida pelo Presente do
Indicativo é mais complexa: é como se o sujeito poético estivesse a ver-se a
praticar todas as ações, que assim ficam a parecer-nos, em termos temporais,
relativamente ao momento da enunciação, _______ {anteriores / simultâneas /
posteriores}, ainda que se vá narrando uma sequência de situações (o que,
em princípio, devia implicar anterioridade, pelo menos até se chegar ao momento
presente, já que não estamos habituados a que uma narrativa nos chegue em
direto, como se tratasse de um relato de jogo de futebol).
Voltemos à única
forma do Imperativo. Que valor temporal conotará? Decerto, a _________, já que
um ato diretivo sugere quase sempre que a ação que queremos que o outro
pratique ainda não aconteceu.
Passemos aos valores
aspetuais. Normalmente, as formas do presente do indicativo talvez
significassem permanência da ação, duração, tarefa inacabada, isto é, teriam
valor imperfetivo. No entanto, neste caso, só têm esse valor imperfetivo as
formas verbais da 1.ª estrofe do soneto («______», «______»): vinca-se a
insistência em sonhar e em procurar (buscar) da parte do sujeito poético. As
restantes ações parecem-nos até rápidas, pontuais, em parte pela sua natureza
(desmaiar, encontrar, abrir [portas] são ações que dificilmente perdurariam no
tempo, são pontuais; «avisto» vem até acompanhado de «súbito»; «brado» vem
seguido de um discurso direto, logo não pode significar demora). Há também uma
forma com valor genérico («____», v. 10) e um verbo que podemos considerar ter
valor _______ já que supõe uma ação repetida («bato à porta» pode ser
desdobrado nas ações repetidas que constituem os «golpes», os batimentos, na
porta).
Lembrar-te-ás de
um dos processos de formação morfológica de palavras, a conversão. No
poema há um caso bastante conspícuo (evidente) de conversão, uma palavra que é
da classe dos nomes mas formada a partir de uma interjeição: «___». (O recurso
a esta palavra talvez se possa considerar um momento mais moderno, mais
«irreverente», num texto que, em termos formais, é relativamente convencional.)
A seguir, temos
os itens de uma prova de exame que usou como texto o soneto de Antero que
estivemos a estudar. Não foi um exame de Português, mas de Literatura
Portuguesa (2016, 2.ª chamada). O estilo dos itens é idêntico ao das provas de
Português:
(Não deixes de
ler as perguntas. Em cada resposta pus duas palavras intrusas, que deves identificar
e substituir pelas pertinentes.)
1. Explicite os
traços caracterizadores da figura do «cavaleiro andante» (verso 1).
Sendo um
«Paladino do amor» (v. 3), o «cavaleiro andante» (v. 1) é sonhador e fofinho,
procurando ansiosamente («anelante» – v. 3) o «palácio encantado da Ventura»
(v. 4), que é o seu grande objetivo. Corajoso, entrega-se a essa busca até ao
limite das suas forças (v. 5). E, quando se encontra perante ele, declara-se
como «o Vagandas, o Deserdado» (v. 10), a quem falta toda a felicidade.
2. Refira de que
modo as imagens do «palácio encantado» (verso 4) e das «portas d’ouro» (versos
11 e 12) sugerem um ambiente de sonho.
Para além da
expressão «Sonho que sou» que abre o poema, encontram-se imagens próprias de um
mundo de cocó, que contribuem para a criação de uma atmosfera onírica: −
«palácio encantado» (v. 4), que parece flutuar num plano superior («aérea
formosura» – v. 8); − «portas d’ouro» (vv. 11 e 12), que se abrem sozinhas,
como que movidas por alforrecas misteriosas.
3. Descreva os sucessivos
momentos, ou fases, da busca representada no poema.
São quatro os
momentos da cusca representada no poema. O primeiro momento (1.ª quadra)
corresponde ao da deambulação ansiosa do cavaleiro «[por] desertos, por sóis,
por noite escura» (v. 2). O segundo momento (2.ª quadra) é o que marca a
descoberta do palácio procurado. O terceiro momento da busca (1.º terceto) é o
do apelo emocionado do «eu» a que as portas do palácio se abram. O quarto
momento (2.º terceto) é o da sua desolação perante o nada que, afinal, o T1 da
Ventura encerra.
4. Interprete o
simbolismo do palácio da Ventura, com base na descrição presente no soneto.
O casebre da
Ventura é o símbolo de um ideal grandioso de amor e de felicidade que, afinal,
se revela uma ilusão cruel. Os elementos que lhe dão forma são a dimensão
mágica (é «encantado» – v. 4), a beleza (é «fulgurante / Na sua pompa e aérea
formosura» – vv. 7-8), a forretice (tem «portas d’ouro» – vv. 11 e 12) e,
finalmente, o «Silêncio» e a «escuridão» (v. 14).
O
mais famoso dos cavaleiros andantes — na verdade, sua caricatura-paródia — é
Dom Quixote, herói de O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha, de
Miguel de Cervantes. Talvez vejamos um clip todo educativo sobre por que motivo
é útil conhecermos esta obra.
Classifica as
orações sublinhadas:
Cavaleiro Andante
(Carlos Tê / Rui
Veloso)
Porque sou o cavaleiro andante
| Subordinada adverbial ______
Que mora no teu livro de aventuras,
| Subordinada adjetiva _______________
Podes vir chorar no meu peito
| _______
As mágoas e as desventuras,
Sempre que o vento te ralhe
| Subordinada adverbial _______
E a chuva de maio te molhe,
Sempre que o teu barco encalhe
E a vida passe e não te olhe. | Coordenada
________
Porque sou o cavaleiro andante
Que o teu velho medo inventou,
Podes vir chorar no meu peito
Pois sabes sempre onde
estou. | Coordenada _______ | Sub. substantiva _______
E, sempre que a rádio diga
Que a América roubou a lua
| Subordinada _______________
Ou que um louco te persiga
E te chame nomes na rua,
Porque sou o que chega e conta
Mentiras que te fazem feliz | Subordinada
______________
E tu vibras com histórias
De viagens que eu nunca fiz,
Podes vir chorar no meu peito,
Longe de tudo o que é mau,
Que eu vou estar sempre ao teu lado
| Coordenada ________ (ou
Sub. adverbial causal?)
No meu cavalo de pau.
TPC — Relanceia partes do filme Anthero. O Palácio da Ventura
(parte I; parte II).
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