Saturday, August 25, 2018

Cesário pelo 11.º 5.ª


Natacha (Bom)
Podemos pensar que se trata de um autorretrato de Vincent Van Gogh, mas, na verdade, esta pintura, é uma recriação do ucraniano Oleg Shuplyak. Torna-se curioso o facto de Van Gogh, que nasceu em 1853, ser contemporâneo de Cesário Verde, apenas dois anos mais novo que o aclamado pintor holandês. Além disso, ambos tiveram uma vida curta, trinta e nove anos e trinta e um anos, respetivamente, ambas revolucionárias à sua maneira.
As relações entre a pintura e o poeta português vão mais além. Ao observar a pintura com atenção, encontramos inúmeros traços da poesia de Cesário. Trata-se, para começar, de um ambiente campestre, frequentemente retratado pelo poeta. Observa-se na pintura de Oleg, a «claridade, a robustez» descrita em «De Verão» (v. 2); Observa-se um trabalhador do campo que, apesar de num panorama geral representar o nariz do holandês, é bastante realista, como sucedia na forma como Cesário Verde descrevia as paisagens e as gentes do seu tempo. Na poesia do senhor Verde são comuns as cenas do quotidiano: em «Cristalizações», são-nos descritos calceteiros; em «O Sentimento dum Ocidental» temos «calafates», «dois dentistas», «um trôpego arlequim», «querubins do lar», «lojistas» e «varinas». A admiração pelo trabalho presente no espírito de Cesário é transmitido para os seus sujeitos poéticos, que procuram a beleza no simples e no trabalhador mais do que no divino e no maravilhoso.
Não podemos deixar de reparar que existe uma rapariga que parece caminhar pelo quadro, seguida pelo olhar atento do trabalhador. Esta situação é semelhante à ação descrita em «A Débil» (num diferente cenário). O trabalhador faz o papel do sujeito poético do poema de Cesário e observa a rapariga que passa «bela, frágil, assustada» (v. 2) com uma admiração evidente, apesar de esta, não mostrar aperceber-se deste olhar e continuar o seu caminho, pensando num outro qualquer assunto — «Seguias a pensar no teu bordado» (v. 26).
Tal como em «De Tarde» e em muitos outros poemas do poeta português, parece que o tempo para e um determinado momento fica gravado numa pintura ou fotografia. Parece tratar-se de uma narrativa em que o observador fica inserido, mergulhando aos poucos no quadro. O mesmo acontece ao ler «Num Bairro Moderno»: no início, o sujeito poético observa a «regateira» à distância, depois aproxima-se dela, e juntos levantam «todo aquele peso / Que o chão de pedra resistia preso» (vv. 68-69). A narrativa vai evoluindo ao longo do poema e para além dos desenvolvimentos espaciais e temporais de que nos apercebemos, também é de realçar o desenvolvimento psicológico do «eu» do texto, que transita da realidade para o imaginário, imaginando figuras através da fruta — «E eu recompunha, por anatomia, / Um novo corpo orgânico, aos bocados.» (vv. 41-42). É esta a característica que mais me faz associar a pintura à poesia de Cesário Verde: o quadro, num panorama geral, é um retrato de Van Gogh e o seu olhar representa para mim o olhar de Cesário sobre o seu mundo, revolucionário para a época.

Sara (Bom (+))
Inspirei-me neste quadro de Edvard Munch — «[Sentimento Doente ao Pôr do Sol, Desespero]» (1892) —, que nasceu três anos antes de Cesário Verde (1855-1886), mas morreu já com oitenta anos, ao contrário do poeta português, que morreu na tenra idade de trinta e um anos. O quadro de Munch com maior reconhecimento é «Skrik [O Grito]», mas não achei que fosse o que mais se aproximasse dos poemas e da escrita de Cesário Verde.
O quadro, um óleo, é quase como a representação visual do poema «O Sentimento dum Ocidental». Até poderemos dizer que o homem na pintura será o ''eu'' poético, que descreve o mundo ao seu redor com uma originalidade inesperada, que se relaciona com o movimento estético a que pertenceu Munch, o expressionismo.
A relação entre o quadro e a escrita de Cesário começa logo na paisagem, que, normalmente, em Cesário pertence a um ambiente citadino, e, no quadro, é representada pela ponte em que o homem se encontra e pelo fundo, que devera representar a cidade, e a proximidade ao mar, aos trabalhadores dos portos. Em «O Sentimento dum Ocidental», o ''eu'' vai vagueando pela «Triste cidade» (II, v. 33) que descreve com grande detalhe: «Nas nossas ruas [...]», «À vista das prisões, da velha Sé [...]» e «Cercam-me as lojas, tépidas.» (I, v. 1; II, v. 7; III, v. 5), também na parte I do poema, o ''eu'', passa «embrenh[ado], a cismar, por boqueirões, por becos / Ou err[a] pelos cais a que se atracam botes» (I, vv. 19 e 20).
O próprio tempo que retratam as duas obras é semelhante: no quadro o foco está no pôr do sol, o início do anoitecer, é por isso que Edvard usa o contraste do laranja do sol com o azul da noite; já em «O Sentimento dum Ocidental», o sujeito poético vai vagueado pela cidade desde o anoitecer, passando pela meia-noite soturna até chegar ao amanhecer: «[...] ao anoitecer.», «[...] A noite pesa, esmaga [...]» (I, v. 1; II, v. 1).
A última característica que se salienta nesta comparação entre dois estilos de arte tão diferentes é a melancolia, o sentimento doentio que os autores das duas obras tentam transmitir aos leitores e observadores. No quadro, um homem encontra-se no que parece uma posição de pensamento, e, com os tons escuros à sua volta, transmite um sentimento de sobriedade, um momento sério de má disposição. Em «O Sentimento dum Ocidental», o ''eu'' encontra-se enjoado pelo ar da cidade, perturbado pela paisagem citadina que o rodeia, também «[...] sonh[a] a Cólera, imagin[a] a Febre» (II, v. 25), o sujeito poético encontra-se cheio de sentimentos doentios.
Apesar de este quadro ser apropriado para analogias com vários poemas Cesário Verde, pois enquadra-se na sua escrita, acredito que aquele com que a pintura possui o maior número de parecenças é o poema «O Sentimento de um Ocidental», como se pode retirar de todas as comparações vistas neste texto.

