Os Maias 17
Mafalda (11.º 3.ª)
Mafalda (Bom (+)/Bom+)
Pontos fortes Muito boa leitura. Boa
relação entre texto imagens, ainda que estas tenham um papel mais decorativo,
ilustrativo, do que significante. O texto é uma correta súmula de aspetos
cruciais do capítulo XVII, sem incorreções, embora talvez eu defendesse valer a pena ter-se
arriscado um distanciamento maior do original de Eça, ser-se mais inventivo. Resulta
um objeto limpo, competente. Aspetos
melhoráveis Creio que «a tirava do sério» é demasiado corrente; há aliás outros
lugares comuns do vocabulário romântico («alma gémea», «sem chão», «viver
intensamente») — não que sejam erros, é claro, mas dão ao texto um nível familiar,
pouco literário.«Ele ama-a como há muito tempo não amava alguém» talvez não
seja coerente (não quebrará o princípio da não-contradição?), porque supõe que o
amor de que se trata é suscetível de repetição, seria periódico, quando o que se
espera de um amor destes é que seja mesmo único (irrepetível nem há pouco nem há muito
tempo).
Joana,
Laura & Mafalda
(11.º 4.ª)
Mafalda, Laura &
Joana (Muito Bom) Pontos fortes Desdobramento do enredo
original pelos vários pontos de vista das personagens (o dar uma mesma história
repetida com narração focalizada em cada um dos participantes tem alguma
tradição, na literatura e no cinema — ocorrem-me os três primeiros livros de O Quarteto de Alexandria, de Lawrence
Durrell, e o filme Rashomon, de Akira
Kurosawa —, mas mantém bastante originalidade, obrigando a reflexão sobre a
obra que as autoras evidenciam ter feito muito bem). Muito bons texto, leitura
em voz alta e representação. Inserção de trechos em segundo nível narrativo
(analepses ou ilustrações do que é dito em monólogo) dá ao filme um ritmo que o
valoriza, o torna ainda mais agradável de seguir. Montagem, som, toda a
execução muito cuidados. Estilização «gráfica» (de pós-produção mas também logo
nos cenários — padrão do papel de parede, por exemplo — e nos adereços). Aspetos melhoráveis Tentativa de
caracterização enquanto personagens masculinas do século XIX (lembram-me
Charlot ou personagens de filmes de Stanley Kubrick; há um efeito paródico que
não é o pretendido — enfim, não têm jeito para se travestirem; de resto, não
vejo Ega nem mesmo Carlos assim tão alinhadinhos — no fundo, são de qualquer
modo as duas personagens que anseiam não ser da sua época, pelo que, neste caso,
o cuidado de replicar as vestimentas de época talvez não fosse necessário: por
exemplo, o comboio final, moderno e ao lado da estrada com carros, resulta bem). A
estrutura «confrontei o Ega» tem-se banalizado nesta última década, mas, na
verdade, em português menos facebookiano ou telenovelesco confrontamos alguém com qualquer coisa ou então
enfrentamo-la ou pomo-la em causa.
Catarina & Marta
(11.º 9.ª)
Marta
& Catarina (Bom+/Muito Bom- ou mesmo quase Muito Bom-) Pontos fortes Recurso a um formato (que
reúne as apresentações de personagens típicas de certos géneros televisivos e
certo estilo de documentário/ficção naturalista), que implica boas capacidades
de realização e encenação, que foram bem ultrapassadas, graças a saber técnico,
a muito trabalho de equipa, boa planificação — assim, Catarina e Marta
conseguiram aludir ao enredo de Os Maias
de modo original, leve, o que faz que sigamos o vídeo facilmente. Ironia na
caracterização (incluindo falas, é claro) das personagens criadas de raiz
(Jacinta, Odete), e mesmo nas outras, assente quer no texto de falas e locução
quer na capacidade para representar essas personagens-tipo. Devo também
salientar que as autoras, tendo feito antes uma primeira versão que eu sugeri
melhorassem ainda que sem lhes impor taxativamente esse trabalho suplementar, deram-se
ao trabalho de resolverem efetivamente os problemas que lhes assinalara. Aspetos melhoráveis Na transposição para
o nosso tempo das personagens Carlos, Maria Eduarda, Ega, defenderia que se
tivessem mantido mais fiéis ao original (não vejo como verosímil um Ega a
gostar de agricultura ou que Carlos fosse o estereótipo de ‘inteligente’;
tentaria encontrar os equivalentes mais esperáveis — talvez tenha faltado aqui
melhor leitura da obra). No final, não se justifica que Ega peça a Maria
Eduarda que vá ter com ele a Santa Olávia (creio haver confusão). A corrigir: «*Algo
de errado não estava certo» (Algo não estava certo / Algo estava errado; ou
fazia parte da caracterização de Jacinta?); no registo da narração, que é
relativamente formal, em vez de «cusca» (que é popular, familiar), poderia
ficar «coscuvilheira», «bisbilhoteira», «mexeriqueira».