Beatriz Entrezede (Bom (-))

“As Respigadoras” é uma pintura a óleo de Jean-François Millet, de 1857 e atualmente exposta no Museu de Orsay, em Paris. É possível relacionar a pintura de Millet com a escrita do poeta Cesário Verde, na medida em que recorrem ambos à descrição pormenorizada de um simples acontecimento.
Cesário Verde é um escritor que descreve a realidade de um modo diferente. O quotidiano e os sentimentos do sujeito poético são, sempre, assuntos profundos e merecedores de um olhar humilde. Um aspeto igualmente relevante neste quadro de Millet é a representação minuciosa do trabalho honesto de três camponesas que apanham espigas de trigo caídas no chão, depois da colheita. Cesário, por sua vez, dá, por exemplo, extrema importância ao trabalho dos “calafates” e dos “carpinteiros”, em “O Sentimento de um Ocidental” (I, v. 16 e vv. 17-18).
A pintura de uma figura de género feminino é outra semelhança com os poemas de Cesário, onde a referência feminina está sempre presente. No poema “De tarde”, o poeta reporta-se a uma “burguesa” que, durante um almoço, deixava entre ver os seus dois seios que saíam da renda. Também em “A Débil” o “eu” (apaixonado) dedicou a vida a “ti”, uma rapariga atraente e bonita, para a salvar de um aglomerado de homens.
As cores vivas que Millet utilizou para pintar este quadro relacionam-se com o autor do poema “De tarde”, pois ambos ilustram o campo como um sítio relaxante que incita ao convívio no trabalho (na pintura) ou a uma boa companhia num “pic-nic de burguesas” (no poema). Também no poema “De Verão” o sujeito poético passeia com a prima no campo. Na pintura, a mancha verde seco corresponde ao campo onde as burguesas apanhavam as espigas e o brilho do céu corresponde a uma sinestesia visual que imita o sol de tarde. Assim, tanto a pintura como estes poemas relatam um momento que, temporalmente, corresponde à mesma etapa do dia – a tarde.
Uma das características mais inovadoras deste poeta é a deambulação e captação de momentos específicos, assemelhando-se, por isso, a uma fotografia polaroid – “Batem carros de aluguer, ao fundo”, em “O Sentimento dum Ocidental”. Esta pintura a óleo pode representar um momento específico de um dia de trabalho comum das camponesas, na medida em que surge como resultado de uma deambulação do pintor pelos campos de trigo que, ao reparar nas três mulheres a apanharem espigas, transpôs este momento irrelevante para uma tela com demasiados pormenores.

Guilherme (Bom -)

Na poesia de Cesário Verde (1855-1886) é frequente a transposição de elementos citadinos para o ambiente rural e de motivos do campo para o contexto urbano. Visualizando os mais pequenos pormenores, criava cidades a partir de pequenas civilizações de formigas e via bustos em frutas e legumes que se vendiam na cidade. Claude Monet (1840-1926), pintor impressionista transpõe nas suas obras, à semelhança de Cesário, elementos que encontramos na cidade para o campo e o contrário também. Ambos os artistas acham no campo a musa que os anima («De Verão», v. 1).  Em «Le Déjeuner sur l’herbe [Almoço na relva]»  (1866) encontramos um grupo de burgueses e burguesas da cidade que, no campo, aproveitam um almoço de convívio, tal como em «De Tarde». A estrofe «Naquele pic-nic de burguesas, / Houve uma coisa simplesmente bela, / E que, sem ter história de grandezas, / Em todo o caso dava uma aguarela», do referido poema, acaba por retratar todo o cenário que observamos não só nesta pintura, mas também noutras feitas por Monet. Estas outras obras representam burgueses em pic-nics, passeios pelo campo e por falésias e tantas outras situações que também são descritas por Cesário. Tal como em  «De Verão», os burgueses «de jasmim na casa do casaco / E de óculo deitado à tiracolo» encontram-se descontextualizados do espaço envolvente, estando demasiado formais para o que aparenta ser um pic-nic informal entre amigos ou mesmo em família.
Toda a poesia de Cesário estabelece um paralelismo com as obras de Monet podendo se ilustrar mutuamente. Tendo sido contemporâneos isso era em parte expectável visto que, embora com a diferença de um viver na provinciana Lisboa e outro em Paris, ambos foram sujeitos às mesmas correntes artísticas, às mesmas ideologias políticas entre muitos outros aspetos. Para Cesário, o campo tem propriedades revigorantes. Quando descreve o que nele se passa, apresenta uma visão mais otimista e alegre — a vinha que «Verdeja, vicejante» (v. 30) ou mesmo «Bons ares! Boa luz! Bons alimentos» (v. 18) — enquanto que, na cidade, destaca tristeza e dor: «Uma turba ruidosa, negra, espessa / Voltava das exéquias dum monarca» («A Débil», vv. 23-24) ou mais explícito ainda «Nas nossas ruas, ao anoitecer / Há tal soturnidade, há tal melancolia / Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia / Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.» («O Sentimento dum Ocidental», I, vv. 1-4).
Um aspeto curioso é o facto de Monet, numa só pintura, retratar um momento que se perpetua no tempo e que nos conta toda uma história através de uma só imagem. Cesário, através das suas palavras transpõe para a tela estes momentos. Já me disseram muitas vezes que uma imagem vale mais que mil palavras; acrescento também que um poema de Cesário vale tanto como um bom quadro do ilustre Monet.

Ângela (Suficiente)

O quadro que resolvi escolher foi o quadro, de Claude Monet, “Campo de papoilas em Argenteuil”. Escolhi-o pois retrata uma paisagem do campo, que, para Cesário Verde, representa liberdade, saúde, harmonia, o povo e os valores rurais.
Oscar-Claude Monet foi um pintor francês e um dos pintores impressionistas mais famosos. Nasceu no seculo XIX, assim como o nosso poeta, e morreu no já século XX. O quadro “Campo de papoilas em Argenteuil“ é bastante conhecido, e foi criado em 1873, no período do impressionismo. Podemos associá-lo a um momento feliz no campo. As cores que são realçadas na pintura são as mesmas que Cesário tenta realçar ao longo do seu poema “De Verão” «No campo eu acho nele a musa que me anima: a claridade, a robustez, a ação»; «Bons ares, boa luz, bons alimentos!»; «O sol abrasa as terras mais ceifadas», Neste poema verifica-se a capacidade descritiva de Cesário Verde e o seu gosto pela natureza, descrevendo o campo quase como o seu lugar ideal e onde acontecem peripécias engraçadas que o fazem feliz. No poema, além do sujeito poético também intervém a prima do poeta, uma criança educada, meiga, vaidosa e mandona e que respeita a natureza.
Com isto tudo, acho também importante realçar os sentimentos de Cesário acerca da cidade que o rodeia. Para o poeta, a cidade simboliza ausência de afeto, doença, exploração, pobreza, injustiça a níveis sociais e o domínio da burguesia (tanto comercial como industrial). Todos os sentimentos que o poeta exprime ao longo do poema podem ter a ver com o facto de ele também estar doente («O gás extravasado enjoa-me, perturba», «Despertam-me um desejo absurdo de sofrer») e ,assim, ver o que o rodeia com um certo ceticismo. Cesário sente uma espécie de desconforto e de repulsa pela cidade à noite, pois é como se visse os seus verdadeiros aspetos e as suas injustiças e defeitos. Mas, ao longo do poema, diz que «o fim da tarde inspira-me; e incomoda-me», retratando como as pessoas trabalham arduamente, pois ao longo das quadras seguintes vai descrevendo o comportamento de cada trabalhador com profissões diferentes.
Os poemas de Cesário Verde dão a entender uma preocupação social na cidade e tenta intervir criticamente. Compara o campo á cidade pois acha que no campo consegue encontrar a vida real de um homem da cidade ou como deveria ser. Cesário quer tentar mais exprimir o real do campo, por assim dizer, e não a sua abstração da natureza, usando só a natureza para realçar mais a sua ideia.

Leonor (Bom)

Quando procurava um quadro para realizar este trabalho, deparei-me com a pintura “Vinhedo Vermelho” (1888), do pintor holandês Van Gogh, nascido em 1853, apenas dois anos antes de Cesário Verde. Ambos tiveram uma vida bastante curta: Van Gogh suicidou-se e Cesário Verde morreu de tuberculose, com trinta e nove e trinta e um anos respetivamente.
A obra, pintada em Arles, na Provence, sul da França, onde Van Gogh viveu durante algum tempo, a única que conseguiu vender em vida, fez-me pensar, de imediato, em Cesário Verde. As cenas da vida quotidiana, citadina ou rural, são tema da poesia de Cesário, que admirava os trabalhadores que realizavam tarefas difíceis, cansativas e rotineiras. No poema “Nós”, o sujeito poético diz-nos que sabe que o trabalho do campo é difícil “Hoje eu sei quanto custam a criar / As cepas, desde que as podo e empo. / Ah! O campo não é um passatempo / Com bucolismos, rouxinóis, luar.” (II, vv. 279, 280, 281, 282).
O contraste entre campo e cidade é grande. A cidade é sentida como um lugar negativo, pois está conetada com a doença, a agitação, o barulho, a tristeza — em “Cristalizações” os calceteiros trabalham ao frio, de cócoras (vv. 1-3) e “gritam as peixeiras” (v. 12) —, enquanto que o campo aparece como um lugar onde a vida corre de forma mais calma e positiva, como podemos observar em “Nós” e em “De Tarde”.
Ao observarmos atentamente a tela de Van Gogh, assistimos a uma vindima tardia, na Provence, sul da França, onde viveu durante algum tempo, em que o vermelho outonal das folhas predomina na paisagem. Várias mulheres curvadas, em posição dolorosa, apanham cachos de uvas que podemos imaginar saborosos e doces. Confronte-se com: “E eram de açúcar e calor os cachos / Criados pelo esterco e pelo amanho” –“Nós” (vv. 191, 192).
No mesmo poema ainda podemos destacar o trabalho da irmã do sujeito poético, nas vinhas familiares “ Tu cortavas os bagos que não prestam / Com a tua tesoura de bordar” (vv. 91, 92).
Na tela, mais ao longe, uma carroça aguarda pelos cestos cheios de cachos de uva, para os transportar pela estrada molhada que vemos à direita. O sol põe-se por detrás das casas da aldeia. As cores predominantes são o vermelho e o amarelo dourado.
Cesário Verde viveu muitos anos no campo, que, para ele, era sinónimo de liberdade, saúde e esperança de cura da sua doença. Em «Vinhedo Vermelho», Van Gogh mostra-nos uma paisagem que nos transmite, para lá do trabalho árduo dos camponeses, a liberdade dos espaços, a beleza da natureza e a possibilidade de ter, naquele local, uma vida melhor.
Penso que as mensagens da tela e da poesia de Cesário coincidem em muitos pontos. Só a forma como nos são comunicadas são diferentes: Van Gogh utilizou óleos para transmitir o que via e sentia e Cesário utilizou as palavras com o mesmo objetivo, como o próprio sujeito poético afirma em “Nós”: “ Pinto quadros com palavras e sinais” (II, v. 169).