João F.,
João R., Pedro & Tomás (11.º 5.ª)
Tomás, Pedro, João R.,
João F. (Bom + ou mesmo Bom+/Muito Bom-) Pontos fortes Texto revela boa perceção
da língua contemporânea falada (há sensibilidade para os aspetos sociolinguísticos
— quanto a língua e a meios de comunicação usados —, o que contribui para que as
situações encenadas sejam verosímeis). Também funcionam nesse sentido a boa
realização e as, em geral, boas representações dos vários atores — saliento,
pela positiva, papel desempenhado por Tomás, depois também o de Pedro e, em
parte, o de João R. , e, pela negativa, pulmões doentes e suposta velhice de
João F. e a primeira reação de João R., inesperadamente calmo, quando sabe ser
Maria Eduarda sua irmã). Há também acertada intuição de como se deve «narrar»
uma história em termos de cinema (ritmo, síntese no enredo, ao lado de certa
recorrência da expressão em termos de texto), o que é apoiado por boas
capacidades técnicas, que fazem que o filme seja visto confortavelmente. Aspetos melhoráveis Tendo em conta que
o trabalho é de quatro, seis minutos é talvez pouco tempo (se fôssemos
proporcionais, a duração do filme devia tender para quatro vezes três minutos,
ou seja, doze minutos — mas não seria necessário tanto). A corrigir: «*e pede provas
para que lhe confirmem o grau de parentesco» (seria: ‘e pede provas que lhe
confirmem o grau de parentesco’); Vilaça era procurador da família, talvez se
esperasse que fosse tratado na 3.ª pessoa (e não por tu), mas é verdade que era
também alguém já da casa.
J. Cardoso
& Miguel B.
(11.º 2.ª)
Miguel B. & J.
Cardoso (Bom+ ou mesmo Muito Bom-/Bom+) Pontos fortes Construção de verdadeiro
filme, com ação verosímil mas, ao mesmo tempo, leve e brincalhona, para,
partindo de um contexto do quotidiano dos autores, fazer referência aos Maias. Argumento é simples, mas adequado
ao desenvolvimento em filme. Realização apurada (boa noção da necessidade de,
em cinema, planificar cenas autónomas para se criar a narrativa; bom domínio
técnico, no filme e na montagem; razoável, ou mesmo boa, representação — sendo
o género ‘ficção verosímil mas assumidamente ligeira e alegórica’, aceita-se
que os diálogos pareçam um pouco artificiais, já que concorrem também para a
estilização, para a caricatura de estereótipos, que o filme pretende aproveitar
comicamente). Aspetos melhoráveis Clímax
da intriga podia talvez ser abordado de outro modo, aproveitando o facto de a
camisola do Sport Futebol Palmense ser confundível com a do Benfica: a
personagem de João Cardoso, julgando tratar-se do equipamento do Benfica, explicitaria
mais dramaticamente a sua revolta (então sim, seria uma verdadeira traição ao
emblema leonino); entretanto, a personagem desempenhada por Miguel Brito
acalmaria o amigo, explicando ser afinal apenas o equipamento de um clube de
bairro embora centenário (é aceitável jogar-se no Palmense e ser-se do
Sporting); resolvido o quiproquó, festejariam o resultado do Sporting contra o Belenenenses
SAD (neste caso, verdadeiramente sad).
A corrigir: em «Vive nas ruas da amargura depois de em tempos já ter tido o
devido reconhecimento», «depois» não se ouve (não sei se por falha na leitura
em voz alta ou se por lapso logo na escrita); aquando da leitura da p. 667 de Os Maias, «de resto» saiu quase como «de
r[ê]sto».
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