Ana (Bom - )

Pintado em 1893, “Colheita-Ceifeiras” é um óleo do português Silva Porto. Atualmente, pertence ao museu Nacional de Soares dos Reis, no Porto (cidade Natal do pintor). Cesário Verde e Silva Porto pertenciam ao Grupo do Leão (tertúlia de literatos e pintores portugueses).
Em primeiro plano, vemos duas mulheres trabalhadoras. Apesar de se ilustrar uma vida dura, as mulheres representadas não aparentam ser infelizes. Como podemos observar ao longo do poema “Cristalizações”, o trabalho é uma tarefa apreciada por Cesário. A referência feminina é também outra semelhança entre os artistas. Em “A Débil”, o sujeito poético mostra-se preocupado com a mulher, pois ela é frágil no meio onde vive (“Mas se a atropela o povo turbulento / Se fosse por acaso ali pisada”, vv. 41-42). Já em “De Tarde”, o momento partilhado com as burguesas é simplesmente belo, merecendo ser registado numa aguarela (atualmente numa fotografia polaroid). Outra das situações em que a mulher está presente surge-nos no poema “De Verão”.
A relação entre as mulheres e o campo é bastante significativa não só para Cesário como para Silva Porto. Nesta ilustração, observamos a representação detalhada do vasto campo ceifado. Em “De verão”, são diversas as vezes em que o senhor Verde espelha os pormenores visualizados (“No ribeiro abundam as ramagens / Dos olivais escuros (…) Regressam os rebanhos das pastagens”, vv. 21-23). Ambos os artistas retratam o campo como um lugar cheio de luz e vida que acaba por ser fonte da sua inspiração (“No campo; eu acho nele a musa que me anima”, v. 1).
Mas Cesário não fica por aí: não foi apenas o campo que descreveu. A cidade é também foco da sua atenção, como se pode observar nos poemas “O sentimento de um ocidental” e “Num bairro moderno”. Em relação ao campo, Cesário criticava-o positivamente. Porém, o que se observa em relação à cidade é uma critica negativa. A tristeza e a melancolia que caracterizam a cidade ao anoitecer, acabam por contribuir para o próprio desconforto do poeta ao longo do seu passeio (“O céu parece baixo e de neblina, / O gás extravasado enjoa-me, perturba-me;” vv. 5-6).
A meu ver, não é possível comparar esta pintura com apenas um poema de Cesário. São vários os versos que se aplicam a este quadro. Vimos que, para Cesário e Silva Porto, o campo é visto como um ambiente pacífico, onde não há problemas constantes a abalar a serenidade do espectador. Já a descrever a cidade, Cesário concentra diversos problemas que não aparentam ter solução. Podemos pensar que ambos os artistas descrevessem o campo constantemente pois era nele que se sentiam bem. Não era interesse de nenhum deles descrever ambientes mórbidos e frios, uma vez que se encontravam doentes.

Elisa (Suficiente)

Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni nasceu em 1475, centenas de anos antes do nascimento de Cesário Verde, em 1855. Miguel Ângelo foi um pintor, escultor, poeta e arquiteto florentino muito importante, considerado um dos maiores criadores da história da arte do ocidente. Ao contrário de Miguel Ângelo, Cesário Verde apenas se dedicava à escrita e à poesia, sendo ainda comerciante, não querendo eu tirar a sua merecida importância, pois foi um dos mais importantes poetas no século XX. A pintura que eu escolhi para comentar é “Criação de Adão”, conhecida como a maravilha do renascimento, localizada na famosa Capela Sistina.
Esta pintura é muito extensa, estando a sua história relacionada com todo o processo do renascimento e da sua evolução, dando-se um grande destaque a figuras mais religiosas. Em «O Sentimento dum Ocidental», de Cesário Verde, é percetível que o sujeito poético vai andando e passeando pela cidade no final de tarde e durante a noite, conseguindo assim reconhecer pessoas de diversos níveis sociais. De certa maneira, este acontecimento relaciona-se, embora não diretamente, com a pintura de Miguel Ângelo, mas, se pensarmos bem, esta pintura encontra-se numa igreja em Itália e a atitude das pessoas ao entrar e ao passear lá dentro deve ser a mesma, sempre a olhar à procura de uma cara conhecida, tal como o “eu” do poema de Cesário Verde. Tal como na pintura as figuras ilustradas apresentam um forte sentimento entre elas, Cesário Verde, num dos seus poemas, põe o sujeito poético a mostrar uma grande admiração e fascínio pela sua amada, reprimindo-se a si mesmo: “Eu, que sou feio, sólido, leal, / A ti, que és bela, frágil, assustada, / Quero  estimar-te, sempre, recatada / Numa existência honesta, de cristal.” (“A débil”, vv. 1-4).
Outro poema que está relacionado com esta pintura é “Eu e ela”, mostrando sentimentos de desejo e saudade que, de uma certa maneira, se assemlham-se a algumas partes da obra de arte de Miguel Ângelo, por exemplo, “Cobertos de folhagem, na verdura, / O teu braço ao redor do meu pescoço, / O teu fato sem ter um só destroço, / O meu braço apertando-te a cintura;” (vv. 1-4), “Nós havemos de estar ambos unidos, / Sem gozos sensuais, sem más ideias, / Esquecendo para sempre as nossas ceias, / E a loucura dos vinhos atrevidos. / Nós teremos então sobre os joelhos / Um livro que nos diga muitas cousas / Dos mistérios que estão para além das lousas, / Onde havemos de entrar antes de velhos.” (vv. 9-16).
Em suma, ambas as obras de arte explicitam sentimentos relacionados com o amor, com a saudade e com o controlo do desejo. Como todos nós sabemos, muitos dos poetas, artistas e outros têm maior facilidade de passar este tipo de sentimentos mais profundos para as suas obras.

Grego (Bom (-))

Uso esta obra de Vincent van Gogh — "Nuit étoilée sur le Rhône (Noite Estrelada sobre o Ródano)” [1888] — para a comparar com a obra de Cesário Verde. van Gogh e Cesário foram contemporâneos e ambos extremamente importantes nas suas áreas, o holandês no pós-impressionismo e o português na poesia realista portuguesa. A pintura representa a vista noturna da cidade de Arles, no sul de França, sobre o Rio Ródano, o que por si, já apresenta bastantes similaridades com Cesário, que gostava de vaguear pela cidade e descrever o que via, algo inovador e que o ajudaria a marcar na poesia portuguesa, apesar do seu curto tempo de vida (trinta e um anos).
Cesário escrevia sobre o que via, a cidade, a vida quotidiana e a mulher. A mulher em Cesário, pode surgir-nos de duas perspetivas: o lado frágil, de mulher feia e mal-vestida ("e rota, pequenina, azafamada", "Num Bairro Moderno", v. 16) e o lado forte, de mulher genuína e trabalhadora, uma mulher do povo, que Cesário tanto admira. A pintura de van Gogh também nos oferece dois lados: a terra, escura, como que sem vida, é iluminada pelo outro lado, o céu, brilhantino por causa das estrelas que o faz destacar e ofuscar a outra faceta. Cesário presta atenção ao detalhe. Antes de relatar o acontecimento, anota que se passa em volta. Em "Num Bairro Moderno", cria um ser a partir da Natureza ao observar uma mulher. Mas, antes de o fazer, descreve-nos o ambiente: "Dez horas da manhã: os transparentes matizam uma casa apalaçada" (vv. 1-2). van Gogh também tem atenção especial ao detalhe, e,  no quadro em causa tem atenção para com as estrelas, como se estas representassem o seu 'eu' lírico, mas também às cores da noite, que van Gogh sempre teve em grande conta.
Em "O Sentimento dum Ocidental", a relação é mais evidente, dado que Cesário conta o que vai vagueando noite lisboeta adentro, percebendo ao longo da noite o cenário desolador em que se encontra a cidade, que o vai afligindo cada vez mais. "Nas nossas ruas, ao anoitecer / Há tal soturnidade, há tal melancolia / Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia / Despertam-me um desejo absurdo de sofrer" (I, vv. 1-4). Esta quadra mostra exatamente isso, e, na relação com o quadro de van Gogh, vemos a noite, escura, a melancolia da imagem sem ação aparente e vemos também um rio, o Tejo em Cesário e o Ródano em van Gogh. Ao fundo na pintura, vemos "os edíficios, com as chaminés, e a turba / [que se toldam] duma cor monótona e londrina" (I, vv. 7-8), que trazem ainda mais sentimento melancólico e agonizante ao poeta, dada a poluição que estraga o ar vivo devido à revolução industrial. Cesário refere o elemento a que van Gogh deu tanto poder nesta obra, em "Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras, enleva-me a quimera azul de transmigrar" (IV, vv. 3-4), referindo-se às preciosas estrelas cuja importância para a pintura foi escrita por Vincent ao irmão Theo numa carta. Cesário tinha uma visão inovadora para o seu tempo, algo que falta ao mundo nos dias de hoje, pois, como dizia o poeta português, "A dor humana busca os amplos horizontes" (IV, v. 43).
 
Beatriz Pi (Bom (-))
O quadro “Evening on Karl Johan Street”, que foi concebido pelo pintor norueguês Edvard Munch, em 1892, fez-me pensar em poemas de Cesário Verde, embora o poeta  já tivesse morrido quando o quadro foi criado. Ao contrário de Cesário, o pintor não se foca em detalhes: as janelas amarelas parecem flutuar no espaço e as caras das figuras observadas são praticamente inexpressivas, excepto os seus olhos arregalados, que olham fixamente para algo, transmitindo um certo sentimento de terror. Mesmo assim, existe uma certa ligação entre as obras artísticas.
Este quadro faz-me pensar especialmente num poema de Cesário Verde,“O Sentimento dum Ocidental”, uma vez que ambas estas obras artísticas têm vários aspectos em comum. Uma destas semelhanças, talvez a mais óbvia, é o facto de tanto no quadro como no poema o espaço são ruas citadinas . No poema de Cesário Verde, o sujeito poético encontra-se a passear pelas ruas de Lisboa (“Nas nossas ruas”) e a obra de Munch tem como localidade uma das zonas principais de Kristiana (a atual cidade de Oslo). Para além disto, ambas decorrem ao anoitecer. No “Sentimento Dum Ocidental” o “eu” do texto passeia pelas ruas desde o pôr do sol até à noite profunda e a pintura de Munch dá-se ao anoitecer, o que é evidenciado pela cor utilizada no céu.
Ao vaguer pelas ruas lisboetas, o sujeito lírico enfrenta sentimentos de melancolia, soturnidade e náusea, que culminam num “desejo absurdo de sofrer”, tal também está expresso na pintura, uma vez que as figuras encasacadas, com os seus olhos arregalados, transmitem também estes sentimentos, quase como se estivessem com medo, já em sofrimento. A maresia é ainda outro fator que contribui para o mal-estar do sujeito poético  (“(…)o Tejo, a maresia”) e, na situação ilustrado pelo quadro, poderá também ser sentida a maresia pois a cidade de Oslo, encontra-se também perto do mar.
Enquanto caminha por Lisboa, o sujeito lírico descreve ainda detalhadamente o que o rodeia, incluindo os edifícios (“E os edifícios, com as chaminés, e a turba / Toldam-se duma cor monótona e londrina.”). Esta descrição poderá ser aplicada aos edifícios representados na pintura, já que estes são pintados em cores escuras e acinzentadas, o que pode ser devido aos fumos e gases extravasados, que o enjoam e perturbam (v. II). O grande amontoado de figuras humanas no quadro ilustra também a “turba” referida no poema. Deste modo, é possível observarmos a tal “cor monótona e londrina” na pintura a óleo.  Existe, ainda, uma certa ironia, porque embora o “eu” do texto considere o seu país e a sua cidade no presente, como algo angustiante e de certo modo melancólico, considera o resto do mundo melhor e que todos aqueles que partem, abandonam Portugal, rumo a vidas mais felizes ((…) os que se vão. Felizes!”), mas quem observa o quadro e lê o poema consegue perceber que estes são mais semelhantes que o sujeito pensa.
Embora existam diferenças entre Cesario Verde e Edvard Munch como artistas, as obras que criaram complementam-se, estando unidas por sentimentos angustiantes e melancólicos. Mas como saberíamos valorizar a felicidade, sem angústia e melancolia?

Beatriz Pa (Bom-)
Para acompanhar o mar turbulento do poema “Heroísmo”, de Cesário Verde, escolhi a lindíssima pintura de Ivan Aivazovsky “The ninth wave [A nona onda]”.
Tal como no poema de Cesário, na tela está retratado um duelo mortal e um confronto com circunstâncias naturais excecionais. Nesta pintura a óleo vários homens apoiam-se no que resta do seu navio, que tal como o “eu” do poema temem (“o mar, o mar enorme, / Solene, enraivecido, turbulento, / Erguido em vagalhões, rugindo ao vento; / O mar sublime, o mar que nunca dorme.”).
O pintor russo de ascendência arménia, do Romantismo, é bem conhecido pelas suas paisagens marítimas, deixando um repertório de mais de seis mil obras, entre elas, a mais famosa, “A Nona Onda” pintada em 1883 e que atualmente, se encontra exposta no Hermitage. Tal como Cesário Verde, nasceu no século XIX, mas já morreu no seculo seguinte, com oitenta e três anos, ao contrário do nosso poeta que morreu ainda jovem aos trinta e um anos.
No início, o “eu” poético começa por temer o mar (“Eu temo o largo mar, rebelde, informe, / De vítimas famélico, sedento, / E creio ouvir em cada seu lamento / Os ruídos dum túmulo disforme.”), mas, depois acaba por apreciá-lo e gozar o momento, rindo, e quase que o admira (“E ouvindo muito ao perto o seu bramar, / Eu rindo, sem cuidados, simplesmente, / Escarro, com desdém, no grande mar!”); na pintura, os homens acabam por apreciar o pôr do sol desfrutando aquele momento único.
No soneto, o poeta personifica o mar, mas, mesmo perante tal força, não recua e enfrenta-o, não sendo apenas uma extensão de água, mas também um ser épico que é camoniano, que faz parte de uma epopeia vivida pelo pequeno barco. “Heroísmo”, de ritmo lento e melancólico, pode-se considerar como uma referência a Camões, porque é um soneto e refere o mar como ser que luta contra um herói.
 “A nona onda” mostra-nos a beleza deste ser épico e como ele funciona, pois as ondas crescem numa série de nove, sendo a primeira onda a mais baixa, e nona, a mais alta recomeçando o ciclo novamente. As cores quentes do sol refletido na água, oferecem conforto e esperança, da mesma forma que o “eu” poético ao longo do poema deixa de temer o mar, dando-nos a sensação de esperança e conforto.  

João R. (Suficiente)
Este óleo de Claude Monet — «Summerfield» ( ou campo de verão, se traduzido) —, podia de facto, servir de ilustração a alguns dos poemas do poeta português — Cesário Verde. Pelos olhos e pelas palavras do poeta, um retrato do mundo real. Observações exímias do poeta sobre o que vê.
“Como teu chapéu de palha desabado, / tu continuas na azinhaga; ao lado / verdeja, vicejante, a nossa vinha.” Não são muitos os anos que separam o nascimento de Claude Monet e de Cesário Verde. O poeta português seria quinze anos mais velho, mas acabaria por morrer quarenta anos antes do francês. São claras as semelhanças entre as sílabas e as cores; entre as palavras e o óleo. O que o português escreve com os seus versos, o francês ilustra com as suas cores.
No seu poema mais extenso, “Nós”, Cesário associa o campo à liberdade, à alegria à autenticidade. Um pouco à semelhança de “De Tarde” e “De Verão”, o campo é visto como “um salutar refúgio” contrastando com a visão deambulante das macadamizadas ruas e do “gás extravasado” — características da cidade. A observação do contexto e do quotidiano servem de base aos poemas de Cesário. Quer seja no campo ou pela cidade, Cesário descreve o que vê como  se de uma fotografia se tratasse. Para além das descrições dos aspetos visuais (cor, luz, etc.) , transmite também sensações olfativas, por vezes, aos seus versos — “O gás extravasado enjoa-me, perturba”.
A observação do quadro de Claude Monet permite outra relação direta com os versos do poeta. O que parece ser uma figura feminina no quadro pode ser outra semelhança entre o poeta luso e o pintor francês. A figura feminina é presença assídua em Cesário. O poema “De tarde” e “A Débil” são disso exemplos. Enquanto que a mulher do campo é vista com admiração por ser inocente e trabalhadora, a mulher citadina é vista como cruel e fria “Milady, é perigoso contemplá-la, / Quando passa aromática e normal, / Com seu tipo tão nobre e tão de sala, /Com seus gestos de neve e de metal.” — (“Deslumbres”).
Cesário passava o que via para o papel, através de palavras; Claude Monet pintava sobre uma tela. Diferentes maneiras de retratar a realidade do século XIX. Se as pinturas de Monet podiam ilustrar as palavras de Cesário, os versos do português podiam descrever os óleos do francês, tal é a semelhança.

Mafalda F. (Bom -)

Em a "Corrida de Táxi", de Iris Scott, de 2016, uma peça no anoitecer com uma iluminação turbulenta da cidade e a representação de um vulto colorido feminino, a correr pelo seu táxi numa cidade confusa e assustadora, que transparece simplicidade e delicadeza, faz-nos recordar alguns pormenores característicos de Cesário Verde. 
Iris Scott nasceu em Brooklyn, Estados Unidos, em 1984. Numa tarde de 2009, a pintora decide não se dar ao trabalho de limpar os seus pincéis e experimentar apenas os dedos para se exprimir. Foi assim que Scott descobriu um novo estilo artístico que começou a identifica-la. Agora, com a ponta dos seus dedos apenas, tem imensos quadros magníficos que se encontram na "Cole Gallery" e na galeria "Adelman Fine Art" em San Diego. 
Cesário Verde, conhecido pelo seu deambular observador, em "A Débil " e "Num Bairro Moderno" faz realçar a descrição de uma "moça" simples, bonita, bem feita e sensível ("Num ser humano que se mova e exista / Cheio de belas proporções carnais?!","A ti, que és bela, frágil, assustada, / Quero estimar-te, sempre, recatada"), que acaba por se identificar com a figura do quadro escolhido, que apresenta ser uma rapariga como as que Cesário descreve nestas duas obras.
Ainda em "A Débil", quando o eu diz "Eu, que sou feio, sólido, leal, / A ti, que és bela, frágil, assustada, / Quero estimar-te, sempre, recatada", podemos encontrar semelhanças com a pintura de Iris, pois, no meio de uma cidade escura, poluída e barulhenta, um lugar a que somente associamos momentos melancólicos e assustadores, conseguimos reparar numa rapariga dócil, bonita e atraente.
Em "O Sentimento dum Ocidental", as referências ao anoitecer, ao trânsito e à poluição da cidade — "E os edifícios, com as chaminés e a turba / Toldam-se duma cor monótona e londrina.” —, entre outros aspetos, são pontos de ligação ao quadro de Iris Scott. A confusão da cidade, a imensa multidão  de pessoas a deambular ou apressadas para chegar a um lugar, de um lado para o outro, gerando uma confusão imensa, o trânsito causado pela enorme quantidade de transportes, que conseguem ofuscar e o furar os tímpanos a uma cidade, com as suas luzes intensas brancas e as suas buzinas barulhentas  —"Batem carros de aluguer, ao fundo, / Levando à via-férrea os que se vão. Felizes!"— e, por fim, o seu verdadeiro anoitecer que acaba por  se tornar sombrio, com o seu silêncio e calmaria anormal (“E saio. A noite pesa, esmaga. Nos.”, “Um sopro que arrepia os ombros quase nus.").
Na tela de Scott, de uma forma mais e pormenorizada, também reparamos nestas pequenas coisas.

Maia (Bom +)
Em relação a este quadro de Yelena Sidorova, não consegui encontrar um título que fosse totalmente credível e apoiado uniformemente por todas as fontes. No entanto, encontrei dois que lhe servem justiça: “O gato no telhado” e “Alfama, Lisboa”. Estes dois títulos são apropriados por motivos diferentes.
Começando pelo mais simples, “Alfama, Lisboa” é muito fácil de relacionar com o poeta em estudo. No seu poema provavelmente mais célebre, “O Sentimento dum Ocidental”, Cesário menciona a passagem pela Sé de Lisboa (“À vista das prisões, da velha Sé, das Cruzes”, v. 7 de “Noite Fechada”). Esta, como certamente a maioria saberá, fica em Alfama. Podemos assim estabelecer uma ligação direta da obra de Yelena ao nosso estimado Cesário Verde. As ruas descritas por Cesário podem muito bem ser as retratadas por Sidorova. Aliás, na obra da pintora russa, vemos um edifício que aparenta ser a Sé. A sua coloração mais escura pode ser relacionada com “O Sentimento dum Ocidental” em “Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero”; através da dupla adjetivação, Cesário Verde refere-se ao passado da Inquisição com uma conotação mais sombria. A pintora pode ter tido uma intenção similar, mas com efeito mais literal, pintando com uma cor mais escura do que o resto da obra, realçando o efeito.
Quanto ao segundo título, acho necessário estabelecer uma ligação ligeiramente mais complexa do que a anterior. O gato no telhado mencionado, é apenas um pequeno detalhe na paisagem. Claro que é diferente observar e descrever uma paisagem a criar e desenha-la. Mesmo assim, eu argumentaria que a imagem que o poeta na inculca na cabeça é mais detalhada do que a da artista. Isto deve-se à capacidade descritiva e atentiva do português. Apesar de Sidorova nos fornecer uma imagem literal, Cesário faz melhor sem nunca apresentar uma única ilustração. Entre descrições de sentimentos, elementos luminosos, ações de terceiros, metáforas e críticas a sociedade (“Despertam-me um desejo absurdo de sofrer”, “ao anoitecer”, “E os guardas, que revistam as escadas”, “Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras”, “Triste cidade”, “Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero”, vv. vários d’ “O Sentimento dum Ocidental”), o poeta rivaliza com todos os pintores contemporâneos que infeliz e injustamente não reconheceram o seu talento no seu tempo de vida. A obra desta pintora, embora tenha detalhes como a roupa estendida numa das varandas e o previamente mencionado gato no telhado sentado sem nada fazer, nem se assemelha, ao nível descritivo, de Cesário Verde, a razão pela qual é tão destacado como artista.

Mafalda M. (Suficiente/Suficiente (-))

O quadro L'Absinthe, “O Absinto”, está datado de entre 1875/76, Edgar Degas, pintor francês foi o criador desta pintura a óleo, que retrata uma mulher bem vestida, com um homem ao seu lado e um copo de absinto, que me fez de imediato recordar o poema “A Débil” de Cesário Verde. No poema, o sujeito poético diz que está “Sentado à mesa dum café devasso” e vê uma mulher “(…) bela, frágil, assustada”, enquanto “(…) bebia cálices de absinto, │Mandei ir a garrafa, porque sinto │Que me tornas prestante, bom, saudável.”. O poema retrata um amor platónico, que não sabemos se será correspondido.
Edgar Degas viveu de 1834 a 1917 e Cesário de 1855 a 1886. Tanto o quadro como o poema estão datados no mesmo ano 1875, o que poderá ser uma pura coincidência… Contudo, o objetivo da pintura seria retratar a sociedade francesa da época, sendo que há mais quadros que retratam a vida boémia da época. Dengas foi um impulsionador para o modernismo, já Cesário ficou ligado ao realismo embora tenha sido grande inspirador dos poetas modernistas.
Ao analisar um pouco a escrita de Cesário, referirei agora outras poesias, como “Num bairro moderno”, “O Sentimento dum Ocidental” ou “De Tarde”. Observamos que todos os seus “eu” poéticos colocam características do campo na cidade e vice-versa, sendo as do campo associadas ao lado positivo da vida e as da cidade à doença, à confusão, à desordem, acabando por equilibrar perfeita e harmoniosamente os dois mundos completamente distintos. Outra particularidade é que todos os poemas são valorizados pelas texturas das frutas inseridas para contextualizar, como por exemplo quando o sujeito poético compara frutas, o seu cheiro, a sua cor e o seu toque, cujas inserções no texto nos fazem logo imaginar o que o “eu” está a descrever. Cesário recorre também a uma escrita deambulante, que vai passando por várias ruas em Lisboa e pontos emblemáticos. Tratando-se de um lisboeta que adorava a sua cidade, é bastante interessante a nova perspetiva que ele dá aos poemas e às ruas referidas nos mesmos.
No caso específico de “A Débil”, não existe uma comparação entre cidade-campo, mas existe uma comparação entre o homem-mulher, que no caso são o “sujeito” e a “Débil”. Tal como nas outras comparações também existe o bom, saudável, frágil e puro, a mulher, e o mau, o “sujeito” que se diz “(…) feio, sólido, leal”, mas, ao vê-la fica “(…) bom, saudável.”, como se apenas um pequeno vislumbre de simplicidade e beleza fizesse mudar um boémio, sendo feita a mesma abordagem na cidade-campo, como se algo tão barulhento e confuso pudesse ser acalmado com a frescura e suavidade do campo.

Rodrigo (Bom -)
“Terraço do Café à Noite”, cujo nome completo é “O Terraço do Café na Praça do Fórum, Arles, à Noite”, é uma obra do pintor holandês Vincent van Gogh, nascido em 1853, apenas dois anos antes de Cesário Verde (1855-1886), um dos pioneiros, precursores da poesia que seria feita em Portugal no século XX. O número de quadros que seria possível utilizar para fazer este trabalho é extensíssimo, mas acho que este se adequa perfeitamente ao “estilo” de Cesário Verde.
Quando oiço falar em “poemas de Cesário Verde” associo-os de imediato ao ambiente citadino, algo que, no quadro representado, é fácil de identificar pois se trata de uma pintura de uma praça. O chão, provavelmente feito de xisto, a esplanada, a rua delimitada por prédios de pequenas dimensões remete-nos ao poema «O Sentimento dum Ocidental», onde o “eu” poético vagueia pela «cidade melancólica».
O tempo que envolve as duas obras é também idêntico. Em «O Sentimento dum Ocidental», o sujeito poético vagueia pela sua cidade desde o anoitecer até chegar a noite carregada (“Nas nossas ruas, ao anoitecer [...]”; “A noite pesa, esmaga [...]”). No quadro, van Gogh faz sobressair o amarelo das estrelas sobre o azul escuro da noite, dando-nos a impressão de um anoitecer escuro e estrelado.
Outra característica deveras interessante que permite a comparação entre as duas obras é, sem dúvida, o estado de espírito, o sentimento carregado que ambas transmitem aos seus apreciadores. No quadro, podemos ver uma esplanada pouco frequentada e, apesar das cores vivas com o objetivo de encenar as luzes que iluminam a esplanada, a rua em si, é escura, fria. Em «O Sentimento dum Ocidental», o “eu” poético é bastante específico e critico à medida que vagueia pela cidade, sentindo-se enjoado pelo ar da cidade, chegando à necessidade de sofrer (“[...]O gás extravasado enjoa-me, perturba [...]”). O “eu” do poema é muito transparente em relação aos seus sentimentos, que são doentios e melancólicos, como se tudo na cidade o perturbasse: “[...] Que as sombras, o bulício, o Tejo, [...] Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.”
Tanto a abordagem literária, neste caso, a do poema «O Sentimento dum Ocidental», que de todos os poemas de Cesário Verde é um dos que mais se assemelha ao quadro de van Gogh “Terraço do Café à Noite”, como a artística apresentam uma conotação pessoal que cabe ao leitor ou observador identificar para, desse modo, fazer o seu juízo.

Alexandra (Suficiente -/Suficiente (-))
Escolho este quadro de Maurits Cornelis Escher — “Self-Portrait in Spherical Mirror” (auto-retrato em espelho esférico) — uma litografia impressa pela primeira vez em janeiro de 1935.
O artista nasceu em Leeuwarden (Holanda), em 1898, e faleceu em 1972. Cesário, nascido em 1855, em Lisboa, mesmo sendo quarenta e três anos mais novo que o pintor holandês acaba por vir a falecer mais cedo que o mesmo devido à tuberculose.
Escher era incompreendido pela classe artística e crítica da época, devido ao seu estilo próprio, não se enquadrando em nenhum movimento artístico específico, tal como o poeta Cesário que, por ter abordagens inovadoras, inspirou os poetas portugueses do século XX, mas foi incompreendido no seu tempo.
Em muitos poemas de Cesário está presente a captação das impressões causadas pela realidade, a transmissão de sensações e a representação das situações do quotidiano, já que o mundo real serve de suporte às suas ideias, como em “Num Bairro Moderno” (“Dez horas da manhã; os transparentes / Matizam uma casa apalaçada; / Pelos jardins estancam-se as nascentes, / E fere a vista, com brancuras quentes, / A larga rua macadamizada.”, vv. 1-5). Estas características estão presentes neste quadro de Escher onde a captação do real é evidente. Neste auto-retrato, tal como o nome indica, Escher representa-se a si próprio e a tudo o que o rodeia da mesma forma que Cesário nos seus poemas, como em “O Sentimento dum Ocidental” (“O céu parece baixo e de neblina, / O gás extravasado enjoa-me, perturba; / E os edifícios, com as chaminés, e a turba / Toldam-se duma cor monótona e londrina.”, vv. 5-8), onde o poeta mostra estas mesmas características.
As estrofes destes poemas, estudados em aula, constituem uma visão panorâmica de tudo o que rodeia o sujeito poético quando deambula “Faz frio. Mas, depois duns dias de aguaceiros, / Vibra uma imensa claridade crua. / De cócoras, em linha os calceteiros, / Com lentidão, terrosos e grosseiros, / Calçam de lado a lado a longa rua,” (vv. 1-5 de “Cristalizações”); e os sentimentos e sensações vividas no ambiente descrito “Sentado à mesa dum café devasso, / Ao avistar-te, há pouco, fraca e loura, / Nesta Babel tão velha e corruptora, / Tive tenções de oferecer-te o braço.” (vv. 5-8 de “A Débil”). A caracterização feita pelo poeta transmite imagens extremamente visuais, de modo a dar uma dimensão realista do mundo com pormenor descritivo. Tal visão é também representada por Escher no seu quadro, onde se representa a si próprio e ao meio em que se encontra inserido.

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